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Pelvimetria e pelvilogia em búfalas mestiças (Bubalus bubalis)

Pelvimetry and pelvilogy in female mixed buffaloes (Bubalus bubalis)

Resumos

Mensurações pélvicas internas e externas foram realizadas in vivo em 255 búfalas mestiças. Para a pelvimetria interna, utilizou-se o pelvímetro de Menissier-Vissac. Os resultados foram confrontados com a idade, perímetro torácico, peso, altura e comprimento. Para comparação das medidas pélvicas, os animais foram divididos equitativamente em 3 grupos (n=85), segundo a ocorrência e freqüência de partos (nulíparas, primíparas e multíparas). Os diâmetros pélvicos internos: biilíacos superior e inferior (horizontais) e sacropúbico (vertical) apresentaram respectivamente as seguintes médias e desvios padrões: 17,1 ± 2,17 cm; 15,7 ± 2,11 cm e 22,3 ± 2,51 cm; e os externos: biilíaco, biisquiático e ilioisquiático, da mesma maneira: 59,8 ± 6,13 cm; 32,4 ± 3,56 cm e 44,5 ± 3,31 cm. Correlações positivas significantes (p < 0,01) foram verificadas entre todas as medidas, porém, dentre as medidas corpóreas gerais, o perímetro torácico revelou o mais alto índice de correlações com as medidas pélvicas internas e externas. Diferenças significativas (p < 0,05) entre os 3 grupos foram observadas em relação à pelvimetria interna, quando comparados através das médias ajustadas em função do perímetro torácico, porém em relação à pelvimetria externa somente entre as nulíparas e os demais grupos para os diâmetros biilíaco e ilioisquiático. Para o diâmetro biisquiático externo nenhum dos grupos revelou tais diferenças. A pelvimetria interna em relação à externa mostrou-se menos correlacionada com o desenvolvimento corpóreo e mais nitidamente influenciada pela ocorrência dos sucessivos partos.

Anatomia, búfalos; Medidas pélvicas, búfalos; Pelve; Morfometria; Pelvimetria; Pelvilogia


In vivo internal and external pelvimetry was carried out in 255 mixed female buffaloes. A Menissier-Vissac pelvimeter was used for the internal measurements. The results were compared to age, heart girth, body weight, height and length. In order to compare the pelvic measurements, the animals were equitably divided into 3 groups (n=85) according to parturition occurrence and frequency (nuliparous, primiparous and multiparous). The internal transverse (horizontal) pelvic diameters, dorsal and ventral bi-iliac and the sacro-pubic (vertical) were respectively: 17.1 ± 2.17 cm; 15.7 ± 2.11 cm and 22.3 ± 2.51 cm; and the external bi-iliac (hipwidth), bi-isquiatic (pin width) and ilioisquiatic (rump length): 59.8 ± 6.13 cm; 32.4 ± 3.56 cm and 44.5 ± 3.31 cm, respectively. Significant positive correlations (p < 0.01) were obtained for all measurements but heart girth was found to have the highest correlations to pelvic measurements. Adjusted means by heart girth revealed significant differences (p < 0.05) for the 3 groups in respect to internal pelvimetry. However, as it concerns to external pelvimetry, significant differences were found only between the nuliparous and the other two groups for the bi-iliac and ilioisquiatic; for the bi-isquiatic diameter no significant differences were found. The internal pelvimetry was found to be less correlated to the body size and more evidently affected by the successive parturition occurrence.

Buffaloes, anatomy; Buffaloes, pelvic measures; Pelvis; Morphometry; Pelvimetry; Pelvilogy


Pelvimetria e pelvilogia em búfalas mestiças (Bubalus bubalis)

Pelvimetry and pelvilogy in female mixed buffaloes (Bubalus bubalis)

