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Atitudes de enfermeiros em face da importância das famílias nos cuidados de enfermagem em pediatria

Resumos

Objetivo

Identificar as atitudes dos enfermeiros sobre a importância de incluir as famílias nos cuidados de enfermagem.

Método

Estudo de abordagem quantitativa descritiva, cuja coleta de dados foi realizada em unidades de pediatria e materno-infantil de um hospital universitário brasileiro. Uma amostra de 50 enfermeiros completou a versão em português da escala Families Importance in Nursing Care-Nurses Attitudes (FINC-NA).

Resultados

Indicaram escores mais elevados em dimensões indicativas de atitudes de apoio sobre a participação das famílias no cuidado de enfermagem. Enfermeiros com mais tempo na profissão e que não tiveram conhecimento prévio de enfermagem da família apresentaram escores indicativos de atitudes de menor apoio para envolver as famílias no cuidado de enfermagem.

Conclusão

A aplicação desse instrumento em outros contextos de assistência poderá contribuir para iluminar importantes aspectos relacionados aos desafios para a implementação de uma abordagem centrada na família na prática clínica e subsidiar o desenvolvimento de pesquisas mais amplas.


Enfermagem familiar; Atitude do pessoal de saúde; Escalas; Competência profissional; Relações profissional-família


Affective, cognitive and behavioral components affect nurses´ attitudes to include families in the care processes. The purpose of this study was to investigate the attitudes of nurses about the importance of including families in nursing care. Data collection was performed in pediatric and maternal-child unit of a Brazilian university hospital. A sample of 50 nurses completed the Portuguese version of the instrument Families’Importance in Nursing Care-Nurses’ Attitudes (FINC-NA). The results indicated that nurses have supportive attitudes regarding families participation in nursing care. Attitudes of lower support for involving families in nursing care were found among nurses with older age, more time in the profession and who had no previous contact with contents related to Family Nursing. The application of the instrument in other contexts of assistance may help to illuminate important aspects of the challenges to implementing a family-centered approach in clinical practice.





Family nursing; Attitude of health personnel; Scales; Professional competence; Professional-family relations


El propósito de este estudio fue identificar las actitudes de los enfermeros sobre la importancia de incluir a las familias en el cuidado de enfermería. La recolección de datos se llevó a cabo en las unidades de pediatría y materno-infantil de un hospital universitario brasileño. Una muestra de 50 enfermeras completó la versión en portugués del el instrumento Families’ Importance in Nursing Care-Nurses’ Attitudes (FINC-NA). Los resultados indicaron las puntuaciones más altas en dimensiones indicativas de actitudes de apoyo a la participación de las familias en el cuidado. Enfermeras con más tiempo en la profesión y que no tenían conocimiento previo de enfermería de familia tuvieron puntuaciones que indican actitudes de menor apoyo para involucrar a las familias en el cuidado de enfermería. La aplicación de este instrumento en otro tipo de asistencia contextos puede ayudar a iluminar aspectos importantes de los desafíos para la implementación de un enfoque centrado en la familia, en la práctica clínica.


Enfermería de la familia; Actitud del personal de salud; Escalas; Competencia profesional; Relaciones profesional-familia


Introdução

A participação da família nos cuidados à criança é reconhecida como essencial para o atendimento de suas necessidades e para o bem-estar de toda a família(101 Cruz AC, Angelo M. Cuidado centrado na família em pediatria: redefinindo os relacionamentos. Ciênc Cuidado Saúde. 2011;10(4):861-5). Prover cuidado centrado na família significa que o profissional incorpora ao cuidado: o conhecimento e a convicção de que a família é uma constante na vida das crianças; crianças são afetadas e igualmente afetam aqueles com quem têm relacionamentos; e que, ao incluir famílias no processo de cuidar, crianças receberão cuidado de maior qualidade(202 Harrison TM. Family-centered pediatric nursing care: state of the science. J Pediatr Nurs. 2010;25(5):335-43). Nesse contexto, as atitudes dos enfermeiros em relação aos indivíduos e às famílias refletem a importância que eles atribuem ao sistema familiar no processo de cuidado, definindo o tipo de relacionamento que se estabelecerá entre as partes. Manter uma atitude de apoio é importante pré-requisito para convidar e engajar famílias no cuidado de enfermagem, e tais atitudes podem estimular atitudes facilitadoras entre enfermeiros e famílias(303 Wright LM, Bell JM. Beliefs and illness: a model for healing. 4th ed. Canada: Floor Press; 2009).

