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Características químicas de solo sob aplicação de esterco líquido de suínos em pastagem natural

Soil chemical characteristics of native pasture affected by liquid swine manure

Resumos

Apesar de o esterco líquido de suínos ser um fertilizante, seu uso inadequado pode comprometer a qualidade do solo e água. O objetivo deste trabalho foi avaliar alterações em algumas características químicas de um solo sob pastagem natural com o uso de esterco líquido de suínos e suas implicações agronômicas e ambientais. O experimento foi conduzido de novembro de 1995 a novembro de 1999 em Paraíso do Sul, RS, em condomínio de suinocultores. Os tratamentos constituíram-se de 0, 20 e 40 m³ ha-1 de esterco líquido de suínos, aplicado em intervalos de 45 a 60 dias. Em cada época de aplicação de esterco, a pastagem natural era roçada, a forragem retirada e o esterco reaplicado. Os resultados mostraram que o uso sistemático de esterco líquido de suínos representa a adição de grandes quantidades de nutrientes ao solo, elevando principalmente os teores de P, Ca e Mg em áreas sob pastagem natural. O ambiente para o crescimento das plantas também pode ser melhorado com o uso de esterco líquido de suínos pela diminuição na saturação de Al, mas deve-se monitorar o teor de K no solo, porque, sob pastoreio, os teores podem decrescer. O fato de adicionar altas quantidades de N por meio do esterco líquido de suínos sem alterar seus teores no solo evidencia que ocorrem grandes perdas de N, principalmente na forma de nitrato. Além disso, a elevada concentração de P na camada mais superficial do solo mostra que estes elementos podem comprometer a qualidade do ambiente, especialmente como contaminantes da água.

água; contaminação ambiental; disponibilidade de nutriente; manejo de resíduos


Pig slurry is a fertilizer but its improper use can contaminate water and soil. The objectives of this study were to determine soil chemical attributes affected by liquid swine manure applied on native pasture and to evaluate the agronomic and environmental impacts of its use. An experiment with liquid swine manure application on native pasture was carried out from November 1995 to November 1999, in an area nearby a swine production place in Paraíso do Sul county, State of Rio Grande do Sul, Brazil, to evaluate the soil chemical attributes. The liquid swine manure application rates were: 0, 20 and 40 m³ ha-1, applied every 45 to 60 days. Right before each manure application, the forage was mowed and taken out. The liquid manure application on natural grass field every 45 to 60 days cause a high addition of soil chemical elements, specially P, Ca and Mg. The reduction of Al saturation may improve soil environment to plant growth, however, the K content should be monitored, because under grazing the latter could decrease. The system should have high N leaching in nitrate form, because, despite heavy N application through manure, the soil N content remains almost the same. This, in turn, could become an environmental problem, as long as one consider a high P content at surface also as potential water pollutant.

water; environmental contamination; nutrients availability; waste management


SOLOS

Características químicas de solo sob aplicação de esterco líquido de suínos em pastagem natural11 Extraído da dissertação de mestrado apresentada pelo segundo autor à Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria, RS. Trabalho parcialmente financiado pela Fapergs, Pronex e CNPq

Soil chemical characteristics of native pasture affected by liquid swine manure

Carlos Alberto CerettaI; Reges DurigonII; Claudir José BassoII; Luiz Antônio Rocha BarcellosIII; Frederico Costa Beber VieiraIV

IUFSM, Dep. de Solos, Faixa Camobi, km 9, CEP 97105-900 Santa Maria, RS. Bolsista do CNPq. E-mail: ceretta@ccr.ufsm.br

IIUFSM, Dep. de Solos. E-mail: rdurigon@bol.com.br, cjbasso@bol.com.br

IIIEmpresa de Assistência Técnica e Extensão Rural, Av. Medianeira, 278, CEP 97060-000 Santa Maria, RS. E-mail: larbarcellos@emater.tche.br

IVUniversidade Federal do Rio Grande do Sul, Dep. de Solos, Caixa Postal 776, CEP 90001-970 Porto Alegre, RS. E-mail: fredericocbv@yahoo.com.br