Cláudio Alvarenga de OLIVEIRA1 1 Departamento de Reprodução Animal da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP 2 Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP 3 Estação Experimental de Zootecnia, IZ/Registro-SP 4 Departamento de Reprodução Animal da Universidade Estadual do Maranhão ; Pedro Primo BOMBONATO2 1 Departamento de Reprodução Animal da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP 2 Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP 3 Estação Experimental de Zootecnia, IZ/Registro-SP 4 Departamento de Reprodução Animal da Universidade Estadual do Maranhão ; Pietro Sampaio BARUSELLI1 1 Departamento de Reprodução Animal da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP 2 Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP 3 Estação Experimental de Zootecnia, IZ/Registro-SP 4 Departamento de Reprodução Animal da Universidade Estadual do Maranhão ; José Fernando Simplício de OLIVEIRA3 1 Departamento de Reprodução Animal da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP 2 Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP 3 Estação Experimental de Zootecnia, IZ/Registro-SP 4 Departamento de Reprodução Animal da Universidade Estadual do Maranhão ; Abisai de Oliveira SOUZA4 1 Departamento de Reprodução Animal da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP 2 Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP 3 Estação Experimental de Zootecnia, IZ/Registro-SP 4 Departamento de Reprodução Animal da Universidade Estadual do Maranhão

CORRESPONDÊNCIA PARA:

Cláudio Alvarenga de Oliveira

Departamento de Reprodução Animal da

Faculdade de Medicina Veterinária e

Zootecnia da USP

Av. Prof. Dr. Orlando Marques de Paiva, 87

Cidade Universitária Armando de Salles

Oliveira - 05508-000 ¾ São Paulo ¾ SP

RESUMO

Mensurações pélvicas internas e externas foram realizadas in vivo em 255 búfalas mestiças. Para a pelvimetria interna, utilizou-se o pelvímetro de Menissier-Vissac. Os resultados foram confrontados com a idade, perímetro torácico, peso, altura e comprimento. Para comparação das medidas pélvicas, os animais foram divididos equitativamente em 3 grupos (n=85), segundo a ocorrência e freqüência de partos (nulíparas, primíparas e multíparas). Os diâmetros pélvicos internos: biilíacos superior e inferior (horizontais) e sacropúbico (vertical) apresentaram respectivamente as seguintes médias e desvios padrões: 17,1 ± 2,17 cm; 15,7 ± 2,11 cm e 22,3 ± 2,51 cm; e os externos: biilíaco, biisquiático e ilioisquiático, da mesma maneira: 59,8 ± 6,13 cm; 32,4 ± 3,56 cm e 44,5 ± 3,31 cm. Correlações positivas significantes (p < 0,01) foram verificadas entre todas as medidas, porém, dentre as medidas corpóreas gerais, o perímetro torácico revelou o mais alto índice de correlações com as medidas pélvicas internas e externas. Diferenças significativas (p < 0,05) entre os 3 grupos foram observadas em relação à pelvimetria interna, quando comparados através das médias ajustadas em função do perímetro torácico, porém em relação à pelvimetria externa somente entre as nulíparas e os demais grupos para os diâmetros biilíaco e ilioisquiático. Para o diâmetro biisquiático externo nenhum dos grupos revelou tais diferenças. A pelvimetria interna em relação à externa mostrou-se menos correlacionada com o desenvolvimento corpóreo e mais nitidamente influenciada pela ocorrência dos sucessivos partos.

UNITERMOS: Anatomia, búfalos; Medidas pélvicas, búfalos; Pelve; Morfometria; Pelvimetria; Pelvilogia.

INTRODUÇÃO

A população bubalina brasileira está estimada em aproximadamente 1,5 a 2,0 milhões de animais, pertencentes às raças Murrah, Jafarabadi, Mediterrânea, Carabao e seus mestiços, distribuindo-se cerca de 50% na Região Norte, 15% na Região Sudeste, 14% no Nordeste, 12% no Centro Oeste e 9% na Região Sul. No Vale do Ribeira, o búfalo teve sua primeira introdução em 1956, seguida de outras introduções até 1970, quando passou a ter maior relevância nessa região, até que em 1984 atingiu um efetivo de 8.000 cabeças distribuídas em 85 propriedades. As informações oficiais mais recentes datam de 1993 e acusam, na região, a presença de mais de 100 criatórios com um rebanho estimado em aproximadamente 12.000 cabeças1. A verificação de dados populacionais tão expressivos e com evidentes perspectivas de incremento contínuo e progressivo, bem como a carência de informações morfológicas na literatura, aliados à importância da pelvilogia nas avaliações dos animais destinados à reprodução, sob o ponto de vista da tocoginecologia clínica e cirúrgica, criação, seleção e melhoramento genético animal, motivaram-nos ao planejamento e execução desta pesquisa.

