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Representações socias em enfermagem: comentários sobre teses e dissertações

Social representations: commentary about thesis and dissertations

Resumos

O ponto de partida deste trabalho se constitui de um levantamento de teses e dissertações desenvolvidas por enfermeiros com o objetivo de verificar como a representação social foi utilizada enquanto referencial teórico nestas pesquisas. Através de uma leitura sistemática dos trabalhos destacou-se as temáticas, os principais resultados e as reflexões que estes propunham para as práticas profissionais de enfermagem. Constatou-se, a partir dos trabalhos analisados que este referencial teórico é utilizado pelos enfermeiros, e que alguns estudos desenvolvidos trazem resultados significativos favorecendo a mudança da visão desses profissionais.

Representações sociais; Enfermagem


The starting point of this work consists on a revision of thesis and dissertations developed by nurses aiming to check how the social representation was used as a theoretical referencial on these researches. Through a sistematic reading of these works some points were dettached, as thematic, main resultas and reflections proposed in order to atain professional practice nursing. It was ascertained from the analysed works that this theoretical referencial is used by nurses, and that some studies developed introduce significative results from these professionals.

Social representations; Nursing


ARTIGOS ORIGINAIS

Representações socias em enfermagem: comentários sobre teses e dissertações1 1 Este trabalho foi apresentado no 47º Congresso Brasileiro de Enfermagem, novembro de 1995, em Goiânia

Social representations: commentary about thesis and dissertations

Ana Lúcia MachadoI; Francisca Bezerra de OliveiraII; Waldine Viana da SilvaIII; Zélia Nunes HupselIV

IEnfermeira. Professora Assistente do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica da EEUSP. Doutoranda em Enfermagem da EEUSP

IIEnfermeira. Professora Assistente do Departamento de Enfermagem do Campus V da Universidade Federal da Paraíba. Doutoranda EEUSP

IIIEnfermeira. Professora Adjunto do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal do Pará. Doutoranda EEUSP

IVEnfermeira. Professora da Faculdade de Enfermagem do Hospital Israelita Albert Einstein

RESUMO

O ponto de partida deste trabalho se constitui de um levantamento de teses e dissertações desenvolvidas por enfermeiros com o objetivo de verificar como a representação social foi utilizada enquanto referencial teórico nestas pesquisas. Através de uma leitura sistemática dos trabalhos destacou-se as temáticas, os principais resultados e as reflexões que estes propunham para as práticas profissionais de enfermagem. Constatou-se, a partir dos trabalhos analisados que este referencial teórico é utilizado pelos enfermeiros, e que alguns estudos desenvolvidos trazem resultados significativos favorecendo a mudança da visão desses profissionais.

Unitermos: Representações sociais. Enfermagem.

ABSTRACT

The starting point of this work consists on a revision of thesis and dissertations developed by nurses aiming to check how the social representation was used as a theoretical referencial on these researches. Through a sistematic reading of these works some points were dettached, as thematic, main resultas and reflections proposed in order to atain professional practice nursing. It was ascertained from the analysed works that this theoretical referencial is used by nurses, and that some studies developed introduce significative results from these professionals.

Unitermos: Social representations. Nursing.

1 INTRODUÇÃO

O conceito de representação social foi resgatado e introduzido na psicologia social por Moscovici, através do estudo "A psicanálise, sua imagem e seu público", publicado em Paris, no início da década de 70 e posteriormente em 1978 no Brasil com o título: "A representação social da psicanálise" (MOSCOVICI, 1978). 0 autor utiliza como objeto de pesquisa a apropriação da psicanálise por alguns segmentos da sociedade francesa, nos anos 50. Interessou a Moscovici averiguar como ocorreu a penetração e integração desse novo conhecimento na cultura francesa.

Representação social é um conjunto de conceitos, explicações e afirmações que se originam no cotidiano através de comunicações interindividuais; contribue para a formação das condutas e a orientação das comunicações sociais; possibilita o processo de objetivação e ancoragem, que será conceituado no decorrer deste trabalho. Enfim, representação social pode ser compreendida como a "teoria do senso comum" designando, numa perspectiva ampliada, uma forma de pensamento social (MOSCOVICI, 1978).

