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Comportamento físico de um argissolo acinzentado coeso no estado do Ceará

Physical behavior of a gray cohesive argisol in Ceara State

Resumos

Em muitas partes do mundo, estuda-se o comportamento natural de um conjunto de solos que se torna duro, muito duro ou extremamente duro, quando seco, e friável, quando úmido. No Brasil, os solos com esse comportamento são conhecidos como "solos coesos" ou "solos com horizontes coesos". Este trabalho teve como objetivo avaliar o comportamento de um solo com horizonte coeso, em área de Tabuleiros Costeiros no estado do Ceará, a partir de variáveis físicas como: resistência tênsil (RT), resistência do solo à penetração (RP), densidade (Ds) e porosidade do solo (PT). O estudo foi realizado no município de Pacajus, em um Argissolo Acinzentado distrófico arênico coeso. Os resultados mostraram que os solos coesos do estado do Ceará apresentaram as mesmas restrições físicas identificadas em solos coesos de outros estados brasileiros, confirmando a hipótese testada.

solos coesos; Tabuleiros Costeiros no estado do Ceará; resistência tênsil; resistência do solo à penetração


The natural behavior of a set of soils that becomes hard, very hard or extremely hard when dry and friable when wet is being studied in many parts of the world. In Brazil, soils with this behavior are known as "cohesive soil" or "soil with cohesive horizon". Objective of this study was to evaluate the behavior of soils with a cohesive horizon in Coastal Tableland areas of Ceara State by means of the following physical parameters: tensile strength (RT), penetration resistance of the soil (RP), bulk density (Ds) and soil porosity (PT). The study was carried out in Pacajus, state of Ceara, Brazil, on a Gray Cohesive Argisol. Results showed that the cohesive soils in Ceara had the same physical restrictions identified in cohesive soils in other Brazilian states, confirming the hypothesis tested.

cohesive horizons; Coastal Tablelands in Ceara State; tensile strength; resistance penetration


SEÇÃO I - FÍSICA DO SOLO

Comportamento físico de um argissolo acinzentado coeso no estado do Ceará1 1 Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor e do projeto de cooperação acadêmica entre cursos de Pós-Graduação da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" - ESALQ/USP e da Universidade Federal do Ceará - UFC (PROCAD 2001 da CAPES).

Physical behavior of a gray cohesive argisol in Ceara State

Herdjania Veras de LimaI; Alvaro Pires da SilvaII; Ricardo Espindola RomeroI; Paulo Klinger Tito JacomineIII

IProfessor do Departamento de Ciências do Solo da Universidade Federal do Ceará - UFC. Av. Mister Hull s/n, Campus do Pici, Bloco 807, CEP 60455-760 Fortaleza (CE). E-mail: reromero@ufc.br; hvlima@ufc.br

IIProfessor do Departamento de Solos e Nutrição de Plantas, ESALQ/USP. E-mail: apisilva@esalq.usp.br

IIIProfessor do Departamento de Agronomia da Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE. Rua D. Manoel de Medeiros s/n, Dois Irmãos, CEP 52171-900 Recife (PE). E-mail: ricardoj@truenet.com.br

RESUMO

Em muitas partes do mundo, estuda-se o comportamento natural de um conjunto de solos que se torna duro, muito duro ou extremamente duro, quando seco, e friável, quando úmido. No Brasil, os solos com esse comportamento são conhecidos como "solos coesos" ou "solos com horizontes coesos". Este trabalho teve como objetivo avaliar o comportamento de um solo com horizonte coeso, em área de Tabuleiros Costeiros no estado do Ceará, a partir de variáveis físicas como: resistência tênsil (RT), resistência do solo à penetração (RP), densidade (Ds) e porosidade do solo (PT). O estudo foi realizado no município de Pacajus, em um Argissolo Acinzentado distrófico arênico coeso. Os resultados mostraram que os solos coesos do estado do Ceará apresentaram as mesmas restrições físicas identificadas em solos coesos de outros estados brasileiros, confirmando a hipótese testada.

Termos de indexação: solos coesos; Tabuleiros Costeiros no estado do Ceará; resistência tênsil, resistência do solo à penetração.