No tocante aos trabalhos especializados, a maioria relaciona-se à espécie bovina e poucos se dedicam a estudos mais aprofundados de aspectos elementares da pelvimetria. Alguns autores, a partir de dados da literatura, dedicaram-se ao estudo crítico da pelvimetria correlacionada a problemas tocológicos de bovinos3,6,7,17. Outros, com auxílio do pelvímetro de Rice, realizaram mensurações pélvicas internas em fêmeas nulíparas de bovinos, tratando-as, porém, em termos de área pélvica, como sendo o produto do diâmetro vertical (Sacropúbico) pelo horizontal (Biilíaco), medido este último, no ponto de maior largura da entrada da pelve9,13,16. Ainda em relação à pelvimetria bovina, dois outros trabalhos utilizando metodologia semelhante à nossa foram encontrados. No primeiro, o autor trabalhou com fêmeas nulíparas, primíparas e multíparas da raça Guzerá, apresentando os seguintes resultados: biilíaco superior = 14,55 ± 1,22 cm; biilíaco inferior = 13,39 ± 1,20 cm; e sacropúbico = 18,6 ± 1,59 cm12. O segundo apresenta dados da raça Jersey, revelando para os mesmos diâmetros pélvicos, respectivamente, as seguintes médias: 15,51 + 2,16; 14,06 + 2,16 e 16,98 + 1,97 cm4.

No que diz respeito à literatura especializada sobre bubalinos, o número de trabalhos, comparativamente às outras espécies domésticas, é bastante reduzido e são oriundos, a maioria, da Índia, Malásia e outros países asiáticos. Em geral, as medidas dos búfalos assemelham-se às dos bovinos, com os seguintes valores médios para um exemplar adulto da espécie: altura variando de 120 a 160 cm; comprimento, de 128 a 154 cm e o perímetro torácico, de 175 a 220 cm8. Pesquisadores da Malásia descrevem as medidas corpóreas ideais para um macho de seis anos de idade, utilizado para fins de tração: peso, 600 kg; perímetro torácico, 210 cm; altura, 126 cm e comprimento, 126 cm. Esse animal, explicam, excluindo-se a cabeça e o pescoço, deve encaixar-se num quadrado, ou seja, o comprimento deve ser aproximadamente igual à altura10. Os trabalhos especializados sobre pelvimetria nesta espécie são ainda mais escassos e, a exemplo do que ocorre em relação aos bovinos, há em geral maior interesse nos aspectos ligados à tocoginecologia, em detrimento de estudos anatômicos. Num trabalho envolvendo 12 machos adultos da raça Murrah, os autores realizaram medidas corpóreas gerais e pelvimétricas externas, assinalando que 83% da variabilidade das medidas pélvicas foi devido ao perímetro torácico; não havendo porém significância estatística para este fato, segundo os próprios autores, provavelmente em função do baixo número de animais na amostra11.

