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Avaliação do conhecimento de enfermeiros sobre a escala de coma de Glasgow em um hospital universitário

RESUMO

Objetivo

Avaliar o conhecimento de enfermeiros de unidades críticas, serviços de emergência e unidades de terapia intensiva em relação à escala de coma de Glasgow.

Métodos

Estudo transversal e analítico com 127 enfermeiros de unidades críticas de um hospital universitário. Utilizou-se entrevista estruturada com 12 questões que avaliaram conhecimento sobre a escala. Associação do conhecimento com variáveis sociodemográficas dos profissionais foi verificada pelo teste de Fisher, teste χ2 e razão de verossimilhança.

Resultados

Houve predominância de mulheres, média de idade de 31,1 anos, especialistas, mais de 5 anos de formado e experiência profissional de 1 a 3 anos. Na avaliação do melhor escore possível para pontuação na escala (questão 3), enfermeiros com tempo de formação maior que 5 anos apresentaram menor porcentual de acertos (p=0,0476). Em relação à questão 7, que avaliou qual intervalo da escala indicava gravidade moderada do trauma craniencefálico, observou-se que quanto maior o tempo de experiência, maior o porcentual de acertos (p=0,0251), sendo que enfermeiros do serviço de emergência tiveram mais acertos nessa questão em relação aos das unidades de terapia intensiva (p=0,0143). Além disso, enfermeiros formados há mais de 5 anos apresentaram menor porcentual de acertos nessa questão (p=0,0161). Quando se identificou como deve ser iniciada a avaliação da resposta motora, enfermeiros com maior tempo de trabalho na unidade apresentaram mais acertos (p=0,0119).

Conclusão

Tempo de formação, experiência e trabalho na unidade interferiu no conhecimento de enfermeiros sobre a escala, evidenciando necessidade de capacitação.

Avaliação em enfermagem; Conhecimento; Enfermeiras e Enfermeiros; Escala de coma de Glasgow; Transtornos da consciência

ABSTRACT

Objective

To assess knowledge of nurses of emergency services and intensive care units about Glasgow Coma Scale.

Methods

This cross-sectional analytical study included 127 nurses of critical units of an university hospital. We used structured interview with 12 questions to evaluate their knowledge about the scale. Association of Knowledge with professionals’ sociodemographic variables were verified by the Fisher-test, χ2 and likelihood ratio.

Results

Most of participants were women mean aged 31.1 years, they had graduated more than 5 years previously, and had 1 to 3 years of work experience. In the assessment of best score possible for Glasgow scale (question 3) nurses who had graduate more than 5 years ago presented a lower percentage success rate (p=0.0476). However, in the question 7, which evaluated what interval of the scale indicated moderate severity of brain trauma injury, those with more years of experience had higher percentage of correct answers (p=0.0251). In addition, nurses from emergency service had more correct answers than nurses from intensive care unit (p=0.0143) in the same question. Nurses graduated for more than 5 years ago had a lower percentage of correct answers in question 7 (p=0.0161). Nurses with more work experience had a better score (p=0.0119) to identify how assessment of motor response should be started.

Conclusion

Number of year since graduation, experience, and work at critical care units interfered in nurses’ knowledge about the scale, which indicates the need of training.

Nursing assessment; Knowledge; Nurses; Glasgow coma scale; Consciousness disorders

INTRODUÇÃO

Lesões traumáticas são importante causa de morbidade e mortalidade no mundo, e o trauma craniencefálico (TCE) é um dos principais determinantes desse panorama. O TCE envolve mecanismos fisiopatológicos complexos.(11. Brain Trauma Foundation; American Association of Neurological Surgeons; Congress of Neurological Surgeons. Guidelines for the management of severe traumatic brain injury. J Neurotrauma. 2007;24 Suppl 1:S1-106. Erratum in: J Neurotrauma. 2008;25(3):276-8.

