Acessibilidade / Reportar erro

Diversidade de fungos filamentosos associados a Hypothenemus hampei (Ferrari) (Coleoptera: Scolytidae) e suas galerias em frutos de Coffea canephora (Pierre)

Diversity of filamentous fungi associated with Hypothenemus hampei (Ferrari) (Coleoptera: Scolytidae) and its galleries in berries of Coffea canephora (Pierre)

Resumos

Amostragens de campo foram realizadas em Ouro Preto d'Oeste (10°45'S e 62°15'W) para avaliar a micobiota associada a Hypothenemus hampei Ferrari [cutícula, aparelho bucal, protórax (micângia), tubo digestivo e fezes] e suas galerias em frutos de Coffea canephora Pierre. Dez gêneros (201 isolados) estavam diretamente relacionados com o inseto, enquanto cinco gêneros (20 isolados) estavam relacionados com galerias do inseto nos frutos. Todos os gêneros identificados associados aos insetos estavam também presentes nas suas galerias, o que indica que o broqueamento pode significar um modo ativo de inoculação de fungos por H. hampei. Na broca, a diversidade de gêneros de fungos foi maior no aparelho bucal e protórax e menor nas fezes. Fusarium, Penicillium e Geotrichum, com abundâncias de 55,7, 24,3 e 10,8%, respectivamente, foram os gêneros dominantes. Nas galerias Fusarium, Geotrichum, Trichoderma e Aspergillus com abundância de 33,3; 29,6; 18,5 e 14,8%, respectivamente, foram os gêneros dominantes. A presença de Fusarium no inseto e suas galerias reforça indicações anteriores de uma interação íntima entre H. hampei-Fusarium. A presença de Aspergillus e Penicillium enfatiza a possibilidade de dispersão da ocratoxina pela broca. Este trabalho fornece o primeiro registro da micobiota associada a H. hampei em C. canephora. Entre os gêneros identificados, Cephalosporium, Geotrichum e Oidiodendrum foram registrados pela primeira vez em associação com o inseto e suas galerias em C. canephora.

Broca-do-café; Micobiota; café; interação ecológica


Field sampling was carried out in Ouro Preto d'Oeste Rondônia (10°45'S and 62°15'W) to evaluate the mycobiota associated with Hypothenemus hampei Ferrari [cuticle, mouth, prothorax (mycangia), gut and feces] and its galleries on berries of Coffea canephora Pierre. Ten genera (201 isolates) were directly related with the insect while five genera (20 isolates) were related with galleries on berries. All the genera identified in the insects were also present in their galleries, what indicates that boring may be an active way of fungi inoculation by H. hampei. The fungi genera were more diverse in the mouth and prothorax of borers, and lower in feces. Fusarium, Penicillium and Geotrichum, with abundance of 55.7, 24.3 and 10.8%, respectively, were dominant genera. In the galleries Fusarium, Geotrichum, Trichoderma and Aspergillus with abundance of 33.3, 29.6, 18.5 and 14.8%, respectively, were dominant genera. The overall presence of Fusarium in coffee berry borer and its galleries) reinforces previous indications of a close interaction between H. hampei-Fusarium. The presence of Aspergillus and Penicillium emphasizes the possibility of "ochratoxin dispersion" by the borer. This work provides the first record of the mycobiota associated with H. hampei in C. canephora. Among the identified genera, Cephalosporium, Geotrichum and Oidiodendrum were recorded for the first time in association with H. hampei and its galleries in C. canephora.

Coffee berry borer; Mycobiota; coffee; ecological interaction


ECOLOGY, BEHAVIOR AND BIONOMICS

Diversidade de fungos filamentosos associados a Hypothenemus hampei (Ferrari) (Coleoptera: Scolytidae) e suas galerias em frutos de Coffea canephora (Pierre)

Diversity of filamentous fungi associated with Hypothenemus hampei (Ferrari) (Coleoptera: Scolytidae) and its galleries in berries of Coffea canephora (Pierre)

Farah de C. GamaI; César A.D. TeixeiraII; Alvanir GarciaII; José N.M. CostaII; Daniela K.S. LimaI