Entre os trabalhos de pelvimetria propriamente ditos, autores indianos trabalharam com 79 búfalas mestiças nulíparas, de 19 a 42 meses, pesando entre 251 e 450 kg, realizando medidas pélvicas internas (pelvímetro de Rice) e externas, mas não mencionam os diâmetros utilizados, transformando-os e lidando com eles sob a forma de área pélvica. Ressaltam, estes autores, o fato de terem encontrado alta correlação entre: pelvimetria interna e externa (0,97); idade e pelvimetria externa (0,98); idade e pelvimetria interna (0,97); peso e pelvimetria interna (0,97); e peso e pelvimetria externa (0,98). Acrescentam que o crescimento da pelve é mais dependente do peso do que da idade e recomendam a utilização prática da pelvimetria externa em função de sua alta correlação com a interna5. Outros pesquisadores, utilizando-se do pelvímetro de Rice, tomaram as medidas pélvicas internas e externas de 85 fêmeas nulíparas da raça Murrah, encontrando, em termos de médias e erros padrões, os seguintes resultados: diâmetro biilíaco externo: 55,0 ± 3,40 cm; diâmetro biisquiático externo: 31,75 ± 2,92 cm; diâmetro ilioisquiático externo: 41,66 ± 2,53 cm; diâmetro sacropúbico: 18,5 ± 1,18 cm; "largura pélvica": 16,27 ± 1,18 cm (para esta medida os autores não especificam os pontos anatômicos de referência). Encontraram, ainda, coeficientes de correlação variando de 0,37 a 0,81 para as combinações entre a idade, peso e pelvimetrias interna e externa, todos significantes (a = 0,01). Concluem, estes autores, chamando a atenção para a alta correlação entre a pelvimetria interna e externa e para o fato de que 61% das variações nas medidas pélvicas são devidas ao peso. Finalmente, os mesmos autores, ao trabalharem com 166 fêmeas nulíparas da raça Murrah, com idades entre 17 e 37 meses, realizaram também as medidas externas encontrando, em termos de médias e erros padrões, os resultados que se seguem: diâmetro biilíaco externo: 55,25 ± 3,02 cm; diâmetro biisquiático externo: 31,69 ± 2,48 cm; diâmetro ilioisquiático externo: 48,48 ± 1,83 cm. Em relação à pelvimetria interna, os autores expressam os dados apenas em função da área pélvica, não mencionando os pontos anatômicos utilizados. Evidenciam correlações positivas significantes (a = 0,01), variando de 0,52 a 0,69 entre o peso e as medidas pélvicas externas e concluem ressaltando que as dimensões pélvicas variam mais em função do peso do animal que, por sua vez, possui uma alta correlação com perímetro torácico14,15.

Objetivamos, portanto, no presente trabalho, realizar mensurações dos diâmetros internos e externos da pelve de fêmeas mestiças da espécie bubalina, paralelamente à tomada das medidas corpóreas gerais, próprias da ezoognose, no intuito de fornecer estimativas confiáveis para a população amostrada, estabelecer eventuais correlações entre elas, bem como avaliar possíveis influências da ocorrência de partos sobre as medidas pélvicas internas e externas.

MATERIAL E MÉTODO

Foram utilizados 255 animais da espécie bubalina (Bubalus bubalis), sendo fêmeas mestiças oriundas das raças Murrah, Mediterrânea e Jafarabadi, com predominância da raça Murrah, na faixa etária de 23 a 87 meses, criadas a pasto e de maneira integralizada. Os animais eram aleatoriamente obtidos de seis propriedades situadas na região do Vale do Ribeira, Estado de São Paulo.

Com auxílio de uma régua de madeira dotada de graduação métrica decimal, procedeu-se à tomada das medidas corpóreas gerais: idade, peso, altura, comprimento e perímetro torácico. Por fim, os animais eram pesados e medidos quanto aos diâmetros pélvicos externos: diâmetro biilíaco externo, tomado entre as extremidades laterais das tuberosidades coxais direita e esquerda; biisquiático externo, tomado entre as extremidades laterais das tuberosidades isquiáticas direita e esquerda; e ilioisquiático externo, tomado entre as extremidades laterais das tuberosidades coxal e isquiática, alternando-se a cada animal o antímero examinado, no caso desta medição. A seguir, com auxílio de um pelvímetro de Menissier-Vissac, efetuavam-se as medidas dos diâmetros pélvicos internos: biilíaco superior, distância entre os braços dos ílios ventralmente ao osso sacro; biilíaco inferior, distância entre os braços dos ílios ao nível das eminências iliopubianas; e sacropúbico, distância entre o relevo ventral do corpo das últimas vértebras sacras e a extremidade cranial da sínfise púbica.

Objetivando o estudo do efeito da ocorrência de partos sobre as medidas pélvicas internas e externas, as fêmeas foram consideradas segundo a ocorrência de partos, sendo classificadas em: nulíparas, primíparas ou multíparas (n=85/grupo).

