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Os museus estaduais

Os museus estaduais

José Willibaldo Thomé

Presidente da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul. Coordenador do Curso de Pós-Graduação em Zoologia da PUC-RS. Porto Alegre - RS

Novamente abordaremos o assunto ''Museus de História Natural" em um Congresso de Zoologia (Thomé, 1981, 1982, 1984b).

Inicialmente permitimo-nos reiterar o que conceituamos como um Museu Contemporâneo; "uma entidade científica-cultural e de lazer, que promove o inventário e a avaliação do patrimônio natural e/ou cultural, regional ou universal, sob a forma de banco de dados" (Thomé, 1984a).

É um conceito abrangente, mas que permite inferir da nossa preferência por museus regionais, isto é, tema de nossa intervenção nesta mesa redonda.

O desenvolvimento de qualquer comunidade e mesmo qualquer civilização, nos parece estar alicerçada na capacidade que demonstrarem os povos da explotação auto-sustentada do patrimônio natural, sob forma de recurso natural. Desse modo, seria e é da maior relevância o conhecimento do patrimônio natural e a sua produtividade, isto é, o desfrute que o mesmo poderá fornecer sob forma de recurso natural.

As cadeias biológicas que entretêm o ambiente natural, todos sabemos hoje, que são de equilíbrio instável e muito frágeis e que a intervenção humana, através dos instrumentos tecnológicos, hauridos da investigação científica, poderá se tornar extremamente danosa e muitas vezes mortalmente destruidora para as mesmas.

O conhecimento do patrimônio natural, através do seu inventário criterioso e sistematizado, bem como a avaliação para detectar seu manejo, deve ser altamente prioritário e nos parece ser uma das finalidades mais preciosas de um Museu de História Natural contemporâneo.

No Brasil, infelizmente, há pouquíssimos Museus de História Natural e quase nenhum com as características que prenunciamos. Segundo Camargo e Almeida (1972), em seu Guia dos Museus do Brasil, só localizamos 4 Museus de História Natural de caracter estadual (no Pará, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul). Destes, o 1º está sendo administrado por órgão federal; o segundo é um órgão universitário; o terceiro está em funcionamento precário, restando o do Rio Grande do Sul, que preenche os requisitos de Museu Estadual em pleno funcionamento.

Ainda segundo o ICON (Conselho Internacional de Museus) são considerados Museus de História Natural, além dos próprios, também os Jardins Botânicos, os Parques Zoológicos e os Parques Nacionais ou equivalentes, (ver Thomé, 1985a-b).

Isto também foi concretizado com felicidade no Rio Grande do Sul, um órgão que administra conjuntamente as 4 entidades nucleares de um Museu contemporâneo. O planejamento racional e científico de desenvolvimento auto-sustentado necessita obrigatoriamente estar calcado no desfrute do patrimônio natural e apenas no seu desfrute, a fim de evitar-se a dilapidação do mesmo, com a degradação constante do ambiente vital.

Impõe-se, por conseguinte, o inventário e a avaliação do patrimônio natural, o que deve ser feito em caráter regional e dum agregado regionalizado extrapolar para o universal. O planejamento do desenvolvimento regional por ora, vem sendo feito quase que exclusivamente com dados econômicos e as vezes alguns demográficos, o que sempre se torna danoso, pois sendo o dado econômico o resultado da exploração de recurso natural, sem se saber qual o desfrute do patrimônio natural, é óbvio que o valor econômico proveniente daquela exploração é quase sempre irreal e aleatório.

Insistimos, pois, na necessidade de bancos de dados do ambiente natural, com programas ágeis e científicos, como vem sendo desenvolvidos no Museu de Ciências Naturais da FZB-RS.

A classificação dos Museus de História Natural em estaduais ou regionais, em nacionais e em universitários, como foi intentado neste encontro, nos parece muito feliz e coerente. Cremos que os 3 tipos de Museus, quanto as suas finalidades e objetivos são perfeitamente compatíveis e necessários.

Propomos que os Museus estaduais e/ou municipais tenham prioritariamente como objetivo o inventário e a avaliação do ambiente natural compreendido em seu âmbito de influência e ação e como finalidade prioritária o fornecimento destes dados às entidades governamentais e privadas encarregadas do planejamento racional e científico do desenvolvimento auto-sustentado da respectiva região.

Quanto aos Museus nacionais, poderiam ter o objetivo básico de coordenar, promover e acumular os dados fundamentais regionais, bem assim os lotes ou representantes típicos desses dados.

Os Museus Universitários, que hoje são raros no mundo, deveriam ter seus objetivos centrados em coleções didáticas, de manipulação e representativas da fauna e flora universal, destinando-se ao amparo do ensino e a cultura de sua clientela. Desse mesmo modo podem e devem funcionar os impropriamente chamados museus escolares, que deveriam ser mostruários faunísticos, para o aprendizado do alunado respectivo, destinando-se também ao lazer dos estudantes.

Concluindo, devemos ressaltar que o grande museu/científico/cultural nos parece que deve ser regional, isto é, municipal, estadual e/ou nacional, instituídos e mantidos pelos poderes públicos. Serão agregados que mantém coleções de representantes do ambiente natural, sob forma de depósitos em magazines (coleções científicas tradicionais) ou sob forma de parques (coleções vivas) dos tradicionais jardins botânicos, parques zoológicos e parques ou reservas naturais. Todos computadorizados sob forma de banco de dados, terão por objetivo o inventário e avaliação do patrimônio ambiental regional e servirão de banco de dados. Banco de dados que subsidiará o planejamento racional e científico da explotação ambiental e por conseqüência o uso auto-sustentado dos recursos naturais e desenvolvimento perene e não predatório.

Cabe, para finalizar, a pergunta: é isto realizável? Cremos firmemente que sim. Depende inicialmente de uma reciclagem dos naturalistas, biólogos, zoólogos, pesquisadores, para se adequarem a esta nova realidade museológica. A seguir deve-se conseguir convencer as autoridades constituídas e bem assim a população como um todo, de que a atividade museológica como banco de dados não é só necessária, mas altamente prioritária, indispensável para se chegar ao amanhã dentro de um contexto são e auto-sustentável para a sobrevivência da humanidade.

  • Camargo e Almeida, F. de 1972. Guia dos Museus do Brasil. Rio de Janeiro, Expressão e Cultura, 317p.
  • Thomé, J.W. 1981. Os Museus e o Conservacionismo. Anais do III Encontro de Zoologia do Nordeste, Recife, p. 11-19.
  • Thomé, J.W. 1982. Conservacionismo e instituições básicas: uma proposição filosófica. In: Salinas, P. J. ed. Zoologia Neotropical; actas del VIII Congresso Latinoamericano de Zoologia, Merida, v.1, p. 285-9.
  • Thomé, J.W. 1984a. Banco de Dados do Ambiente Natural. Ciência e Cultura, São Paulo, 36(4)689-692.
  • Thomé, J.W. 1984b. Conservacionismo e instituições básicas - uma proposição filosófica. Ciência e Cultura, São Paulo, 36(12):2166-69.
  • Thomé, J.W. 1985a. Museus, sustentáculos do desenvolvimento. Ciência e Cultura, São Paulo, 37(1):61-63.
  • Thomé, J.W. 1985b. Museus, sustentáculos do desenvolvimento. Natureza em Revista, Porto Alegre, (10)34-57.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Ago 2009
  • Data do Fascículo
    1988
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