Resumos
O objetivo deste trabalho foi avaliar, nas diferentes estações do ano, as características morfogênicas e estruturais e a produção de matéria seca de Brachiaria decumbens Stapf., cultivada em três graus de sombreamento: área de pastagem exclusivamente com B. decumbens, área próxima ao bosque e área com bosque de Eucalyptus grandis consorciado com leguminosas arbóreas (0, 18 e 50% de sombreamento, respectivamente). O delineamento experimental foi o de blocos ao acaso, com arranjo em parcelas subdivididas no tempo, com quatro repetições. O sombreamento induziu à elevação das taxas de alongamento de folhas e colmos. A taxa de aparecimento de folhas e o número de folhas vivas por perfilho não foram influenciados pelos graus de sombreamento. Em geral, no inverno houve redução nos valores das variáveis morfogenéticas e estruturais do dossel, assim como das taxas de produção de forragem, independentemente do sombreamento. A braquiária apresenta plasticidade fenotípica, em resposta às variações climáticas sazonais e aos níveis de sombreamento ambiental, o que confere a essa espécie elevado potencial para uso em sistemas silvipastoris.
Brachiaria decumbens; morfogênese; perfilhamento; sistema silvipastoril; taxa de alongamento de folhas; taxa de aparecimento de folhas
The objective of this work was to evaluate, in different seasons of the year, the morphogenetic and structural traits and dry matter production of Brachiaria decumbens Stapf., established under three shading conditions: exclusive B. decumbens pasture, area distant 12 m from trees, and area under trees cultivated with Eucalyptus grandis mixed with leguminous trees (0, 18 and 50% shading level, respectively). The experimental design was the randomized blocks, in a split plot array in time, with four replications. Shade caused an increase of leaf and stem elongation rates. Shading levels have not influenced leaf appearance rates and leaf number per tiller. Morphogenetic and structural traits and herbage production rates reduced during winter, independently of shading level. Signalgrass presents phenotypical plasticity and responded to seasonal climatic variations and shade conditions; therefore, it has a good potential to be used in silvipastural systems.
Brachiaria decumbens; morphogenesis; tillering; silvopastoral system; leaf elongation rate; leaf appearance rate
ZOOTECNIA
Domingos Sávio Campos PaciulloI; Núbia Ribeiro CamposI; Carlos Augusto Miranda GomideI; Carlos Renato Tavares de CastroI; Roberto César TavelaI; Roberto Oscar Pereyra RossielloII
IEmbrapa Gado de Leite, Rua Eugênio do Nascimento, nº 610, Dom Bosco, CEP 36038-330 Juiz de Fora, MG. E-mail: domingos@cnpgl.embrapa.br, cagomide@cnpgl.embrapa.br, castro@cnpgl.embrapa.br
IIUniversidade Federal Rural do Rio de Janeiro, BR 465, Km 7, CEP 23890-000 Seropédica, RJ. E-mail: ropr@ufrrj.br
RESUMO
O objetivo deste trabalho foi avaliar, nas diferentes estações do ano, as características morfogênicas e estruturais e a produção de matéria seca de Brachiaria decumbens Stapf., cultivada em três graus de sombreamento: área de pastagem exclusivamente com B. decumbens, área próxima ao bosque e área com bosque de Eucalyptus grandis consorciado com leguminosas arbóreas (0, 18 e 50% de sombreamento, respectivamente). O delineamento experimental foi o de blocos ao acaso, com arranjo em parcelas subdivididas no tempo, com quatro repetições. O sombreamento induziu à elevação das taxas de alongamento de folhas e colmos. A taxa de aparecimento de folhas e o número de folhas vivas por perfilho não foram influenciados pelos graus de sombreamento. Em geral, no inverno houve redução nos valores das variáveis morfogenéticas e estruturais do dossel, assim como das taxas de produção de forragem, independentemente do sombreamento. A braquiária apresenta plasticidade fenotípica, em resposta às variações climáticas sazonais e aos níveis de sombreamento ambiental, o que confere a essa espécie elevado potencial para uso em sistemas silvipastoris.
