Resumos
A osteoartrose é uma doença crônica das articulações que, uma vez instalada, leva seus portadores a uma incapacidade funcional progressiva. Como os proteocondroitins sulfato são os maiores constituintes das cartilagens, espera-se que com a ingestão de glucosamina e condroitina haja uma melhora das condições biológicas desse tecido. Uma vez que não temos conhecimento de estudo da farmacocinética da administração oral dessa associação em seres humanos, o objetivo deste trabalho foi avaliá-la utilizando a associação entre o sulfato de glucosamina (SG) e o sulfato de condroitina (SC) administrada a dois grupos de doze voluntários sadios do sexo masculino (grupo I uma cápsula de (500 mg SG; 400 mg SC) e grupo II quatro cápsulas). Amostras de sangue foram retiradas a intervalos de tempo pré-definidos até 48 horas pós-dose. O SG e o SC foram dosados no plasma pelo método de DMMB (azul de 1,9,dimetildimetileno). A concentração máxima foi atingida em 2 horas (média ±SE; 0,893±0,093 µg/mL, grupo I e 2,222±0,313 µg/mL, grupo II). As áreas sob a curva até 48 horas foram de 10,803±0,965 µg-hr/mL e 38,776±2,981 µg-hr/mL, respectivamente para os grupos I e II. Os dois grupos apresentaram um segundo pico após 18 horas, indicando circulação êntero-hepática. Os nossos resultados indicam que essa associação é absorvida por via oral por mecanismo saturável, o que pode facilitar o seu uso em tratamentos clínicos.
Osteoartrose; Sulfato de condroitina; Glucosamina; Proteoglicanos
Osteoarthrosis is a chronic joint disease that, once patent, leads to a progressive functional disability. As proteochondroitin sulfates are the major contents of the cartilage, it is expected that the ingestion of glucosamine and chondroitin might improve the biological status of that tissue. As we could not find any studies on the pharmacokinetic profile of this association by oral administration route in human beings, the objective of this study was to evaluate it by using the association of glucosamine sulfate (GS) and chondroitin sulfate (CS) given to two groups of twelve healthy male volunteers (group I: one capsule containing 500 mg of GS and 400 mg of CS; group II: four capsules with the same content). Blood samples were collected at pre-determined time intervals up to 48 hours post-dosing. GS and CS were measured in plasma by the DMMB (1,9,dimethyl-dimethilene blue) method. Maximum concentration was achieved within 2 hours (average ± SE; 0.893±0.093 µg/ml, group I; and 2.222±0.313 µg/ml, group II). Areas under curve up to 48 hours were 10.803±0.965 µg-hr/ml and 38.776±2.981 µg-hr/ml for groups I and II, respectively. Both groups showed a second peak after 18 hours, indicating an enterohepatic flow. Our results indicate that this association is absorbed through the oral route by a saturable mechanism, which can enable its use in clinical treatments.
Osteoarthrosis; Chondroitin Sulfate; Glucosamine; Proteoglicans
ARTIGO ORIGINAL
Farmacocinética da associação de glucosamina e sulfato de condroitina em humanos sadios do sexo masculino
Odaly ToffolettoI; Agostinho TavaresII; Dulce Elena CasariniIII; Beata Marie RedubloIV; Artur Beltrame RibeiroV
IDoutora em Ciências, Coordenadora de Pesquisa Clínica Hospital do Rim e Hipertensão Fundação Oswaldo Ramos
IIDoutor em Medicina, Professor Adjunto Disciplina de Nefrologia UNIFESP-EPM
IIIDoutora em Ciências, Pesquisadora Disciplina de Nefrologia UNIFESP-EPM
IVDoutor em Medicina, Disciplina de Nefrologia UNIFESP-EPM
VDoutor em Medicina, Professor Titular Disciplina de Nefrologia UNIFESP-EPM
Endereço para correspondência Endereço para Correspondência Rua Pedro de Toledo, 720 2º andar - CEP.: 04044-000
RESUMO
A osteoartrose é uma doença crônica das articulações que, uma vez instalada, leva seus portadores a uma incapacidade funcional progressiva. Como os proteocondroitins sulfato são os maiores constituintes das cartilagens, espera-se que com a ingestão de glucosamina e condroitina haja uma melhora das condições biológicas desse tecido. Uma vez que não temos conhecimento de estudo da farmacocinética da administração oral dessa associação em seres humanos, o objetivo deste trabalho foi avaliá-la utilizando a associação entre o sulfato de glucosamina (SG) e o sulfato de condroitina (SC) administrada a dois grupos de doze voluntários sadios do sexo masculino (grupo I uma cápsula de (500 mg SG; 400 mg SC) e grupo II quatro cápsulas). Amostras de sangue foram retiradas a intervalos de tempo pré-definidos até 48 horas pós-dose. O SG e o SC foram dosados no plasma pelo método de DMMB (azul de 1,9,dimetildimetileno). A concentração máxima foi atingida em 2 horas (média ±SE; 0,893±0,093 µg/mL, grupo I e 2,222±0,313 µg/mL, grupo II). As áreas sob a curva até 48 horas foram de 10,803±0,965 µg-hr/mL e 38,776±2,981 µg-hr/mL, respectivamente para os grupos I e II. Os dois grupos apresentaram um segundo pico após 18 horas, indicando circulação êntero-hepática. Os nossos resultados indicam que essa associação é absorvida por via oral por mecanismo saturável, o que pode facilitar o seu uso em tratamentos clínicos.