IEmbrapa Rondônia, BR 364, km 5,5, C. postal 406, 78900-970, Porto Velho, RO, farah_gama@yahoo.com.br

IIPós-Graduação em Biologia Experimental,Univ. Federal de Rondônia, Campus - BR 364, km 9,5 78900-000, Porto Velho, RO

RESUMO

Amostragens de campo foram realizadas em Ouro Preto d'Oeste (10°45'S e 62°15'W) para avaliar a micobiota associada a Hypothenemus hampei Ferrari [cutícula, aparelho bucal, protórax (micângia), tubo digestivo e fezes] e suas galerias em frutos de Coffea canephora Pierre. Dez gêneros (201 isolados) estavam diretamente relacionados com o inseto, enquanto cinco gêneros (20 isolados) estavam relacionados com galerias do inseto nos frutos. Todos os gêneros identificados associados aos insetos estavam também presentes nas suas galerias, o que indica que o broqueamento pode significar um modo ativo de inoculação de fungos por H. hampei. Na broca, a diversidade de gêneros de fungos foi maior no aparelho bucal e protórax e menor nas fezes. Fusarium, Penicillium e Geotrichum, com abundâncias de 55,7, 24,3 e 10,8%, respectivamente, foram os gêneros dominantes. Nas galerias Fusarium, Geotrichum, Trichoderma e Aspergillus com abundância de 33,3; 29,6; 18,5 e 14,8%, respectivamente, foram os gêneros dominantes. A presença de Fusarium no inseto e suas galerias reforça indicações anteriores de uma interação íntima entre H. hampei-Fusarium. A presença de Aspergillus e Penicillium enfatiza a possibilidade de dispersão da ocratoxina pela broca. Este trabalho fornece o primeiro registro da micobiota associada a H. hampei em C. canephora. Entre os gêneros identificados, Cephalosporium, Geotrichum e Oidiodendrum foram registrados pela primeira vez em associação com o inseto e suas galerias em C. canephora.

Palavras-chave: Broca-do-café, Micobiota, café, interação ecológica

ABSTRACT

Field sampling was carried out in Ouro Preto d'Oeste Rondônia (10°45'S and 62°15'W) to evaluate the mycobiota associated with Hypothenemus hampei Ferrari [cuticle, mouth, prothorax (mycangia), gut and feces] and its galleries on berries of Coffea canephora Pierre. Ten genera (201 isolates) were directly related with the insect while five genera (20 isolates) were related with galleries on berries. All the genera identified in the insects were also present in their galleries, what indicates that boring may be an active way of fungi inoculation by H. hampei. The fungi genera were more diverse in the mouth and prothorax of borers, and lower in feces. Fusarium, Penicillium and Geotrichum, with abundance of 55.7, 24.3 and 10.8%, respectively, were dominant genera. In the galleries Fusarium, Geotrichum, Trichoderma and Aspergillus with abundance of 33.3, 29.6, 18.5 and 14.8%, respectively, were dominant genera. The overall presence of Fusarium in coffee berry borer and its galleries) reinforces previous indications of a close interaction between H. hampei-Fusarium. The presence of Aspergillus and Penicillium emphasizes the possibility of "ochratoxin dispersion" by the borer. This work provides the first record of the mycobiota associated with H. hampei in C. canephora. Among the identified genera, Cephalosporium, Geotrichum and Oidiodendrum were recorded for the first time in association with H. hampei and its galleries in C. canephora.

Key words: Coffee berry borer, Mycobiota, coffee, ecological interaction

A broca-do-café, Hypothenemus hampei (Ferrari), é uma importante praga da cultura do café nas principais regiões produtoras da cultura no Brasil (Souza & Reis 1997) e no mundo (Barrera et al. 1990, Baker 1999). É natural da África equatorial, região de Uganda, de onde se espalhou para outras partes do globo (Souza & Reis 1997), alcançando o Brasil provavelmente em 1913, a partir de sementes infestadas trazidas do Congo Belga para o interior de São Paulo (Benassi 1995, Souza & Reis 1997, Cantor et al. 2000). Atualmente a broca se encontra praticamente em todos os países produtores de café (Bustillo et al. 2002) e tem causado grandes perdas em vários países da África e nos países em que foi introduzida (Le Pelley 1968). O inseto coloniza os frutos de café, em todos os estádios de maturação (Guharay & Monterrey 1997), afetando a produtividade e modificando a qualidade do café pela a entrada de microorganismos que se desenvolvem nos grãos (Benassi 1989).