Termos para indexação:Brachiaria decumbens, morfogênese, perfilhamento, sistema silvipastoril, taxa de alongamento de folhas, taxa de aparecimento de folhas.
ABSTRACT
The objective of this work was to evaluate, in different seasons of the year, the morphogenetic and structural traits and dry matter production of Brachiaria decumbens Stapf., established under three shading conditions: exclusive B. decumbens pasture, area distant 12 m from trees, and area under trees cultivated with Eucalyptus grandis mixed with leguminous trees (0, 18 and 50% shading level, respectively). The experimental design was the randomized blocks, in a split plot array in time, with four replications. Shade caused an increase of leaf and stem elongation rates. Shading levels have not influenced leaf appearance rates and leaf number per tiller. Morphogenetic and structural traits and herbage production rates reduced during winter, independently of shading level. Signalgrass presents phenotypical plasticity and responded to seasonal climatic variations and shade conditions; therefore, it has a good potential to be used in silvipastural systems.
Index terms:Brachiaria decumbens, morphogenesis, tillering, silvopastoral system, leaf elongation rate, leaf appearance rate.
Introdução
No Brasil, as pastagens cultivadas com gramíneas tiveram grande expansão entre as décadas de 1970 e 1990, principalmente com o plantio de espécies do gênero Brachiaria, com predominância de B. decumbens e B. brizantha (Boddey et al., 2004). Essas pastagens foram formadas, na maioria das vezes, em solos de baixa fertilidade natural, o que contribuiu para o avanço do processo de degradação, poucos anos após o estabelecimento das pastagens (Boddey et al., 2004; Macedo, 2005), que é um problema presente em cerca de 50% dos 105 milhões de hectares com pastagens cultivadas (Macedo, 2005).
Uma solução viável para se enfrentar esse problema é o estabelecimento de sistemas silvipastoris, que implica a presença e o aproveitamento de árvores, pastagem e animais numa mesma área. Entre os benefícios das árvores para o sistema, especialmente quando se trata de leguminosas arbóreas, destacam-se a maior retenção de umidade e o aumento da fertilidade do solo, com melhoria da atividade biológica na sua superfície e maior conforto térmico para os animais (Carvalho et al., 2001; Leme et al., 2005; Paciullo et al., 2007).
As árvores, porém, reduzem a luminosidade disponível para as plantas que crescem sob suas copas e têm influência sobre aspectos morfofisiológicos determinantes da produtividade da pastagem. Paciullo et al. (2007) observaram maior área foliar específica e menor índice de área foliar de um pasto de B. decumbens, em condições de sombreamento, quando comparado ao cultivo a pleno sol. Embora alguns trabalhos apresentem resultados sobre a morfofisiologia de plantas forrageiras cultivadas sob sombreamento, como o mencionado acima, ainda são poucos os estudos que avaliam a morfogênese de gramíneas forrageiras, em sistemas silvipastoris. É importante o conhecimento básico sobre as respostas ecofisiológicas e a morfogênese de gramíneas forrageiras, em condições de sombreamento, pois pode auxiliar no manejo adequado dessas espécies, quando usadas em sistemas silvipastoris.
O aparecimento e o crescimento de folhas e de perfilhos determinam a restauração da área foliar das gramíneas forrageiras, após o corte ou pastejo, e contribuem para a manutenção da produção e para a perenidade da pastagem. Por isso, as variáveis morfogênicas - taxas de aparecimento e alongamento de folhas e sua longevidade - tornam-se importantes características no estabelecimento de modelos de manejo da pastagem (Gomide et al., 2006). Sob ação da luz, temperatura, água e nutrientes, as variáveis morfogênicas determinam as características estruturais do relvado e, entre elas, o número e o tamanho das folhas e a densidade de perfilhos são as mais importantes. Além de definir o índice de área foliar do pasto, as características estruturais apresentam alta correlação com as variáveis relacionadas ao consumo de forragem pelos animais em pastejo (Carvalho et al., 2001), e são importantes na avaliação da qualidade do pasto.