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-33. Settervall CH, Sousa RM. Escala de coma de Glasgow e qualidade de vida pós-trauma cranioencefálico. Acta Paul Enferm. 2012:25(3):364-70.) Dentre as causas não traumáticas de alteração da consciência, destacam-se os abscessos e tumores cerebrais, as lesões oriundas de acidentes vasculares cerebrais, as hidrocefalias e os aneurisma, entre outras, também chamadas de lesões estruturais. Dentre as lesões não estruturais, destacam-se: hipóxia, alterações hidroeletrolíticas, hipertermia e hipotermia, encefalopatia hepática, intoxicações por álcool, drogas ilícitas, sedativos hipnóticos e metais pesados.(44. Mendes PD, Maciel MS, Brandão MV, Rozental-Fernandes PC, Esperidião-Antonio V, Kodaira SK, et al. Distúrbios da consciência humana – Parte 1 de 3: bases neurobiológicas. Rev Neurocienc. 2012;20(3):437-43.,55. Mendes PD, Maciel MS, Brandão MV, Rozental-Fernandes PC, Esperidião-Antonio V, Kodaira SK, et al. Distúrbios da consciência humana – Parte 3 de 3: intermezzo entre coma e vigília: bases neurobiológicas. Rev Neurocienc. 2013;21(1):102-7.)

A escala de coma de Glasgow (ECG), desenvolvida em 1974 na Universidade de Glasgow, na Escócia, por Taeasdale e Jennet, é empregada mundialmente para identificar disfunções neurológicas e acompanhar a evolução do nível de consciência; predizer prognóstico; e padronizar a linguagem entre os profissionais de saúde.(66. Mendes PD, Maciel MS, Brandão MV, Rozental-Fernandes PC, Esperidião-Antonio V, Kodaira SK, et al. Distúrbios da consciência humana – Parte 2 de 3: a abordagem dos enfermos em coma. Rev Neurocienc. 2012;20(4):576-83.) Tornou-se um adjunto no atendimento ao paciente de trauma, principalmente a vítimas de TCE, e, posteriormente, seu uso foi estendido às outras condições neurológicas capazes de alterar a consciência. O escore total varia de 3 até 15 e é obtido por meio da observação de atividades espontâneas e da aplicação de estímulos verbais e/ou dolorosos. A ECG é composta por três parâmetros de avaliação:

– Abertura ocular (nota de 1 a 4): observar a abertura ocular espontânea, aproximando-se do leito ou mesmo durante os procedimentos realizados, que recebe nota 4. A abertura ocular mediante estímulo verbal, por meio de chamado ou comando simples, como “abra os olhos”, por vezes sendo necessários estímulos verbais contínuos, pontua nota 3. Abertura ocular com aplicação de estímulo doloroso, aplicado pelo examinador, nas regiões de leito ungueal e supraorbital, pontua nota 2. A ausência de abertura ocular, mesmo após a aplicação de todos os estímulos anteriores, tem nota 1.

– Resposta verbal (nota de 1 a 5): o paciente orientado em tempo, espaço e pessoa, capaz de responder de forma coerente a perguntas simples formuladas pelo avaliador, tais como “Você sabe onde está?”, “Sabe o que aconteceu com você?”, deve ganhar nota 5. O paciente capaz de responder as perguntas, porém de forma não coerente, desorientada e confusa, pontua nota 4. A nota 3 correspondente a pacientes cujas respostas, de forma imprópria, não se relacionam com as perguntas. A necessidade de aplicação de estímulo doloroso, tendo como resposta sons incompreensíveis, como, por exemplo, gemidos e grunhidos, pontua nota 2. Paciente que não apresenta nenhuma resposta verbal, mesmo após aplicação de todos os estímulos anteriores, tem nota 1.

– Resposta motora (nota de 1 a 6): pontua nota 6 o paciente capaz de obedecer comandos simples, como “Levante o braço ou a perna”, “Mexa os pés ou as mãos”, com uma resposta motora adequada. Após aplicar um estímulo doloroso, o paciente localiza e tenta retirar a fonte da dor, e recebe nota (5). Após aplicar estímulo doloroso, o paciente é capaz de localizar a dor e retirar o membro por meio da flexão, entretanto, não retira a fonte do estímulo, e pontua nota (4). Recebe nota (3), o paciente cuja resposta motora seja pelo movimento de flexão, evidenciada pela postura de decorticação, na qual os braços são mantidos próximos ao corpo com punhos, mãos e dedos fletidos. As pernas estão em extensão e os pés, em flexão. Pontuam nota (2) aqueles pacientes cuja resposta motora for pelo movimento de extensão e com a postura de descerebração, na qual o pescoço está em extensão, os braços estão abduzidos e em extensão rígida próximos aos cotovelos, as pernas em extensão rígida na altura dos joelhos, e os pés em flexão plantar. Pontua nota (1) o paciente que não apresentar nenhuma resposta motora diante dos estímulos aplicados.(77. Prado C. Ensino-aprendizagem da escala de coma de Glasgow: análise de duas técnicas em enfermeiros do serviço de emergência [Internet]. [Tese]. São Paulo: Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo; 2001 [citado 2015 Nov 19]. Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/7/7135/tde-30032007-115512/pt-br.php
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)