Poucos são os trabalhos referentes ao conhecimento da micobiota associada à broca-do-café, a maioria deles refere-se aos entomopatógenos, com destaque para Beauveria bassiana (Bals.) Vuillemin e as pesquisas sobre interações entre brocas e fungos são direcionadas aos frutos de Coffea arabica Pierre. Alguns trabalhos registraram a presença de diferentes gêneros de fungos em café arabica. Carrión & Bonet (2004) encontraram Fusarium, Penicillium, Cladosporium, Aspergillus e Beauveria associados à broca-do-café e frutos de C. arabica e Bustillo et al. (1999) registraram pela primeira vez Paecilomyces lilacinus Thom. atacando H. hampei.

Trabalhando com C. arabica, Pérez et al. (2003) registraram 18 gêneros de fungos filamentosos associados ao corpo da broca-do-café e dois gêneros nas galerias. Outros trabalhos relatam a presença de Hirsutella (Posada et al. 1993), Fusarium (Pérez et al. 1996) e Paecilomyces (Vega et al. 1999) associados à broca-do-café. Morales et al. (2000) registraram Fusarium solani (Mart.) Sacc. associado a H. hampei. Também uma nova espécie de Penicillium, descrita como Penicillium brocae SW Peterson, Pérez, Vega et Infante, foi encontrada associada à broca-do-café no México (Peterson et al. 2003).

Dentre os microorganismos, algumas espécies de fungos dos gêneros Aspergillus, Penicillium e Fusarium são contaminantes toxigênicos do café (Batista et al. 2003) e, segundo Vega & Mercadier (1998), Vega et al. (1999) e Taniwaki et al. (2003) Aspergillus ochraceus Wilhelm, Asperguillus carbonarius (Bainier) Thom, Penicillium viridicatum Westling e Penicillium verrucosum Dierck são importantes fungos que produzem uma micotoxina (ochratoxina A) considerada um problema grave para a saúde humana e para a indústria de café. O objetivo deste trabalho foi levantar a micobiota associada à broca-do-café e galerias em frutos de Coffea canephora Pierre, em Rondônia.

Material e Métodos

O presente trabalho foi desenvolvido na Estação Experimental da Embrapa Rondônia, localizada em Ouro Preto do Oeste, RO, a 10º 45' de latitude Sul e 62º 15' de longitude Oeste. A coleta de frutos brocados (infestados com broca-do-café) foi realizada em abril de 2004. As plantas selecionadas apresentavam-se distribuídas por toda a área de estudo e os frutos coletados encontravam-se no mesmo estágio de maturação. As brocas e galerias foram obtidas através da dissecação dos frutos.

Isolamento dos fungos. Brocas e galerias foram superficialmente desinfectadas em uma solução de 0,5% de hipoclorito de sódio por 1 min e enxaguados em água destilada estéril. Posteriormente, foram imersas em uma solução de 0,05% de ácido ascórbico + 0,05% de ácido cítrico por 1 min.

As fezes foram obtidas colocando as brocas em placas de Petri estéreis (5 cm de diâmetro) forradas com papel de filtro umedecido em solução salina por 24h. Posteriormente, as brocas foram retiradas e as fezes foram coletadas e mantidas em tubos eppendorf contendo solução salina.

As mesmas brocas utilizadas para a coleta das fezes foram dissecadas e separadas nas seguintes partes: aparelho bucal, protórax (pseudomicângia) e tubo digestivo (canal alimentar) que, em seguida, foram acondicionadas em tubos eppendorf, contendo 100 ml de solução salina 0,85%. A remoção dos esporos da cutícula foi realizada por imersão dos insetos em tubos eppendorf contendo 100 ml de solução salina 0,85%.

Todas as amostras foram mantidas sob agitação constante à freqüência de 42 khz por 10 segundos (Cazemier et al. 1997). Alíquotas de 10 ml de cada amostra foram transferidas para placas de Petri contendo BDA (Batata Dextrose Agar) acidificado com ácido lático (44%), para inibir crescimento bacteriano.