Ainda são escassos os estudos sobre os diversos aspectos ecofisiológicos da interação entre árvores e gramíneas, especialmente aqueles relativos aos efeitos do sombreamento sobre o crescimento da planta forrageira. O objetivo deste trabalho foi avaliar, em diferentes estações do ano, a produção de matéria seca e as características morfogênicas e estruturais de pastos de B. decumbens, em três ambientes diferenciados em termos de radiação incidente.
Material e Métodos
O trabalho foi realizado na Embrapa Gado de Leite, Município de Coronel Pacheco, MG, de janeiro a dezembro de 2006, a 21º33'S, 43º6'W e 410 m de altitude. De acordo com a classificação de Köppen, o clima da região é do tipo Cwa (mesotérmico). O solo da área experimental é do tipo Latossolo Vermelho-Amarelo distrófico, de textura argilosa. As características químicas do solo eram: pH em água, 4,61; P disponível (Mehlich-1), 4,47 mg dm-3; Al, 0,79 cmolc dm-3; K, 0,11 cmolc dm-3; Ca, 0,33 cmolc dm-3; Mg, 0,12 cmolc dm-3. Os dados climáticos relativos ao período experimental foram coletados na Estação Meteorológica do Campo Experimental de Coronel Pacheco, a cerca de 500 m da área experimental (Tabela 1).
As avaliações foram realizadas em pastagem arborizada (sistema silvipastoril - SSP) e em pastagem exclusiva de B. decumbens, ambas estabelecidas em novembro de 1997, numa área de 8 ha, de topografia montanhosa, com aproximadamente 30% de declividade.
O sistema silvipastoril foi constituído pela gramínea B. decumbens cv. Basilisk e pelas leguminosas arbóreas Acacia mangium, A. angustissima e Mimosa artemisiana, além do Eucalyptus grandis. As árvores foram distribuídas em faixas, cada uma com quatro linhas, em espaçamento de 3x3 m. As faixas com árvores foram estabelecidas em nível, a cada 30 m de distância. A primeira e a terceira linhas das faixas de árvores foram constituídas pela seqüência E. grandis, M. artemisiana, A. mangium e A. angustissima, enquanto a segunda e quarta linhas apresentavam a seqüência A. mangium, A. angustissima, E. grandis e M. artemisiana, a fim de se buscar uma distribuição homogênea das espécies nas faixas. A braquiária estava estabelecida tanto na área sem árvores (30 m entre faixas com árvores), quanto na área sob as copas das árvores.
Antes do plantio, em novembro de 1997, aplicaram-se, de acordo com análise de solo, 1.000 kg ha-1 de calcário dolomítico, 600 kg ha-1 de fosfato de Araxá, 25 kg ha-1 de superfosfato simples, 100 kg ha-1 de cloreto de potássio e 30 kg ha-1 de FTE BR-16. Para implantação da pastagem exclusiva de braquiária, seguiu-se protocolo de preparo de solo e aplicação de corretivo e fertilizante, semelhante ao adotado dentro do SSP, uma vez que as áreas destinadas ao SSP e à pastagem de braquiária exclusiva eram contíguas e apresentavam a mesma declividade e tipo de solo. Depois do plantio, as áreas com pastagens não receberam aplicações adicionais de fertilizantes e corretivos.
Entre 1998 e 2000, a pastagem arborizada permaneceu vedada, a fim de se garantir o crescimento inicial das espécies arbóreas. As pastagens de B. decumbens, no SSP e em cultivo exclusivo, foram divididas em oito piquetes de 0,5 ha. Entre os anos de 2001 e 2003, as pastagens foram utilizadas para o pastejo de vacas secas, tendo-se respeitado os períodos de ocupação e descanso de 5 e 35 dias, respectivamente. A partir de 2003, as áreas foram manejadas com novilhas Holandês x Zebu em crescimento, em regime de lotação rotacionada, com períodos de 7 dias de ocupação do piquete e de 35 e 49 dias de descanso, nas épocas chuvosa e seca, respectivamente.