Toda representação é sempre a representação de um objeto por um sujeito. Não existe, portanto, representação sem objeto. Dessa forma, uma representação não pode ser compreendida enquanto processo cognitivo individual já que é produzida no intercâmbio das relações e comunicações sociais. A representação descreve as interconexões entre o sujeito e o sistema, o sujeito e o objeto. Um não existe sem o outro, porém, cada um possui suas próprias especificidades.

De acordo com SPINK (1991) "ao trabalhar com representações sociais, deparamo-nos com uma noção "carrefour", que está situada na encruzilhada de múltiplas disciplinas e, portanto, prenuncia uma postura "pós-moderna" e de ciência francamente interdisciplinar. Assim, a representação social é um referencial possível para investigações psicossociais que ajudariam a enfermagem a dar respostas aos complexos problemas enfrentados no seu cotidiano, especialmente por enfatizar a necessidade de contextualizar os fenômenos sobre os quais se debruça. Dessa forma, o conhecimento estudado via representações sociais é sempre uma maneira comprometida e/ou negociada de interpretar a realidade.

Constata-se crescente interesse de pesquisadores em enfermagem por essa abordagem teórica2 2 Na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto-USP, existe um grupo de estudos sobre representações sociais desde 1994, onde algumas pesquisas estão sendo desenvolvidas com esse referencial. O grupo conta com a participação de docentes e alunos de pós-graduação e alguns estudos de pós-graduação têm sido elaborados a partir dessa perspectiva, uma vez que, as representações sociais permitem explicitar nossa visão das complexas relações entre o biológico e o social, pois, ao expormos nossas visões de saúde/doença estamos falando, efetivamente, da sociedade e da nossa relação com a realidade social.

Sendo assim, consideramos oportuno fazer um levantamento das pesquisas desenvolvidas pelos enfermeiros, nos últimos cinco anos, para averiguar como estes profissionais estão utilizando a teoria das representações sociais. Nestas pesquisas, procuramos destacar as temáticas, os principais resultados e as reflexões propostas para o exercício da prática profissional .

2 FUNÇÕES E FORMAÇÃO DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

SPINK (1993), fundamentada na análise de diversos estudos que abordam as representações sociais enquanto forma de conhecimento prático, destaca asseguintes funções da representação: "orientação das condutas e das comunicações (função social); proteção e legitimação de identidades sociais (função afetiva) e familiarização com a novidade (função cognitiva)".

Na mesma perspectiva MOÑIVAS (1994) assinala que as representações sociais cumprem três funções: a) possibilitar aos indivíduos dominar e dar sentido ao mundo; b) facilitar a comunicação; c) transformar o conhecimento científico em sentido comum.

A elaboração e funcionamento de uma representação podem ser entendidos através dos processos de objetivação e ancoragem que compreendem a articulação entre conteúdo cognitivo e as determinações sócio-históricas em que surgem e circulam as representações.

Como afirma MOSCOVICI (1978), a ancoragem se refere a inserção orgânica do que é estranho ao pensamento já constituído. Ancorar é denominar, classificar fenômenos desconhecidos, novos para o senso comum, a partir de conhecimentos já existentes, atribuindo significado aos objetos. Este processo se revela enquanto um instrumento para o pesquisador verificar a incorporação social de um saber, como é o caso da difusão de uma teoria em determinado grupo social.