SUMMARY

The natural behavior of a set of soils that becomes hard, very hard or extremely hard when dry and friable when wet is being studied in many parts of the world. In Brazil, soils with this behavior are known as "cohesive soil" or "soil with cohesive horizon". Objective of this study was to evaluate the behavior of soils with a cohesive horizon in Coastal Tableland areas of Ceara State by means of the following physical parameters: tensile strength (RT), penetration resistance of the soil (RP), bulk density (Ds) and soil porosity (PT). The study was carried out in Pacajus, state of Ceara, Brazil, on a Gray Cohesive Argisol. Results showed that the cohesive soils in Ceara had the same physical restrictions identified in cohesive soils in other Brazilian states, confirming the hypothesis tested.

Index terms: cohesive horizons, Coastal Tablelands in Ceara State, tensile strength, resistance penetration.

INTRODUÇÃO

O caráter coeso ocorre em um horizonte pedogenético, adensado, muito duro ou extremamente duro, quando seco, e normalmente friável, quando úmido, que se desmancha subitamente ao ser imerso em água (Jacomine, 2001). É característico de horizontes subsuperficiais (AB, BA e, ou, parte do Bw ou Bt) e está relacionado com os sedimentos da Formação Barreiras, período Terciário, que constituem a unidade geomorfológica dos Tabuleiros Costeiros.

A origem dos horizontes com caráter coeso ainda não foi completamente esclarecida, porém se sabe que ocorre de forma natural e que pode estar associada a vários processos, tais como: perda do plasma argiloso das camadas superficiais do solo para as camadas subjacentes; forte instabilidade estrutural; presença de argila dispersa, como de outros agentes químicos, nos microporos, e adensamento por dessecação, proveniente da alteração da estrutura do solo pela alternância de ciclos de umedecimento e secagem (Ribeiro, 1986).

Mullins et al. (1987) propõem uma explicação física para solos com esse tipo de comportamento, como também indicam vários problemas agronômicos a ele associados, como: restrição ao cultivo e aumento do impedimento físico para crescimento de raízes. Outros estudos também mostram a grande influência das propriedades físicas no comportamento desses solos (Cintra & Libardi, 1998; Giarola et al., 2003).

Tentando definir, com maior clareza, parâmetros físicos que melhor caracterizem o horizonte coeso e a sua localização no perfil, Santana (2003) testou algumas variáveis físicas, a saber: resistência do solo à penetração, macroporosidade e densidade do solo, que pudessem detectar a ocorrência do horizonte coeso. Dentre as variáveis testadas, a resistência à penetração apresentou o melhor comportamento, tendo, como limitação, a necessidade de sua avaliação em ampla faixa de umidade do solo. A macroporosidade também se revelou um atributo bastante adequado para avaliar a coesão, considerando a sua correlação positiva com a condutividade hidráulica saturada.

Smith et al. (1997) já haviam sugerido a resistência do solo à penetração (RP) como uma medida física bastante confiável para avaliar o grau de adensamento dos solos, já que os pãs (horizontes endurecidos) têm poucos macroporos e desenvolvem uma resistência do solo muito alta, suficiente para restringir o crescimento das raízes (Vepraskas, 1984). A RP é fortemente relacionada com conteúdo de água e pode mudar consideravelmente com os ciclos de umedecimento e secagem do solo (Smith et al., 1997).

Outro indicador físico muito sensível das condições do solo é a resistência tênsil, que é usada para avaliar a resistência dos agregados, podendo ser determinada por teste simples (Dexter & Kroesbergen, 1985) e, ao mesmo tempo, mostra-se dependente da composição do solo, bem como do volume de agregados (Guérif, 1990). Essa resistência é definida como o estresse, ou força por unidade de área, requerida para que o solo se rompa mediante a aplicação de uma tensão (Dexter & Watts, 2000).

Um grande desafio é avaliar qual propriedade física é mais sensível para determinar a ocorrência ou não de um solo com horizonte coeso. Giarola et al. (2003), estudando solos coesos do estado da Bahia, concluíram que as medidas de resistência tênsil, resistência do solo à penetração e densidade do solo foram os principais fatores que influenciaram, direta ou indiretamente, as propriedades físicas analisadas, sendo estas responsáveis pelas diferenças entre solos coesos e não-coesos.