Tratamento estatístico dos resultados

Os dados encontram-se apresentados em função de suas médias, desvios padrões, medianas, valores mínimos, máximos e amplitudes de variação. Para todas as variáveis pesquisadas, determinaram-se os respectivos intervalos de confiança de 95% para as médias populacionais, no sentido de se fornecer uma estimativa confiável de valores extrapoláveis para o rebanho. A avaliação das correlações estatísticas entre as variáveis estudadas foi realizada calculando-se os respectivos coeficientes de correlação de Pearson para todas as possíveis combinações duas a duas.

Em relação aos dados pelvimétricos internos e externos dos grupos comparativos, procederam-se às comparações entre variâncias e entre médias através de análises de variâncias (ANOVA) e testes de Tukey, ao nível de significância de 5%. Análises de covariâncias (ANCOVA), tendo como covariável as medidas do perímetro torácico, foram também realizadas fornecendo médias ajustadas em função do tamanho do animal, as quais foram comparadas através de testes t de Student, ao nível de significância de 5%2.

RESULTADOS

Os resultados obtidos nesta pesquisa estão apresentados sob a forma de tabelas e de acordo com os seguintes itens: resumo estatístico (Tab. 1, 2 e 3), intervalos de confiança para as médias populacionais dos parâmetros estimados (Tab. 4), coeficientes de correlação entre as variáveis estudadas (Tab. 5) e análise estatística comparativa de variâncias e médias dos dados pelvimétricos (Tab. 6).

DISCUSSÃO

No que diz respeito aos trabalhos especializados, alguns autores3,6,7,17 fazem menção à pelvimetria interna, em termos do que chamam de "área pélvica" com o que, aliás, não concordamos, embora seja este um conceito bastante difundido na literatura. Senão vejamos: tomam, estes autores, a área pélvica como sendo o simples produto do diâmetro vertical (sacropúbico) pelo diâmetro transversal (biilíaco, na porção mais larga), como se esta fosse absolutamente retangular ou quadrada, o que sabemos, pelo estudo dos demais diâmetros ou pela simples observação de uma peça macerada, não ser verídico, visto que tal área tem nítidos contornos irregulares, tendendo a elípticos. Sugerimos, outrossim, para os interessados neste tipo de estudo, sobre a área pélvica interna, que o façam, já que os cálculos de uma área irregular são complexos e variáveis, em termos de "fator ou índice pélvico", mais adequadamente, como sendo o resultado do produto entre os diâmetros anteriormente mencionados. Mas, ainda assim, tal "fator ou índice" estaria pecando por não revelar a proporção entre estes diâmetros. Acreditamos que exemplos como este reforçam a idéia de que não somente trabalhos de cunho "aplicado" devam ser incentivados, mas também aqueles, como o que ora empreendemos, voltados para a elaboração de bases mais precisas, em nossa opinião, tão necessárias aos trabalhos ditos de aplicação direta.

Embora trabalhando com aparelho diferente do nosso, para a pelvimetria interna de fêmeas bovinas nulíparas, outros autores9,13,16 realizaram tais medidas, porém tratam-nas também em termos de "área pélvica". Mas pareceu-nos digno de nota o fato de estes autores ponderarem sobre a existência de diferenças intrínsecas entre as pelves ósseas, independentes de sua natural, porém parcial, correspondência com o desenvolvimento corpóreo do animal, afirmando, mesmo, não serem lícitas simples inferências sobre o tamanho da pelve exclusivamente em função do peso ou outra medida de caráter geral. A partir daí, novos estudos poderiam ser elaborados no sentido de se verificar a possível influência, principalmente da raça, dos padreadores, das doadoras (nos casos de transferências de embriões), dos cruzamentos entre raças e até mesmo comparações interespecíficas, como as que ora fazemos, podem suscitar detalhes, questionamentos ou elucidações de relevância para o assunto.

