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Gerenciamento da segurança do paciente sob a ótica dos enfermeiros* * Extraído da dissertação "Gerenciamento da segurança assistencial nos serviços de enfermagem", Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, 2013

Resumos

OBJETIVO

Avaliar sob a ótica dos enfermeiros, as ações de gerenciamento da segurança dos pacientes desenvolvidas em instituições hospitalares.

MÉTODO

Trata-se de um estudo transversal, descritivo, tipo Survey. Participaram do estudo sete hospitais nos quais sete enfermeiros responsáveis e 49 enfermeiros coordenadores de setores (n=56) responderam ao instrumento elaborado pelo autor.

RESULTADOS

Os resultados evidenciaram que 100% dos hospitais possuem sistema de notificação de eventos adversos, 71,4% possuem Comissão de Gerenciamento de Riscos, 80% realizam discussão dos eventos, havendo consenso de que tais discussões levam a mudanças favoráveis à segurança do paciente nas instituições pesquisadas. O receio dos colaboradores por punição frente às suas falhas e a subnotificação dos eventos foram os aspectos de maior fragilidade encontrados.

CONCLUSÃO

As instituições devem desenvolver políticas organizacionais focadas no estímulo à notificação de eventos e na implementação de medidas que direcionem para uma cultura organizacional não punitiva.

Segurança do Paciente; Gerenciamento de Segurança; Enfermagem


OBJECTIVE

To evaluate the actions of patient safety management developed in hospitals, from the perspective of nurses.

METHOD

This is a cross-sectional, descriptive study of the survey type. Participants were seven hospitals, in which seven nurse managers and 49 sector coordinator nurses (n = 56) answered the instrument prepared by the author.

RESULTS

The results showed that 100% of hospitals have an adverse event reporting system, 71.4% have a Risk Management Committee and 80% have discussions about the events. There is agreement that these discussions lead to favorable changes for patient safety in the surveyed institutions. The employees' fear of punishment for their faults, and the underreporting of events were the aspects of greatest weakness found.

CONCLUSION

The institutions should develop organizational policies focused on stimulating event notification and on the implementation of measures directed to a non-punitive organizational culture.

Patient Safety; Safety Management; Nursing


OBJETIVO

Evaluar bajo el punto de vista de los enfermeros las acciones de gestión de la seguridad de los pacientes desarrolladas en instituciones hospitalarias.

MÉTODO

Se trata de un estudio transversal, descriptivo, tipo Survey. Participaron del estudio siete hospitales en los que siete enfermeros responsables y 49 enfermeros coordinadores de sectores (n=56) respondieron al instrumento elaborado por el autor.

RESULTADOS

Los resultados evidenciaron que el 100% de los hospitales tiene sistema de notificación de eventos adversos, el 71,4% tiene Comisión de Gestión de Riesgos, el 80% llevó a cabo la discusión de los eventos, habiendo consenso de que dichas discusiones conducen a cambios favorables a la seguridad del paciente en las instituciones investigadas. El recelo de los colaboradores por punición ante sus fallos y la subnotificación de los eventos fueron los aspectos de mayor fragilidad encontrados.

CONCLUSIÓN

Las instituciones deben desarrollar políticas organizacionales enfocadas en el estímulo a la notificación de eventos y la implantación de medidas que remitan a una cultura organizacional no punitiva.

Seguridad del Paciente; Administración de la Seguridad; Enfermería


Introdução

Segundo a World Health Organization (WHO)(1World Health Organization. Summary of the evidence on patient safety: implications for research. Geneva: WHO; 2008.), dezenas de milhões de pacientes sofrem lesões incapacitantes ou morte relacionados a erros e falhas na assistência em saúde, todos os anos ao redor do mundo, sendo que, um em cada dez pacientes sofre um evento adverso ao receber cuidados de saúde em ambientes hospitalares nos países desenvolvidos. Nos países em desenvolvimento destaca-se ainda a necessidade de realizar pesquisas que possam desvelar os números acerca desses eventos, os quais podem ser classificados como: circunstância de risco (reportable circumstance), quase incidente (near-miss), incidente sem dano (no harm incident) ou incidente com dano (harmful incident), que pode ser referido também como evento adverso EA (adverse event)(2World Health Organization. The conceptual framework for the international classification for patient safety (ICPS). Geneva: WHO; 2009.-3Runciman W, Hibbert P, Thomson R, Van Der Schaaf T, Sherman H, Lewalle P. Towards an International Classification for Patient Safety: key concepts and terms. Int J Qual Health Care. 2009;21(1):18-26.).