A cristalização de uma representação remete, por sua vez, ao processo enunciado na teoria das representações sociais - a objetivação - isto é, a constituição formal do conhecimento. "Fundamentalmente, a objetivação consiste em materizalizar as abstrações, corporificar os pensamentos, tornar físico e visível o impalpável, enfim, transformar em objeto o que é representado". A objetivação, em resumo, significa descobrir o aspecto icônico de uma idéia ou ser. Portanto, no processo de formação das representações sociais entendemos que é relevante articular a ancoragem e a objetivação numa perspectiva dialética, pois, segundo NÓBREGA (1990), tal relação assegura as três funções da representação: "incorporação do estranho ou do novo, interpretação da realidade e orientação dos comportamentos"

3 ESTUDO

Realizamos um levantamento de teses e dissertações desenvolvidas pelos enfermeiros com o objetivo de verificar como a representação social foi utilizada enquanto referencial teórico. O levantamento abrangeu trabalhos desenvolvidos nos últimos cinco anos e foi realizado no Estado de São Paulo, devido a concentração maior de cursos de pós-graduação - mestrados e doutorados em enfermagem (CAPES, 1993).

Foram pesquisados trabalhos da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Faculdade de Saúde Pública e Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, representando um total de nove trabalhos. Utilizando a seguinte metodologia: realizamos uma leitura das pesquisas realizadas objetivando destacar temáticas, principais resultados e reflexões que favorecem a prática profissional. Esta leitura nos permitiu delinear alguns passos metodológicos utilizados pelos autores, discriminar os objetivos propostos, apresentando resumidamente as conclusões ou considerações mais gerais a que chegaram.

Nota-se uma variedade em relação à população escolhida, significando a ampla gama de objetos de estudo que dispomos em enfermagem (enfermeiros assistenciais e equipe de enfermagem, docentes, população assistida pelo enfermeiro). Diante deste fato, a representação social como opção para o suporte teórico-metodológico, tem sua pertinência já que lida atentamente com os aspectos psicossociais do cotidiano, com o pensar, sentir, agir inerente a todas as relações sociais e dimensiona nossas investigações na interdisciplinaridade.

4 RESULTADOS

MORGAN, G.A.S.G. Estudo da representação social do enfermeiro recémformado em seu primeiro emprego e suas expectativas em relação ao programa de orientação. São Paulo, 1992. Dissertação (Mestrado) - Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo.

O estudo é descritivo - exploratório sobre as representações de enfermeiros recém-formados em seu primeiro emprego. A pesquisa teve como objetivos: “identificar a representação social de enfermeiro recém-formado em relação ao seu primeiro emprego; identificar o tipo de programa de orientação oferecido pela instituição hospitalar ao enfermeiro recém-formado; verificar a relação entre a representação social do enfermeiro e o programa de orientação oferecido”.

Os dados foram obtidos em hospitais gerais públicos e privados, localizados na cidade de São Paulo, que tinham, no mínimo 200 e no máximo 500 leitos. Destes, foram selecionados 26 hospitais, dos quais 15 contam com o programa de orientação, e 11 não. A população foi constituída de 14 enfermeiros recémformados e 5 enfermeiros chefes das referidas instituições.

Em suas conclusões finais, a autora afirma que "a representação social do enfermeiro recém-formado em relação ao seu primeiro emprego expressou-se através das dificuldades e insatisfações encontradas no seu trabalho nas instituições empregadoras e como foi orientado". Além disso, destaca ainda que "tanto os enfermeiros que receberam orientação como os que não receberam relatam que houve dificuldade de relacionamento com os funcionários por causa de sua inexperiência, dificuldade no desenvolvimento do trabalho pela existência de número grande de pacientes; dificuldades de enfrentamento da realidade por causa da falta de continuidade e de ligação entre os conhecimentos adquiridos na faculdade e os problemas encontrados no hospital e a falta de orientação por parte das chefias, que no entanto alegam ter orientado bem os recém-admitidos".

ROLIM, M.A. As representações sociais acerca do doente mental atendido em emergências psiquiátricas. São Paulo, 1993. Tese (Doutorado) - Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo.

O estudo é referente às representações sociais de enfermeiros e auxiliares de enfermagem, trabalhadores de serviço de emergência psiquiátrica, sobre o doente mental.

Teve como objetivo: “captar as representações sociais acerca do doente mental e refletir sobre o processo de construção dessas representações, as relações entre elas e a prática assistencial cotidiana de enfermagem.”

