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Nodulação e fixação simbiótica de nitrogênio em feijoeiro com estirpes nativas de rizóbio, em solo tratado com lodo de esgoto

Nodulation and symbiotic nitrogen fixation in bean with rhizobium native strains, in soil amended with sewage sludge

Resumos

O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito da aplicação do lodo de esgoto ao solo, na nodulação e fixação de N2, por estirpes nativas de rizóbio em associação com o feijoeiro, em experimento de casa de vegetação. Os tratamentos constituíram-se de: ausência de adubos químicos e de lodo; adubação química completa; doses equivalentes a 14,8 t ha-1, 29,6 t ha-1 e 59,2 t ha-1 de lodo; e feijão inoculado com estirpes de rizóbio + adubação nitrogenada no plantio. Os maiores valores da atividade de redução do acetileno e dos números e massas dos nódulos secos, nos tratamentos com as doses 14,8 t ha-1 e 29,6 t ha-1 de lodo, demonstram que a sua aplicação pode aumentar a eficiência simbiótica dos rizóbios nativos, em feijoeiro.

Phaseolus vulgaris; fertilização nitrogenada; atividade da nitrogenase; biossólido


The objective of this work was to evaluate the effect of sewage sludge soil amendment, on nodulation and N2 fixation on bean nodulated with native rhizobia in greenhouse. Treatments were: no fertilization and no sludge; complete fertilization; 14.8 t ha-1, 29.6 t ha-1 and 59.2 t ha-1 of sewage sludge; and bean inoculated with selected rhizobia strains+N at planting. The doses of sewage sludge were calculated based on N crop requirement. The highest values obtained with the acetylene reduction activity, nodule number and mass by doses 14.8 t ha-1 and 29.6 t ha-1 of sludge demonstrated that soil amendment with sludge may increase bean native rhizobia efficiency.

Phaseolus vulgaris; nitrogenous fertilization; nitrogenase activity; biosolid


NOTAS CIENTÍFICAS

Nodulação e fixação simbiótica de nitrogênio em feijoeiro com estirpes nativas de rizóbio, em solo tratado com lodo de esgoto

Nodulation and symbiotic nitrogen fixation in bean with rhizobium native strains, in soil amended with sewage sludge

Rosana Faria VieiraI; Siu Mui TsaiII; Manoel Araújo TeixeiraIII

IEmbrapa Meio Ambiente, Caixa Postal 69, CEP 18200-000 Jaguariúna, SP. E-mail: rosana@cnpma.embrapa.br

IIUniversidade de São Paulo, Centro de Energia Nuclear na Agricultura, Caixa Postal 96, CEP 13400-970 Piracicaba, SP. E-mail: tsai@usp.com.br

IIIUniversidade do Vale do Sapucaí, Caixa Postal 213, CEP 37550-000 Pouso Alegre, MG. E-mail: manoel.at@uol.com.br

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito da aplicação do lodo de esgoto ao solo, na nodulação e fixação de N2, por estirpes nativas de rizóbio em associação com o feijoeiro, em experimento de casa de vegetação. Os tratamentos constituíram-se de: ausência de adubos químicos e de lodo; adubação química completa; doses equivalentes a 14,8 t ha-1, 29,6 t ha-1 e 59,2 t ha-1 de lodo; e feijão inoculado com estirpes de rizóbio + adubação nitrogenada no plantio. Os maiores valores da atividade de redução do acetileno e dos números e massas dos nódulos secos, nos tratamentos com as doses 14,8 t ha-1 e 29,6 t ha-1 de lodo, demonstram que a sua aplicação pode aumentar a eficiência simbiótica dos rizóbios nativos, em feijoeiro.

Termos para indexação:Phaseolus vulgaris, fertilização nitrogenada, atividade da nitrogenase, biossólido.

ABSTRACT

The objective of this work was to evaluate the effect of sewage sludge soil amendment, on nodulation and N2 fixation on bean nodulated with native rhizobia in greenhouse. Treatments were: no fertilization and no sludge; complete fertilization; 14.8 t ha-1, 29.6 t ha-1 and 59.2 t ha-1 of sewage sludge; and bean inoculated with selected rhizobia strains+N at planting. The doses of sewage sludge were calculated based on N crop requirement. The highest values obtained with the acetylene reduction activity, nodule number and mass by doses 14.8 t ha-1 and 29.6 t ha-1 of sludge demonstrated that soil amendment with sludge may increase bean native rhizobia efficiency.

Index terms:Phaseolus vulgaris, nitrogenous fertilization, nitrogenase activity, biosolid.