A falta de segurança do paciente causa 42.7 milhões de incidentes com dano ao redor do mundo por ano, desse total, dois terços ocorrem nos países em desenvolvimento e nos países em transição, segundo estudo realizado pela Universidade de Harvard(4Jha AK, Larizgoitia I, Audera-Lopez C, Prasopa-Plaizier N, Waters H, Bates DW. The global burden of unsafe medical care: analytic modelling of observational studies. BMJ Qual Saf [Internet]. 2013 [cited 2014 Mar 21];22(10):809-15. Available from: http//www.qualitysafety.bmj.com/content/22/10/809.full.pdf+html
http://qualitysafety.bmj.com/content/22/...
).

Nesse contexto, a análise de diferentes pesquisas efetuadas em diversos países, como Inglaterra, Austrália, Canadá, Dinamarca, Nova Zelândia, Portugal, França, Suécia, Espanha, Holanda e Brasil, demonstrou um número elevado de casos de eventos adversos incidindo sob uma parcela significativa dos pacientes hospitalizados, concluindo-se que aproximadamente 10% das internações resultam em algum tipo de evento adverso. Ainda em relação aos locais citados, divulgou-se que o número de eventos adversos evitáveis em situações de internação hospitalar representa 50% dos casos(5de Vries EN, Ramrattan MA, Smorenburg SM, Gouma DJ, Boermeester MA. The incidence and nature of in-hospital adverse events: a systematic review. Qual Saf Health Care [internet]. 2008 [cited 2014 Mar 21];17(3):216-23. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2569153/
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles...
).

Dados da Agency for Healthcare Research and Quality (AHRQ), organização designada pelo governo americano como agência líder no apoio à pesquisa para redução das falhas em saúde, demonstram que mais de uma década depois de sua criação e da publicação do relatório To err is human(6Kohn LT, Corrigan JM, Donaldson MS; Committee on Quality of Health Care in America; Institute of Medicine. To err is human: Building a Safer Health System. Washington: National Academy Press; 2000.), o sistema de saúde americano não foi ainda abrangido uniformemente pelos poucos progressos realizados na questão da segurança do paciente(7Agency for Healthcare Research and Quality. A decade of evidence, design, and implementation: advancing patient safety [Internet]. Rockville: AHRQ; 2012 [cited 2014 Mar 21]. Available from: http://www.ahrq.gov/professionals/quality-patient-safety/patient-safety-resources/advancing-patient-safety/index.html
http://www.ahrq.gov/professionals/qualit...
).

Estudo realizado na Espanha analisou 245.320 episódios de atendimentos hospitalares com custo total de 1.308.791.871 euros. Concluiu-se que, deste total, 16.782 (6,8%) pacientes sofreram um ou mais eventos adversos e que, quando analisados por grupos de diagnósticos, os eventos adversos acrescentaram um custo médio entre 5.260 e 11.905 euros nas despesas com saúde. Desta forma, o custo total gerado pelos eventos adversos foi de 88.268.906 euros, 6,7% do total de custos da saúde. Os dados do estudo mostram que os eventos adversos representam um impacto econômico bastante significativo que pode ser revertido por meio da melhoria da qualidade e segurança dos sistemas de saúde(8Allué N, Chiarello P, Bernal Delgado E, Castells X, Giraldo P, Martínez N, et al. Impacto económico de los eventos adversos em los hospitales españoles a partir del conjunto mínimo básico de datos. Gac Sanit. 2014;28(1):48-54.).

Esses dados são preocupantes e causam grande repercussão, tanto em âmbito internacional como nacional, e justifica que o tema segurança do paciente deva ser considerado prioridade pelas principais organizações de saúde do mundo.