RESUMO

Apesar de o esterco líquido de suínos ser um fertilizante, seu uso inadequado pode comprometer a qualidade do solo e água. O objetivo deste trabalho foi avaliar alterações em algumas características químicas de um solo sob pastagem natural com o uso de esterco líquido de suínos e suas implicações agronômicas e ambientais. O experimento foi conduzido de novembro de 1995 a novembro de 1999 em Paraíso do Sul, RS, em condomínio de suinocultores. Os tratamentos constituíram-se de 0, 20 e 40 m3 ha-1 de esterco líquido de suínos, aplicado em intervalos de 45 a 60 dias. Em cada época de aplicação de esterco, a pastagem natural era roçada, a forragem retirada e o esterco reaplicado. Os resultados mostraram que o uso sistemático de esterco líquido de suínos representa a adição de grandes quantidades de nutrientes ao solo, elevando principalmente os teores de P, Ca e Mg em áreas sob pastagem natural. O ambiente para o crescimento das plantas também pode ser melhorado com o uso de esterco líquido de suínos pela diminuição na saturação de Al, mas deve-se monitorar o teor de K no solo, porque, sob pastoreio, os teores podem decrescer. O fato de adicionar altas quantidades de N por meio do esterco líquido de suínos sem alterar seus teores no solo evidencia que ocorrem grandes perdas de N, principalmente na forma de nitrato. Além disso, a elevada concentração de P na camada mais superficial do solo mostra que estes elementos podem comprometer a qualidade do ambiente, especialmente como contaminantes da água.

Termos para indexação: água, contaminação ambiental, disponibilidade de nutriente, manejo de resíduos.

ABSTRACT

Pig slurry is a fertilizer but its improper use can contaminate water and soil. The objectives of this study were to determine soil chemical attributes affected by liquid swine manure applied on native pasture and to evaluate the agronomic and environmental impacts of its use. An experiment with liquid swine manure application on native pasture was carried out from November 1995 to November 1999, in an area nearby a swine production place in Paraíso do Sul county, State of Rio Grande do Sul, Brazil, to evaluate the soil chemical attributes. The liquid swine manure application rates were: 0, 20 and 40 m3 ha-1, applied every 45 to 60 days. Right before each manure application, the forage was mowed and taken out. The liquid manure application on natural grass field every 45 to 60 days cause a high addition of soil chemical elements, specially P, Ca and Mg. The reduction of Al saturation may improve soil environment to plant growth, however, the K content should be monitored, because under grazing the latter could decrease. The system should have high N leaching in nitrate form, because, despite heavy N application through manure, the soil N content remains almost the same. This, in turn, could become an environmental problem, as long as one consider a high P content at surface also as potential water pollutant.

Index terms: water, environmental contamination, nutrients availability, waste management.

Introdução

Os solos com pastagem natural no Rio Grande do Sul são na sua maioria ácidos, com baixa disponibilidade de nutrientes e altos teores de Al em solução. O uso de esterco líquido de suínos pode melhorar estas condições pelo seu potencial fertilizante. Entretanto, seu uso deve ser criterioso, pois o esterco representa um potencial poluente para o ambiente, e pode comprometer a qualidade do solo e água.

O N é um dos principais constituintes do esterco líquido de suínos. Cerca de 50% desse N está na forma mineral (Barcellos, 1992), e ao ser aplicado tem efeito imediato no crescimento das plantas. Por sua vez, o escoamento superficial e a lixiviação no solo podem contaminar mananciais de água com nitrato. O K se encontra no esterco totalmente na forma mineral, solúvel e, por isso, seu efeito residual é muito curto. Plantas com alta taxa de absorção de K diminuem suas perdas potenciais no sistema.

Aproximadamente dois terços do P presente no esterco líquido de suínos está numa forma não solúvel em água, fazendo parte de estruturas orgânicas (Barcellos, 1992), as quais propiciam efeito residual ao esterco. Aplicações sucessivas de esterco podem causar acúmulo de P no solo, conforme observou Pratt (1979). Sua maior presença na camada superficial do solo é indesejável, pois favorece as perdas por escoamento superficial que, junto com o P que se movimenta no perfil do solo, podem causar eutroficação da água, conforme Giusquiani et al. (1998). Tal fato ficou demonstrado por Hountin et al. (2000), que verificaram incrementos de 16, 26, 33 e 50% em todas as formas de P até a profundidade de 1 m após aplicação de 30, 60, 90 e 120 m3 ha-1 de esterco líquido de suínos, respectivamente.

A possibilidade de alteração no pH do solo com a aplicação de esterco líquido de suínos é mínima, principalmente tratando-se de solos altamente tamponados (Scherer et al., 1984), ainda que os teores de alumínio possam ser diminuídos, especialmente pelo incremento de compostos orgânicos de baixo peso molecular.

O objetivo deste trabalho foi avaliar alterações em algumas características químicas de um solo sob pastagem natural com o uso de esterco líquido de suínos e suas implicações agronômicas e ambientais.

