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Dor: avaliação do 5º sinal vital. Uma reflexão teórica

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

A dor é na atualidade um critério obrigatório de avaliação de pacientes por se tratar de sintoma prevalente no decurso da doença, como também por ser aspecto de gerenciamento compulsório. Trata-se de uma reflexão teórica e literária que objetivou validar a dor como um sinal vital, elucidar sobre a experiência dolorosa e seu enfrentamento e como a enfermagem gerencia a dor do paciente.

CONTEÚDO:

De acordo com a literatura, apesar dos avanços na área de saúde a dor ainda se apresenta como um problema pouco investigado e por vezes subestimado pelos profissionais de saúde no atendimento ao paciente, portanto reflexões teóricas emergiram formando três categorias: Dor: o 5º Sinal Vital, a experiência dolorosa e seu enfrentamento, gerenciamento da dor e avaliação e intervenção de enfermagem.

CONCLUSÃO:

O paciente necessita de acolhimento, apoio familiar e cuidado numa perspectiva ampla de intervenções de enfermagem, para que desenvolva estratégias de enfrentamento à doença, controle da dor e garanta seu bem-estar.

Descritores:
Cuidados; Dor; Enfermagem

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

Pain is currently a mandatory evaluation criterion for patients’ evaluation because it is a prevailing symptom during disease, as well as because its management is compulsory. This is a theoretical and literary reflection aiming at validating pain as a vital sign, clarifying the painful experience and its coping and how nurses manage patients’ pain.

CONTENTS:

According to the literature, in spite of advances in health care pain is still a scarcely studied problem and is sometimes underestimated by health professionals during patients’ assistance. This has led to theoretical reflections to develop three categories: Pain as the fifth vital sign, painful experience and coping, pain management and nursing interventions.

CONCLUSION:

Patients need attention, family support and care in a broad perspective of nursing interventions to develop disease coping strategies, to control pain and to assure their wellbeing.

Keywords:
Care; Nursing; Pain

INTRODUÇÃO

A dor é na atualidade um critério obrigatório para avaliação de pacientes, por se tratar de sintoma prevalente no decurso da maioria das doenças. A inclusão da dor como 5º sinal vital, com apropriado registro e consequente intervenção, assegura que todos os pacientes, incluindo os terminais, tenham acesso a medidas eficazes para o controle da dor.

A dor é um sintoma frequente no paciente com câncer e certamente o mais temido por estar associado a sofrimento e incapacidades. Estima-se que 18 milhões de pessoas em todo o mundo sofrem devido à dor causada pelo câncer, sendo 60 a 90% por conta de tumores em estágio avançado e 30% em decorrência de formas leves e/ou moderadas que têm possibilidade terapêutica11 Chaves LD. O enfermeiro no manejo da dor do câncer. Associação Brasileira de Cuidados Paliativos (ABCP) 2004.,22 Kipel AG. Prevalência da dor: mitos, medos e desacertos relacionados ao uso de analgésicos opiáceos. Texto Contexto Enferm. 2004;13(2):303-8..

Mais do que um sintoma, a dor é a doença em si, é um evento orgânico subjetivo, difícil de aferir e o seu controle é o objetivo do tratamento. Quem sofre com a dor tem alterações biológicas, psicossociais e psicossomáticas. Em relação aos sintomas orgânicos comuns pode-se relatar perda do sono, prejuízo no trabalho, na movimentação, deambulação, ocorre alteração do humor, da capacidade de concentração, do relacionamento familiar, da atividade sexual e outras questões que englobam a saúde mental. Intervenções de enfermagem ao paciente com dor33 Centro integrado de tratamento da dor. Disponível em: http://centrodetratamentodador.com.br/?p=616. Acesso 29/04/2015.
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O enfermeiro necessita de um vasto conhecimento sobre quando ocorre a dor e como ela afeta o paciente, para poder ajudá-lo. Os profissionais médicos, de enfermagem e também os do serviço devem usar as técnicas de comunicação para o estabelecimento de uma relação empática, ou seja, saber se colocar no lugar do outro e assim sentir suas necessidades e experimentar como é o mundo do paciente que está com dor, e finalmente, saber ouvi-lo para efetuar um diagnóstico rápido e uma terapêutica eficaz para o alívio da dor33 Centro integrado de tratamento da dor. Disponível em: http://centrodetratamentodador.com.br/?p=616. Acesso 29/04/2015.
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Sabe-se que apesar dos avanços na área de saúde, a dor ainda se apresenta como um problema pouco investigado e por vezes subestimado pelos profissionais de saúde no atendimento ao paciente. O tratamento correto da dor esbarra em obstáculos frequentes como a falta de conhecimento e habilidade dos profissionais de saúde na obtenção do controle analgésico, a citar a preocupação com os efeitos adversos dos opioides, o medo sobre a possibilidade de droga-adição (dependência) e a relutância em aceitar as queixas dolorosas como respostas humanas que exigem intervenção.