Para obtenção de altas produções de feijão (Phaseolus vulgaris L.) é necessária a aplicação de fertilizantes nitrogenados, uma vez que os rizóbios nativos apresentam, em geral, baixa eficiência simbiótica (Dowling & Broughton, 1986). Tem sido relatada a ausência de resposta à inoculação, em experimentos realizados no campo (Ramos & Boddey, 1987). Diante desse insucesso, formas alternativas de cultivo do feijoeiro, que aumentem a fixação simbiótica de N2 por essa leguminosa, têm sido estudadas.

Vieira et al. (1998) demonstraram que os rizóbios nativos do solo podem ter sua eficiência simbiótica aumentada, quando o feijoeiro é fertilizado com Mo, em um período definido do seu ciclo vegetativo. Rebah et al. (2002) verificaram que o lodo de esgoto, além de aumentar o tamanho da população nativa de rizóbio de trevo, também induziu a formação de nódulos maiores, com conseqüente aumento no crescimento da planta.

O objetivo deste trabalho foi avaliar o efeito da aplicação do lodo de esgoto ao solo, na nodulação e fixação de N atmosférico, por estirpes nativas de rizóbio em associação com o feijoeiro.

Utilizaram-se vasos com 5 kg de Latossolo Vermelho distroférrico textura média/argilosa coletado (0-20 cm) na área experimental da Embrapa Meio Ambiente, Jaguariúna, SP, com as seguintes características químicas: pH em CaCl2, 4,6; P, 11 mg dm-3 e em mmolc dm-3: K, 1,9; Ca, 12; Mg, 8; H + Al, 52 e CTC, 74,1; MO, 28 g dm-3 e V, 30%. O lodo de esgoto foi proveniente da estação de tratamento de esgoto de Barueri, SP. A digestão anaeróbia foi utilizada na estabilização do lodo, que apresentou as seguintes características químicas: K e N total, 1,61 e 33,1 (g kg-1); Ca, Mg, Na, Fe, Al e Co, respectivamente, 27,9, 3,3, 402, 26,6, 29,1, e 9,32 (g kg-1); Cd, Pb, Cu, Cr, Mo, Ni, Zn, B e Mn, respectivamente, 6,69, 78,6, 746, 625, 11,3, 336, 2.463, 125 e 220 (mg kg-1).

O experimento foi montado em delineamento de blocos ao acaso, com quatro repetições. Os tratamentos foram os seguintes: sem aplicação de fertilizantes químicos ou de lodo (T); adubação química completa (AQ); doses equivalentes a 14,8 t ha-1 (dose L1), 29,6 t ha-1 (dose L2) e 59,2 t ha-1 (dose L3) de lodo (base seca); e inoculação de estirpes selecionadas de rizóbio + N mineral no plantio (IN). A utilização do tratamento IN serviu como parâmetro na comparação da eficiência das estirpes nativas, juntamente com o tratamento testemunha. Estirpes de Rhizobium tropici, CM 255 e CM 01, foram inoculadas, conjuntamente, nas sementes. O inoculante turfoso foi produzido no Centro de Energia Nuclear na Agricultura, Piracicaba, SP, e aplicado numa proporção de 1 kg por 50 kg de sementes.

As doses de lodo foram calculadas, tomando-se como base os teores de N do lodo e as necessidades deste elemento para a cultura, conforme a equação: dose de lodo (kg ha-1) = N recomendado para a cultura (kg ha-1)/N disponível no lodo (kg kg-1 de lodo) (Cetesb, 1999). A dose L1 forneceu a metade do N mineral recomendado para o feijoeiro, a dose L2 e a dose L3 forneceram, respectivamente, a quantidade de N mineral recomendada e duas vezes essa quantidade.

Os vasos do tratamento AQ foram adubados com 60 kg ha-1 de P2O5, 50 kg ha-1 de K2O e 84 kg ha-1 de N, respectivamente, como superfosfato simples, cloreto de potássio e sulfato de amônio. O nitrogênio, dividido em quantidades similares, foi aplicado na semeadura e em cobertura, aos 15 e 30 dias após a emergência (DAE). Nos vasos do tratamento IN foram aplicados 10 kg ha-1 de N na semeadura. Os vasos suplementados com o biossólido receberam cloreto de potássio, para atingir a dose recomendada de 60 kg ha-1 de K2O, em razão do baixo teor de K no lodo. O pH do solo foi ajustado, por meio da aplicação de 7,9 g de calcário dolomítico (PRNT = 95%) por vaso.