A utilização da ECG requer conhecimento prévio e habilidades. Sua aplicação criteriosa e sistematizada é fundamental para a avaliação e a instituição de medidas ao paciente, de modo a garantir a fidedignidade do resultado − algo imprescindível para o acompanhamento da evolução destes pacientes.(88. Oliveira DM, Pereira CU, Freitas ZM. Escalas para avaliação do nível de consciência em trauma cranioencefálico e sua relevância para a prática de enfermagem em neurocirurgia. Arq Bras Neurocir. 2014;33(1):22-32.)

Ao longo dos anos, diversos estudos foram desenvolvidos para avaliar a precisão e a confiabilidade da ECG.(33. Settervall CH, Sousa RM. Escala de coma de Glasgow e qualidade de vida pós-trauma cranioencefálico. Acta Paul Enferm. 2012:25(3):364-70.,99. Mattar I, Liaw SY, Chan MF. Nurses’ self-confidence and attitudes in using the Glasgow Coma Scale: a primary study. Nurs Crit Care. 2015;20(2):98-107.) Pesquisas demonstraram baixa aderência à utilização da ECG, dificuldades em sua aplicação e falhas dos profissionais quanto à avaliação da consciência, como falta de padronização e carência no conhecimento sobre a escala, além da rotina do serviço configurar um vetor para priorização de outros sistemas orgânicos, apontando ainda que apenas 42,7% dos enfermeiros utilizam essa escala para avaliação da consciência. A avaliação do nível de consciência faz parte da rotina dos profissionais da saúde, principalmente daqueles inseridos em unidades críticas, como os serviços de emergência (SE) e as unidades de terapia intensiva (UTI), que, bem treinados e com mais experiência, utilizam a ECG com maiores níveis de confiabilidade e precisão.(77. Prado C. Ensino-aprendizagem da escala de coma de Glasgow: análise de duas técnicas em enfermeiros do serviço de emergência [Internet]. [Tese]. São Paulo: Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo; 2001 [citado 2015 Nov 19]. Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/7/7135/tde-30032007-115512/pt-br.php
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,1010. Amorim CF, Menezes Jr. JE, Thiago TE, Araújo DP, Gúzen FP, Cavalcanti JR. Avaliação neurológica realizada por enfermeiros em vítimas de traumatismo cranioencefálico. Rev Neurocienc. 2013;21(4):520-4.)

Um trabalho internacional, realizado com o objetivo de avaliar o conhecimento dos enfermeiros sobre a ECG e sua associação com as variáveis demográficas, revelou que a área e o tempo de atuação estão associados com maior ou menor conhecimento. Enfermeiras de neonatologia intensiva obtiveram maior escore (12,7), enquanto as de clínica geral tiveram o menor (9,7). Na escala de conhecimento, as enfermeiras que trabalham em unidades neurológicas por tempo igual ou superior a 6 anos tiveram maiores escores (11,9), e as que trabalham por tempo igual ou inferior a 1 ano tiveram o menor (10,0). Esse estudo registrou a necessidade de intervenções educacionais e manuais, para a manutenção e a melhora da realização da avaliação da consciência por meio da ECG.(1111. Mattar I, Liaw SY, Chan MF. A study to explore nurses’ knowledge in using the Glasgow Coma Scale in an acute care hospital. J Neurosci Nurs. 2013;45(5):272-80.)