Nessa perspectiva, conjectura-se que o profissional de saúde tem tido dificuldade de avaliar e documentar rotineiramente a dor, considerando protocolos específicos de identificação e terapia de dor44 Lopes LB, Souza MI, Pereira ME. Dor - 5º sinal vital: Análise do Conhecimento da Equipe de Enfermagem. 57º Congresso Brasileiro de Enfermagem. Goiânia, 2005. http://www.abennacional.org.br/57CBEn/apresentacao.html.
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Com o propósito de dar visibilidade e resolubilidade ao suporte terapêutico doloroso necessário no cuidado do paciente oncológico, em 2003 as portarias GM/MS nº. 19 de 03/01/2002 e GM/MS nº. 1318 de 23/07/2002 tornam obrigatório o registro sistemático da dor e sua intensidade nos serviços públicos de saúde44 Lopes LB, Souza MI, Pereira ME. Dor - 5º sinal vital: Análise do Conhecimento da Equipe de Enfermagem. 57º Congresso Brasileiro de Enfermagem. Goiânia, 2005. http://www.abennacional.org.br/57CBEn/apresentacao.html.
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Assim, o monitoramento da dor como o 5º sinal vital faz com que a resposta dolorosa seja reconhecida não só como um sintoma, mas como um sinal de alarme que demanda um padrão de cuidado diferenciado, e o cuidado, por sua vez, funciona como um indicador de excelência na qualidade da assistência em oncologia55 SBED. Sociedade Brasileira para o estudo da dor. Projeto Brasil sem dor. São Paulo, 2005. Disponível em: www.dor.org, acesso em: 25.03.2014.
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,66 Diccini S. Dor como 5° sinal vital. Acta Paul Enferm. 2004;17(1):7-8. .

O enfermeiro é o profissional responsável pelo cuidado direto, porque permanece mais tempo próximo ao paciente; assim, deve assumir o manuseio da dor, proporcionando, sobretudo, alívio do sofrimento e melhora da qualidade de vida (QV)77 Tulli AC, Pinheiro CS, Teixeira SZ. Dor oncológica: os cuidados de enfermagem. RevBrasCancerol. 1999. Disponível em: http://portaldeenfermagem.blogspot.com.br/2008/07/artigo-dor-oncolgica-os-cuidados-de.html Acesso em 22/05/2015.
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Frente a essas colocações, reforça-se a ideia de que a QV do paciente oncológico pode sim ser substancialmente melhorada, caso a avaliação da dor seja uma prioridade no planejamento e organização da assistência de enfermagem, cujos pressupostos humanísticos nortearão os cuidados88 Gutiérrez MG, Arthur TC, Fonseca, SM, Matheus MC. O câncer e seu tratamento: impacto na vida dos pacientes Online Braz J Nurs. 2007;6(0)..

Haja vista as alterações nas atividades da vida diária, de trabalho e de lazer, no sono e repouso, na vida sexual, no humor, na autoimagem e na autoestima, na apreciação da vida, nos papéis e nas relações sociais; a dor, sem dúvida, traz consigo repercussões não apenas fisiológicas, mas emocionais, sociais e psicológicas.

Partindo dessa assertiva, entende-se que a preocupação do enfermeiro com a dor deve transcender aspectos biológicos representados por parâmetros da experimentação momentânea da dor, em virtude do papel social do indivíduo e de relações e interações que possam corroborar para libertação do quadro doloroso agudo e crônico vivenciado.

Diante disso, levantou-se como questão norteadora: a dor é um sinal vital? Como enfrentá-la? Como a enfermagem gerencia a dor do paciente?

O objetivo deste estudo foi mostrar que a dor é um sinal vital, e elucidar sobre a experiência dolorosa e seu enfrentamento pela enfermagem. De acordo com a literatura e reflexões teóricas emergiram três categorias: dor: o 5º Sinal vital, a experiência dolorosa e seu enfrentamento, gerenciamento da dor - avaliação e intervenção de enfermagem.

DOR: O 5º SINAL VITAL

Apesar de estudos despontarem com enfoque na mensuração e registro da dor pela equipe de saúde como uma intervenção imprescindível para a terapêutica, ainda existe grande dificuldade por parte dos profissionais na valorização da dor sofrida pelos indivíduos99 Sousa FA. [Pain: thefifthvialsign]. RevLatAm Enfermagem. 2002;10(3):446-7 Portuguese..

Por ser a dor definida como uma experiência subjetiva e multidimensional cuja mensuração e manuseio dependem tanto da sensibilidade do profissional em percebê-la no sujeito com dor quanto da escolha de estratégias para alívio dos sintomas, o despreparo do profissional na identificação da dor ou a negligência do seu diagnóstico pode desqualificar o processo de cuidar.

De modo que a dor não pode ser objetivada, mas como um evento orgânico, ela, assim como o peso corporal, a temperatura, a altura, a pressão sanguínea e o pulso, podem ser captados pela alteração dos dados vitais e outras alterações orgânicas. O paciente “sem dor” experimenta o bem-estar do equilíbrio sistêmico, que pode ser considerado uma experiência interna, complexa e pessoal1010 Bottega FH, Fontana RT. A dor como quinto sinal vital: utilização da escala de avaliação por enfermeiros de um hospital geral. Texto Contexto Enferm. 2010;19(2):283-90..