Num destes trabalhos16, os pesquisadores encontraram em fêmeas bovinas nulíparas baixa correlação entre o perímetro torácico e a medida horizontal da pelve (0,28) e média (0,54) entre o perímetro torácico e a medida vertical, o que concorda com os resultados de pelo menos um autor12 em relação aos diâmetros transversais que foram, neste caso, para o perímetro torácico e o diâmetro biilíaco superior de 0,24; e entre o perímetro torácico e o diâmetro biilíaco inferior de 0,16, porém discorda com este autor em relação ao diâmetro vertical, que, em suas pesquisas, praticamente não apresentou correlação (0,05) com o perímetro torácico. Fato este que tampouco concorda com os nossos resultados, os quais mostraram, na espécie bubalina, para as mesmas correlações, valores respectivamente de 0,65; 0,66; e 0,62.

Confrontando nossos dados ainda com os deste último autor12, o qual trabalhou com fêmeas bovinas da raça Guzerá, chamaram-nos atenção as semelhanças observadas em relação às medidas corpóreas gerais que, para o perímetro torácico, foram em média, em seus trabalhos de 174,25 cm contra os nossos 177,3 cm; para a altura: 133,03 cm contra os nossos 134,1 cm; para o comprimento: 139,03 cm contra os nossos 136,5 cm; e para o peso de 399,61 kg contra os nossos 451,4 kg; e, em contrapartida, as diferenças aparentemente mais acentuadas entre as medidas pélvicas internas que, em seus estudos, para o diâmetro biilíaco superior teve média de 14,55 cm contra os nossos 17,1 cm; para o diâmetro biilíaco inferior: 13,39 cm contra os nossos 15,7 cm; e para o diâmetro sacropúbico: 18,6 cm contra os nossos 22,3 cm.

À semelhança deste autor, encontramos correlação positiva entre a pelvimetria, tanto interna como externa, e as medidas corpóreas gerais; e alta correlação positiva (0,90) entre o diâmetro biilíaco superior e o inferior, o que aliás concorda, pelo menos em parte, com outro trabalho realizado em condições semelhantes4 encontrado em nossa revisão da literatura.

Entretanto, afirma ainda este autor ser o diâmetro biilíaco superior o que mantém mais estreita relação com o crescimento do animal expresso pela altura, o que, ao nosso ver, não encontra apoio nos coeficientes de correlação apresentados, uma vez que, no grupo das nulíparas, nenhum dos coeficientes entre a altura e os diâmetros pélvicos internos alcançaram significância estatística (a = 0,05), supondo-se que a amostra tenha sido equitativamente dividida (n=91) entre os três grupos; e nos outros dois grupos (primíparas e multíparas) tais coeficientes, apesar de apontarem para uma correlação positiva significante, ficaram em valores muito próximos: no grupo das primíparas, 0,42 em relação ao diâmetro biilíaco superior e 0,44 em relação ao inferior; e no grupo das multíparas, 0,32 em relação ao diâmetro biilíaco superior e 0,26 em relação ao inferior.

Finalmente, conclui ainda o mesmo autor que o aumento do diâmetro biilíaco inferior é o que está mais intimamente ligado ao parto, que a medida do diâmetro vertical (sacropúbico) é a que apresenta menor alteração com um ou mais partos e que as modificações métricas sofridas pela pelve com o suceder dos partos decorrem mais do aumento de sua largura do que de sua altura, conforme os "índices de significância" obtidos pelo teste de Tukey, sem contudo expressá-los, mostrando outrossim diferenças todas significativas (a = 0,01) entre as médias dos três grupos comparativos, qualquer que seja o diâmetro considerado.

Como comentamos anteriormente, os trabalhos especializados em bubalinos, relativamente às outras espécies domésticas, são um tanto escassos na literatura, concentrando-se mais em países asiáticos, particularmente na Índia, local da mais provável origem da espécie e onde este animal representa para a sociedade local importante fonte de subsistência.