Entende-se não ser possível discorrer sobre segurança do paciente sem transitar pela temática da cultura organizacional das instituições de saúde, que pode ser definida como uma forma de perceber, pensar e sentir de um grupo(9Schein E. Organizational culture and leadership. 3nd ed. San Francisco: Jossey-Bass; 2004.). Se a cultura organizacional da instituição em relação ao manejo de eventos adversos estiver baseada na punição e culpa isso poderá causar omissão dos relatos desses eventos, dificultando a construção de uma cultura institucional voltada para a segurança do paciente.

Para a implantação e incorporação da cultura de segurança do paciente em qualquer instituição de saúde, faz-se necessário elevado nível de comprometimento da gerência e dos profissionais da instituição, bem como forte espírito de coesão entre os diversos departamentos, fatores imprescindíveis para a garantia de assistência segura, tanto para o profissional como para o paciente(1010 Carvalho RE, Cassiani SH. Cross-cultural adaptation of the Safety Attitudes Questionnaire - Short Form 2006 for Brazil. Rev Lat Am Enfermagem. 2012;20(3):575-82.).

Nas instituições de saúde, o enfermeiro pode ser considerado facilitador no processo de identificação de riscos de EA, o que se configura em elemento chave nesse processo, dado o seu protagonismo na assistência. Entende-se que à medida que os enfermeiros assumem de seu papel de liderança junto à equipe, há evidências de melhoria da assistência(1111 Laschinger HK, Smith LM. The influence of authentic leadership and empowerment on new-graduate nurses' perceptions of interprofessional collaboration. J Nurs Adm. 2013;43(1):24-9.), portanto, devem relatar comparar e mensurar os fatos e suas consequências dos EA. Além disso, o enfermeiro é o responsável técnico pela equipe de enfermagem frente ao seu conselho de classe, e irá responder a possíveis processos judiciais relacionados à ocorrência de EA.

Um evento tem maior probabilidade de ser relatado se ele tiver provocado dano ao paciente e, pelo fato dos enfermeiros serem os que mais conhecem o sistema de relato de EA da instituição, são esses os profissionais que mais relatam(1212 Kreckler S, Catchpole K, McCulloch P, Handa A. Factors influencing incident reporting in surgical care. Qual Saf Health Care. 2009;18(2):116-20.).

Todos os esforços para a melhoria da qualidade em saúde e o aumento das pesquisas sobre a segurança do paciente corroboram o que é apresentado no Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP), que elenca como objetivo específico a produção, sistematização e difusão de conhecimentos sobre segurança do paciente(1313 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria n. 529, de 1º de abril de 2013. Institui o Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP) [Internet]. Brasília; 2013 [citado 2014 mar. 21]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt0529_01_04_2013.html
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
), justificando a realização dessa pesquisa, que questiona quais as ações de gerenciamento de segurança têm sido adotada nos hospitais.

Nessa perspectiva, o estudo teve como objetivo avaliar, sob a ótica dos enfermeiros, as ações de gerenciamento da segurança do paciente desenvolvidas em instituições hospitalares.

Método

Trata-se de estudo descritivo, com abordagem quantitativa e delineamento transversal do tipo Survey. Os dados foram coletados por meio da aplicação de dois instrumentos estruturados, um para os enfermeiros responsáveis técnicos (RT) e outro para os coordenadores, elaborados pelo investigador principal, que buscou identificar e avaliar ações de gerenciamento da segurança do paciente desenvolvidas nas respectivas instituições.

O estudo foi desenvolvido na cidade de Ribeirão Preto, estado de São Paulo (SP) e proposto para todos os 15 hospitais do município, incluindo instituições governamentais, privadas com ou sem fins lucrativos. Destes, sete (46,7%) aceitaram participar, sendo seis (85,7%) hospitais gerais e um (14,3%) especializado. Em relação à complexidade assistencial, três (42,9%) são classificados de alta complexidade e quatro (57,1%) de média complexidade e juntos representam cerca de 30% da capacidade de leitos hospitalares do município.