A despeito dessas dificuldades intrínsecas, por que mensurar a dor? A mensuração da dor é importante, pois torna possível ao profissional de saúde utilizar uma medida sobre a qual irá basear o tratamento ou a conduta terapêutica da dor, acertando na prescrição e determinando até o tempo de tratamento ou quando se deve interrompê-lo1010 Bottega FH, Fontana RT. A dor como quinto sinal vital: utilização da escala de avaliação por enfermeiros de um hospital geral. Texto Contexto Enferm. 2010;19(2):283-90..

A terapêutica que deve ser empregada para o alívio da dor e do sofrimento do paciente lhes permitindo um cuidado integral1111 Pimenta CA, Cruz DA. Crenças em dor crônica: validação do Inventário de Atitudes frente à dor para a língua portuguesa. RevEscEnferm USP. 2006;40(3):365-73..

É importante entender que assim como os demais sinais vitais, a dor traz um forte indício de desconforto e instabilidade capaz de desestabilizar os sinais vitais fisiológicos e consequentemente a hemodinâmica dos pacientes. Por isso, na utilização dos sinais vitais clássicos para o direcionamento do atendimento à saúde do paciente com dor, destacam-se os parâmetros fisiológicos como os mais importantes a serem observados e registrados, para concomitantemente se explorar os sinais de dor.

Apesar disso, pode-se constatar que a avaliação e controle da dor ainda não estão legitimados nas instituições de saúde; observa-se que apenas a mensuração dos sinais vitais clássicos faz parte da rotina de enfermagem enquanto que o registro da dor e seu manuseio permanecem exclusos dos protocolos de avaliação da situação de saúde do paciente oncológico.

A herança/influência do positivismo é fortemente identificada na lógica de cuidar desses enfermeiros. A subjetividade que envolve a avaliação e o registro da dor parece obstaculizar o reconhecimento de sua importância como dado vital que merece ser valorizado e incluído no planejamento da assistência dos indivíduos, especialmente do paciente oncológico.

Estes relatos ratificam a necessidade de capacitação permanente da equipe de enfermagem, bem como uma reestruturação na folha de registros do paciente, incluindo o 5º sinal vital – a dor. Assim, seria possível sua abordagem não como algo que evoca uma terapêutica complementar, nem como um elemento dissociado da hemodinâmica corpórea, mas como um sinal vital revelador do equilíbrio, conforto e bem-estar dos pacientes.

Desse modo, garante-se que o cuidado e o conforto prestados ao paciente que está experimentando a dor, sejam tão básicos na prática de enfermagem quanto as intervenções utilizadas para estabilizar os outros sinais vitais.

A EXPERIÊNCIA DOLOROSA E SEU ENFRENTAMENTO

Ao logo dos anos, o homem vem, progressivamente, procurando compreender as causas da dor com a finalidade de livrar-se dela. Todas as pessoas, indiscriminadamente, sentem, sentiram ou vão sentir dor. Entretanto, a grande maioria das pessoas não sabe descrever sua dor, o que torna difícil para o profissional de saúde captar de fato a experiência de dor de outra pessoa. Essa dificuldade tem a ver com a resiliência do paciente: alguns suportam mais a dor, outros menos1212 Pedroso RA, Celich KL. Dor: quinto sinal vital, um desafio para o cuidar em enfermagem. Texto & Contexto Enferm. 2006;15(2):270-6.. A compreensão da dor foi sendo empregada de várias formas. Em 320 a.C., Aristóteles a considerou como sendo uma “antítese ao prazer”, alertando para uma sensação desconfortável. Em 1895, Strang associou a sensação e a reação como sendo dois componentes da dor. Sherrington, em 1900, reconheceu o caráter duplo do fenômeno, admitindo o envolvimento dos componentes sensitivos e afetivos na síndrome dolorosa1313 da Silva LM, Zago MM. [Care for theoncologicpatientwithchronicpainfromthe point ofviewofthe nurse]. Rev Lat Am Enfermagem. 2001;9(4):44-9. Portuguese..

As descobertas mais importantes sobre a dor, entretanto, ocorreram após a II Guerra Mundial, decorrentes da expansão do conhecimento sobre anatomia e fisiologia e a utilização do método científico para investigar o significado da dor. A necessidade de uma definição de dor e de termos relacionados a ela para facilitar o entendimento e a comunicação com caráter universal, fez com que a Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) constituísse, em 1976, uma subcomissão de taxonomia da dor1414 Booss J, Drake A, Kerns RD, Ryan B, Wasse L. Pain as the 5th vital sign [toolkit on the internet]. Illinois: Joint Commission on Accreditation of Healthcare Organizations; 2000 Disponívelem: http://www.va.gov/oaa/pocketcard/pain5thvitalsign/PainToolkit_Oct2000.doc. Acesso 16/05/2015.
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,1515 Pavani NJP. Dor no Câncer. RevSocBrasCancerol. 2000;3(12):42-52..