Os tratamentos consistiram de três ambientes, em termos de radiação solar recebida pelo pasto de B. decumbens: radiação solar plena, na pastagem em cultivo exclusivo, em área adjacente ao SSP; sombreamento médio de 50%, em relação à radiação solar plena, na faixa com árvores; sombreamento médio de 18%, na pastagem cultivada a 12 m da faixa com árvores, em que a luminosidade recebida era reduzida apenas no início da manhã e no final da tarde. O grau de sombreamento médio foi calculado a partir de medições da radiação solar recebida no topo do relvado de B. decumbens, nas condições de pleno sol, abaixo do dossel arbóreo e a 12 m da faixa de árvores. Para tanto, foi usado um sensor de radiação fotossinteticamente ativa (LI-COR, modelo LI-190SA), conectado a um radiômetro portátil (LI-COR, modelo LI-250), em três medições ao longo do dia: às 9, 12 e 15h.
Foram realizadas avaliações durante o verão (12/1 a 15/2), outono (26/4 a 29/5), inverno (10/7 a 22/8) e primavera (28/10 a 2/12) de 2006, tendo-se respeitado o cronograma de manejo adotado a partir de 2003.
O estudo de morfogênese foi realizado segundo o delineamento de blocos ao acaso, em parcelas subdivididas no tempo, com quatro repetições. Nas parcelas, foram alocadas as condições de sombreamento e, nas subparcelas, as estações do ano. Cada repetição foi constituída pelo valor médio das variáveis, avaliadas em seis perfilhos previamente identificados, que tiveram os comprimentos de suas lâminas foliares e colmos medidos semanalmente. A lâmina foliar foi medida em seu comprimento até sua completa expansão, ou seja, até o aparecimento da lígula. O comprimento da lâmina emergente foi medido do seu ápice até a lígula da última folha expandida, até que sua lígula se tornasse visível. Foi definido, como data de aparecimento foliar, o dia em que se observou a exposição da lígula, e como data de morte, quando todo seu tecido se apresentou senescente (Paciullo et al., 2003; Gomide et al., 2007). O comprimento do colmo foi medido considerando-se a distância do solo até a lígula da folha adulta mais jovem. Tais registros, realizados durante o período de descanso, se iniciaram após a saída dos animais do piquete e se repetiram até a próxima utilização do piquete.
A partir desses dados, foram estimadas, por perfilho, as taxas de aparecimento de folhas e de alongamento de folhas e colmos. Foi possível determinar, também, o número total de folhas e de folhas vivas, por perfilho. O tempo de vida da folha foi estimado a partir dos valores de suas taxas de aparecimento e do número de folhas por perfilho (Chapman & Lemaire, 1993). As taxas de alongamento foliar e de colmos foram obtidas por meio da divisão da diferença entre o comprimento final e inicial das lâminas foliares, ou dos colmos, pelo número de dias referente ao período de descanso da pastagem. A taxa de aparecimento de folhas foi calculada pela divisão do número de folhas totalmente expandidas (lígula exposta), por perfilho, pelo número de dias envolvidos. Ao mesmo tempo, foi calculado o inverso da taxa de aparecimento de folhas (filocrono), equivalente ao intervalo de tempo necessário para o aparecimento de uma folha no perfilho.
As taxas de produção de forragem foram obtidas a partir das estimativas da densidade de perfilhos totais e das taxas de alongamento de folhas e colmos, conforme Bircham & Hodgson (1983). Amostras de lâminas foliares verdes e de colmos, após a medição de seus comprimentos, foram mantidas em estufa, a 65ºC, e posteriormente pesadas, a fim de se estabelecer o índice gravimétrico, ou seja, o fator de conversão entre comprimento e massa da matéria seca (MS) de lâmina foliar (milímetro de lâmina foliar por perfilho, transformado em miligrama de MS de lâmina foliar por perfilho), de acordo com Mazzanti et al. (1994). A produção de forragem foi estimada pela contribuição do crescimento foliar e de colmos (alongamento foliar ou alongamento de colmos x população de perfilhos x índice gravimétrico x dias de crescimento).