Uma atitude envolve um componente afetivo, cognitivo e comportamental, sendo considerada uma resposta a um estímulo(404 Altmann TK. Attitude: a concept analysis. Nurs Forum. 2008;43(3):144-50). A presença da família no ambiente de cuidado em saúde é o estímulo necessário para desencadear as atitudes que o enfermeiro assumirá para com ela, estando pautadas em sentimentos e emoções (componente afetivo), pensamentos e crenças (componente cognitivo), e nas tendências para reagir (componente comportamental)(505 Oliveira PCM, Fernandes HIV, Vilar AISP, Figueiredo MHJS, Ferreira MMSRS, Martinho MJCM, et al. Attitudes of nurses towards families: validation of the scale Families Importance in Nursing Care - Nurses Attitudes. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2011 [cited 2014 Mar 22];45(6):1329-35. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v45n6/en_v45n6a08.pdf
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).

Prover a aproximação do enfermeiro aos conhecimentos e estratégias de Enfermagem da Família pode ampliar a sua maneira de trabalhar com famílias, modificando o seu padrão de prática habitual para uma abordagem mais centrada na família. O enfermeiro sensibilizado é capaz de considerar a importância da família para o cuidado de enfermagem e a importância do cuidado da família e suas experiências de saúde e doença(606 Angelo M. Abrir-se para a família: superando desafios. Fam Saúde Desenvolv. 1999;1(1-2):7-14-707 Angelo M. The emergence of family nursing in Brazil. J Fam Nurs. 2008;14(4):436-41). No Brasil, a Enfermagem da Família ainda não está consolidada como especialidade e nem todos os currículos de graduação em enfermagem abordam aspectos dessa perspectiva(808 Angelo M, Bousso RS, Rossato LM, Damião EBC, Silveira AO, Castilho AMCM, et al. Family as an analysis category and research field in nursing. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2009 [cited 2014 Mar 22];43 (n.spe2):1337-41. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v43nspe2/en_a33v43s2.pdf
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). Além disso, a maior parte do conhecimento nacional produzido nessa área ainda está centrada na descrição da experiência de doença da família, onde é relatado o significado da doença para a família e o impacto dessa na vida cotidiana(909 Sampaio PSS. Cuidado da família em pediatria: vivência do enfermeiro em um hospital universitário [dissertação]. São Paulo: Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo; 2011). Com isso ainda há uma grande demanda pela compreensão de como os profissionais atuam no que se refere ao modo de cuidar da família em pediatria.

Estudo evidenciou que a vivência da enfermeira no cuidado prestado à família no contexto da pediatria não é única, nem tampouco uniforme; que suas motivações ainda se dão no âmbito individual, conforme a bagagem de conhecimento de cada profissional, que atua motivada para envolver e engajar a família no cuidado(909 Sampaio PSS. Cuidado da família em pediatria: vivência do enfermeiro em um hospital universitário [dissertação]. São Paulo: Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo; 2011). Uma atitude que apoia o envolvimento das famílias é um importante pré-requisito para convidar e engajar as famílias nos cuidados de enfermagem(1010 Benzein E, Arestedt KF, Johansson P, Saveman BI. Families’ importance in nursing care: nurses’attitudes: an instrument development. J Fam Nurs. 2008;14(1):97-117). A partir dessas considerações, apresentou-se como pergunta norteadora deste estudo: qual a atitude do enfermeiro sobre a importância das famílias no processo de cuidado da criança?

O objetivo deste estudo foi identificar as atitudes de enfermeiros sobre a importância das famílias nos cuidados de enfermagem no contexto da pediatria.

Método

Estudo de abordagem quantitativa descritiva, realizado no primeiro semestre de 2011 em um Hospital Universitário da cidade de São Paulo, Brasil, tendo como população todos os enfermeiros (n=59) que trabalhavam em unidades pediátricas e materno-infantil. Os critérios de inclusão na amostra dos enfermeiros da população-alvo foram ter disponibilidade de participar do estudo e exercer funções de cuidado com pacientes e famílias.