A subcomissão composta por diversos profissionais da área de saúde foi presidida por Merskey e Bogduk1616 Merskey H, Bogduk N. Classification of Chronic Pain, 2nded, IASP Press, Seattle: 1994. Disponívelem: http://www.uptodate.com/contents/definition-and-pathogenesis-of-chronic-pain. Acesso 11/05/2015.
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, e apresentou em 1979 um trabalho consensual que foi apreciado pelo Congresso e pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para inclusão na Classificação Internacional de Doença (CID). A partir de então, a dor passa a ser definida como uma experiência sensorial e emocional desagradável, associada às lesões reais ou potenciais ou descrita em termos de tais lesões.

Dessa definição depreende-se que a relação entre lesão tecidual e dor não é exclusiva ou direta, e que na experiência dolorosa, aspectos sensitivos, emocionais e culturais estão imbricados de forma indissociável, de modo que a dor como experiência subjetiva e pessoal se revela com intensidade e constância variáveis na expressão de um indivíduo para outro1313 da Silva LM, Zago MM. [Care for theoncologicpatientwithchronicpainfromthe point ofviewofthe nurse]. Rev Lat Am Enfermagem. 2001;9(4):44-9. Portuguese..

Em 2000, a Joint Commission on Accreditation on Health Care Organizations (JCAHO) preconizou que a dor fosse avaliada e registrada em conjunto com os demais dados vitais, validando-a como 5º sinal vital. A uniformidade da conduta valoriza e respeita a queixa de dor e o desconforto que esta provoca no paciente e consequentemente produz um cuidado integral e mais humano1616 Merskey H, Bogduk N. Classification of Chronic Pain, 2nded, IASP Press, Seattle: 1994. Disponívelem: http://www.uptodate.com/contents/definition-and-pathogenesis-of-chronic-pain. Acesso 11/05/2015.
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Ao instituir a dor como 5º sinal vital, a equipe de saúde emprega diversas perspectivas de cuidado em atendimento às queixas álgicas, assegurando ao paciente o acesso às intervenções terapêuticas específicas à situação de dor1717 Boss J, Drake A, Kerns RD, Ryan B, Wasse L. Pain as the 5th vital sign.[toolkit on the internet].Illinois: Joint Commission On Accreditation of Healthcare Organizations; 2000..

Assim, a adequada avaliação da dor, sua identificação, controle e alívio constituem papel fundamental do enfermeiro como principal provedor do cuidado. Sabendo que as respostas humanas e os limiares para dor são diferenciados de um indivíduo para outro, a avaliação da dor deve englobar muitos aspectos, sendo foco da investigação tanto a qualidade quanto a intensidade da dor1818 Calil AM, Pimenta CA. [Painintensityofpainandadequacyof analgesia]. RevLatAm Enfermagem. 2005;13(5):692-9. Portuguese..

O exame físico ajuda a certificar o profissional acerca da existência da dor, através da localização, duração, periodicidade, evolução e resposta aos fatores externos que atuam como agravantes ou atenuantes da dor e outros sintomas associados. No entanto, toda dor deve ser considerada real e ter validade diagnóstica simplesmente pelo relato do paciente de que ela existe. Nos casos em que existe dor, mas não há relatos verbais para expressá-la, urge o esforço do enfermeiro na detecção de possíveis indícios reveladores de experiência dolorosa.

A experiência dolorosa de uma pessoa é influenciada por inúmeros fatores, incluindo as experiências pregressas com a dor, ansiedade, idade e expectativas a respeito do alívio da dor (efeito placebo). Esses fatores podem aumentar ou diminuir a percepção da dor da pessoa, aumentar ou reduzir a tolerância para a dor1818 Calil AM, Pimenta CA. [Painintensityofpainandadequacyof analgesia]. RevLatAm Enfermagem. 2005;13(5):692-9. Portuguese..

A dor pode ser classificada em aguda ou crônica. A aguda se traduz numa dor breve, caracterizada por pontadas, midríase, sudorese, esforço cardíaco, fraqueza, dentre outros sintomas, exigindo abordagem quase que puramente sintomática relacionada ao desequilíbrio apresentado; o tratamento analgésico adequado e intervenções específicas levam ao desaparecimento do quadro álgico e de suas consequências. Já a dor crônica é persistente, de difícil localização, causando insônia, anorexia, diminuição da libido, desesperança e ansiedade1919 Ribeiro MA, Lopes MH. [Development, implementationandevaluationof a distancecourseaboutwoundtreatment]. RevLatAm Enfermagem. 2006;6(3):77-84. Portuguese..