Destarte, consideremos inicialmente o trabalho de um autor indiano11 que realizou medidas corpóreas gerais e pelvimétricas externas em 12 machos adultos da raça Murrah, constatando que 83% da variabilidade das medidas pélvicas foi devido ao perímetro torácico, embora assinale não ter atingido este dado significância estatística provavelmente em função do baixo número de animais na amostra. De nossa parte, apesar de não termos nos preocupado com análises discriminantes e em que pese termos trabalhado com fêmeas ao invés de machos, registramos observações congruentes quando constatamos serem as medidas do perímetro torácico as que apresentaram, no cômputo geral, as mais altas correlações quando confrontadas, quer com todas as outras medidas, quer somente com as medidas pelvimétricas, fato este que nos conduziu a eleger tal parâmetro para funcionar como covariável, no sentido de controlarmos a influência do desenvolvimento corpóreo do animal sobre as medidas pélvicas através das análises de covariância.

Outro grupo de pesquisadores5, trabalhando como nós, com búfalas mestiças, porém só com nulíparas, realizaram medidas pélvicas internas e externas, mas não mencionam os diâmetros utilizados, transformando-os em "área pélvica". Porém, o que chama atenção neste trabalho são as altas correlações positivas (todas acima de 0,97) encontradas entre a pelvimetria interna e externa, bem como entre estas e a idade e entre estas e o peso dos animais. Em nosso trabalho tais correlações, embora não em termos de "área pélvica" mas em termos dos próprios diâmetros, estiveram numa faixa, diríamos, "média", ou seja, entre 0,33 e 0,66, exceto para as medidas pélvicas externas e o peso, onde tais valores posicionaram-se na faixa considerável "alta" (acima de 0,66). Quanto ao fato de estes autores recomendarem a utilização prática da pelvimetria externa em substituição à interna, baseados nas altas correlações encontradas entre elas, pareceu-nos também um tanto razoável, embora preferíssemos ainda a avaliação pelvimétrica interna, em função de ter esta se mostrado menos influenciada pelo desenvolvimento corpóreo do animal, a contar pelo perímetro torácico, portanto, possivelmente mais dependente da própria predisposição anatômica bem como do efeito das sucessivas parições sobre a dinâmica entre os elementos ósseos do canal do parto.

Segundo dois outros trabalhos14,15, ambos realizados em fêmeas nulíparas da raça Murrah, as medidas pélvicas externas revelaram médias e erros padrões respectivamente de: para o diâmetro biilíaco externo 55,0 ± 3,40 cm e 55,25 ± 3,02 cm; para o diâmetro biisquiático externo de 31,75 ± 2,92 cm e 31,69 ± 2,48 cm; e para o diâmetro ilioisquiático externo de 41,66 ± 2,53 e 48,48 ± 1,83 cm; todos muito próximos dos valores obtidos em nosso trabalho, que foram, em termos de médias e desvios padrões, para o diâmetro biilíaco externo de 55,6 ± 6,35 cm; para o diâmetro biisquiático externo de 30,3 ± 4,11 cm; e para o diâmetro ilioisquiático de 42,2 ± 3,53 cm. Para as medidas pélvicas internas, relatadas individualmente por estes autores apenas em um dos trabalhos, temos 18,5 ± 1,18 cm para o diâmetro sacropúbico, contra os nossos 20,3 ± 2,06 cm; e para o que chamam de "largura pélvica" (provavelmente o diâmetro biilíaco medido na porção mais larga) apresentam valores de 16,27 ± 1,18 cm contra os nossos 15,5 ± 1,86 cm para o diâmetro biilíaco superior e 14,3 ± 1,86 cm para o biilíaco inferior, restringindo-se sobremaneira as comparações em função de terem esses autores adotado método diferente do nosso (pelvímetro de Rice) para a pelvimetria interna, além de terem trabalhado com animais, cujo grau de pureza racial era provavelmente, pelas próprias características dos rebanhos locais, mais elevado do que o dos animais por nós examinados.

Vale lembrar ainda que estes autores destacam novamente a observação de alta correlação principalmente entre o peso e a pelvimetria interna e externa e entre este e o perímetro torácico, fato este por nós também constatado.