A estratégia para coleta de dados foi estabelecida pelas pesquisadoras juntamente com as enfermeiras chefes de cada unidade. Assim, para viabilizar a coleta de dados, um conjunto de 59 envelopes contendo o instrumento com respectiva explicação de preenchimento e o termo de consentimento livre e esclarecido foi deixado nas referidas unidades, a fim de que os enfermeiros de todos os turnos pudessem preenchê-los no horário de melhor conveniência para eles. Ao final do período os envelopes preenchidos foram recolhidos pelos pesquisadores para proceder à análise.

O instrumento de coleta de dados constou de um questionário composto por duas partes: a primeira, com questões de caracterização sociodemográficas e profissionais, como sexo, idade, grau acadêmico, tempo de exercício profissional, setor onde desenvolve as atividades laborais, experiência prévia de doença grave na família e tipo de formação em Enfermagem da Família; a segunda parte foi constituída pela escala A Importância das Famílias nos Cuidados de Enfermagem – Atitudes dos Enfermeiros (IFCE-AE).

A escala, originalmente desenvolvida na Suécia(1010 Benzein E, Arestedt KF, Johansson P, Saveman BI. Families’ importance in nursing care: nurses’attitudes: an instrument development. J Fam Nurs. 2008;14(1):97-117), foi traduzida e validada para o português(505 Oliveira PCM, Fernandes HIV, Vilar AISP, Figueiredo MHJS, Ferreira MMSRS, Martinho MJCM, et al. Attitudes of nurses towards families: validation of the scale Families Importance in Nursing Care - Nurses Attitudes. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2011 [cited 2014 Mar 22];45(6):1329-35. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v45n6/en_v45n6a08.pdf
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) e ainda não havia sido utilizada em estudos no Brasil. Trata-se de uma escala de autopreenchimento do tipo Likert composta por 26 itens com 4 opções de resposta (discordo completamente, discordo, concordo e concordo completamente). O escore de cada item varia de 1 a 4 e da escala total IFCE-AE de 26 a 104(505 Oliveira PCM, Fernandes HIV, Vilar AISP, Figueiredo MHJS, Ferreira MMSRS, Martinho MJCM, et al. Attitudes of nurses towards families: validation of the scale Families Importance in Nursing Care - Nurses Attitudes. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2011 [cited 2014 Mar 22];45(6):1329-35. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v45n6/en_v45n6a08.pdf
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). A escala total de 26 itens é subdividida em três subescalas, (Quadro 1) que podem ser mensuradas como três dimensões independentes: (1) Família: parceiro dialogante e recurso de coping, composta por 12 itens, cujo escore varia de 12 a 48; (2) Família: recurso nos cuidados de enfermagem, composta de 10 itens, cujo escore varia de 10 a 40; (3) Família: fardo, composta por quatro itens, cujo escore varia de 4 a 16. Quanto maior o escore obtido nas duas primeiras dimensões e menor for o escore obtido na terceira dimensão, mais importância atribuem os enfermeiros à família nos cuidados, ou seja, mais atitudes de suporte revelam(505 Oliveira PCM, Fernandes HIV, Vilar AISP, Figueiredo MHJS, Ferreira MMSRS, Martinho MJCM, et al. Attitudes of nurses towards families: validation of the scale Families Importance in Nursing Care - Nurses Attitudes. Rev Esc Enferm USP [Internet]. 2011 [cited 2014 Mar 22];45(6):1329-35. Available from: http://www.scielo.br/pdf/reeusp/v45n6/en_v45n6a08.pdf
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). Previamente à aplicação da escala foi realizada equivalência semântica(1111 Reichenheim M, Moraes C. Operacionalização de adaptação transcultural de instrumentos de aferição usados em epidemiologia. Rev Saúde Pública [Internet]. 2007 [citado 2014 mar. 22];41(4):665-73. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rsp/v41n4/6294.pdf
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) para o português do Brasil.