Para a estimativa da densidade de perfilhos, foi usado um quadrado de 0,5 m de lado, lançado ao acaso, três vezes em cada parcela, ao final do período de descanso da pastagem. A cada lançamento, os perfilhos existentes no interior do quadrado foram cortados rente ao solo e armazenados em sacos de papel. Em seguida, as amostras foram levadas ao laboratório, para contagem do número de perfilhos.
Os resultados obtidos foram submetidos à análise de variância, e as médias foram comparadas pelo teste de Tukey, a 5% de probabilidade.
Resultados e Discussão
A taxa de alongamento de folhas variou em função da interação entre o grau de sombreamento e a estação do ano (p<0,01). Os maiores valores foram encontrados à sombra intensa (sob a copa das árvores), com exceção do inverno, quando foi constatada igualdade para as três condições de luminosidade (Tabela 2). Sob o sombreamento de 50%, as taxas de alongamento foliar foram 13, 117 e 118% maiores que aquelas obtidas a pleno sol, no verão, outono e primavera, respectivamente, o que evidencia uma mudança no padrão de alocação de fotoassimilados pelas plantas, que resultou em maior área foliar para captação de luz em ambiente com reduzida luminosidade. De fato, tem sido observado aumento da área foliar por planta, em gramíneas submetidas ao sombreamento (Castro et al., 1999; Paciullo et al., 2007).
Quanto ao efeito das estações do ano, foram observadas maiores taxas de alongamento de folhas no verão, outono e primavera; e menores no inverno, para a gramínea que cresceu no sistema silvipastoril sob sombra intensa e moderada. Sob condições de pleno sol, a maior taxa foi observada no verão, seguida das observadas no outono e na primavera (valores semelhantes entre si) e, por último, das observadas no inverno. No outono, se poderia esperar redução da taxa de alongamento de folhas, nas condições de sombra, em decorrência da redução da quantidade de chuvas (Tabela 1). Entretanto, a semelhança nas taxas de alongamento no verão e outono, à sombra, pode ser explicada pelas condições favoráveis à manutenção da umidade do solo, proporcionadas pelo sombreamento exercido pelo componente arbóreo do sistema, e pelo fato de que o estresse hídrico no outono, na região, ainda não é acentuado. Wilson (1998) demonstrou que, após um período de chuva, o teor de umidade do solo se reduz mais lentamente à sombra do que em condições de pleno sol. A sombra reduz a temperatura do solo entre 5 e 10ºC, a depender de seu movimento durante o dia. Isto é importante no aumento do crescimento das plantas, tanto pela redução do deficit hídrico, quanto pelo favorecimento da atividade microbiana na serapilheira e no solo. A drástica redução da taxa de alongamento de folhas, observada a pleno sol durante o outono, quando a escassez de água no solo provavelmente limitou o crescimento dessas folhas, reforça essa hipótese.
A taxa de alongamento de colmos variou em função da interação entre a estação do ano e o grau de sombreamento, e as respostas foram semelhantes àquelas observadas para a taxa de alongamento foliar, ou seja, maiores valores à sombra intensa, com exceção do inverno, quando não houve efeito do grau de sombreamento (Tabela 2). No inverno, foram obtidas menores taxas de alongamento de colmos, quando comparadas às demais estações, fato explicado pelas condições climáticas desfavoráveis, principalmente deficiência hídrica e baixa temperatura. O aumento das taxas de alongamento de colmos, sob as copas das árvores, parece ser comum em plantas cultivadas à sombra, por ser uma estratégia usual das plantas para compensar a redução na luminosidade (Samarakoon et al., 1990; Castro et al., 1999). O estiolamento de plantas submetidas ao sombreamento é um mecanismo pelo qual a planta busca luz, pela elevação de suas folhas no dossel. Em gramíneas, tal mecanismo permite, ainda, melhor distribuição da radiação ao longo do perfil do dossel (Mello & Pedreira, 2004; Gomide et al., 2007).