Foram incluídos os enfermeiros (RT) das instituições e enfermeiros coordenadores de áreas assistenciais ou de apoio assistencial, que não estavam em período de férias ou afastamentos durante o estudo.

O convite foi dirigido aos RT e estes apontavam os respectivos coordenadores ou líderes de áreas assistenciais e de apoio para participar do estudo. Após a seleção, o estudo obteve 56 participantes, sendo sete (12,5%) RT e 49 (87,5%) enfermeiros coordenadores.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, sob o protocolo CAAE: 00803212.2.0000.5393. Todos os participantes manifestaram voluntariamente sua concordância em participar, assinando o Termo de Compromisso Livre e Esclarecido, e cada um foi entrevistado uma vez, na própria instituição, no horário de trabalho, mediante agendamento prévio.

A coleta dos dados ocorreu de agosto a setembro de 2012, por meio de entrevista. O instrumento passou por validação de face, conteúdo e semântica por cinco juízes, pesquisadores e enfermeiros, atuantes na área de segurança do paciente, que receberam o questionário, analisaram e propuseram ajustes, inclusão e exclusão de termos. Cada avaliação foi analisada cuidadosamente por dois pesquisadores independentemente. A versão final do instrumento incluiu questões fechadas referentes à caracterização dos profissionais, e na temática dos EA, sua ocorrência na instituição, fatores causais, condutas adotadas e medidas de prevenção.

Dentre as variáveis relacionadas ao gerenciamento de segurança do paciente, direcionadas aos RT, foram consideradas: existência de sistema de notificação, existência de comissão de gerenciamento de risco, participação de enfermeiro nesta comissão, existência de discussões sobre EA na comissão e forma de identificação de EA, e descrição das ferramentas adotadas para avaliar riscos de EA.

Para as variáveis direcionadas aos enfermeiros coordenadores, foram elencadas: a frequência de notificação de EA ou quase EA; identificação de elementos que favorecem a cultura da segurança nas instituições e a existência de medo dos colaboradores frente às consequências da notificação de EA; existência de discussões multidisciplinares sobre formas de prevenir EA e existência de entendimento de que discussões sobre EA promovem mudanças positivas nas equipes.

Foi analisada uma variável comum aos enfermeiros RT e coordenadores, sobre o apoio da alta administração para implantar ações de segurança do paciente.

Os resultados foram inseridos em um banco de dados do Microsoft Excel® versão 2007 e analisados por estatística descritiva, com frequências relativas, absolutas e porcentagens, com o uso do software Statistical Package For The Social Science® (SPSS) versão 15.0.

Resultados

Para avaliar, sob a ótica dos enfermeiros, as ações desenvolvidas em instituições hospitalares, pautadas no gerenciamento da segurança dos pacientes, em relação ao sistema de notificação, existência e presença de enfermeiros no comitê de gerenciamento de riscos, ferramentas adotadas para identificação e prevenção de riscos, o estudo contou com 56 participantes, sendo sete RT e 49 enfermeiros coordenadores.

Quanto à caracterização da amostra, há predominância do sexo feminino, característica observada em seis (85,7%) dos enfermeiros RT e em 41 (87,7%) dos enfermeiros coordenadores. Em relação à formação complementar seis (85,7%) dos RT e 39 (79,6%) dos coordenadores possuem pós-graduação, predominando a modalidade lato sensu em cinco (83,3%) dos RT e em 32 (82,0%) dos coordenadores.

Em relação ao perfil dos hospitais participantes, somente dois (28,6%) possui algum programa de qualidade implantado, e todos os hospitais possuem sistema interno de notificação de EA, predominando a forma eletrônica para notificação (Tabela 1).

Tabela 1
Sistema de notificação de EA, comissão de gerenciamento de riscos e tratativas dos EA nas instituições pesquisadas, de acordo com relatos dos enfermeiros RT - Ribeirão Preto, SP, 2012

Sobre a forma adotada para identificar os riscos assistenciais, segundo os RT, seis (85,7%) referem adotar pelo menos uma ferramenta para avaliação dos riscos, e somente um (14,3%) refere não adotar formalmente qualquer tipo de ferramenta.