A autora usou a análise de conteúdo do discurso de 10 enfermeiros e 15 auxiliares de enfermagem. “O processo de compreensão da dinâmica, estabelecida entre os níveis de saber envolvidos na prática institucional de atendimento do doente mental - o saber do senso-comum, por um lado, e o saber baseado em conhecimento científico especializado da área psiquiátrica, por outro - foi questão que perpassou todo o trabalho.”

Em suma, a pesquisadora conclui que “a representação social que as profissionais de enfermagem têm da doença mental apresenta um núcleo figurativo que aponta o cérebro como instância biológica de localização da doença mental" (...) ou seja, a “representação organicista orienta e justifica uma prática cotidiana centrada na terapêutica farmacológica que revela ser o paciente tratado apenas como ser biológico, parecendo negar a sua natureza emocional e social".

Como sugestão, aponta a necessidade de se repensar o ensino da enfermagem psiquiátrica que contemple mudanças nas representações sociais acerca do doente mental, “representações estas que o concebem como um ser improdutivo, agressivo, incurável, à margem da sociedade, e que o ensino seja voltado não só para mudanças de opiniões, atitudes e para o acúmulo de conhecimentos formais como também apresente possibilidades de repensarmos o papel da teoria de enfermagem a luz de como se apresenta na prática".

MANDÚ, E.N.T. Sáude no olhar de mulheres: afirmação e negação do saber e prática dominantes no campo médico. Ribeirão Preto, 1995. Dissertação (Mestrado) - Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo.

O estudo procurou compreender as representações de um segmento de mulheres das camadas populares acerca do fenômeno saúde-doença.

Participaram deste estudo onze mulheres residentes na periferia do município de Cuiabá., Mato Grosso. Como instrumentos de coleta de dados utilizou-se a entrevista semi-estruturada e a observação. Como método de análise a hermenêutica-dialética.

No processo de análise foi feito um movimento constante entre o empírico e a teoria na tentativa de explorar profundamente o discurso das entrevistadas. Constatou-se que as representações das mulheres sobre o processo saúde-doença reproduzem valores veiculados pela medicina "oficial" e, ao mesmo tempo, apresentam uma identidade particular segundo necessidades, experiências e interesses específicos do grupo.

Enfim, o estudo revelou "que em meio as formas refinadas de dominação do sistema encontram-se espaços e sujeitos em condições de exercitar a liberdade e a cidadania". O discurso que apresentam é rico e contribui para o questionamento das políticas sociais vigentes.

PADILHA, K.G. Des-Cuidar: as representações sociais dos enfermeiros de UTI sobre as ocorrências iatrogênicas de enfermagem. São Paulo, 1994. Tese (Doutorado) - Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo.

Os objetivos propostos pela autora são: "descrever as ocorrências iatrogênicas de enfermagem na UTI quanto à incidência, natureza, consequências imediatas para o paciente, circunstâncias nas quais ocorrem e os fatores a elas relacionados; analisar as representações sociais dos enfermeiros de UTI sobre as iatrogênias de enfermagem, a partir do relato de ocorrência iatrogênica vivenciada na prática profissional."

A pesquisa foi realizada em dois momentos: primeiro uma coleta de dados descritivos obtidos em cinco UTIs, ou seja, incidência, consequências, circunstâncias nas quais ocorrem e fatores intervenientes. Num segundo momento, denominado de subjetivo, foram realizadas entrevistas com seis enfermeiros de um Curso de Especialização de Enfermagem em Cuidados Intensivos.

A apresentação dos dados foi feita separadamente, porém a análise final foi um cruzamento do conjunto dos dados. O núcleo temático principal, ao analisar as representações sociais dos enfermeiros, foi o Cuidar e as ocorrências iatrogênicas o Des-cuidar, definidas em contraposição ao cuidado idealizado. "Para explicar tal cuidar, os sujeitos percorreram três temas básicos que configuraram as seguintes categorias: o objeto da ação na UTI, a ação propriamente dita e o agente da ação naquele cenário."