Amostras das galerias consistiram de cinco pedaços de 2 mm de comprimento, os quais foram colocados diretamente em placas de Petri contendo BDA acidificado com ácido lático (44%) (Pérez et al. 2003).

Posteriormente os isolados foram incubados em câmara tipo BOD a 25,6°C e 12h de fotofase, por sete dias. As colônias de fungos foram repicadas para novas placas contendo BDA e as identificações foram realizadas com base em caracteres macro e microscópicos das colônias desenvolvidas em meio BDA (Barnett & Hunter 1998). Para melhor visualização das estruturas foi utilizado o método de cultura em lâmina (Menezes & Silva-Hanlin 1997). As identificações em nível de gênero foram feitas segundo as chaves de identificações de Barnett & Hunter (1998) e Hanlin & Menezes (1996).

Cálculos de diversidade. A porcentagem de abundância, para verificar a dominância fúngica (espécies mais e menos abundantes) presente na broca-do-café (cutícula, aparelho bucal, protórax, tubo digestivo e fezes) e galerias de frutos de café, foi calculada segundo a equação (Ho et al. 2001):

Onde: i=23,....,S

Pi=porcentagem de abundância de i gêneros

ni=nº de colônias de fungos com i gêneros

S=nº de gêneros de fungos com i gêneros

S=nº de gêneros encontrados em todas as amostas

Para o cálculo do Pi total da broca-do-café, ni corresponde ao número de colônias de fungos de cada gênero presente na cutícula, aparelho bucal, protórax, tubo digestivo e fezes.

Os gêneros com porcentagem de abundância (Pi) maior que 5% foram considerados abundantes e os demais raros (Pi < 5%). A diversidade foi calculada a partir do índice de Shannon-Wienner, um dos índices mais utilizados para caracterização das comunidades (Fonseca 1985). Para maior confiabilidade foi utilizado o índice de Simpson, que pondera a favor das espécies mais abundantes, é menos sensível à riqueza e atribui menor peso às espécies raras (Magurran 1988).

Os índices utilizados foram: (i) Riqueza (Odum 1983); (ii) Diversidade - Shannon-Wiener (iii) Dominância - Simpson e (iv) Eqüitabilidade (Odum 1983, Begon et al. 1996, Ricklefs & Miller 2000e). A unidade taxonômica de comparação para a medida da diversidade foi o gênero (Ricklefs & Miller 2000). Os resultados foram submetidos à análise de variância (ANOVA) e as médias comparadas pelo teste de Tukey a 5% de significância.

Resultados

Abundância de fungos filamentosos nos insetos e suas galerias em C. canephora. Dez gêneros (201 isolados) de fungos filamentosos foram encontrados associados à broca-do-café. Destes, 9, 6, 5, 4 e 1 gêneros foram registrados no aparelho bucal, protórax, cutícula, tubo digestivo e fezes, respectivamente (Tabela 1). Os gêneros dominantes foram Fusarium, Penicillium e Geotrichum, com porcentagem de abundância de 55,7, 24,3 e 10,8%, respectivamente e os demais, com abundância abaixo de 5% foram considerados raros (Tabela 2). Nas galerias o número total de colônias e gêneros de fungos presentes foi menor que nas brocas. Foram obtidos apenas 20 isolados distribuídos em cinco gêneros: Fusarium, Geotrichum, Trichoderma e Aspergillus, como gêneros dominantes com porcentagem de abundância de 33,3, 29,6, 18,5, 14,8% nesta ordem, e Curvularia (3,70%), como o gênero mais raro (Tabela 2 ).

Índices de riqueza e diversidade. Os índices de riqueza, dominância e diversidade obtidos foram baixos para insetos e galerias avaliados (Tabelas 3 e 4), dado que eles foram calculados tendo o gênero como unidade taxonômica de referência. Nas brocas os maiores índices, riqueza (d = 1,40 ± 0,35), dominância (D = 4,58 ± 1,38) e diversidade (H = 1,36 ± 0,20) foram encontrados no aparelho bucal, que apresentou o maior número de gêneros. Por outro lado, as fezes (onde apenas o gênero Fusarium foi registrado) apresentaram os menores índices e estes diferiram significativamente quando comparado com as demais amostras, a 5% pelo teste de Tukey.