Material e Métodos

O experimento iniciou-se em novembro de 1995 e os resultados apresentados referem-se ao período até novembro de 1999. A área experimental pertence a um condomínio suinícola situado no Município de Paraíso do Sul, na região fisiográfica da Depressão Central do Rio Grande do Sul. O solo é classificado como Alissolo Crômico Órtico típico (Embrapa, 1999) e pertence à unidade de mapeamento Santa Maria. Os resultados da análise química do solo nas camadas 0-10 cm e 10-20 cm de profundidade são mostrados na Tabela 1.

Os tratamentos constituíram-se de 0, 20 e 40 m3 ha-1 de esterco líquido de suínos, aplicado em intervalos de 45 a 60 dias, o que corresponderia ao intervalo de tempo no qual os tanques de armazenamento (esterqueiras) estariam cheios novamente e o produtor deveria dar um destino ao esterco. O delineamento experimental utilizado foi de blocos casualizados com quatro repetições. As unidades experimentais constituíram-se de parcelas de 4,0x3,5 m.

As aplicações do esterco líquido de suínos foram realizadas manualmente e em superfície, logo após cada coleta de amostras da matéria vegetal aérea e corte e retirada total da vegetação da área experimental. No momento de cada aplicação, foi analisada a densidade do esterco para determinação da matéria seca, utilizando-se densímetro e proveta. Os teores de N, P, K, Ca e Mg totais no esterco líquido de suínos foram determinados conforme métodos descritos em Tedesco et al. (1995).

Durante o período experimental, foram realizadas 28 aplicações de esterco líquido de suínos. A concentração média e a quantidade total de nutrientes aplicados em cada dose encontram-se na Tabela 2.

A amostragem do solo foi realizada anualmente (5/8/96, 1º/7/97, 30/6/98 e 6/11/99) nas profundidades de 0-2,5, 2,5-5,0, 5,0-10, 10-20 e 20-40 cm, utilizando-se trado calador, e as análises foram realizadas segundo métodos descritos em Tedesco et al. (1995). Foi analisado o carbono orgânico por meio de oxidação por K2Cr2O7 + H2SO4, segundo o método de Walkley-Black (Allison, 1965); N total pelo método de Kjeldahl (oxidação úmida); P e K disponíveis pelo extrator Mehlich-1; Ca, Mg e Al trocáveis extraídos com sal neutro (KCl 1 mol dm-3) e pH em água.

Os resultados foram submetidos à análise de variância, sendo as variáveis analisadas como bifatorial (profundidade de amostragem x doses de esterco) e as médias comparadas pelo teste de Duncan a 5% de probabilidade de erro.

Resultados e Discussão

As características químicas do solo foram afetadas pelo uso de esterco líquido de suínos durante quatro anos, havendo interação entre as doses e profundidade do solo (Tabela 3). O incremento nos teores de C orgânico e N total ocorreu apenas na camada 0-2,5 cm, embora na sua interpretação deva-se considerar a possibilidade de efeito da amostragem do solo, já que resíduos vegetais ou do esterco misturam-se com o solo nesta camada até 2,5 cm, dificultando sua separação.

O fato de a aplicação de esterco não resultar em incrementos nos teores de C orgânico e N total nas camadas mais profundas deve-se, provavelmente, ao aumento na atividade microbiana motivada pelo esterco aplicado (N'Dayegamiye & Côté, 1989). Além do baixo teor de matéria seca que caracterizou o esterco utilizado, os compostos orgânicos presentes são de fácil mineralização, oxidando em poucos dias ou semanas (Redoy et al., 1979). Além disso, os resíduos da vegetação eram retirados da área experimental, diminuindo o aporte de material orgânico ao solo.

O fator que mais influencia a persistência da matéria orgânica no solo é a sua própria proteção física, originada pela interação com argilominerais e óxidos de Fe e Al (Ceretta, 1995). Em solo com pastagem natural e com baixo teor de argila, como o do presente trabalho, em que o teor de argila é de apenas 150 g kg-1, a proteção física da matéria orgânica é pequena, favorecendo a sua decomposição, e proporcionando um estado estacionário da matéria orgânica no tempo, com quantidades adicionadas e perdidas equivalentes (Bayer & Mielniczuk, 1999). A introdução de espécies forrageiras com maior potencial de produção de matéria seca poderia não alterar o teor de matéria orgânica no solo mas contribuiria para melhorar a ciclagem dos nutrientes do esterco.