Para a análise dos dados foi utilizada análise estatística descritiva e análise de variância. Todas as análises estatísticas foram realizadas utilizando o Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) para Windows, versão 17.0. O teste ANOVA foi utilizado para comparar as diferenças entre dois grupos independentes. Os escores das escala IFCE-AE total e das subescalas foram tratados como dados ordinais. Aos escores ausentes foram atribuídos os valores da média do item faltante. O método de seleção stepwise foi utilizado para investigar as variáveis mais significativas para cada uma das subescalas e para a escala total IFCE-AE. Para identificar os participantes que apresentaram atitudes de menor apoio, ou seja, com baixos escores, o primeiro quartil (q1) da escala total e todas as subescalas foram utilizados como nota de corte(1111 Reichenheim M, Moraes C. Operacionalização de adaptação transcultural de instrumentos de aferição usados em epidemiologia. Rev Saúde Pública [Internet]. 2007 [citado 2014 mar. 22];41(4):665-73. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rsp/v41n4/6294.pdf
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). Foram consideradas atitudes de apoio em relação à participação das famílias nos cuidados de enfermagem aqueles participantes que apresentaram escores entre o q1 (77) e o q3 (87), e atitudes de excelência aqueles cujos escores estiveram acima do terceiro quartil (Quadro 1).

Quadro 1
Itens da Escala IFCE-AE distribuídos nas subescalas

Aspectos éticos: A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo sob o parecer número 979/10. Todos os participantes foram devidamente esclarecidos sobre os procedimentos da pesquisa e assinaram o termo de consentimento. O estudo seguiu todos os preceitos éticos contidos na Resolução do Conselho Nacional de Saúde (196/96).

Resultados

O índice de respostas dos questionários foi de 84,7% (n=50). A amostra de enfermeiros participantes do estudo distribuiu-se da seguinte maneira em relação às diferentes unidades pediátricas: 8 do Alojamento Conjunto (16%); 8 do Pronto Socorro Infantil (16%); 10 do Berçário (20%); 12 da Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica e Neonatal (24%); e 12 da Unidade de Internação Pediátrica (24%).

Os participantes do estudo, majoritariamente do sexo feminino (94%), foram enquadrados em três distintos grupos quanto à faixa etária, sendo o maior deles compreendido por indivíduos com mais de 41 anos de idade (40%). Quanto ao grau de formação acadêmica, parte expressiva da amostra possuía Especialização Lato Senso (68%), tempo de exercício profissional variando igualmente entre o grupo de 2 a 5 anos (26%) e de 6 a 10 anos (26%), e predominância de indivíduos que trabalhavam no local do estudo há mais de 10 anos (44%). Em relação à experiência anterior de doença na família, 76% da amostra referiu já ter tido algum familiar gravemente doente, e alguma formação em Enfermagem da Família foi referida por 78% dos participantes (Tabela 1).

A média do escore total da escala IFCE-AE foi de 82 (DP=7,7; q1=77; q3=87), indicando que os enfermeiros do local investigado têm uma atitude de apoio sobre a importância das famílias nos cuidados de enfermagem. Atitudes de maior e de menor apoio estatisticamente significativas (p ≤ 0,05) foram encontradas nas variáveis relacionadas à faixa etária (p=0,003), tempo de profissão (p=0,014), setor (p=0,007) e contato prévio com conteúdo sobre Enfermagem da Família (p=0,004).

Tabela 1
Caracterização da amostra

Apresentaram maior atitude de apoio sobre a importância das famílias no cuidado de enfermagem os grupos compreendidos entre 31 e 40 anos de idade, média total do escore de 87 (DP= 7,6), com tempo de profissão variando entre 6 e 10 anos, cujo escore total foi de 87 (DP= 6,6), do setor de Pronto Socorro Infantil, com escore de 87 (DP=7,2) e que já haviam tido aproximação com algum conteúdo sobre a Enfermagem da Família, com escore médio de 83 (DP= 6,8).

Na subescala Família: parceiro dialogante e recurso de coping, que inclui itens como Procuro sempre saber quem são os membros da família do paciente e Pergunto às famílias como posso ajudá-las, o escore médio foi de 37 (DP=3,9; q1=34; q3=40). Escores mais altos e estatisticamente significativos foram encontrados nos grupos cuja faixa etária variou entre 31 e 40 anos de idade, cujo escore foi de 35 (DP=3,8) e que possuíam contato prévio com conteúdos relacionados à Enfermagem da Família, cujo escore foi de 38 (DP= 3,7), e do setor de Pronto Socorro Infantil, com escore de 39 (DP=4).