Dentre as ferramentas adotadas para avaliação de riscos, segundo os RT, destacam-se a auditoria clínica, adotada por quatro (57,1%) instituições, a escala de Braden e o escore NAS (Nursing Activities Score), ambas adotadas por três (42,9%) instituições (Tabela 2).

Tabela 2
Ferramentas adotadas para identificação de riscos e complexidade assistencial de acordo com enfermeiros RT - Ribeirão Preto, SP, 2012.

Segundo os enfermeiros coordenadores, em relação à frequência de notificação de EA, observa-se que 30 (81,7%) participantes referem notificar quando se trata de um EA com potencial de prejudicar o paciente e 43 (87,7%) notificam quando ocorre EA que atinge o paciente, mas não causam danos. Mesmo quando o EA atinge o paciente, observa-se que sete (14,3%) coordenadores nunca ou raramente relatam (Tabela 3).

Tabela 3
Notificação de EA e quase EA realizados pelos enfermeiros coordenadores -Ribeirão Preto, SP, 2012

Segundo os enfermeiros coordenadores, 44 (89,8%) concordam que existe medo por parte da equipe em relação às consequências da notificação e 44 (89,8%) coordenadores concordam que a discussão sobre os erros têm levado a mudanças positivas (Tabela 4).

Tabela 4
Opinião dos enfermeiros coordenadores sobre a disseminação da cultura da segurança dos hospitais pesquisados - Ribeirão Preto, SP, 2012.

Quando questionados se existe apoio da administração para a implantação de gerenciamento da segurança nas instituições, entre os enfermeiros RT a concordância é unânime (Figura 1).

Figura 1
Opinião dos enfermeiros RT (n=7) e enfermeiros coordenadores (n=49), em relação ao apoio da administração para implantação de medidas de segurança - Ribeirão Preto, SP, 2012

Discussão

Este estudo evidenciou que existem ações sendo desenvolvidas em instituições hospitalares, pautadas no gerenciamento da segurança do paciente, sob a ótica dos enfermeiros, na amostra estudada.

Dados do Conselho Federal de Enfermagem(1414 Conselho Federal de Enfermagem (COFEN). Análise de dados dos profissionais de enfermagem existentes nos Conselhos Regionais. Brasília: Departamento de Tecnologia da Informação; 2011.) apontam que os profissionais de enfermagem são majoritariamente do sexo feminino, corroborando com os resultados deste estudo.

Resultados evidenciaram que todas as instituições notificam EA, e a maioria usa sistema eletrônico, o que revela uma perspectiva bastante positiva, tendo em vista as recomendações da Resolução RDC no. 36 de 25 de julho de 2013(1515 Brasil. Ministério da Saúde. Resolução da Diretoria Colegiada n.36, de 25 de julho de 2013. Institui ações para a segurança do paciente em serviços de saúde e dá outras providências [Internet]. Brasília; 2013 [citado 2014 mar. 21]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2013/rdc0036_25_07_2013.html
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
), a qual afirma que, sem conhecer os EA não é possível o estabelecimento de melhoria da segurança.

Os resultados evidenciaram também o medo dos profissionais em relação às medidas punitivas relacionadas à notificação de EA, o que deve ser considerado um ponto de atenção e melhoria. Os indivíduos devem ser capazes de reportar erros sem medo de punição ou constrangimento. Eles devem ser convencidos de que a resposta ao evento não será quem falhou?, mas sim, o que aconteceu? (1616 Leape L, Berwick D, Clancy C, Conway J, Gluck P, Guest J, et al. Transforming healthcare: a safety imperative.. Qual Saf Health Care 2009;18(6):424-8.), com ênfase de que a notificação pode diminuir a incidência do erro. A existência de um ambiente não punitivo e apoiador é fundamental para que se tenha a notificação das situações de riscos/erros e quase falhas, uma vez que, na sua maioria, os erros são decorrentes do sistema e não só humanos(1717 McCannon CJ, Hackbarth AD, Griffin FA. Miles to go: an introduction to the 5 Million Lives Campaign. Jt Comm J Qual Patient Saf. 2007;33(8):477-84.).