Considerando a importância da ECG como ferramenta para avaliação neurológica dos pacientes, e sua aplicação de forma criteriosa e uniformizada, torna-se importante avaliar o conhecimento dos profissionais da saúde sobre essa escala, afim de garantir uniformização, confiabilidade e precisão em sua utilização.

OBJETIVO

Avaliar o conhecimento de enfermeiros de unidades críticas, serviços de emergência e unidades de terapia intensiva em relação à escala de coma de Glasgow.

MÉTODOS

Estudo transversal e analítico, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo, com número CAAE: 42505115.8.0000.5505, que investigou 127 enfermeiros do Hospital São Paulo, São Paulo (SP). Todos os participantes da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e tiveram suas identidades preservadas.

Foram incluídos no estudo enfermeiros que trabalhavam no SE e nas UTI do Hospital São Paulo. Foram excluídos os enfermeiros dos programas de residência multiprofissional, os enfermeiros que atuavam no SE e UTI pediátricos, e aqueles que estavam em período de férias ou em licença médica durante o período de coleta.

Os dados foram coletados no período de maio a julho de 2015. Foram pesquisadas as seguintes variáveis sociodemográficas: idade, sexo, cor da pele, estado civil e escolaridade. Foram também verificadas as seguintes variáveis profissionais: tempo de formação, setor de atuação e tempo de atuação em unidade crítica. Além disso, foi realizada uma entrevista estruturada com perguntas fechadas, em ambiente privado, com duração média de 20 minutos, para avaliar o conhecimento dos enfermeiros em relação à ECG e sua aplicação no paciente.

A análise estatística foi realizada pelo programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 19 (Chicago Il, EUA). Para análise descritiva das variáveis categóricas, calcularam-se a frequência e o porcentual. Para a análise descritiva das variáveis contínuas, calcularam-se média, desvio padrão, mediana, mínimo e máximo, com cada questão da ECG.

Para comparar a escolaridade, o tempo de formação, o tempo de experiência, a unidade de trabalho e o tempo de trabalho na unidade com cada questão foi utilizado o teste χ2. Quando 20% das células apresentaram valor esperado inferior a cinco, utilizou-se o teste exato de Fisher ou a razão de verossimilhança. Foi considerado um nível de significância de 5% (valor de p≤0,05).

RESULTADOS

A tabela 1 apresenta os dados sociodemográficos e profissionais dos enfermeiros do estudo. Observou-se predominância do sexo feminino (82,7%), com média de idade 31,1±5,1 anos, brancos (72,4%). A maioria dos profissionais possuía curso de especialização (89,8%); 62,2% referiram ter entre 1 e 5 anos de formado; e 37,8% relataram de 1 a 3 anos de experiência como enfermeiro. Em relação à unidade de trabalho, a maioria dos profissionais (76,4%) era da UTI, sendo que 44,9% já atuavam de 1 a 3 anos na unidade.

Tabela 1
Dados sociodemográficos e profissionais dos enfermeiros do serviço de emergência e unidades de terapia intensiva

A tabela 2 apresenta as respostas dos profissionais em relação à ECG.

Tabela 2
Descrição das respostas dos enfermeiros do serviço de emergência e das unidades de terapia intensiva, em relação à escala de coma de Glasgow

Quando questionados para que servia a escala, a maioria dos profissionais (99,2%) referiu que para avaliar o nível de consciência. Quando indagados sobre quais eram os parâmetros da ECG, 98,4% dos profissionais disseram abertura ocular, melhor resposta verbal e melhor resposta motora. Quando perguntado qual era o melhor escore possível para a escala, 97,6% da população referiu 15 pontos, e quando perguntado qual o menor escore possível, 97,6% assinalaram como correto 3 pontos.

Quando questionados sobre o valor da ECG que indicava um ponto crítico para o paciente e servia como alerta para o profissional, 80,3% referiram que este valor era ≤8. Em relação a qual aspecto não influencia na aplicação da ECG, 66,1% referiram a incontinência urinária.

Em relação ao intervalo da escala que classificava o TCE, de acordo com a gravidade, 81,1% dos sujeitos responderam de forma correta, indicando que este intervalo encontrava-se entre 12-9 pontos para TCE moderado. Quando questionados sobre qual resposta seria a mais adequada para a pontuação na escala, a maioria dos sujeitos (92,9%) referiu que se deve utilizar a melhor resposta apresentada pelo paciente.