Tabela 2
Comparação dos Escores das Atitudes dos Enfermeiros em face da importância das famílias da Escala Total IFCE-AE e das subescalas com os subgrupos

O escore médio para a subescala Família: Recurso nos Cuidados de Enfermagem , que inclui itens como É importante dedicar tempo às famílias e A presença de membros da família é importante para mim como enfermeiro(a), foi de 33 (DP= 3,2; q1=30; q3=35). Escores mais altos e estatisticamente significativos nessa subescala foram encontrados nos grupos cuja faixa etária variou entre 31 e 40 anos de idade, com escore de 35 (DP=3,7), com tempo no serviço atual variando entre 2 e 10 anos, cujo escore foi de 34 (DP=2,5), que possuíam contato prévio com conteúdos relacionados à Enfermagem da Família, escore de 33 (DP= 2,7) e do setor de Pronto Socorro Infantil, com escore de 35 (DP=3,5).

Na subescala Família: fardo, que inclui itens como A presença de membros da família deixa-me estressado(a) e Não tenho tempo para cuidar das famílias, o escore médio total foi igual a 12 (DP=1,8; q1=11; q3=14), demonstrando que, em geral, a família não é considerada um fardo na assistência de enfermagem pelos enfermeiros estudados. Escores mais altos e estatisticamente significativos nessa subescala foram encontrados no grupo com tempo de profissão variando entre 6 e 10 anos, cujo escore foi igual a 13 (DP=1,6) (Tabela 2).

No que tange à escala IFCE-AE total, atitudes de menor apoio dos enfermeiros sobre a importância de incluir as famílias no cuidado de enfermagem foram encontradas nos grupos com mais de 41 anos de idade, escore médio de 78 (DP=7,2), com mais de 10 anos de profissão, escore total de 80 (DP=7,3), sem contato prévio com conteúdos relacionados à Enfermagem da Família, escore total de 76 (DP= 8) e cujos enfermeiros eram do setor de Alojamento Conjunto, escore total igual a 76 (DP= 5,7). A análise das variáveis foi realizada através do método de seleção stepwise, iniciando com um modelo com quatro variáveis: faixa etária, tempo de profissão, setor e contato prévio com conteúdo sobre Enfermagem da Família. Após a regressão foi indicado que uma importante variável para explicar os valores dos escores está relacionada ao enfermeiro ter tido contato prévio com algum conteúdo relacionado à Enfermagem da Família.

Discussão

A pesquisa foi realizada em unidades pediátricas e materno-infantil, onde a presença parental faz parte do cotidiano dos profissionais que nelas trabalham. Quando se trata da hospitalização de crianças, o envolvimento dos pais nos cuidados é um importante indicador da qualidade assistencial prestada(1212 Ygge BM. Nurses perceptions of parental involvement in hospital care. Paediatr Nurs. 2007;19(5):38-40-1313 Jolley J, Shields L. The evolution of family-centered care. J Pediatr Nurs. 2009;24(2): 164-70).

Os enfermeiros participantes do estudo evidenciaram, em sua maioria, uma atitude de apoio sobre a importância de envolver as famílias nos cuidados de enfermagem entre a maioria dos enfermeiros participantes deste estudo. O mesmo resultado foi encontrado em estudos que utilizaram a mesma escala, realizados em diferentes contextos de cuidado europeus, como Suécia(1414 Benzein E, Johansson P, Arestedt KF, Saveman BI. Nurses’ attitudes about the importance of families in nursing care: a survey of Swedish nurses. J Fam Nurs. 2008;14(2):162-80

15 Viveca LR, Chatrin PV, Inger SB, Claire JE, Karl I, Ulrika ÖEA. An initiative to teach family systems nursing using online health-promoting conversations: a multi-methods evaluation. J Nurs Educ Pract. 2013;3(2):54-66
-1616 Silva MANCGMM, Costa MASM, Silva MMFP. A família em cuidados de saúde primários: caracterização das atitudes dos enfermeiros. Referência. 2013;3(11):19-28) Portugal(202 Harrison TM. Family-centered pediatric nursing care: state of the science. J Pediatr Nurs. 2010;25(5):335-43,1616 Silva MANCGMM, Costa MASM, Silva MMFP. A família em cuidados de saúde primários: caracterização das atitudes dos enfermeiros. Referência. 2013;3(11):19-28) e Islândia(1717 Sveinbjarnardottir EK, Svavarsdottir EK, Saveman BI. Nurses attitudes towards the importance of families in psychiatric care following an educational and training intervention program. J Psychiatr Ment Health Nurs. 2011;18(10):895-903).