CONCLUSÕES

Os resultados obtidos pela mensuração in vivo dos diâmetros pélvicos internos e externos de 255 búfalas mestiças, assim como o estudo de suas correlações intrínsecas e com as respectivas medidas corpóreas gerais, além das comparações entre os grupos de fêmeas nulíparas, primíparas e multíparas, levaram-nos às seguintes conclusões:

1) O diâmetro sacropúbico foi em média aproximadamente 30,0% maior que o biilíaco superior e 42,0% maior que o biilíaco inferior; e o diâmetro biilíaco superior foi cerca de 10,0% maior que o inferior;

2) O diâmetro biilíaco externo foi em média ao redor de 34,0% maior que o ilioisquiático e 85,0% maior que o biisquiático; e o ilioisquiático da ordem de 37,0% maior que biisquiático;

3) As variáveis correspondentes às medidas corpóreas gerais, pélvicas internas e externas apresentaram correlações positivas e significantes (a = 0,01) quando confrontadas individualmente com cada uma das demais, todas na faixa de 0,47 a 0,96;

4) O perímetro torácico foi a medida corpórea geral que somou mais alto índice de correlações no confronto com as medidas pélvicas internas e externas; as correlações entre o perímetro torácico e as medidas pélvicas internas foram de 0,62 a 0,65; e entre este parâmetro e as medidas pélvicas externas de 0,74 a 0,80;

5) A comparação entre os 3 grupos (nulíparas, primíparas e multíparas) mostrou diferenças significativas (a = 0,05) para as médias ajustadas pela análise de covariância, tendo como covariável o perímetro torácico, no que se refere aos diâmetros pélvicos internos; para a pelvimetria externa, tais diferenças ocorreram apenas entre as nulíparas e os demais grupos, no que se refere aos diâmetros biilíaco e ilioisquiático externos, não havendo portanto, em relação ao biisquiático externo, diferenças significativas (a = 0,05) entre as médias dos grupos comparativos;

6) A análise de variância (ANOVA) e o teste de Tukey, para as comparações pelvimétricas entre os grupos estudados (nulíparas, primíparas e multíparas), mostraram-se menos precisos porquanto desconsideram a influência intrínseca do desenvolvimento corpóreo do animal.

SUMMARY

In vivo internal and external pelvimetry was carried out in 255 mixed female buffaloes. A Menissier-Vissac pelvimeter was used for the internal measurements. The results were compared to age, heart girth, body weight, height and length. In order to compare the pelvic measurements, the animals were equitably divided into 3 groups (n=85) according to parturition occurrence and frequency (nuliparous, primiparous and multiparous). The internal transverse (horizontal) pelvic diameters, dorsal and ventral bi-iliac and the sacro-pubic (vertical) were respectively: 17.1 ± 2.17 cm; 15.7 ± 2.11 cm and 22.3 ± 2.51 cm; and the external bi-iliac (hipwidth), bi-isquiatic (pin width) and ilioisquiatic (rump length): 59.8 ± 6.13 cm; 32.4 ± 3.56 cm and 44.5 ± 3.31 cm, respectively. Significant positive correlations (p < 0.01) were obtained for all measurements but heart girth was found to have the highest correlations to pelvic measurements. Adjusted means by heart girth revealed significant differences (p < 0.05) for the 3 groups in respect to internal pelvimetry. However, as it concerns to external pelvimetry, significant differences were found only between the nuliparous and the other two groups for the bi-iliac and ilioisquiatic; for the bi-isquiatic diameter no significant differences were found. The internal pelvimetry was found to be less correlated to the body size and more evidently affected by the successive parturition occurrence.

UNITERMS: Buffaloes, anatomy; Buffaloes, pelvic measures; Pelvis; Morphometry; Pelvimetry; Pelvilogy.

Recebido para publicação: 27/03/2001

Aprovado para publicação: 07/07/2001

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    Departamento de Reprodução Animal da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP
    2
    Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP
    3
    Estação Experimental de Zootecnia, IZ/Registro-SP
    4
    Departamento de Reprodução Animal da Universidade Estadual do Maranhão
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Jun 2002
    • Data do Fascículo
      2001

    Histórico

    • Aceito
      07 Jul 2001
    • Recebido
      27 Mar 2001
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