A autora conclui que as "ocorrências iatrogênicas são eventos reais" no cotidiano da prática de enfermagem na UTI, gerando preocupações e sofrimento aos profissionais. A discussão vislumbra a existência de relação entre as ocorrências e o volume excessivo de trabalho. As representações sociais "apontam para o potencial educativo", vislumbram a qualidade do cuidar, a análise crítica deste cuidar. Como sugestão propõe a revisão constante do ensino e da assistência, "pautados na reelaboração da relação sujeito e objeto de prática: o cuidar em UTI".

OSAVA, R.H. Estudo das representações sociais do parto entre enfermeiros de maternidade num município paulista. Ribeirão Preto, 1990. Dissertação (Mestrado)- Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo.

A pesquisa analisou a assistência obstétrica brasileira, determinada pelo número elevado de cesareanas. A autora fez um levantamento histórico "da disputa entre os agentes ligados à atenção ao parto."

O estudo foi realizado em duas maternidades, sendo entrevistados seis sujeitos. As entrevistas foram não-diretivas; como técnica para a análise dos dados, utilizou-se a análise de conteúdo.

Concluiu que as classes sociais influenciam na representação social do parto, estando "mais relacionadas a um ato "instintivo" para mulheres das classes populares, e mais relacionadas a um ato "cultural", para as mulheres das classes mais elevadas; e que o parto normal é fortemente associado a idéia de "imprevisibilidade", enquanto o parto cesáreo é predominantemente associado à idéia de "segurança"."

SILVA, M.A.D.da As representações sociais dos professores de enfermagem e a dimensão ética: uma tentativa de articulação. São Paulo, 1995. Tese (Doutorado) - Faculdade de Educação, Pontifícia Universidade Católica.

A pesquisa buscou estudar as representações sociais de professores de enfermagem sobre a formação do enfermeiro, o seu trabalho, as suas relações com as associações de classe e as suas dimensões éticas.

O estudo teve como cenário duas Escolas Públicas de Enfermagem do Estado de São Paulo, ambas unidades da Universidade de São Paulo (USP), uma situa-se na capital, e outra em Ribeirão Preto. Participaram da pesquisa 13 professores de enfermagem. Utilizou-se como estratégia de coleta de dados a entrevista semi-estruturada contendo um roteiro de perguntas. Os conteúdos relatados foram agregados em unidades temáticas.

A análise dos dados revelou que os professores entrevistados têm dificuldades em delimitar as funções do enfermeiro. "Os professores de enfermagem associaram as atividades profissionais do enfermeiro fundamentadas basicamente nas atividades de cuidados diretos junto ao paciente e nas administrativas, estas em vários âmbitos, desde administração do cuidado do paciente até a administração de hospitais, unidades e setores da área da saúde como um todo. Os depoimentos sobre pesquisa e ensino foram praticamente inexistente, indicando um distanciamento das atividades consideradas intrínsecas do seu cotidiano, enquanto docente e pesquisador".

O autor concluiu que os professores entrevistados associam a enfermagem e o enfermeiro como uma profissão: com "falta de reconhecimento social, intelectual, além de ser submissa". No tocante ao exercício liberal os entrevistados não conseguiram deixar claro as atribuições e funções específicas do enfermeiro, tornando difícil a associação com um exercício de trabalho caracteristicamente liberal. O médico é o parâmetro de comparação para a formação e atuação profissional do enfermeiro. Os professores assinalaram que os enfermeiros desconhecem as especificidades do seu trabalho e o ensino de enfermagem vive o conflito entre o que é ensinado nas escolas de enfermagem e aquilo que é exercido pelo enfermeiro na sua prática de trabalho. O ensino de enfermagem é apontado, ainda, como fragmentado e ministrado de forma superficial. Sobre as associações de classe, os pesquisados assinalaram um desinteresse generalizado do enfermeiro. E o professor se associa pelo interesse em publicar seus trabalhos nas revistas das entidades, já que a publicação é uma exigência acadêmica, e ainda, que as associações não promovem a "união de classe".