Os resultados mostraram que os enfermeiros com mais tempo de experiência profissional apresentaram menores escores na escala IFCE-AE, evidenciando atitudes de menos suporte em relação à participação da família nos cuidados. Esse resultado é bastante diferente de outros estudos que revelaram que enfermeiros mais experientes valorizavam mais o cuidado da família do que enfermeiros mais jovens e inexperientes(1414 Benzein E, Johansson P, Arestedt KF, Saveman BI. Nurses’ attitudes about the importance of families in nursing care: a survey of Swedish nurses. J Fam Nurs. 2008;14(2):162-80,1616 Silva MANCGMM, Costa MASM, Silva MMFP. A família em cuidados de saúde primários: caracterização das atitudes dos enfermeiros. Referência. 2013;3(11):19-28-1717 Sveinbjarnardottir EK, Svavarsdottir EK, Saveman BI. Nurses attitudes towards the importance of families in psychiatric care following an educational and training intervention program. J Psychiatr Ment Health Nurs. 2011;18(10):895-903). No caso do nosso estudo, esse resultado pode ser um indicador do impacto da formação sobre enfermagem da família, que começa a tomar força mais recentemente nos cursos de graduação no Brasil, o que não acontecia no passado, quando vários enfermeiros do estudo se graduaram. Do mesmo modo, estudo realizado no Reino Unido relatou que os enfermeiros pediatras consideram que aqueles com mais experiência com crianças apresentam atitudes de maior apoio em relação às famílias(1818 Lee P. What does partnership in care mean for children’s nurses? J Clin Nurs. 2007; 16(3):518-26).

Na subescala Família: parceiro dialogante e recurso de coping, maiores escores foram observados entre os enfermeiros que trabalhavam na unidade de Pronto Socorro Infantil. Estudo realizado sobre a importância de famílias no cuidado psiquiátrico também encontrou diferenças preponderantes de atitudes de enfermeiros em diferentes unidades. Enfermeiros que trabalhavam em unidades psiquiátricas de crianças e adolescentes apresentaram os maiores escores, enquanto os de unidades psiquiátricas agudas apresentaram os menores escores(1717 Sveinbjarnardottir EK, Svavarsdottir EK, Saveman BI. Nurses attitudes towards the importance of families in psychiatric care following an educational and training intervention program. J Psychiatr Ment Health Nurs. 2011;18(10):895-903). A presença constante da família em pediatria é um fator facilitador de uma atitude mais favorável ao envolvimento das famílias no cuidado. No caso do nosso estudo, o resultado diferenciado pode estar relacionado a um movimento interno da unidade no preparo da equipe para a implementação do cuidado centrado na família. Dentre as diferentes variáveis relacionadas ao valor do escore, na subescala Família: recurso nos cuidados de enfermagem, os menores escores apresentados neste estudo foram encontrados entre os enfermeiros que não tiveram nenhum tipo de formação ou contato com conteúdos relacionados à Enfermagem da Família. Resultados semelhantes foram encontrados em estudos realizados em contextos de cuidados de saúde primários(1616 Silva MANCGMM, Costa MASM, Silva MMFP. A família em cuidados de saúde primários: caracterização das atitudes dos enfermeiros. Referência. 2013;3(11):19-28) e de cuidado psiquiátrico(1717 Sveinbjarnardottir EK, Svavarsdottir EK, Saveman BI. Nurses attitudes towards the importance of families in psychiatric care following an educational and training intervention program. J Psychiatr Ment Health Nurs. 2011;18(10):895-903) que incluíram também menor habilitação acadêmica, ou seja, somente a graduação entre os menores escores. Escores mais elevados também foram encontrados após treinamento online para interação com famílias(1515 Viveca LR, Chatrin PV, Inger SB, Claire JE, Karl I, Ulrika ÖEA. An initiative to teach family systems nursing using online health-promoting conversations: a multi-methods evaluation. J Nurs Educ Pract. 2013;3(2):54-66). Pôde-se constatar que a instrumentalização do enfermeiro no que se refere à Enfermagem da Família, ainda que em graus variados, foi um importante indicador de atitudes de maior suporte ao envolvimento das famílias nos cuidados de enfermagem. Nesse sentido, o cerne de atitudes direcionadas às famílias encontra-se além da sensibilização do profissional. Quando o enfermeiro se instrumentaliza, ele se aproxima do conhecimento disponível sobre família, ficando mais capacitado para pensar e agir com a família de modo mais direcionado(707 Angelo M. The emergence of family nursing in Brazil. J Fam Nurs. 2008;14(4):436-41).