Nas galerias, o índice de dominância (D = 6,20 ± 1,0) foi elevado, pois dos cinco gêneros encontrados, quatro apresentaram alta porcentagem de abundância (Tabela 4).

Fusarium foi o único gênero comum à cutícula, aparelho bucal, protórax, tubo digestivo, fezes e galerias. Nas fezes foi o único gênero encontrado. Geotrichum, assim como Penicillium, esteve presente na cutícula, aparelho bucal, protórax e tubo digestivo e está sendo referido pela primeira vez em associação com H. hampei. Por outro lado, Cephalosporium, Beauveria, Oidiodendron e Lecanicillium foram detectados apenas nas brocas.

Discussão

Dez gêneros de fungos filamentosos foram registrados em H. hampei e galerias de C. canephora. Até o momento, os únicos estudos que incluem fungos relacionados à broca-do-café em C. canephora referem-se ao entomopatógeno B. bassiana (Neves & Hirose 2005).

Trabalhos relativos à diversidade de fungos associados à broca-do-café referem-se a C. arabica. Nesta espécie de café, Pérez et al. (2003) registraram 18 gêneros de fungos filamentosos em brocas e apenas dois gêneros nas galerias. Carrión & Bonet (2004) registraram sete e quatro gêneros em brocas e galerias, respectivamente.

Fusarium também foi observado por Pérez et al. (2003) e Carrión & Bonet (2004) em C. arabica. Este gênero possui espécies que são conhecidas por sua abundância na natureza e por suas interações diversas com animais e plantas, tendo sido isolados de Dendroctonus sp. (Whitney 1982); Xyleborus fornicatus (Eichh.) (Kumar et al. 1998) e Xylosandrus compactus (Eichhoff) (Le Pelley 1968); Reticulitermes flavipes (Kollar) (Zoberi & Grace 1990);(Triatoma sp. (Morales-Ramos et al. 2000) e Spodoptera litorallis (Boisduval) (Ismail & Abdel-Sater 1993). A existência desse fungo no tubo digestivo e nas fezes, bem como nas galerias dos frutos (tanto em C. canephora quanto em C. arabica) reforça a idéia levantada por Morales-Ramos et al. (2000) de possível associação simbiótica entre o fungo e H. hampei. Na interação Fusarium é importante para a alimentação da broca e esta, para a dispersão dos esporos do fungo.

Geotrichum e Penicillium estiveram presentes em todas as partes da broca, exceto nas fezes, o que aponta para possível associação estreita entre representantes dos dois gêneros e a broca-do-café. Apesar de Geotrichum aparecer como dominante em brocas atacando C. canephora, até o momento não há registro de espécies desse gênero associadas à broca-do-café em C. arabica. Peterson et al. (2003) sugerem que P. brocae pode ser um simbionte da broca-do-café suprindo-a com os esteróis necessários ao seu crescimento e desenvolvimento.

Aspergillus, apesar de raro em C. canephora, tem sido um gênero comum em C. arabica e já foi relatado por Vega et al. (1999), Pérez et al. (2003) e Carrión & Bonet (2004). Espécies de Penicillium juntamente com Aspergillus, são contaminantes toxigênicos do café (Batista et al. 2003). Segundo Vega & Mercadier (1998) e Vega et al. (1999), os fungos A. ochraceus, A. carbonarius, P. viridicatum e Penicillium verrucosum Dierck são produtores de uma micotoxina (ochratoxina) considerada um problema grave para a indústria de café.

Os gêneros, Cephalosporium, Beauveria, Lecanicillium e Trichoderma, apesar de terem se mostrados raros em C. canephora são considerados importantes por suas associações com insetos e fungos. Cephalosporium apresenta espécies conhecidas como "fungos de Ambrósia" (Beaver 1989, Alves 1998), B. bassiana é o principal agente de mortalidade da broca-do-café (Bustillo & Posada 1996, Bustillo et al. 1999), Lecanicillium lecanii (Zimm.) Zare & W. Gams foi relatado como importante patógeno de insetos das ordens Coleoptera, Diptera, Hymenoptera e sobre ácaros (Alves 1998) e, por sua vez, espécies de Trichoderma são reconhecidas como eficientes antagonistas de muitas espécies de fungos fito e entomopatogênicos (Martins-Corder & Melo 1998, Moino Jr. & Alves 1999).