Quatro sementes de feijão cultivar Carioquinha foram semeadas por vaso; após a emergência foram mantidas apenas duas plantas, que foram colhidas aos 46 (florescimento) e 58 (enchimento das vagens) dias após a emergência. Nessas duas épocas, foram avaliados a massa seca da parte aérea e seu conteúdo em N total (Tedesco et al., 1985). Aos 58 DAE, as vagens foram separadas da parte aérea, e a massa da matéria seca e seu conteúdo em N total foram quantificados. Aos 46 DAE foi avaliada a atividade de redução do acetileno (Hardy, 1968), o número e a massa dos nódulos secos. O conteúdo de N mineral no solo foi quantificado aos 10 DAE e, depois, a cada 15 dias (Tedesco et al., 1985).

Tanto as plantas com inoculação como as sem inoculação apresentaram nódulos, demonstrando a presença de rizóbios nativos no solo. Os maiores números de nódulos foram obtidos nos tratamentos L1 e no tratamento IN, enquanto as maiores massas de nódulos secos foram obtidos nos tratamentos L1, L2 e IN (Tabela 1). Em média, os tratamentos L1 e L2, e o tratamento IN apresentaram massas dos nódulos secos, 18 e 14 vezes maiores, respectivamente, do que o tratamento testemunha. Esses dados demonstram que o lodo de esgoto teve um efeito benéfico na população de rizóbios nativos do solo. As maiores massas dos nódulos, nos tratamentos L1 e L2, podem ter sido decorrentes do aumento da população nativa de rizóbio, nos solos tratados com lodo. Segundo Rebah et al. (2002), o cultivo de trevo, em solo suplementado com lodo, aumentou a população nativa de Sinorhizobium meliloti e produziu nódulos maiores do que aqueles do tratamento testemunha.

A atividade de redução do acetileno foi maior nas plantas que receberam as duas menores doses de lodo, ou que receberam inoculação de estirpes selecionadas (Tabela 1); na maior dose não houve diferença significativa quanto àquele parâmetro, em relação ao tratamento testemunha (Tabela 1). Os altos teores de N mineral no solo, nos tratamentos L1 e L2, não afetaram negativamente o processo simbiótico do feijoeiro com as estirpes nativas de rizóbio, embora seja bem conhecido que o N, geralmente, diminui a nodulação e fixação de N2 (Waterer & Vessey, 1993).

Em média, aos 10 DAE, as doses baixa, intermediária e alta de lodo apresentaram, respectivamente, 27%, 57% e 98% mais N mineral no solo que o tratamento AQ (Tabela 2). A menor nodulação e atividade de redução do acetileno no tratamento AQ, em relação aos obtidos nos tratamentos L1 e L2, demonstraram a existência de características do solo que podem ter interagido com o lodo e atuado de forma benéfica nos parâmetros de fixação de N2, em estirpes nativas de rizóbios no solo (Munn et al., 2001). Os baixos valores obtidos para os parâmetros simbióticos, no tratamento L3, por outro lado, demonstram que doses excessivamente altas de lodo podem ser prejudiciais ao processo simbiótico dos rizóbios nativos com o feijoeiro.

A massa da parte aérea do feijoeiro, aos 46 DAE, aumentou com as doses de lodo e, aos 58 DAE, a tendência praticamente continuou a mesma (Tabela 3). O teor de N total na parte aérea, tanto aos 46 DAE como aos 58 DAE, também aumentou com as doses de lodo. A massa das vagens secas e seu teor total em N foi praticamente igual para todos os tratamentos, à exceção da testemunha. No tratamento L3, apesar do maior teor de N no solo, e do maior crescimento e teor de N total da planta, pelo menos no início do crescimento, o feijoeiro não apresentou a maior produtividade em termos de massa de vagens e teor de N total. Isto demonstra que a simbiose entre os rizóbios nativos e o feijoeiro, nos tratamentos L1, L2 e IN, pode ter ocasionado uma remobilização mais eficiente de nutrientes para a parte reprodutiva da planta. Morris & Weaver (1983) verificaram, em soja, um efeito de estirpes de rizóbio, na remobilização de N para o desenvolvimento das vagens. No caso do feijoeiro, isto ocorreu independentemente da origem dos rizóbios (nativas ou selecionadas). Os resultados dos tratamentos L1 e L2 demonstram que as estirpes nativas de rizóbio podem ser tão eficientes quanto as estirpes selecionadas, quando condições adequadas de expressão do seu alto potencial de fixação de N2 são fornecidas.

Agradecimentos

À Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), pelo apoio financeiro.

Recebido em 20 de maio de 2004 e aprovado em 23 de março de 2005

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Dez 2005
  • Data do Fascículo
    Out 2005

Histórico

  • Aceito
    23 Mar 2005
  • Recebido
    20 Maio 2004
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