Por fim, "a dimensão ética de enfermagem é embasada pelas suas experiências particulares de vida, embora nos seus discursos, o mais perceptível são os entendimentos de ética relacionados com a normatização, com a ética legal, provavelmente pela influência dos códigos de ética da enfermagem na sua formação profissional".

OLIVEIRA, D. C. de. O desenvolvimento infantil e suas representações: dimensões do saber técnico-profissional e do senso comum. São Paulo, 1990. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo.

O trabalho se propõe a investigar: "as representações sociais de mães e de profissionais atuantes na rede básica de serviços acerca do desenvolvimento infantil; elementos comuns e específicos aos dois níveis de conhecimento - técnico profissional e do senso-comum; as implicações das representações existentes nas duas categorias para a prática profissional/institucional no campo da Saúde Pública/Coletiva".

A pesquisa foi dividida em dois momentos: primeiro foram entrevistadas 54 mulheres usuárias de duas unidades básicas de saúde, localizadas na Grande São Paulo. No segundo momento, foram entrevistados 15 profissionais, de formação variada, que atuam nas referidas unidades, em programas dirigidos à criança.

Para o entendimento dos dados, foi feita a análise dos discursos, com a constituição de três "núcleos estruturadores dos discursos" e por categorias gerais e específicas de discurso e grupos temáticos. Alguns dos temas discutidos na análise dos discursos das mães foram: "as formas de estruturação do grupo familiar, os valores incorporados pela família e transmitidos aos filhos através do processo de socialização das crianças" , entre outros. No tocante às práticas profissionais, as temáticas destacadas foram: as "relações de poder estabelecidas entre mulheres usuárias dos serviços e o grupo profissional a ele vinculados".

A pesquisa se sustenta na interdisciplinaridade, na discussão de propostas governamentais, que às vezes ignoram os sujeitos: mães e profissionais. Assim, a autora procura “reconstruir a realidade pesquisada à luz da psicologia, antropologia e sociologia", permitindo dimensionar conceitos da ordem do individual e do social, inseridos no processo de desenvolvimento infantil.

Condições de produção do saber e das práticas daí derivadas, direcionam o trabalho. A autora finaliza esperando ter contribuído para um "processo de entendimento” entre os saberes do senso-comum de um lado e técnico profissional do outro, associando o saber científico especializado da área.

CIAMPONE, M.H.T. Assistência institucionalizada a indivíduos portadores de deficiência mental: dimensões esquecidas. São Paulo, 1993. Tese (Doutorado) - Institudo de Psicologia, Universidade de São Paulo.

O objetivo da tese foi o de "conhecer e compreender o trabalho das pajens" de uma instituição que assiste a indivíduos portadores de deficiência mental, em regime de internato. As pajens representam "o maior contingente do pessoal da Instituição", é uma categoria composta por pessoal tecnicamente menos qualificado, que permanece ao lado do deficiente, exercendo atividades sob supervisão do Serviço de Enfermagem.

Foram feitas entrevistas com as pajens, onde a autora desenvolveu "a proposta de análise do universo simbólico, reconstituido a partir da representação contida no discurso das pajens, o seu cotidiano de trabalho e os vínculos aí constituídos". Ficaram dimensionados os níveis psicossocial (individual), o sociodinâmico (grupo), o institucional (instituição) e o comunitário (sociedade).

Assim, a autora chama a atenção sobre a "vivência subjetiva e a significação do trabalho", ao descrever os mecanismos de defesa construídos no exercício coletivo do trabalho. Esses mecanismos de defesa permitem o contato com o "sofrimento e a ansiedade advindos da tarefa primária - cuidar do portador de deficiência mental"; influenciam a organização e as mudanças no trabalho institucional; remetem a um contexto mais amplo da representação da sociedade, ao exteriorizar medo, isolamento e exclusão em relação aos deficientes.