Além da categorização em aguda e crônica, a dor pode ser classificada em nociceptiva e por desaferentação. Essa diferenciação é importante, pois define as diferenças do tratamento. Dor nociceptiva é aquela onde há elevada síntese de substâncias algiogênicas e intensa estimulação das fibras nociceptivas, tal como ocorre nas situações de doenças inflamatórias, traumáticas ou isquêmicas. A dor neuropática ou por desaferentação ocorre quando há lesão parcial ou total das vias nervosas do sistema nervoso periférico ou central, como a decorrente de neuropatia dolorosa por diabetes, herpes zoster, acidente vascular encefálico, invasão de estruturas por tumores, entre outras situações2020 Vasconcellos MH. Ante a impossibilidade de sustentar a dor, a insustentabilidade do ser. CadPsicanál. 2005;21(24):199-218..

A dor é uma sensação, mas também um fenômeno emocional que leva a um comportamento de fuga e proteção; deve ser entendida como um fenômeno muito complexo e de variações biológicas, intelectuais, emocionais e culturais1717 Boss J, Drake A, Kerns RD, Ryan B, Wasse L. Pain as the 5th vital sign.[toolkit on the internet].Illinois: Joint Commission On Accreditation of Healthcare Organizations; 2000..

A dor é reconhecidamente o principal fator estressor, o que justifica uso de protocolo de controle da dor, como alternativa para ajudar e promover algumas intervenções para seu alívio, como: avaliação da ocorrência da dor em intervalos regulares a cada seis horas ou de acordo com aferição de dados vitais; utilização de escalas específicas para a avaliação da intensidade da dor de acordo com as necessidades de cada paciente, o uso de ações não farmacológicas para seu controle, protocolos de analgesia estabelecidos em literatura. A dor como 5º sinal vital: atuação da equipe de enfermagem no hospital privado com gestão do Sistema Único de Saúde (SUS)2121 Pimenta CA, Partinoi AG. Dor e cultura. In: Carvalho MM (organizador.). Dor: um estudo multidisciplinar. São Paulo; Summus: 1999. 159-73p..

A avaliação da dor compreende o exame clínico (história da doença, exame físico, exames laboratoriais e de imagem), as características de experimentação da dor, repercussão da dor nas atividades de vida diária e a investigação de elementos psíquicos e socioculturais significativos para o quadro. Isso é possível com a implantação de protocolos de avaliação e manuseio da dor, como também com a aquisição de conhecimentos e de treinamento por parte da equipe de enfermagem1313 da Silva LM, Zago MM. [Care for theoncologicpatientwithchronicpainfromthe point ofviewofthe nurse]. Rev Lat Am Enfermagem. 2001;9(4):44-9. Portuguese..

A dor pode ser avaliada por meio do relato do paciente, observação do seu comportamento e das respostas fisiológicas à dor1919 Ribeiro MA, Lopes MH. [Development, implementationandevaluationof a distancecourseaboutwoundtreatment]. RevLatAm Enfermagem. 2006;6(3):77-84. Portuguese.. As escalas de avaliação são instrumentos para mensurar a dor e podem ser classificadas em uni ou multidimensionais. As escalas unidimensionais avaliam somente uma das dimensões da experiência dolorosa, e dentre as mais usadas, destacam-se as escala visual numérica (EVN) e a escala analógica visual (EAV). A EVN é graduada de zero a 10, onde zero significa ausência de dor e 10 a pior dor imaginável. A vantagem desse instrumento é a sua familiaridade com os participantes, uma vez que o ser humano utiliza números desde a infância. A EAV consiste em uma linha reta, não numerada, indicando-se em uma extremidade a marcação de “ausência de dor”, e na outra, “pior dor imaginável”1010 Bottega FH, Fontana RT. A dor como quinto sinal vital: utilização da escala de avaliação por enfermeiros de um hospital geral. Texto Contexto Enferm. 2010;19(2):283-90.,2222 Marconi MA, Lakatos EM. Técnicas da Pesquisa: planejamento e execução de pesquisas, amostragens e técnicas de pesquisas, elaboração, análise e interpretação de dados. 5ª ed. São Paulo: Atlas; 2002..

Há ainda escalas quantitativas não numéricas, de expressões faciais de sofrimento crescente ou de “sequência de copos” e a escala das mãos. A primeira gradua a intensidade da dor por meio de um copo de água, sendo o copo vazio equivalente a nenhuma dor e o copo transbordando, equivalente a dor 10; e a segunda seguindo a posição das mãos, o afastamento das mãos da posição de oração evidencia aumento da dor. Essas escalas são úteis em pacientes com baixa escolaridade e naqueles com dificuldade em compreender a escala numérica2020 Vasconcellos MH. Ante a impossibilidade de sustentar a dor, a insustentabilidade do ser. CadPsicanál. 2005;21(24):199-218..

Outra forma de graduação da dor é a escala comportamental, na qual se dá uma nota questionando diretamente o paciente sobre sua lembrança de dor em função de suas atividades cotidianas. A nota zero é atribuída quando o paciente está sem dor; nota três quando a dor está presente, havendo períodos em que é esquecida; nota seis quando a dor não é esquecida, mas também não é impeditiva das atividades da vida diária; nota oito quando a dor não é esquecida e atrapalha todas as atividades, exceto alimentação e higiene, e por último, nota 10, quando a dor persiste mesmo em repouso, está presente e não pode ser ignorada1717 Boss J, Drake A, Kerns RD, Ryan B, Wasse L. Pain as the 5th vital sign.[toolkit on the internet].Illinois: Joint Commission On Accreditation of Healthcare Organizations; 2000..