É importante mencionar que alguns gêneros de fungos estiveram associados a partes específicas da broca-do-café. Por exemplo, Cephalosporium esteve presente apenas na cutícula, enquanto que Oidiodendron, Trichoderma e Beauveria foram isolados exclusivamente do aparelho bucal.

Este trabalho representa o primeiro registro da micobiota associada a H. hampei em C. canephora. Pela primeira vez são apresentados alguns gêneros de fungos (Geotrichum, Cephalosporium e Oidiodendron) associados ao inseto. Interações positivas e negativas são possíveis entre a broca-do-café, os fungos e os frutos de café. Uma delas, a patogenicidade de B. bassiana à broca, já é bem conhecida. Outras, como a simbiose broca-Fusarium e a presença de fungos produtores de micotoxinas, apenas recentemente começaram a ser avaliadas. Estudos adicionais são necessários para esclarecer o papel desses fungos associados à broca-do-café e frutos de C. canephora, com destaque para aqueles com potencial para o controle biológico do inseto.

Agradecimentos

À Dra. Mariângela Soares de Azevedo (UNIR), Dra. Marília Locatelli e Dr. Maurício Reginaldo Alves dos Santos (Embrapa Rondônia) pela revisão do manuscrito. Ao CBP&D Café pelo financiamento do projeto de pesquisa. Ao CNPq, pela bolsa de mestrado do primeiro autor.

Received 20/VI/05.

Accepted 31/III/06.