Diversos estudos, efetuados em áreas de solos coesos nos estados da BA, PE e AL, enfatizaram a importância das propriedades físicas no comportamento desses solos (Silva & Ribeiro, 1992; Silva et al., 1998; Cintra & Libardi, 1998). Com base nessas informações, estabeleceu-se a hipótese de que os solos coesos do Ceará apresentam as mesmas restrições físicas identificadas em solos coesos de outros estados brasileiros.

O objetivo deste trabalho foi avaliar o comportamento de um solo com horizonte coeso, em área de Tabuleiros Costeiros no estado do Ceará, analisando as variáveis físicas: resistência tênsil, resistência do solo à penetração, densidade e porosidade do solo.

MATERIAL E MÉTODOS

Área de estudo

O estudo foi realizado no município de Pacajus, litoral nordeste do estado do Ceará, em área pertencente à Estação Experimental da Embrapa/CNPAT. O clima da região é do tipo Aw (clima quente com temperatura do mês mais frio superior a 18 ºC, sendo o verão chuvoso e o inverno seco) pela classificação de Köppen, com precipitação pluviométrica média anual de 800 a 1.100 mm (Jacomine et al., 1973). O relevo regional é plano e suave ondulado, com altitudes variando de 20 a 80 m.

O solo usado neste estudo foi coletado em área cultivada com cajueiro anão, sendo classificado como Argissolo Acinzentado distrófico arênico coeso, correspondendo ao perfil 1 (P1). Para efeito de comparação quanto à coesão do solo, utilizou-se um perfil em área sob mata preservada, próxima ao P1, classificado como Argissolo Amarelo distrófico arênico, correspondente ao perfil 2 (P2), ambos provenientes de sedimentos arenosos e essencialmente quartzosos do Grupo Barreiras. Para avaliar o comportamento coeso, foram estudados com detalhes o horizonte coeso (Bt1 coeso do P1) e o não-coeso (Bt1 do P2), os quais apresentam estrutura maciça, tendendo à formação de blocos (Lima et al., 2004), e estão incluídos dentro da mesma classe textural (Quadro 1). A granulometria desses horizontes foi determinada conforme Gee & Bauder (1986).


O horizonte coeso e o não-coeso apresentaram baixos teores de matéria orgânica (M.O.), baixa capacidade de troca de cátions (CTC), baixos teores de SiO2, Al2O3 e Fe3O3, sendo caracterizados como bastante intemperizados (caulínitico) (Quadro 2) (Lima et al., 2004).


Determinação da resistência tênsil

Para determinar a resistência tênsil (RT), foram coletadas amostras indeformadas (pequenos monólitos) em caixa de alumínio (10 x 12 x 14 cm), no horizonte coeso (Bt1 coeso) e no não-coeso (Bt1), as quais foram revestidas com filme plástico e acondicionadas em caixas térmicas. No laboratório, os monólitos ainda úmidos (6,5 %) foram desfeitos manualmente, selecionando-se 44 agregados (torrões) por horizonte, com diâmetros entre 12,5 e 19 mm, sendo, posteriormente, secos ao ar e em estufa a 40 ºC. A resistência tênsil (RT) foi determinada, utilizando-se equipamento e procedimentos descritos por Imhoff et al. (2002), e calculada, segundo Dexter & Kroesbergen, (1985):

sendo 0,576 a constante de proporcionalidade, P a força aplicada por ocasião da ruptura (N) e D o diâmetro efetivo (m). Assumindo que a densidade dos agregados é constante, o diâmetro efetivo foi calculado de acordo com Watts & Dexter (1998):

em que M é a massa do agregado (g), Mo é a massa média dos agregados (g) e Dm é o diâmetro médio (mm). O diâmetro médio dos agregados nos conjuntos foi assumido como sendo o diâmetro médio das peneiras utilizadas para selecioná-los.