MORENO,V. O processo de desinstitucionalização e a Reforma Psiquiátrica: representações sociais entre profissionais e ocupacionais da Enfermagem. São Paulo, 1995. Dissertação (Mestrado) - Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo.

O objeto de estudo consiste em apreender as representações sociais do processo de desinstitucionalização do doente mental e a Reforma Psiquiátrica entre os profissionais e ocupacionais da enfermagem.

Partiu do princípio de que embora o referido processo dê mostras de avanços no plano político tendo como ator privilegiado o movimento de trabalhadores de saúde mental e no plano jurídico através de Projetos de Leis, a nível estadual e nacional, ele não tem sido compreendido em seus aspectos gerais, pelas categorias alvo deste estudo. Apreender o objeto exigiu, inicialmente, explicitar uma concepção de processo de desinstitucionalização, reforma psiquiátrica e representação social.

Utilizou como método de pesquisa - o estudo de caso, em uma instituição psiquiátrica, procurando a partir da população alvo caracterizada dos pontos de vista sócio-econômicos, profissional, modos predominantes de conceber e lidar com a doença/doente mental. Como técnica de coleta de dados foi utilizada a entrevista. Do total de 46 trabalhadores entrevistados quatro são profissionais da enfermagem e 42 são ocupacionais.

Concluiu que os profissionais e ocupacionais da enfermagem fundamentam suas práticas nos paradigmas organicista e psicodinâmico. Referem-se ao doente mental como "o ser diferente, excluído socialmente e tendo a pior doença que existe". Sendo que esta é enfrentada basicamente através do uso de medicações e de atividades que exigem pouca elaboração intelectual.

Enfim, a autora constatou que os ocupacionais de enfermagem concebem o processo de desinstitucionalização como desospitalização resultando em desemprego para uma parcela de trabalhadores pouco qualificados e na inexistência de condições objetivas para sua existência social e daqueles pacientes internados na instituição por problemas sócio-econômicos. Como modelo para implantação do processo de desinstitucionalização e reforma psiquiátrica identificam o programa de saúde mental da cidade de Santos.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A teoria das representações sociais formulada no final dos anos 50, só vai encontrar ressonância na comunidade científica no campo da psicologia social, bem como em outras áreas de domínio tais como sociologia, filosofia, antropologia e história, na década de 70.

Historicamente a enfermagem investigativa teve certa preferência por determinados referenciais. No entanto, um olhar ampliado a partir de eventos e produções científicas, tem delineado outro panorama no tocante à apreensão de teorias, iniciativas de leituras interdisciplinares dos objetos de pesquisa e um compromisso em renovar as discussões e estudos em consonância com as mudanças paradigmáticas contemporâneas.

No que concerne à difusão das representações sociais no meio acadêmico da enfermagem, observamos que o movimento neste sentido é recente e portanto a intenção maior de nosso trabalho é permitir reflexões e divulgação, tanto do referencial como de sua utilidade concreta. Salientamos que outras pesquisas sobre a produção de conhecimentos em enfermagem, devem ser estruturadas permitindo um diálogo crítico, ético e aprofundado do nosso papel de investigadores.

A partir do levantamento de teses e dissertações elaboradas pelos enfermeiros, nos últimos cinco anos dessa década, constatamos apenas nove pesquisas respaldadas pelo referencial teórico das representações sociais. Acreditamos que em algumas pesquisas seria apropriado uma melhor fundamentação teórica, o que permitiria dimensionar e aprofundar a análise da complexidade dos fenômenos estudados. Talvez isso seja decorrente de um conhecimento pouco aprofundado da teoria, como das múltiplas dimensões do campo de estudo das representações sociais, as contradições e paradoxos com que se depara o pesquisador ao utilizar uma abordagem teórica.