Este estudo evidenciou que as discussões sobre EA foram consideradas positivas na busca de melhorias, entendendo que a detecção desses eventos pode servir como base para a tomada de decisão e para o planejamento da segurança do paciente a partir da análise, do monitoramento, da minimização e da prevenção de incidentes que possam causar EA(1818 Silva RC, Ferreira MA. Características dos enfermeiros de uma unidade tecnológica: implicações para o cuidado de enfermagem. Rev Bras Enferm. 2011;64(1):98-105.-1919 Hinrichsen SL, Oliveira CLF, Campos MA, Possas LCM, Sabino G, Vilella T. Gestão da qualidade e dos riscos na segurança do paciente: estudo-piloto. RAHIS. 2011(7):10-7.). Para o enfrentamento dos EA, dos erros e dos incidentes em serviços de saúde, que colocam em risco a segurança do paciente, é necessário conhecer a abrangência e a magnitude de suas ocorrências(2020 Adhikari R, Tocher J, Smith P, Corcoran J, MacArthur J. A multi-disciplinary approach to medication safety and the implication for nursing education and practice. Nurse Educ Today. 2014;34(2):185-90.), que vão muito além do desenvolvimento de um sistema informatizado para notificação dos eventos.

A identificação e relato dos EA, além de analisar o risco, podem favorecer a adoção de medidas preventivas para possíveis correções, pelos profissionais de saúde, visando minimizar ou eliminar a sua ocorrência, e ainda acompanhar o desenvolvimento das ações implementadas para melhoria da prática em saúde(2121 Carneiro FS, Bezerra ALQ, Silva AEBC, Souza LP, Paranaguá TTB, Branquinho NCSS. Eventos adversos na clínica cirúrgica de um hospital universitário: instrumento de avaliação da qualidade. Rev Enferm UERJ. 2011;19(2):204-11.).

Os resultados demonstraram que as notificações são decorrentes de EA que poderiam afetar o paciente, mas não afetaram. No mesmo sentido, outro estudo(2222 Reis CT, Laguardia J, Martins M. Translation and cross-cultural adaptation of the Brazilian version of the Hospital Survey on Patient Safety Culture: initial stage. Cad Saúde Pública. 2012;28(11):2199-210.), demonstrou relatos de EA quando ocorre erro, engano ou falha, sem dano ao paciente. Tal fato ratifica o medo dos trabalhadores em relatar erros quando o paciente é atingido.

Destaca-se a importância de incentivo por parte da instituição à realização de notificações com dados completos, pois assim estratégias de controle podem ser desenvolvidas a fim de evitar novas ocorrências, influenciando diretamente na qualidade da assistência. Para que as notificações ocorram, os profissionais devem ser constantemente orientados sobre a importância de registros e do preenchimento correto e completo, com formulários simples, de fácil compreensão e preenchimento(2323 Bezerra ALQ, Silva AEBC, Branquinho NCSS,. Paranaguá TTB Análise de queixas técnicas e eventos adversos notificados em um hospital sentinela.. Rev Enferm UERJ; 2009.17(4):467-72.).

Ao identificar os riscos que afetam a segurança do paciente, surge a necessidade de analisá-los, o que consiste em um processo sistemático de identificação, análise e tratamento das causas(2020 Adhikari R, Tocher J, Smith P, Corcoran J, MacArthur J. A multi-disciplinary approach to medication safety and the implication for nursing education and practice. Nurse Educ Today. 2014;34(2):185-90.). Os resultados deste estudo convergem nesse sentido ao evidenciar ações relacionadas à discussão dos EA, com presença do enfermeiro em comissões de gerenciamento de riscos, percepção de mudanças positivas decorrentes das ações.