No entanto, a experiência dolorosa não se restringe apenas à sua intensidade, sendo muito mais ampla. A necessidade de abrangência dessa realidade fez surgir escalas multidimensionais para a avaliação da dor. O questionário de dor mais largamente usado é o inventário desenvolvido por Melzack (1975), na Universidade McGill. Esse questionário consta de uma relação de 78 descritores das qualidades sensoriais da dor, além do desenho do corpo, no qual o paciente assinala a localização da dor, e de uma escala de intensidade da dor. Uma crítica aos instrumentos de avaliação multidimensional da dor é o fato de serem complexos, de difícil aplicação na prática clínica e entendimento pelo paciente. Portanto, o fator mais importante na escolha de qual instrumento deve ser usado é a capacidade do paciente para compreendê-lo; assim, os instrumentos de avaliação devem ser adequados à faixa etária, à capacidade cognitiva e aos aspectos culturais dos indivíduos avaliados11 Chaves LD. O enfermeiro no manejo da dor do câncer. Associação Brasileira de Cuidados Paliativos (ABCP) 2004..

É desejável o uso de intervenções múltiplas, que possibilitam a melhor resposta analgésica, visto a possibilidade de interferirem simultaneamente na geração do impulso nociceptivo, nos processos de transmissão e de interpretação do fenômeno doloroso e na estimulação do sistema supressor de dor.

O tratamento da dor é complexo, e seu sucesso exige múltiplos esforços da equipe de saúde para a obtenção de resultados satisfatórios. Técnicas de relaxamento, hipnose, distração, terapias com gelo e calor, massagem e estimulação cutânea, imagem guiada, entre outros, são alguns exemplos de medidas não farmacológicas que surtem efeito desejável2323 Saça CS, Carmo FA, Arbuleia JP, Regiane CX, Alves AS, Rosa BA. A dor como 5º sinal vital: atuação da equipe de enfermagem no hospital privado com gestão do Sistema Único de Saúde (SUS). J Health Sci Inst. 2010;28(1):35-41..

GERENCIAMENTO DA DOR - AVALIAÇÃO E INTERVENÇÃO DE ENFERMAGEM

A avaliação da dor tem sido um desafio para a enfermagem oncológica no que tange ao diagnóstico e acompanhamento do sofrimento do indivíduo que vive/convive com a dor.

Com o entendimento de que a dor é uma experiência tanto individual como social experimentada além do corpo físico, muitas vezes ela não consegue ser captada ou expressa integralmente pelo indivíduo por meio da oralidade1919 Ribeiro MA, Lopes MH. [Development, implementationandevaluationof a distancecourseaboutwoundtreatment]. RevLatAm Enfermagem. 2006;6(3):77-84. Portuguese.. De modo que o significado da dor necessita ser avaliado pela enfermagem através da leitura de uma linguagem do corpo, bem como de outros aspectos que apontam para sinais e sintomas de experimentação da dor, fato que exige cautela, atenção e esforço do profissional para o adequado rastreamento2424 Sampaio LR, Moura CV, Resende MA. Recursos fisioterapêuticos no controle da dor oncológica: revisão de literatura. RevBrasCancerol. 2005;51(4):339-46..

Para tanto, entende-se que a identificação da dor seria o primeiro passo para um registro adequado sobre a tipologia da dor, sua intensidade e repercussão na QV dos pacientes que sofrem com o câncer. As descrições de sinais de dor crônica nos pacientes oncológicos pelos enfermeiros seguem seus conhecimentos, crenças e valores. Assim, entre as características que permitem a identificação da dor nos pacientes, as que emergiram com maior frequência foram mudança da expressão facial, alteração no estado de humor e no comportamento.

Essas características tomadas como base para a percepção do sintoma álgico nos indivíduos são importantes indícios de dor e referências para terapêutica analgésica, porém não são suficientes para um diagnóstico mais preciso da dor.

Os profissionais devem tomar conhecimento do sofrimento do paciente pelo seu comportamento estereotipado, como choro, gemido, agitação e tremor.

O enfermeiro deve ser capaz de reconhecer/identificar «indícios da dor», tarefa que indubitavelmente não é fácil, visto que pacientes e profissionais podem ter concepções diferentes sobre a dor.

Os pacientes podem reagir das mais diversas maneiras à experimentação da dor, portanto, a abordagem profissional de aproximação, conquista, escuta atenta e observação sistemática pode facilitar o rastreamento de sintomas álgicos e o planejamento da assistência adequada.