O comprimento final das lâminas foliares foi influenciado pela interação entre a estação do ano e o grau de sombreamento. No verão, outono e primavera, maiores comprimentos foram observados à sombra intensa, em comparação aos outros graus de sombreamento (Tabela 2). No inverno, os valores foram semelhantes entre os tratamentos, independentemente do sombreamento. De acordo com os resultados, deduz-se que as taxas de alongamento de folhas tiveram forte influência do comprimento final das lâminas foliares. Os valores à sombra intensa superaram, em 49 e 88%, aqueles obtidos em condições de radiação solar plena, no outono e na primavera, respectivamente (Tabela 2). De acordo com Castro et al. (1999), o desenvolvimento do aparelho fotossintético é influenciado pelo ambiente luminoso, e são observados, em várias espécies, aumentos significativos no comprimento da lâmina foliar em condições de luminosidade reduzida. Esses autores observaram, para B. decumbens e B. brizantha cultivadas em condições de sombreamento (60%), comprimentos de lâminas foliares 24,4 e 32,3%, respectivamente, maiores que os obtidos a pleno sol.
Em geral, lâminas mais longas foram observadas no outono, quando comparadas às das demais estações do ano. Isto pode ser atribuído à associação de dois fatores: semelhança nas taxas de alongamento de folhas, quando comparadas às do verão, outono e primavera; e menores taxas de aparecimento de folhas, no outono (Tabela 3), comparadas às do verão e primavera, o que provavelmente concorreu para maior duração do período de alongamento, conforme mecanismo descrito por Skinner & Nelson (1995).
A densidade populacional de perfilhos variou conforme a interação entre estação do ano e o grau de sombreamento. Em geral, os menores valores ocorreram sob sombreamento de 50%, no inverno. A queda na densidade de perfilhos, em condições de sombreamento intenso, realça a importância da luz no surgimento de novos perfilhos, em pastagens de gramíneas. Estudo realizado em pastagem de capim-braquiária arborizada revelou que o aumento da radiação incidente, de 35 para 65% da luz solar plena, proporcionou aumento de 76% no número de perfilhos (Paciullo et al., 2007).
A taxa de aparecimento de folhas e o filocrono não variaram com o grau de sombreamento, tampouco com a interação entre a estação e o grau de sombreamento, mas foram influenciadas pela estação do ano. Em geral, os valores no verão e na primavera superaram os das outras estações (Tabela 3), em decorrência das melhores condições para crescimento, principalmente em relação às variáveis temperatura do ar (Tabela 1) e umidade do solo. No inverno, houve decréscimo de aproximadamente 50% na taxa de aparecimento, em relação às taxas obtidas no verão e na primavera.
O tempo de vida da folha variou de acordo com a estação, sem efeito do grau de sombreamento, nem da interação grau de sombreamento x estação. No inverno, as folhas foram mais longevas, e no verão, menos. No outono e na primavera, a longevidade foi intermediária em relação às observadas no verão e no inverno (Tabela 3). O padrão de resposta sazonal, quanto à taxa de aparecimento e a longevidade das folhas, foi semelhante ao reportado por Zeferino (2006). Esse autor verificou, para B. brizantha, taxas de aparecimento de 70% menores no inverno, quando comparadas às do verão e da primavera, e folhas mais longevas no outono/inverno (155 dias por folha) do que no verão/outono (62 dias por folha). Essas variações de respostas das plantas às mudanças nos fatores de crescimento refletem a ação de mecanismos adaptativos para assegurar rebrotação e perenidade. Por exemplo, a redução da taxa de aparecimento, em épocas com condições climáticas desfavoráveis, foi compensada, em parte, pelo aumento do tempo de vida das folhas, conforme também constatado por Zeferino (2006).