Descritores: Osteoartrose; Sulfato de condroitina; Glucosamina; Proteoglicanos
INTRODUÇÃO
A osteoartrite é uma doença crônica das articulações que leva seus portadores a uma incapacidade funcional progressiva. A doença não é sinônimo de envelhecimento, mas, uma vez instalada, progride com a idade(1-3). Ela está relacionada com a perda da capacidade funcional das articulações, e é caracterizada por dor constante. A ausência de cura da osteoartrite faz com que somente a dor seja tratada por meio de agentes tópicos, antiinflamatórios, analgésicos tipo opióide e -adrenérgicos, agentes intra-articulares, como depocorticosteróides, hialuronato e radionucleotides de emissão beta. Têm sido utilizados também glicosaminoglicanos sulfatados como sulfato de condroitina (CS) e de glucosamina(GS)(4-6).Por outro lado , o tratamento cirúrgico por meio de desbridamentos, ostertomias e próteses totais têm surtido bons efeitos.
Glucosamina (N-acetil-glucosamina) é um produto do metabolismo da glicose e este produto de degradação é um dos constituintes dos galato e glucosminoglicanos(6). Os glicosaminoglicanos são polímeros lineares compostos por unidades dissacarídicas repetitivas onde uma das unidades é invariavelmente uma hexosAmina (D-glucosamina ou D-galactosamina) e a outra um ácido hexurônico (glucurônico ou idurônico) ou uma galactose em seqüência não ramificada apresentando substituições de grupamentos sulfatos em várias posições da cadeia polissacarídica(7). As três unidades dissacarídicas: N-acetil-galactosamina-ácido hexurônico; N-acetil-glucosamina-ácido hexurônico e N-acetil-glucosamina-galactose representam as unidades básicas na formação da cadeia dos glicosaminoglicanos. Os galactosminoglicanos, cuja hexosamina será sempre uma D-galactosamina, são constituídos pela família das condroitinas sulfato e os glucosaminoglicanos, cuja hexosamina será sempre uma D-glucosAmina, são constituídos pelo ácido hialurônico, heparam sulfato, heparina e queratam sulfato.
Na classe das condroitinas iremos encontrar os condroitina não sulfatados, 4-sulfatados, 6-sulfatados e o dermatam sulfato(1).
As condroitinas sulfato são formadas por unidades dissacarídicas repetitivas de ácido glucurônico unidos por uma N-acetilgalacto-samina e apresentam um éster sulfato na posição 4- ou 6- e por isso o polissacarídeo formado recebe a designação de condrotim 4-sulfato ou 6-sulfato.
As cadeias das condroitinas sulfato variam em seu comprimento médio de um tecido para outro ou dentro do mesmo tecido. Em geral, a massa molecular média das cadeias das condroitinas sulfato diminui do jovem para o adulto, na cartilagem articular(8). Com exceção do ácido hialurônico todos os glicosamino e /ou galactosaminoglicanos são encontrados na forma de proteoglicanos.
Os tipos de proteoglicanos na cartilagem apresentam-se com diferentes volumes hidrodinâmicos, fato este ligado ao número de cadeias de glicosaminoglicanos. É importante lembrar que a maior parte dos glicosaminoglicanos encontrados em ossos e cartilagens é constituída por condroitins sulfato.