As quantidades de N adicionadas ao solo foram altas e inferiores apenas às de P (Tabela 2). Entretanto, neste mesmo experimento, Durigon et al. (2002) mostraram que apenas 53% e 35% do N aplicado por meio do esterco líquido de suínos nas doses de 20 e 40 m3 ha-1, respectivamente, foram exportados pela matéria seca da pastagem natural. Logo, as perdas de N aplicado por meio do esterco foram expressivas, e podem ter ocorrido por volatilização de amônia, escoamento superficial ou lixiviação na forma de nitrato. Apesar dos porcentuais de perdas de N por volatilização de amônia atingirem valores de 45% a 63% do N amoniacal (Moal et al., 1995), o principal problema ambiental relacionado ao uso do esterco como fertilizante é a lixiviação de N na forma de nitrato (Gangbazo et al., 1995), especialmente no caso em que o esterco apresentava um teor médio de 3,23 kg m-3 de N, considerado alto.

O teor de P disponível no solo aumentou consideravelmente com a aplicação do esterco ao longo do tempo (Figura 1). Aos 8,3 meses de aplicação de esterco, o aumento na quantidade de P disponível na camada 0-10 cm foi de 242% e 580% com aplicação de 20 e 40 m3 ha-1, respectivamente; aos 48 meses, o incremento foi de 3.943% e 6.710% com as doses de 20 e 40 m3 ha-1, respectivamente, atingindo teores extremamente altos de P disponível no solo, uma vez que, para esta condição de solo, teores de P acima de 24 mg dm-3 são considerados altos (Comissão de Fertilidade do Solo - RS/SC, 1995).


Esses resultados evidenciam que se deve atentar para o potencial poluente do P no ambiente, evitando-se a aplicação de altas doses de esterco em pequenas áreas, e adotando-se medidas técnicas que permitam maior taxa de infiltração da água no solo, e sistemas de culturas que proporcionem a produção e manutenção de altas quantidades de resíduos vegetais sobre a superfície do solo, a fim de diminuir o escoamento superficial. Embora em alguns casos as perdas de P sejam pequenas, mesmo concentrações relativamente baixas (0,01 mg dm-3 de P solúvel ou 0,02 mg dm-3 de P total) são suficientes para causar eutroficação (Sharpley & Rekolainen, 1997).

Houve migração de P às camadas mais profundas do solo, com o uso de maior dose de esterco (Tabela 3). Se de 20 para 40 m3 ha-1 significou o dobro de esterco aplicado, o teor de P no solo aumentou 2,57 e 2,41 vezes nas camadas 5-10 cm e 20-40 cm, respectivamente, com aplicação de 40 m3 ha-1 em relação aos 20 m3 ha-1.

O teor de K disponível no solo diminuiu com a aplicação do esterco até a profundidade de 10-20 cm. Até a profundidade de 5-10 cm, a diminuição do teor de K no solo variou de 47% a 56% com a aplicação de 20 m3 ha-1 e de 33% a 44%, com o uso de 40 m3 ha-1, demonstrando que a quantidade de K exportada na matéria seca da pastagem natural foi mais relevante quando se aplicou a menor dose de esterco. Em parte, isso pode ser justificado pela maior absorção relativa de K com a menor dose do esterco, cujos dados são mostrados por Durigon et al. (2002) que, neste mesmo experimento, determinaram que a quantidade absorvida de K pelas plantas em pastagem natural foi 45% e 32% do total aplicado nas doses de 20 e 40 m3 ha-1, respectivamente. O fato de manter maiores teores de K disponível na área em que não foi aplicado esterco mostra que o tamponamento do solo é maior do que a quantidade exportada na matéria seca da pastagem.

O menor decréscimo no teor de K (25% a 28%) na profundidade de 20-40 cm pode ser considerado um indicativo da importância da sua exportação na matéria seca da pastagem natural, pois é acima desta profundidade do solo que se concentra a maior massa de raízes. Contudo, podem ocorrer perdas expressivas de K por escoamento superficial, pois a quase totalidade do K presente no esterco de suínos está na forma solúvel. Além disso, parte do K aplicado pode ter lixiviado além das camadas amostradas. Mesmo com 28 aplicações de 40 m3 ha-1 de esterco, durante os quatro anos, o teor de K no solo ficou abaixo do nível crítico, que é de 80 mg dm-3 (Comissão de Fertilidade do Solo - RS/SC, 1995), a partir de 2,5 cm de profundidade.