Ao se perguntar como o examinador devia iniciar a avaliação do parâmetro abertura ocular, 39,4% responderam corretamente, indicando que o examinador devia se aproximar do paciente, realizando observação. Quando questionado como o examinador devia iniciar a avaliação do parâmetro melhor resposta verbal, 89,0% disseram que a realização de perguntas sobre tempo, espaço e pessoa era a forma correta. Ao se questionar como o examinador iniciaria a avaliação da melhor resposta motora, 89,8% dos sujeitos referiram que seria por uma ordem verbal, solicitando uma resposta motora.

Em relação ao registro da ECG, a maioria (89,8%) dos profissionais respondeu de forma correta, referindo pontuar cada parâmetro, registrando ao final o valor total da escala.

Quando comparadas as variáveis escolaridade, tempo de formado, tempo de experiência, unidade de trabalho, tempo de trabalho na unidade com as respostas de cada questão, observou-se que, na questão 3, que avaliou o melhor escore possível para pontuação na escala, enfermeiros com tempo de formação maior que 5 anos apresentaram um menor porcentual de acertos (p=0,0476).

Em relação à questão 7, que avaliou qual o intervalo da ECG que indicava gravidade moderada do TCE, quanto maior o tempo de experiência, maior foi o porcentual de acertos (p=0,0251), e enfermeiros do pronto-socorro apresentaram maior porcentual de acertos nessa questão em relação aos enfermeiros da unidade de terapia intensiva (p=0,0143). Além disso, enfermeiros com tempo de formação maior que 5 anos apresentaram um menor porcentual de acertos nesta questão (p=0,0161).

Em relação à questão 11, que avaliou como o examinador deveria iniciar a avaliação do parâmetro melhor resposta motora, enfermeiros com maior tempo de trabalho na unidade apresentaram maior porcentual de acertos (p=0,0119).

DISCUSSÃO

Os profissionais envolvidos no cuidado de pacientes graves devem se deparar com situações que apresentam algum tipo de desordem neurológica, necessitando, assim, de um instrumento de fácil aplicação, capaz de identificar rapidamente essas disfunções e mudanças nos parâmetros neurológicos (consciência, sensibilidade e motricidade). Com isso, a avaliação neurológica desses pacientes torna-se um elemento imprescindível no cotidiano das práticas de enfermagem nas unidades críticas, SE e UTI.(1010. Amorim CF, Menezes Jr. JE, Thiago TE, Araújo DP, Gúzen FP, Cavalcanti JR. Avaliação neurológica realizada por enfermeiros em vítimas de traumatismo cranioencefálico. Rev Neurocienc. 2013;21(4):520-4.)

Os enfermeiros deste estudo eram a maioria do sexo feminino, com média de idade 31,18 anos, brancos e solteiros. Esses resultados corroboram, em parte, os achados em outra pesquisa realizada em duas unidades de cuidados intensivos de pacientes adultos pertencentes a um hospital de ensino do interior paulista, cuja amostra foi predominantemente feminina e a média da idade foi de 32 anos, sendo uma proporção maior na faixa etária entre 23 e 33 anos e configurando, portanto, uma população jovem.(1212. Camelo SH, Silva VL, Laus AM, Chaves LD. Perfil profissional de enfermeiros atuantes em unidades de terapia intensiva de um hospital de ensino. Cienc Enferm. 2013;19(3):51-62.)

A maioria dos profissionais deste estudo possuía curso de especialização e referiu ter entre 1 e 5 anos de formado (62,2%). Resultado inferior foi encontrado em pesquisa realizada em UTI de três hospitais de ensino do Estado de Alagoas, em que 68% dos enfermeiros disseram possuir especialização.(1313. Pimentel TS, Lúcio IM, Oliveira KC, Bastos ML, Santos EA. Processo de trabalho de enfermeiros de unidades de terapia intensiva: desafios da formação acadêmica. Rev Enferm UFPE. 2013;7(10):5915-22.) Já estudo realizado na Unidade Cardiointensiva do Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro, na cidade do Rio de Janeiro (RJ), verificou que 50% dos enfermeiros tinham entre 1 e 5 anos de formado.(1414. da Silva RC, Ferreira M de A. Características dos enfermeiros de uma unidade tecnológica: implicações para o cuidado de enfermagem. Rev Bras Enferm. 2011;64(1):98-105.)