A experiência dolorosa não é um procedimento simples de ser diagnosticado, visto tratar-se de um fenômeno individual e subjetivo, cuja interpretação e expressão envolvem elementos culturais, sensitivos e emocionais que exigem empenho dos profissionais no que tange ao conhecimento dos mecanismos de estimulação e respostas de dor1111 Pimenta CA, Cruz DA. Crenças em dor crônica: validação do Inventário de Atitudes frente à dor para a língua portuguesa. RevEscEnferm USP. 2006;40(3):365-73..

Os enfermeiros devem avaliar o paciente com dor baseados no processo de enfermagem, para investigar e obter dados que permitam a identificação do diagnóstico da dor. Dessa forma, desenvolverão habilidade para a identificação de necessidades dos pacientes e a condução da prática de enfermagem será adequada.

A implantação de protocolos de avaliação e manuseio da dor, como também a aquisição de conhecimentos e de treinamento por parte da equipe de enfermagem, facilitarão a conduta e eficácia na terapêutica da dor1313 da Silva LM, Zago MM. [Care for theoncologicpatientwithchronicpainfromthe point ofviewofthe nurse]. Rev Lat Am Enfermagem. 2001;9(4):44-9. Portuguese..

O cuidado com a dor aguda está diretamente relacionado com a implantação de protocolos de avaliação e manuseio da dor, como também com a aquisição de conhecimentos e de treinamento por parte da equipe de enfermagem2525 Lasaponari EF, Costa AL, Peniche AC, Leite O, RCB de Revisão integrativa: dor aguda e intervenções de enfermagem no pós-operatório imediato. SOBECC, São Paulo. jul./set. 2013; 18(3):38-48.Disponível em: www.sobecc.org.br. Acesso em 29/11/2015
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O planejamento do cuidado em enfermagem não deve ser subestimado, pois define a arte e a ciência da profissão. Se a enfermagem continuar a funcionar de modo tradicional, continuará a ser definida pelo que faz e não pelo que realmente construiu de conhecimento teórico-prático2626 Nascimento LC, Rocha SM, Hayes VH, de Lima RA. [Childrenwith câncer andtheirfamilies]. RevEscEnferm USP. 2005;39(4):469-74. Portuguese..

Para a assistência de enfermagem contemplar a resposta humana à dor e o significado para o indivíduo que a vivencia, necessita incluí-la como item de avaliação, ou seja, como parâmetro que conduzirá o enfermeiro que cuida do paciente oncológico a prestar cuidados mais humanizados e de qualidade.

Nessa perspectiva, não basta somente o aprendizado empírico do cotidiano de quem lida com o paciente oncológico para planejar a assistência de enfermagem que atenda às especificidades de saúde e cuidado desses pacientes. Os instrumentos de avaliação da dor são necessários e imprescindíveis para direcionar a atuação do enfermeiro. Tulli, Pinheiro e Teixeira77 Tulli AC, Pinheiro CS, Teixeira SZ. Dor oncológica: os cuidados de enfermagem. RevBrasCancerol. 1999. Disponível em: http://portaldeenfermagem.blogspot.com.br/2008/07/artigo-dor-oncolgica-os-cuidados-de.html Acesso em 22/05/2015.
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ratificam a necessidade de realizar anamnese e exame físico incluindo em seu roteiro a avaliação da dor, sua intensidade, localização, tipo, início e duração, fatores que proporcionam alívio ou pioram o efeito ocasionado pelas terapias empregadas, além das queixas do paciente.

A experiência dolorosa, como traz este estudo, é um exemplo de sintoma amplo, não se resumindo apenas à intensidade, localização, tipo, início e duração; engloba outras características da dor que também devem ser avaliadas, incluindo o seu local, irradiação, periodicidade e fatores desencadeantes. É importante observar as reações comportamentais e fisiológicas da dor, tais como: expressão facial, inquietação, posicionamento protetor, insônia, ansiedade, irritabilidade, sudorese, palidez, taquicardia, taquipneia, hipertensão, entre outros1212 Pedroso RA, Celich KL. Dor: quinto sinal vital, um desafio para o cuidar em enfermagem. Texto & Contexto Enferm. 2006;15(2):270-6..

A dor não controlada resulta em alterações respiratórias, hemodinâmicas e metabólicas, predispondo o paciente a instabilidade cardiovascular, maior consumo energético e proteico, dificuldade na deambulação precoce, favorecendo o aparecimento de trombose venosa profunda, principalmente em idosos, causa insônia, maior desgaste metabólico, fadiga e menor motivação para cooperar com o tratamento2121 Pimenta CA, Partinoi AG. Dor e cultura. In: Carvalho MM (organizador.). Dor: um estudo multidisciplinar. São Paulo; Summus: 1999. 159-73p..

Devido a seus vastos sintomas a dor acomete o indivíduo no seu íntimo e muitas vezes o deixa debilitado e precisando de apoio e compreensão.

O envolvimento da família e sua participação no cuidado são altamente significativos para integrar os conhecimentos que os profissionais de saúde já têm aos necessários para o cuidado holístico para atender o paciente com dor.