Proteoglicanos (PGs) são macromoléculas complexas que contêm um esqueleto protéico com uma ou mais cadeias de glico-saminoglicano, ligado covalentemente(9-13). O esqueleto protéico dos proteoglicanos tem uma localização central na molécula e, freqüentemente, fica apoiado a um "berço" formado pelas cadeias dos glicosaminoglicanos.
Nas cartilagens, os condrócitos sintetizam os vários tipos de proteoglicanos que formam juntos com a matriz colagênica um complexo supramolecular que dão a este tecido a função de uma mola biológica capaz de resistir a forças de alta compressão, além de estarem envolvidos no crescimento e remodelação do tecido. As cartilagens têm um altíssimo teor de proteoglicanos que são responsáveis pela sua estrutura morfológica e pela nutrição das células cartilaginosas.
Como os proteocondroitins sulfato são os maiores constituintes das cartilagens, espera-se que fornecendo glucosamina e condroitina, haja uma melhora das condições biológicas do tecido. Entretanto, há controvérsias quanto a proposta sobre os benefícios do tratamento com glucosamina e condroitina nos pacientes com osteoartrite(14-17). O presente estudo mostra que a administração de sulfato glucosamina associada do sulfato de condroitina sulfato é absorvida por via oral por indivíduos sadios.
CASUÍSTICA, MATERIAL E MÉTODOS
Casuística
Este protocolo foi conduzido de acordo com a Declaração de Helsinque, expressos nas Resoluções 196/96 e 251/97 do CNS/MS Normas de Pesquisa Envolvendo Seres Humanos. O protocolo experimental e o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital do Rim e Hipertensão, credenciado pelo CONEP/Ministério da Saúde. Foram incluídos no estudo voluntários sadios do sexo masculino, idade entre 18 e 45 anos, índice de massa corpórea (IMC) entre 19 e 25. Foram excluídos indivíduos com anormalidades clinicamente significantes nos exames bioquímicos, hematológicos e de urina I, presença de doença gastrintestinal, cardiovascular, hepática, hematopoiética, renal ou respiratória ou, ainda, história de alergia ao SC e ao SG. Outros critérios de exclusão foram: exposição recente (menos do que 3 meses) a drogas experimentais ou não, ingestão recente ou história de abuso de álcool ou de drogas ilícitas, fumantes, doação recente (menos do que 3 meses) de sangue, sorologia positiva para HIV e hepatites B e C. O estudo foi conduzido na Unidade de Farmacologia Clínica do Hospital do Rim e Hipertensão, de acordo com as normas de Boas Práticas Clínicas e o TCLE foi assinado por todos os voluntários incluídos antes do início do estudo.
Desenho do estudo
O estudo foi aberto, randomizado, dose única, um período. Vinte e quatro voluntários foram divididos aleatoriamente em dois grupos de 12 indivíduos. O grupo I (GI) recebeu 1 cápsula 500 mg de SC e 400 mg SG e o grupo II (GII) recebeu 4 cápsulas. Os voluntários foram internados na véspera da administração do medicamento. A administração foi feita às 7:00 da manhã após 10 horas de jejum. Os voluntários permaneceram sentados durante as 4 horas seguintes. Refeições padronizadas foram servidas 4, 7, 11, 13, 24, 28, 31, 35, 37 e 48 horas após a administração do medicamento.
Coleta e manipulação das amostras
As amostras de sangue dos voluntários deste estudo foram coletadas antes da administração do medicamento (coleta basal) e 0,5, 1, 2, 4, 5, 6, 8, 10, 12, 18, 24, 36, 48 e 168 horas após. em tubos Vacuntainer, perfazendo um total de 15 alíquotas. Como anticoagulante utilizou-se o EDTA. As amostras foram coletadas durante a internação dentro de 2 minutos do tempo determinado, mantidas em gelo e centrifugadas (10 minutos a 720 x g, 4ºC). O plasma separado foi congelado em 2 (duas) alíquotas e mantido a -20ºC até o momento da análise. O tempo entre a coleta do sangue e o congelamento do plasma não ultrapassou 30 minutos.