Nesta pesquisa, a maior parte dos enfermeiros (mais que 80%) acertaram as respostas sobre a ECG sobre a finalidade da escala, os parâmetros, o escore, o valor da escala que indica um ponto crítico para o paciente e que serve como alerta para o profissional, o intervalo da escala que classifica o TCE como moderado, a forma correta de pontuar cada parâmetro, e como se deve iniciar a avaliação dos parâmetros melhor resposta verbal e melhor resposta motora.

Apesar da maioria expressiva dos enfermeiros deste estudo ter um bom conhecimento sobre a ECG, ainda pequena parte apresentou déficit com relação a esse conhecimento. Tal fato condiz com o que foi achado em estudo internacional, no qual os participantes apresentaram déficits em alguns parâmetros da escala, indicando uma necessidade de treinamento contínuo no uso da escala e garantindo, dessa forma, seu uso padronizado e fidedigno.(1515. Reith FC, Brennan PM, Maas AI, Teasdale GM. Lack of Standardization in the Use of the Glasgow Coma Scale: results of International Surveys. J Neurotrauma. 2016;33(1):89-94.) Isso pode ser preocupante, uma vez que o objetivo da avaliação neurológica é a prevenção ou o diagnóstico precoce dos eventos que podem desencadear lesões cerebrais secundárias ou agravar as já existentes. O paciente crítico exige percepção aguda e acompanhamento vigilante por parte do enfermeiro. Dentro desse contexto, cabe ao enfermeiro conhecer as alterações que podem ocorrer com o paciente, para, por sua vez, poder agir corretamente, pois grande parte da assistência de enfermagem baseia-se em observação constante e avaliação correta.(1515. Reith FC, Brennan PM, Maas AI, Teasdale GM. Lack of Standardization in the Use of the Glasgow Coma Scale: results of International Surveys. J Neurotrauma. 2016;33(1):89-94.)

Quando questionados sobre a correta forma de avaliação da abertura ocular, apenas 39,4% responderam corretamente. Este achado é corroborado por estudo realizado com o objetivo de comparar a aplicação da ECG entre enfermeiros e médicos do departamento de emergência. Os participantes da pesquisa apresentaram uma menor pontuação nesse parâmetro da escala.(1616. Holdgate A, Ching N, Angonese L. Variability in agreement between physicians and nurses when measuring the Glasgow Coma Scale in the emergency department limits its clinical usefulness. Emerg Med Australas. 2006;18(4): 379-84.)

Os enfermeiros deste estudo com tempo de formação maior que 5 anos apresentaram menor porcentual de acertos nas questões que avaliaram os escores relacionados ao intervalo que indica gravidade moderada do TCE. Este resultado pode estar relacionado à falta de treinamento no uso da ECG, à confiabilidade e à precisão no uso da escala, que podem ser aumentadas com a experiência profissional, associada ao treinamento e ao seu uso contínuo.(88. Oliveira DM, Pereira CU, Freitas ZM. Escalas para avaliação do nível de consciência em trauma cranioencefálico e sua relevância para a prática de enfermagem em neurocirurgia. Arq Bras Neurocir. 2014;33(1):22-32.)

Em relação à questão que avaliou o intervalo da ECG que indica gravidade moderada do TCE, quanto maior o tempo de experiência do enfermeiro deste estudo, maior o porcentual de acertos, sendo que enfermeiros do pronto-socorro apresentaram maior percentual de acertos quando comparados com os da UTI. O enfermeiro que atua na assistência ao paciente crítico necessita ter conhecimento científico, prático e técnico, afim de tomar decisões rápidas e concretas, visto que a identificação de alteração neurológica pode significar um melhor ou pior prognóstico do paciente. Para que se tenha uma assistência segura ao paciente, é necessário que o enfermeiro esteja apto a desempenhar sua função, uma vez que constantemente atua junto à recuperação do doente. O cuidado prestado pelo enfermeiro exige multiplicidade de conhecimentos e a compreensão quanto ao processo de liderança da equipe, destacando o relacionamento interpessoal e a tomada de decisões.(1717. Pereira N, Valle AR, Fernandes MA, Moura ME, Brito JN, Mesquita GV. O cuidado do enfermeiro à vítima de traumatismo cranioencefálico: uma revisão da literatura. Rev Interdisc NOVAFAPI (Teresina). 2011;4(3):60-5. Review.) A experiência profissional, aliada à capacitação do enfermeiro, é determinante neste processo, para se alcançar uma assistência de enfermagem de qualidade.