Contudo, é importante ressaltar, que algumas pesquisas desenvolvidas evidenciam resultados que poderão resignificar discussões e práticas profissionais. Assim, entendemos que a representação social, quando utilizada com competência, poderá auxiliar o enfermeiro a dar respostas sábias aos complexos problemas enfrentados no seu cotidiano, especialmente, por enfatizar a necessidade de contextualizar os fenômenos sociais/afetivos sobre os quais se debruça. Em suma, a enfermagem poderá ter um "novo olhar" - um olhar psicossocial dos problemas pesquisados.

  • CAPES, avaliação da pós-graduação: síntese dos resultados, Brasília, 1993.
  • CIAMPONE, M.H.T. Assistência institucionalizada à indivíduos portadores de deficiência mental: dimensões esquecidas. São Paulo, 1993. Tese (Doutorado) - Institudo de Psicologia, Universidade de São Paulo.
  • MANDÚ,E.N.T. Sáude no olhar de mulheres: afirmação e negação do saber e prática dominantes no campo módico. Ribeirão Preto, 1995. Dissertação (Mestrado) - Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo.
  • MOŃIVAS, A. Epistemologia y representaciones sociales: concepto y teoria. Rev.de Psicol Geral y Aplic. n.4, p.409-19, 1994.
  • MORENO, V. O processo de desinstitucionalização e a Reforma Psiquiátrica: representações sociais entre profissionais e ocupacionais da Enfermagem. Ribeirão Preto, 1995. Dissertação (Mestrado) - Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo.
  • MORGAN, G.A.S.G. Estudo da representação social do enfermeiro recém-formado em seu primeiro emprego e suas expectativas em relação ao programa de orientação. São Paulo, 1992. Dissertação (Mestrado) - Escola de Enfermagem, Univesidade de São Paulo.
  • MOSCOVICI, S. A representação social da psicanálise. Rio de Janeiro, Zahar, 1978.
  • NOBREGA, S.M. As representações sociais. (Texto apresentado na forma de "Mémoire", no Curso de Doutorado em Psicologia da Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales, Paris. Tradução parcial e revisada do trabalho intitulado "La maladie mentale au Brésil: étude sur les representations sociales de la folie pour des sujets internes à hospital psychiatrique et leurs families", Paris, 1990, 76 p./mimeografado/
  • OLIVEIRA, D.C. de. O desenvolvimento infantil e suas representações: dimensões do saber técnico-profissional e do senso comum. São Paulo, 1990. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo.
  • OSAVA, R.H. Estudo das representações sociais do parto entre enfermeiros de maternidade num município paulista. Ribeirão Preto, 1990. Dissertação (Mestrado) Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo.
  • PADILHA, K.G. Des-Cuidar: as representações sociais dos enfermeiros de UTI sobre as ocorrências iatrogênicas de enfermagem. São Paulo, 1994. Tese (Doutorado) - Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo.
  • ROLIM, M.A. As representações sociais acerca do doente mental atendido em emergências psiquiátricas. São Paulo, 1993. Tese (Doutorado) - Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo.
  • SILVA, M.A.D.da. As representações sociais dos professores de enfermagem e a dimensão ética: uma tentativa de articulação. São Paulo, 1995. Tese (Doutorado) - Faculdade de Educação, Pontifícia Universidade Católica.
  • SPINK, M.J.P. Representação social - uma perspectiva interdisciplinar. Trabalho apresentado no 6ş Encontro de Psiologia Social - ABRAPSO, Rio de Janeiro, 1991/mimeografado/ .
  • _____________________. O conceito de representação social na abordagem psicossocial. Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, v. 9, n.3, p.300-08, jul/set, 1993.
  • 1
    Este trabalho foi apresentado no 47º Congresso Brasileiro de Enfermagem, novembro de 1995, em Goiânia
  • 2
    Na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto-USP, existe um grupo de estudos sobre representações sociais desde 1994, onde algumas pesquisas estão sendo desenvolvidas com esse referencial. O grupo conta com a participação de docentes e alunos de pós-graduação
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Mar 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 1997
    Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 419 , 05403-000 São Paulo - SP/ Brasil, Tel./Fax: (55 11) 3061-7553, - São Paulo - SP - Brazil
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