Estudo constatou maiores atitudes que sustentam a ideia de que a família configura-se como um fardo nos cuidados de enfermagem entre enfermeiros com menor tempo de graduação(1414 Benzein E, Johansson P, Arestedt KF, Saveman BI. Nurses’ attitudes about the importance of families in nursing care: a survey of Swedish nurses. J Fam Nurs. 2008;14(2):162-80). As autoras referem que a concepção de que a família é um fardo está relacionada à ideia de que o enfermeiro não dispõe de tempo para cuidar das famílias e que elas são indesejáveis nos ambientes de cuidado em saúde(1414 Benzein E, Johansson P, Arestedt KF, Saveman BI. Nurses’ attitudes about the importance of families in nursing care: a survey of Swedish nurses. J Fam Nurs. 2008;14(2):162-80). Em nosso estudo, essa constatação foi encontrada entre os enfermeiros com maior tempo de graduação. Consideramos que enxergar a família como um fardo pode constituir evidências importantes de que o enfermeiro estabelece prioridades ao iniciar a sua atividade profissional e que essas podem ou não incluir o envolvimento da família nos cuidados de enfermagem. Entretanto, é necessário considerar que adotar a concepção de que a família é um fardo é uma barreira para o desenvolvimento de um relacionamento colaborativo entre enfermeiros e famílias e pode estar relacionado às barreiras pessoais, organizacionais e ambientais.

Conclusão

Conhecer a importância que o enfermeiro atribui à família nos cuidados de enfermagem é um indicador relevante para uma avaliação situacional de quão aberta à participação das famílias na assistência está a equipe de enfermagem de um determinado serviço, instituição ou setor. Os resultados da aplicação da escala IFCE-AE em uma amostra de enfermeiros das áreas de pediatria e materno-infantil de um hospital universitário brasileiro reiteram estudos que vêm sendo realizados em outros países e trazem importantes evidências para um campo onde a pesquisa ainda é limitada em nosso meio. Embora a quase totalidade da população dos enfermeiros das áreas estudadas tenha participado do estudo, o pequeno tamanho de sua amostra constituiu limitação a ele. O instrumento aplicado neste estudo pode ser utilizado para nortear processos de implementação de uma assistência centrada na família, uma vez que atitudes de maior apoio podem ser indicativas de que os enfermeiros estão mais sensibilizados e são mais favoráveis a uma prática de enfermagem que têm a família como parceira no cuidado. Para ampliar a compreensão do contexto estudado, a escala pode ser utilizada em nível institucional, em outras áreas de assistência, para futuros estudos e comparações entre enfermeiros de diferentes unidades.

Compreender a relação entre o tempo de formação do enfermeiro e a importância que este atribui às famílias nos cuidados configura-se como um importante objeto de estudo para futuras investigações, tendo o potencial de revelar quais fatores levam os enfermeiros a se distanciar das famílias e indicar em qual momento da vivência profissional é preciso realizar intervenções de modo que o enfermeiro se aproxime ou se reaproxime com conceitos acerca do cuidado centrado na família.

Os esforços para a formação do profissional na área de Enfermagem da Família, seja pela inserção de conteúdos específicos nos currículos dos cursos de graduação e pós-graduação, seja na formação especializada e complementar do profissional, trarão bons resultados para a prática de cuidado em saúde que tem a família como parceira no cuidado.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2014

Histórico

  • Recebido
    21 Mar 2014
  • Aceito
    06 Ago 2014
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