Método Analítico
O SG e o SC foram dosados pelo método que utiliza o azul de 1,9,dimetildimetileno(18) (DMMB), desenvolvido para a determinação de glucosaminoglicanos sulfatados. O método, validado de acordo com normas da ANVISA, baseia-se em extração liquido-liquido e quantificação por espectrofotometria. O método é linear entre 0,5 e 5,0 µg/mL. Tanto o SG quanto o SC são estáveis no plasma nas condições do ensaio, a três ciclos de congelamento/descongelamento, à luz e até 3 meses de armazenamento a 20ºC. A precisão intraensaio varia de 3,1 a 9,0% e interensaio de 2,9 a 13,9%; a exatidão intraensaio varia de 90 a 110% e interensaio de 100 a 115%.
Extração da Glucosamina e Condroitina
A cada alíquota de 2 mL de amostra de plasma foi adicionada 1 mg de papaína dissolvida em tampão fosfato:cisteína, pH 6,5 contendo EDTA 0,10 M. As amostras foram incubadas a 55º C durante 16 horas. Após incubação foram adicionados 500 µL de NaCL 4 M e, após agitação, o equivalente a 10% do volume total de ácido tricloroacético (TCA) 90%. O sobrenadante foi precipatado com etanol absoluto (3 vezes o volume) por 16 h a 20º C. O precipitado foi seco a vácuo e ressuspenso em 100 µL de água. Às amostras diluídas em água foi adicionado 1 mL do reagente DMMB seguido de suave agitação. A leitura foi feita em espectrofotômetro a 525 nm, dentro de 3 minutos da adição do DMBB. A curva padrão foi feita utilizando solução de condroitina sulfato SC (Aché Laboratórios Farmacêuticos).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Casuística
Os dados antropométricos dos voluntários sadios que participaram do estudo estão resumidos na Tabela 1. Pode-se observar que a população de estudo é homogênea e os dois grupos são semelhantes.
Ensaio Clínico
Os voluntários foram observados durante a internação e especificamente argüidos sobre eventos adversos a cada 4 horas. Durante esse período, não foram observados eventos adversos. Após 7 dias da alta hospitalar, os voluntários retornaram para exames bioquímicos, ECG e exame clínico, quando receberam alta do estudo.
Cinética Plasmática
A Figura 1A mostra a média±SE dos resultados brutos dos dois grupos (incluindo a concentração endógena). Após administração oral, a concentração plasmática aumenta, atingindo o máximo após 2 horas (Tmáx), decrescendo até o mínimo após 8 horas da administração, tanto no grupo I quanto no grupo II. Segue-se um segundo pico, após 18 horas de administração, provavelmente devido à re-circulação êntero-hepática(19). A Figura 1B exibe a média±SE do resultado líquido, isto é, após desconto da concentração basal (endógena).
O Cmáx observado (acima da concentração basal) foi de 0,893± 0,093 µg/mL e 2,222±0,313 µg/mL e a AUC0-48h 10,803±0,965 µg-h/mL e 28,543±6,704 µg-h/mL (média ±SE), respectivamente para GI e GII. Após 18 horas de administração a concentração foi de 0,365±0,041 µg/mL e 0,974±0,198 µg/mL, GI e GII, respectivamente. A Tabela 2 resume a média±SE dos parâmetros calculados desconsiderando a concentração plasmática basal (endógena).
A cinética de absorção do SC e do SG não é linear, como indicado pela relação entre os Cmáx e as AUC0-48h (2,389 e 2,642, respectivamente, Tabela 2). Essa relação se mantém no pico de 18 horas, resultante de recirculação êntero-hepática (2,668), o que reforça a evidência de que a etapa de absorção é limitante. Além disso, a meia-vida também é dependente da dose (16,931±1,902 h e 25,515±2,560 h, respectivamente para 1 e 4 cápsulas).
CONCLUSÃO
Os nossos resultados indicam que a dose única de até quatro cápsulas de 500 mg SC associada a 400 mg SG é bem tolerada e o perfil encontrado é consistente com administração a cada 12 horas.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem ao Aché Laboratórios Farmacêuticos pelo patrocínio e apoio deste estudo e Dra. Mônica V. Marquezim Dra. em Ciências pela cuidadosa revisão dos resultados do estudo.
Trabalho recebido em: 06/05/05 aprovado em 13/06/05
Trabalho realizado no Hospital do Rim e Hipertensão - Rua Borges Lagoa, 960 - 04038-002 São Paulo, SP Brasil - Displina de Nefrologia - Universidade Federal de São Paulo
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
26 Jan 2006 -
Data do Fascículo
2005
Histórico
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Aceito
13 Jun 2005 -
Recebido
06 Maio 2005