  • Ali-Shtayeh, M.S., A.B.M. Mara'i & R.M. Jamous. 2002. Distribution, occurrence and characterization of entomopathogenic fungi in agricultural soil in the Palestinian area. Mycopathology 156: 235-244.
  • Alves, S.B. 1998. Controle microbiano de insetos. 2. ed. São Paulo, FEALQ, 407p.
  • Baker, P.S. 1999. La broca del café en Colombia. Informe final del proyecto MIP para el café. Cenicafé-CABI Bioscience, Chinchina, Colombia, 154p.
  • Barnett, H.L. & B.B. Hunter. 1998. Illustrated genera of imperfect fungi. 4. ed. St. Paul, MN. Am. Phytopatol. Soc. Press, 218p.
  • Barras, S.J. & T. Perry. 1971. Glands cells and fungi associated with prothoracic mycangium of Dendroctonus adjunctus (Coleoptera: Scolytidae). Ann. Entomol. Soc. Am. 64: 123-126.
  • Barrera, J.F., P.S. Baker, J.E. Valenzuela & A. Schwarz. 1990. Introducción de dos especies de parasitoides africanos a México para el control biológico de la broca del café, Hypothenemus hampei (Ferrari) (Coleoptera: Scolytidae). Folia Entomol. Mex. 79: 245-247.
  • Batista, L.R., S.M. Chalfoun, G. Prado, R.F. Schwan & A.E. Wheals. 2003. Toxigenic fungi associated with processed (green) coffee beans (Coffea arabica L.). Int. J. Food Microbiol. 85: 293-300.
  • Batra, L.R., S.W.T. Batra & G.E. Bohart. 1973. The mycoflora of domesticated and wild bees (Apoidea). Mycopathol. Mycol. Appl. 49: 13-44.
  • Beaver, R.A. 1989. InsectFungus relationships in the bark and ambrosia beetles, p.121-143. In N. Wilding, N.M. Collins, P.M. Hammondand & J.F. Webber (eds.), Insect-fungus interactions. Academic Press, London, 589p.
  • Begon, M., J.L. Harper & C.L. Townsend. 1996. Ecology: Individuals, populations and communities. 3. ed. London, Blackwell Science, 1068p.
  • Benassi, V.L.R.M. 1995. Levantamento dos inimigos naturais da broca-do-café, Hypothenemus hampei (Ferr.) (Coleoptera: Scolytidae), no norte do Espírito Santo. An. Soc. Entomol. Brasil 24: 635-638.
  • Benassi, V.L.R.M. 1989. A broca-do-café. Vitória, EMCAPA, 63p. (Documentos, 57).
  • Bustillo, A.E. & J.F. Posada. 1996. El uso de entomopatógenos en el control de la broca del café en Colombia. Man. Int. Plagas 42: 1-13.
  • Bustillo, A.E., M.G. Bernal, P. Benavides & B. Chaves. 1999. Dynamics of Beauveria bassiana and Metarhizium anisopliae infecting Hypothenemus hampei (Coleoptera: Scolytidae) populations emerging form fallen coffee berries. Fla. Entomol. 82: 491-498.
  • Bustillo, A.E., R. Cardenas & F.J. Posada. 2002. Natural enemies and competitors of Hypothenemus hampei (Ferrari) (Coleoptera: Scolytidae) in Colombia. Neotrop. Entomol. 31: 635-639.
  • Cantor, F., V.L.R.M. Benassi & C.J. Fanton. 2000. Broca-do-café, Hypothenemus hampei (Coleoptera: Scolytidae), p.99-105. In E.F. Vilela, R.A. Zucchi & F. Cantor. (eds.). Histórico e impacto das pragas introduzidas no Brasil. Ribeirão Preto, Holos, 173p.
  • Carrión, G. & A. Bonet. 2004. Mycobiota associated with the coffee berry borer (Coleoptera: Scolytidae) and its galleries in fruit. Ann. Entomol. Soc. Am. 97: 492-499.
  • Cazemier, A.E., J.H.P. Hackestein, H.J.M. Op den Camp, J. Rosenberg, & C. Van der Drift. 1997. Bacteria in the intestinal tract of different species of arthropods. Microb. Ecol. 33: 189-197.
  • Fonseca, G.A.B. 1985. The vanishing Brazilian Atlantic forest. Biol Conserv. 34: 17-34.
  • Gilliam, M. & D.B. Prest. 1977. The mycoflora of selected organs of queen honey bees, Apis mellifera J. Invert. Pathol. 29: 235-237.
  • Guharay, J. & J. Monterrey. 1997. Manejo ecológico de la broca del cafeto (Hypothenemus hampei) en America Central. Man. Int. Plagas 22: 1-7.
  • Hanlin, R.T.& M. Menezes. 1996. Gêneros ilustrados de ascomicetos. UFRPe, Recife 274p.
  • Happ, G.M., C.M. Happ & S.J. Barras. 1971. Fine structure of the prothoracic mycangium, a chamber for the culture of symbiotic fungi, in Southern pine beetle. Tissue Cell: 3: 295-308.
  • Ho, W.A., K.D. Hyde, I.J. Hodgkiss & Yanna. 2001. Fungal communities on submerged wood from streams in Brunei, Hong Kong, and Malaysia. Mycol. Res. 105: 1492-1501.