Curva de resistência do solo à penetração

Para determinar a curva de resistência à penetração, foram coletadas amostras indeformadas em anéis volumétricos (2,4 x 3,0 cm) no horizonte coeso e no não-coeso. As amostras foram saturadas com água e submetidas a diferentes potenciais mátricos (y), utilizando mesa de tensão e câmaras de pressão, segundo Klute (1986). Os y aplicados nas amostras foram: -2, -4, -6, -10, -20, -50, -300 e -1.500 kPa. Após as amostras terem atingido o equilíbrio, a resistência à penetração foi medida com o auxílio de um penetrômetro eletrônico, descrito por Tormena et al. (1998). Em seguida, as amostras foram secas em estufa a 105 °C e determinadas a umidade e a densidade do solo (Ds) (Blake & Hartge, 1986).

Distribuição da porosidade do solo

A porosidade total (PT) nos horizontes estudados foi calculada por meio da relação, , em que Dp é a densidade de partículas. Para calcular a Dp, certa quantidade de TFSA (Terra Fina Seca ao Ar) foi colocada num cilindro de volume conhecido, o qual foi introduzido numa câmara de pressão, conhecida como picnômetro de gás. Depois de atingido o equilíbrio dos gases no picnômetro, o volume de sólidos foi determinado, conforme Flint & Flint (2002). Posteriormente, a TFSA do cilindro foi levada à estufa a 105 ºC para a determinação da massa de sólidos.

A distribuição da porosidade foi classificada de acordo com o diâmetro dos poros, obtido a partir da curva de retenção de água no solo. Nessa classificação, foram considerados macroporos aqueles com diâmetro maior que 0,08 mm (y > -4 kPa); mesoporos, aqueles com diâmetros entre 0,08 e 0,03 mm (-4 > y > -10 kPa), e microporos, aqueles com diâmetros inferiores a 0,03 mm (y < -10 kPa), conforme Brewer (1964) e Luxmoore (1981).

Análises estatísticas

A normalidade dos dados de RT e Ds foi testada, usando a estatística de Shapiro-Wilk, que testa a hipótese de nulidade, ou seja, verifica se os dados foram extraídos de uma população com distribuição normal. A estatística de Shapiro-Wilk dá o valor W com um valor p correspondente. A hipótese de nulidade da normalidade é rejeitada quando o valor p é menor que 0,05.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Resistência tênsil (RT)

Os testes estatísticos indicaram que a resistência tênsil (RT) dos agregados apresentaram uma distribuição log-normal para o horizonte coeso (W = 0,98151, p < W = 0,7821) e não-coeso (W = 0,97922, p < W = 0,69985) (Figura 1), corroborando com os dados apresentados por Imhoff et al. (2002) e Giarola et al. (2003).


Os agregados do horizonte coeso foram significativamente (P < 0,001) mais duros que os agregados do não-coeso, apresentando média aritmética da RT de 76,65 e 18,88 kPa, respectivamente. A distribuição dos valores de RT transformados (logaritmo na base e) apresentou média ± erro-padrão de 4,29 ± 0,047, para o Bt1 coeso, e de 2,84 ± 0,067, para o Bt1 não-coeso, sendo estes valores significativamente diferentes (P < 0,001), mostrando que a estrutura maciça observada no campo, para os dois horizontes, não é o principal fator determinante da coesão.

Os valores de umidade, 4,41 e 4,19 %, para os agregados do horizonte coeso e o não-coeso, respectivamente, não apresentaram diferença estatística significativa (P > 0,1), o que favorece a comparação entre os horizontes, já que a umidade do solo é um dos principais fatores que influenciam a RT (Ley et al., 1989; Causarano, 1993; Perfect et al., 1995).

A diferença nos valores de RT (Bt1 coeso > Bt1 não-coeso) também não foi influenciada pela textura do solo, pois os dois horizontes apresentaram conteúdo de argila similar e estão colocados dentro da mesma classe textural (franco-argilo-arenosa) (Quadro 1). Ley et al. (1989) mostraram que a RT aumenta com a quantidade de argila e com o aumento da Ds.

Em solos hardsetting (solos australianos com comportamento semelhante ao dos solos coesos), secos ao ar, foram registrados valores de RT próximos a 200 kPa, o que corresponde, em bases logarítmicas, a 5,30 (Ley et al., 1989; Gusli et al., 1994). Giarola et al. (2003), avaliando o comportamento físico de solos coesos no estado da Bahia, encontraram valores de RT próximos a 37 kPa (ou 3,61 em bases logarítmicas), bem abaixo dos valores encontrados no Ceará.