A aplicação do esterco proporcionou aumento no teor de Ca trocável no solo até a camada 2,5-5,0 cm. Na camada 0-2,5 cm, o aumento de Ca trocável foi de 50% e 49%, enquanto na camada 2,5-5,0 cm, o aumento foi de 36% e 40% nas doses de 20 e 40 m3 ha-1, respectivamente. Esses porcentuais de acréscimo no teor de Ca no solo são relativamente pequenos, e podem ser justificados pela baixa concentração de Ca no esterco (Tabela 2), pela possibilidade de formação de compostos minerais com fosfatos ou, segundo Mendonça & Rowell (1994), pela maior retenção de Ca pela matéria orgânica, diminuindo, desta maneira, sua extração pelo KCl. Na matéria seca da pastagem natural, foi exportado 43% e 29% do Ca contido nas doses de 20 e 40 m3 ha-1, respectivamente, determinado por Durigon et al. (2002).

Os teores de Mg aumentaram com a aplicação do esterco ao longo dos quatro anos (Figura 2) e foram dependentes das doses aplicadas, porque enquanto o acréscimo no teor de Mg nas camadas 2,5-5,0, 5-10 e 10-20 cm variou de 60% a 160% com a dose de 20 m3 ha-1, os porcentuais elevaram-se para 207% a 323% com a aplicação de 40 m3 ha-1, após os quatro anos (Tabela 3). À semelhança do que aconteceu com K e Ca, não houve efeito da aplicação do esterco no teor de Mg na profundidade de 20-40 cm de solo. Entretanto, quando se compara com as variações nos teores de Ca, pode-se sugerir que uma das causas dos maiores incrementos de Mg no solo pode ser a maior capacidade de extração de Mg pelo KCl 1 mol L-1 usado na sua determinação.


O teor de Al trocável no solo diminuiu com a aplicação do esterco até a camada de 10-20 cm de profundidade e isso se refletiu no decréscimo da saturação de Al no solo, principalmente com o uso de 40 m3 ha-1. Considerando-se que o Al é um dos principais fatores limitantes para o desenvolvimento das plantas em solos ácidos, é importante observar que os valores da saturação de Al onde não foi aplicado esterco foram de 17, 46, 53, 60 e 78%, ao passo que onde foi aplicado 20 m3 ha-1, os valores foram de 1, 18, 42, 51 e 75% e na dose de 40 m3 ha-1 os valores foram de 2, 10, 26, 46 e 70%, nas profundidades de 0-2,5, 2,5-5,0, 5,0-10, 10-20 e 20-40 cm, respectivamente. Contudo, abaixo de 5 cm de profundidade, os valores de saturação de Al se mantiveram altos, mesmo com a aplicação de esterco. Isso mostra que em muitos casos é possível obter maior eficiência no uso de esterco associando-se à prática da calagem.

A complexação de Al, especialmente pelas frações ácidos fúlvicos e húmicos da matéria orgânica, que são muito reativos e aumentam significativamente no solo com adições de altas quantidades de carbono (Ceretta, 1995), também pode justificar o grande decréscimo no teor de Al trocável até 5 cm de profundidade. Se por um lado não houve acréscimo no teor de C no solo, por outro lado, pode ter ocorrido alterações na qualidade da matéria orgânica, em virtude das características do C do esterco.

Apesar de ter sido detectada diferença significativa pelo teste de comparação de médias, pode-se, mais criteriosamente, considerar que o pH do solo praticamente não foi alterado com a aplicação do esterco.

Conclusões

1. O uso sistemático de esterco líquido de suínos representa a adição de grande quantidade de nutrientes ao solo, e eleva principalmente os teores de P, Ca e Mg em áreas sob pastagem natural.

2. O ambiente para o crescimento das plantas pode ser melhorado com o uso de esterco líquido de suínos pela diminuição na saturação de alumínio.

3. A lixiviação de N e a elevada concentração de P na camada mais superficial do solo adubado com esterco líquido de suínos mostram que estes elementos podem comprometer a qualidade do ambiente, especialmente como contaminantes da água.

Agradecimentos

Aos produtores do Condomínio de suinocultores, ao eng. agrôn. Cezar Augusto Medeiros e ao técnico Agrícola José Valdetar da Silva Gomes, ambos da Emater/RS, ao eng. agrôn. Aldo Roberto Tisott (SLC Agrícola Ltda), aos alunos Jeferson Diekow e Naracelis Poletto (UFRGS), Paulo Sérgio Pavinato e Miguel Gustavo Herbes (UFSM), pela colaboração prestada na realização deste trabalho.

Aceito para publicação em 12 de março de 2003

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  • 1
    Extraído da dissertação de mestrado apresentada pelo segundo autor à Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria, RS. Trabalho parcialmente financiado pela Fapergs, Pronex e CNPq
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Fev 2004
    • Data do Fascículo
      Jun 2003

    Histórico

    • Aceito
      12 Mar 2003
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