Os enfermeiros desta pesquisa com maior tempo de trabalho na unidade apresentaram maior porcentual de acertos na questão que avaliou como o examinador deve registrar a resposta motora, resultados que corroboram os encontrados por outros estudos, em que os enfermeiros com maior tempo de experiência possuíram maior conhecimento sobre a ECG.(1111. Mattar I, Liaw SY, Chan MF. A study to explore nurses’ knowledge in using the Glasgow Coma Scale in an acute care hospital. J Neurosci Nurs. 2013;45(5):272-80.,1818. Chan MF, Matter I. Investigating nurses’ knowledge, attitudes and self-confidence patterns to perform the conscious level assessment: a cluster analysis. Int J Nurs Pract. 2013;19(4):351-9.,1919. Chan MF, Mattar I, Taylor BJ. Investigating factors that have an impact on nurses’ performance of patients’ conscious level assessment: a systematic review. J Nurs Manag. 2013;21(1):31-46. Review.) Esse resultado, mostra a importância da educação em serviço para a aplicação da escala, pois o perfil dos profissionais encontrados nos SE é jovem e com curso de especialização, porém com formação recente e pouco tempo de trabalho, além do fato de a rotatividade ser alta nesses serviços.(2020. Mendes AC, Araújo Jr JL, Furtado BM, Duarte PO, Silva AL, Miranda GM. Condições e motivações para o trabalho de enfermeiros e médicos em serviços de emergência de alta complexidade. Rev Bras Enferm. 2013;66(2):161-6.,2121. Adriaenssens J, De Gucht V, Maes S. Causes and consequences of occupational stress in emergency nurses, a longitudinal study. J Nurs Manag. 2015;23(3): 346-58.)

Diante dos resultados deste estudo, cabe uma reflexão sobre estratégias para capacitação na utilização da ECG, pois pode garantir a confiabilidade e a precisão esperadas em seu uso pelo enfermeiro.(88. Oliveira DM, Pereira CU, Freitas ZM. Escalas para avaliação do nível de consciência em trauma cranioencefálico e sua relevância para a prática de enfermagem em neurocirurgia. Arq Bras Neurocir. 2014;33(1):22-32.) O Ensino Baseado em Simulação caracteriza-se como uma metodologia de aprendizado ativo em ambiente livre de risco, no qual é possível construir o conhecimento e a habilidade técnica. Esta pode ser uma estratégia que proporcione ao enfermeiro segurança na utilização da escala na prática clínica.(2222. Dourado AS, Giannella TR. Ensino baseado em simulação na formação continuada de médicos: análise das percepções de alunos e professores de um Hospital do Rio de Janeiro. Rev Bras Educ Med. 2014;38(4):460-9.)

A principal limitação do presente estudo foi sua realização em um único centro e, portanto, constitui uma experiência local.

CONCLUSÃO

A maioria dos enfermeiros das unidades críticas apresentou bom conhecimento sobre a escala de coma de Glasgow, uma vez que acertaram as questões acerca dela, com exceção da pergunta sobre abertura ocular.

Em relação à questão que avaliou o intervalo da escala de coma de Glasgow que indica gravidade moderada do trauma craniencefálico, quanto maior o tempo de experiência do enfermeiro, maior foi o percentual de acertos. Os enfermeiros com maior tempo de trabalho na unidade apresentaram maior porcentual de acertos na questão que avaliou como o examinador deve iniciar a avaliação do parâmetro melhor resposta motora.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2016

Histórico

  • Recebido
    12 Jan 2016
  • Aceito
    17 Maio 2016
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