  • Ismail, M.A. & M.A. Abdel-Sater. 1993. Fungi associated with the Egyptian cotton leafworm Spodoptera littoralis Boisdoval. Mycopathol. 124: 79-86.
  • Kumar, N.S., P. Hewavitharanage & N.K.B. Adikaram. 1998. Histology and fungal flora of shote-hole borer beetles (Xyleborus fornicatus) galleries in tea (Camellia sinensis). J. Nat. Sci. Council Sri Lanka 26: 195-207.
  • Larcher, W. 2000. Ecofisiologia vegetal. São Carlos, RIMA, 531p.
  • Le Pelley, R.H. 1968. Pests of coffee. London, Longman, 590 p.
  • Magurran, M.E. 1988. Ecological diversity and its measurement. Princeton, Princeton University Press, 178p.
  • Martins-Corder, M.P. & I.S. de Melo. 1998. Antagonismo in Vitro de Trichoderma spp. a Verticillium dahliae Kleb. J. Sci. Agric. 5: 1-7.
  • Menezes, M. & D.M.W. Silva-Hanlin. 1997. Guia prático para fungos fitopatogênicos. UFRPE, Imprensa Universitária, Recife. 106p.
  • Moino Jr., A. & S.B. Alves. 1999. Efeito antagônico de Trichoderma sp. no desenvolvimento de Beauveria bassiana (bals.) Vuill. e Metarhizium anisopliae (Metsch.) Sorok. Sci. Agric. 56: 217-224.
  • Morales-Ramos, J.A., M.G. Rojas, H. Sittertz-Bhatkar & G. Saldana. 2000. Symbiotic relationship between Hypothenemus hampei (Coleoptera: Scolytidae) and Fusarium solani (Moniliales: Tuberculariaceae). Ann. Entomol. Soc. Am. 93: 541-547.
  • Neves, P.M.O.J & E. Hirose. 2005. Seleção de isolados de Beauveria bassiana para o controle biológico da broca-do-café, Hypothenemus hampei (Ferrari) (Coleoptera: Scolytidae). Neotrop. Entomol. 34: 77-82.
  • Odum, E.P. 1983. Ecologia. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 434p.
  • Paine, T.D. & M.C. Birch. 1983. Acquisition and maintenance of mycangial fungi by Dendroctonus brevicomis LeConte (Coeloptera: Scolytidae). Environ. Entomol. 12: 1384-1386.
  • Pérez, J., F. Infante, F.E. Vega, F. Holguin, J. Macías, J. Valle, G. Nieto, S.W. Peterson, & C.P. Kurtzman. 2003. Mycobiota associated with coffee berry borer (Hypothenemus hampei) in Mexico. Mycol. Res. 107: 879-887.
  • Pérez, J., F.J. Posada & M. Gonzáles. 1996. Patogenicidad de un aislamento de Fusarium sp. encontrado infectando la broca del café, Hypothenemus hampei Rev. Colomb. Entomol. 22: 105-111.
  • Peterson, S.W., J. Pérez, F.E. Vega & F. Infante. 2003. Penicillium brocae a new species associated with the coffee berry borer in Chiapas, Mexico. Mycol. 95:141-147.
  • Posada, F.J., A.E. Bustillo & G. Saldarriaga. 1993. Primer registro del ataque de Hirsutella eleuteratorum sobre la broca del café en Colombia. Cenicafé 44: 155-158.
  • Ricklefs, R.E. & G. . Miller. 2000. Ecology. 4. ed. New York, Freeman, 822p.
  • Souza, J.C. & P.R. Reis. 1997. Broca-do-café: Histórico, reconhecimento, biologia, prejuízos, monitoramento e controle. 2. ed. Belo Horizonte, EPAMIG, 40p. (Boletim Técnico, 50).
  • Taniwaki, M.H., J.I. Pitt, A.A. Teixeira & B.T. Iamanaka. 2003. The source of ochratoxin A in Brazilian coffee and its formation in relation to processing methods. Int. J. Food Microbiol. 82: 173-179.
  • Vega, F.E. & G. Mercadier. 1998. Insects, coffee and ochratoxin A. Fla. Entomol. 81: 543-544.
  • Vega, F.E., G. Mercadier & P.F. Dowd. 1999. Fungi associated with the coffee berry borer Hypothenemus hampei (Ferrari) (Coleoptera: Scolytidae). Colloquium Assoc. Sci. Int. Café (ASIC) 18: 229-236.
  • Whitney, H.S. 1982. Relationships between bark beetles and symbiotic organisms. p.183 -211. In J.B. Milton & R.B. Stureeon (eds.), Bark beetles in North American conifers: A system for study of evolutionary biology University of Texas Press, Austin, 539p.
  • Zoberi, M.H. & K. Grace. 1990. Fungi associated with subterranean termite R. flavipes in Ontario. Mycol. 82: 289-294.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Dez 2006
  • Data do Fascículo
    Out 2006

Histórico

  • Aceito
    31 Mar 2006
  • Recebido
    20 Jun 2005
Sociedade Entomológica do Brasil Sociedade Entomológica do Brasil, R. Harry Prochet, 55, 86047-040 Londrina PR Brasil, Tel.: (55 43) 3342 3987 - Londrina - PR - Brazil
E-mail: editor@seb.org.br