O número de folhas totais e vivas por perfilho não variou com o grau de sombreamento nem com a interação com estação do ano. Efeito significativo foi observado apenas para a estação do ano, cujos valores foram maiores no verão e na primavera e menores no outono e no inverno (Tabela 3). O número de folhas vivas depende das taxas de aparecimento e senescência de folhas. Aumentos na taxa de aparecimento geralmente resultam em maior número de folhas por perfilho, principalmente quando associados à baixa taxa de senescência foliar. Os resultados ora relatados mostram semelhança no número de folhas vivas por perfilho, nas três condições de sombreamento, e refletem a igualdade estatística existente nas taxas de aparecimento de folhas, nos três tratamentos. Entretanto, foi verificado efeito significativo da estação do ano sobre o número de folhas vivas por perfilho, com redução no inverno (Tabela 3). A influência da estação do ano sobre o número de folhas vivas foi semelhante aos resultados verificados por Fagundes et al. (2006), que encontraram, para a B. decumbens, valores de 4,9 e 5,4 folhas por perfilho, no inverno e verão, respectivamente.
A taxa de produção de matéria seca variou com a estação do ano e com o grau de sombreamento (Tabela 4). Quanto ao efeito da estação, observou-se padrão de resposta semelhante ao das taxas de alongamento de folhas e colmos, com menores valores durante o inverno e maiores nas demais estações. O grau de sombreamento não influenciou a taxa de produção de folhas, que apresentou valor médio de 22,4 kg ha-1 por dia.
A taxa de produção de matéria seca de colmos foi menor sob sombreamento de 18%, e não diferiu nas demais condições de sombreamento. Pela semelhança nas taxas de alongamento de colmos, entre as condições de 18% de sombra e a pleno sol (Tabela 2), se poderiam esperar valores semelhantes também para a taxa de produção de matéria seca de colmos. Porém, é importante lembrar a relevância da densidade de perfilhos, que foi maior a pleno sol e elevou a taxa de produção de colmos.
A taxa de produção de matéria seca total foi maior em condições de 50% de sombreamento, intermediária a pleno sol e menor sob sombra de 18%. Diversos trabalhos têm demonstrado efeito negativo do sombreamento intenso sobre a produtividade de gramíneas forrageiras (Castro et al., 1999; Andrade et al., 2004; Paciullo et al., 2007), o que se mostra contrário ao resultado apresentado no presente trabalho. Dois aspectos devem ser considerados para explicar a maior taxa de produção de matéria seca à sombra de 50%. Primeiro, a menor densidade populacional de perfilhos pode ter sido, até certo ponto, compensada pelo aumento do peso por perfilho, que é conseqüência das maiores taxas de alongamento de folhas e colmos à sombra mais intensa. Segundo, sob a copa das árvores é possível que as plantas tenham se beneficiado do efeito positivo da decomposição da serapilheira das árvores leguminosas (A. mangium, A. angustissima e M. artemisiana), o que pode ter aumentado a disponibilidade de nutrientes no solo (Wilson, 1998). Portanto, ainda que sob sombreamento mais intenso tenha havido redução da quantidade de luz, os efeitos positivos das árvores sobre a ciclagem e liberação de nutrientes no solo podem ter favorecido o crescimento das plantas, em comparação às condições de sombra parcial, especialmente após nove anos da implantação das pastagens, sem adubação nitrogenada de manutenção durante esse período. Com 18% de sombreamento, houve efeito negativo da redução de luz sobre o crescimento das plantas, sem melhoria nas condições de fertilidade de solo, por causa do distanciamento das árvores do local de amostragem.
Conclusões
1. O sombreamento eleva as taxas de alongamento de folhas e colmos, bem como o comprimento final das lâminas foliares, mas não influencia a taxa de aparecimento de folhas e o número de folhas vivas por perfilho da Brachiaria decumbens.
2. A redução da densidade populacional de perfilhos é compensada pelo aumento nas taxas de alongamento de folhas e colmos, na condição de sombreamento mais intenso, e resulta em maior produção de matéria seca à sombra.
3. A Brachiaria decumbens apresenta plasticidade fenotípica, em resposta às variações sazonais das condições climáticas e de sombreamento, o que confere a essa espécie elevado potencial para uso em sistemas silvipastoris.
Recebido em 4 de março de 2008 e aprovado em 9 de junho de 2008
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Crescimento de capim-braquiária influenciado pelo grau de sombreamento e pela estação do ano
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
12 Ago 2008 -
Data do Fascículo
Jul 2008
Histórico
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Aceito
09 Jul 2008 -
Recebido
04 Mar 2008