A relação entre o potencial matricial de água no solo (y) e a umidade volumétrica é mostrada na figura 2. A curva mostra um comportamento similar para os dois horizontes a y > -50 kPa, já que os valores de umidade nos y = -50 kPa não apresentaram diferença estatística entre si a 0,05 [P variou de 0,668 (y = -2 kPa) a 0,071 (y = -50 kPa)]. A partir de y < -50 kPa o horizonte coeso passa a reter mais água que o horizonte não-coeso. Essa diferença pode ser atribuída ao adensamento das partículas no horizonte coeso (Figura 4).




Nos potenciais de maior retenção de água (y = -2 kPa a y = -6 kPa), a curva de resistência à penetração, para os dois horizontes, apresentou o mesmo comportamento (Figura 3). Com a diminuição da umidade do solo (< 0,15 cm3 cm-3 ), as linhas da curva divergiram, ilustrando que a diferença da RP nos horizontes, além de ser influenciada pela densidade do solo, sofreu influência do conteúdo de água no solo, tendo sido a RP maior no horizonte coeso. O horizonte não-coeso, quando seco, apesar de apresentar valores de RP suficientes para ser enquadrado dentro da faixa de baixo grau de coesão sugerida por Souza et al. (2003), não apresentou características de umidade condizentes com a definição do termo coeso.

Observando a figura 3, nota-se que os valores de RP atingiram um valor de 3 MPa em umidades próximos a 0,15 cm3 cm-3, o que corresponde, aproximadamente, ao potencial de -50 kPa. De acordo com Mullins (1997), valores de RP próximos a 3 MPa são suficientes para impedir o crescimento ou a emergência das plantas.

Com base nos dados apresentados, pode-se inferir que o aumento da RP no coeso mostrou-se diretamente relacionado com a diminuição do conteúdo de água e com o aumento da Ds. De acordo com Smith et al. (1997), a RP foi fortemente influenciada pelo grau de compactação do solo, a qual, por sua vez, foi influenciada pela Ds. A presença de materiais finos, como argila e silte, também contribuiu com o aumento da RP do solo seco, atuando como pontes que conectam as partículas de areia (Mullins, 1997).

A força exercida pelas ligações existentes entre as partículas do solo e o potencial mátrico tem efeito similar à aplicação de uma força externa (Mullins et al., 1987), uma vez que o ar, apesar de entrar nos espaços entre os grãos de areia durante a secagem do solo, penetra na matriz fina em baixos valores de potencial mátrico (> -1 MPa), o que pode contribuir para maior resistência do solo (Mullins & Panayiotopoulos, 1984). Tal explicação dá indícios de como a resistência pode variar com a umidade, pois uma queda acentuada do potencial mátrico, numa faixa estreita de umidade, resulta em aumento acentuado da resistência do solo.

Comparando dados da curva de resistência à penetração, o solo coeso do estado do Ceará apresenta valores de RP muito superiores (25 MPa) aos observados em solos coesos da Bahia (4,5 MPa) (Giarola et al., 2003), considerando a mesma faixa de umidade (0,1 a 0,15 cm3 cm-3) e a ocorrência de características físicas semelhantes.

A freqüência de distribuição da Ds mostrou-se normal para o horizonte coeso (W = 0,9874, p < W = 0,9118) e para o não-coeso (W = 0,9917, p < W = 0,9986) (Figura 4), corroborando com diversos trabalhos que apresentam a Ds como uma variável de distribuição normal (Nielsen et al., 1973; Silva et al., 1997; Giarola et al., 2003).

O valor de Ds foi significativamente maior (P < 0,001) no horizonte coeso, com média e erro-padrão de 1,75 ± 0,008 g cm-3, do que no horizonte não-coeso (1,52 ± 0,018). Essa diferença evidenciou que a Ds foi o principal fator que influenciou a resistência do solo entre os dois horizontes, levando à ocorrência do horizonte Bt coeso.