A discussão dos EA em uma comissão de gerenciamento de riscos composta por equipe multidisciplinar, com o propósito de elaborar estratégias com base nas exigências normativas e regulamentadoras, pode favorecer a minimização de erros(2424 Battaglia JN, Lis JE, Chui MA. Evaluation of a patient perspective module in a required medication safety and quality course at a college of pharmacy. Inov Pharm. 2013;4(1):102.), bem como promover ações de educação em saúde, a fim de prevenir danos relacionados à assistência que afetam a segurança do paciente. Essa é uma estratégia que as instituições de saúde devem utilizar, visando auxiliar a investigação dos EA, para que sejam antecipados e minimizados(2525 Manias E, Gerdtz M, Williams A, Dooley M. Complexities of medicines safety: communicating about managing medicines at transition points of care across emergency departments and medical wards. J Clin Nurs. 2014 Sept 11. [Epub ahead of print].).

A maior contribuição deste estudo centra-se na produção de um diagnóstico das ações de gerenciamento da segurança do paciente em um polo regional de saúde, relacionado aos serviços hospitalares.

Considera-se como limitação deste estudo a avaliação das ações do gerenciamento da segurança do paciente restrita à ótica de enfermeiros com cargo de liderança.

Conclusão

O presente estudo atingiu seus objetivos na medida em que avaliou as ações desenvolvidas em instituições hospitalares, sob a ótica dos enfermeiros, pautadas no gerenciamento da segurança dos pacientes, evidenciando vários aspectos positivos e relevantes nos processos de gerenciamento de riscos das instituições pesquisadas. Um deles refere-se à presença de sistema de notificação de EA em todas as instituições, facilitando a identificação de fragilidades.

O estudo ainda aponta que a maioria dos hospitais possui Comissão de Gerenciamento de Risco implantada e com enfermeiros participantes. Além disso, vários serviços de enfermagem já se utilizam de escores e escalas para predição de riscos assistenciais, que auxiliam no planejamento da assistência. Outro aspecto importante refere-se ao fato de que a maioria dos coordenadores afirmou que os erros têm levado a mudanças positivas nas instituições.

Dentre os aspectos de fragilidade encontrados, evidenciou-se a existência da cultura do medo dos colaboradores de que seus erros sejam inscritos em suas fichas funcionais. Outra evidência foi a subnotificação dos EA, mesmo aqueles que chegaram atingir o paciente.

O desenvolvimento de ações que visam à otimização da assistência ao paciente com a finalidade de diminuir os erros decorrentes de falhas no sistema são urgentes, e nesse aspecto os programas de qualidade podem ser ferramentas que auxiliam as instituições de saúde a conhecer melhor seus serviços, identificando suas fragilidades e implementando ações mais consistentes, seguras e ágeis, além de propiciar melhor utilização dos recursos disponíveis, evitando desperdícios e permitindo uma melhor aplicação dos mesmos.

As instituições devem refletir criticamente sobre o papel que os gestores devem desempenhar, uma vez que suas decisões estratégicas incluem a gestão de pessoas, o planejamento das instalações, a elaboração dos procedimentos operacionais, a escolha dos equipamentos, bem como todas as outras decisões que definem a estrutura do sistema.

O aprimoramento das habilidades e do conhecimento por parte dos enfermeiros se constitui em fator primordial para a melhoria da qualidade assistencial e, consequentemente, da segurança do paciente. Nesse contexto, é preciso investir na qualificação profissional e na prestação de assistência segura aos usuários dos serviços de saúde que buscam atendimento.

O alto índice de concordância em relação ao apoio da alta administração no gerenciamento da segurança das instituições é fator importante, pois as correções das fragilidades certamente implicam não apenas melhorias processuais, mas também melhorias ambientais, tecnológicas e, portanto, necessitam de investimentos para que ocorram.

Entende-se que o diagnóstico do gerenciamento do risco apresentado poderá apoiar gestores de serviços hospitalares a implementar medidas que possam melhorar o gerenciamento da segurança nas instituições, uma vez que qualidade e segurança são atributos indissociáveis.

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    Extraído da dissertação "Gerenciamento da segurança assistencial nos serviços de enfermagem", Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, 2013

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2015

Histórico

  • Recebido
    29 Abr 2014
  • Aceito
    30 Nov 2014
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