O horizonte coeso (Bt1 coeso) apresentou Ds (1,75 g cm-3) superior à observada em horizonte coeso (BA) no estado de Sergipe (1,72 g cm-3) (Cintra & Libardi, 1998), apesar de estes solos pertencerem à mesma classe taxonômica (Argissolos Acinzentados) e possuírem a mesma classe textural (franco-argilo-arenosa). Contudo, diferiram quanto ao tipo de horizonte, profundidade de ocorrência e teor de matéria orgânica.

Estudos realizados em Latossolos Amarelos coesos, nos estados de Alagoas e Bahia (Silva et al., 1998; Giarola et al., 2003), encontraram valores de Ds, respectivamente, de 1,42 e 1,57 g cm-3, sendo ambos inferiores aos observados na classe dos Argissolos Acinzentados coesos, apesar de estarem dentro da mesma classe textural.

A Ds é um dos parâmetros físicos do solo mais usados para quantificar a compactação do solo, principalmente quando são comparados solos com as mesmas características (Silva et al., 1997).

A distribuição do tamanho dos poros, em classes, está apresentada na figura 5. Observa-se que os valores da porosidade total no horizonte coeso, com média e erro-padrão de 0,34 ± 0,002 cm3 cm-3, foram significativamente menores do que os do horizonte não-coeso, 0,42 ± 0,006 cm3. O menor volume de poros total no horizonte coeso é acompanhado por redução similar dos macroporos e mesoporos, onde o horizonte coeso (0,10 ± 0,004; 0,02 ± 0,001 cm3 cm-3) foi significativamente menor (P < 0,001) que o não-coeso (0,19 ± 0,006; 0,04 ± 0,001 cm3 cm-3).


O menor volume de poros do horizonte coeso (Figura 5) mostrou efeito marcante sobre o aumento da resistência à penetração, durante o período seco, e sobre a densidade do solo. Em solos adensados, como é o caso dos horizontes coesos, os poros originalmente grandes são comprimidos, refletindo na redução do volume total de poros e, provavelmente, na redução do volume de macroporos. Guérif (1990) e Munkholm et al. (2002) mostraram uma forte correlação negativa entre macroporos e resistência tênsil.

Verificou-se o predomínio do volume de microporos nos dois horizontes, onde o coeso apresentou média e erro-padrão de 0,20 ± 0,004 e o não-coeso de 0,19 ± 0,002 cm3 cm-3, sendo P = 0,007. O predomínio de microporos no horizonte coeso explicou a retenção de maior quantidade de água nesse horizonte em relação ao horizonte não-coeso.

A maior quantidade de microporos deveu-se ao fato de eles ficarem posicionados dentro dos agregados, de forma a não serem atingidos pelos processos ocorridos no solo, somando-se aos outros microporos que foram criados quando ocorreu o adensamento, aumentando, dessa forma, o volume total de poros muito pequenos nos horizontes coesos (Cintra & Libardi, 1998).

De acordo com Cintra & Libardi (1998), uma das principais conseqüências negativas dos horizontes coesos foi a diminuição no volume total de poros, já que a alteração na porosidade afetou a atividade biológica, o movimento e a capacidade de retenção de água, bem como a sua disponibilidade para as plantas.

Os valores da porosidade do solo indicaram um possível arranjamento natural de suas partículas, já que o horizonte Bt1 coeso não sofreu alteração pelo manejo do solo, uma vez que se encontrava a 0,97 m de profundidade.

CONCLUSÕES

1. O trabalho confirmou a hipótese de que os solos coesos do Ceará apresentaram as mesmas restrições físicas identificadas em solos coesos de outros estados brasileiros.

2. Os valores de resistência tênsil, resistência do solo à penetração e densidade do solo foram mais elevados no solo coeso do Ceará do que em outras áreas dos Tabuleiros Costeiros estudadas no Brasil.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em novembro de 2003 e aprovado em novembro de 2004.

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  • 1
    Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor e do projeto de cooperação acadêmica entre cursos de Pós-Graduação da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" - ESALQ/USP e da Universidade Federal do Ceará - UFC (PROCAD 2001 da CAPES).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Abr 2005
    • Data do Fascículo
      Fev 2005

    Histórico

    • Recebido
      Nov 2003
    • Aceito
      Nov 2004
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