Por conviver com o paciente, os familiares são capazes de traduzir mudanças de comportamentos, sentimentos e expressões de dor do paciente, colaborando com a equipe na condução terapêutica. Portanto, faz parte da assistência de enfermagem analisar conjuntamente o discurso do paciente e da família, suas atitudes, posturas e expressões que evidenciem uma comunicação simbólica da dor.

As informações da família são uma ferramenta importante para o profissional de saúde entender como se processa a dor e têm papel relevante no planejamento e nas decisões da enfermagem.

Não obstante a aquisição de informações advindas dos familiares sobre a condição do paciente e mais especificamente da sua dor, elas são pouco apreciadas e utilizadas pelos enfermeiros de modo contundente e sistemático. Entretanto, por estar imbricado no cuidado ao indivíduo enfermo e sua família, não há como o profissional negar o valor da interação indivíduo-família para a investigação da dor, estando implícito que o profissional recorre às informações ditas “desqualificadas” do acompanhante-familiar para conduzir o processo terapêutico1212 Pedroso RA, Celich KL. Dor: quinto sinal vital, um desafio para o cuidar em enfermagem. Texto & Contexto Enferm. 2006;15(2):270-6..

Considerando-se a família como um sistema, o surgimento de uma doença grave em um ente querido vai provocar uma reorganização em sua estrutura e distribuição de papéis2727 SalvettiMde G, Pimenta CA. [Chronicpainandthebelief in self-efficacy]. Rev. Esc. Enferm. USP. 2007;41(1):135-40. Portuguese.,2828 Barbosa FS, Valle IN. Pain in newborns: a descriptive study about assessment and non-pharmacological treatment at a NICU. Online Braz J Nurs. 2006;5(2) Disponível em: http://www.objnursing.uff.br/index.php/nursing/article/view/337. Acesso em: 22 de maio de 2014.
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Reconhecer a família enquanto provedora de cuidados, solicitando apoio para identificação dos sintomas álgicos do indivíduo portador de câncer é extremamente relevante, já que normalmente são os familiares que cotidianamente vivenciam a doença junto com seu paciente. Baseando-se nos padrões de interação indivíduo-família é que se conjeturou que por ser a pertença do indivíduo, a família é capaz de detectar as sutilezas das mudanças de vida decorrentes da doença, como também as alterações comportamentais e/ou fisiológicas advindas de um quadro doloroso.

Reitera-se a necessidade de considerar o conjunto de fatores que interagem nos processos de dor crônica e as estratégias familiares paradesvelar a dor do paciente oncológico. É oportuno que a enfermagem torne os familiares corresponsáveis pela terapêutica do paciente oncológico, encorajando-os, até que se sintam seguros e confiantes, pois esse passo é muito importante para se avançar nas apropriações do cuidado individualizado.

Entendendo a dor como uma síndrome resultante da interpretação do aspecto físico-químico do estímulo nocivo e da sua interação com as características individuais como humor, aspectos culturais e afetivos dos indivíduos88 Gutiérrez MG, Arthur TC, Fonseca, SM, Matheus MC. O câncer e seu tratamento: impacto na vida dos pacientes Online Braz J Nurs. 2007;6(0)., reforça-se o valor da comunicação terapêutica comentada por alguns entrevistados. A interação profissional-paciente deve ser de encorajamento e de estímulo sempre, buscando transmitir aos pacientes a sensação de que sua dor está sendo compreendida e que pode ser controlada.

As medidas terapêuticas restantes, mencionadas com menor frequência pela enfermagem para o alívio da dor foram: crioterapia, mudança de decúbito, uso de compressa com água morna, avaliação da tolerância do fármaco, massagem de conforto, diminuição de ruídos e luminosidade, além da utilização de placebos.

Face às respostas, depreende-se que os enfermeiros, basicamente, restringem-se aos fármacos analgésicos e ao apoio emocional para o manuseio da queixa álgica nos seus pacientes, mesmo tendo acesso a outros recursos antiálgicos e de fácil aplicabilidade.

O alívio da dor é uma necessidade humana básica, um direito humano e, portanto, trata-se não apenas de uma questão clínica, mas também de uma situação ética que envolve os profissionais de saúde. Várias são as intervenções de enfermagem que devem ser oferecidas aos pacientes para que possam desenvolver sua capacidade funcional e sobreviver sem dor, a citar: correlacionar a dor e sua intensidade ao analgésico prescrito; ter controle da sua eficácia e reações adversas; abolir esquemas de prescrição “se necessário”; preferir via oral para administração de analgésicos, pois além de ser efetiva e acessível é menos onerosa e de baixo potencial de risco; utilizar medidas alternativas de construção de imagem, exercícios respiratórios e massagens; promover conforto físico, psíquico e espiritual; estimular medidas relacionadas à terapia ocupacional; controlar fluxo de visitas; passar confiança ao cliente; apoio emocional; auxiliar a família a reagir de forma ideal à experiência dolorosa do indivíduo77 Tulli AC, Pinheiro CS, Teixeira SZ. Dor oncológica: os cuidados de enfermagem. RevBrasCancerol. 1999. Disponível em: http://portaldeenfermagem.blogspot.com.br/2008/07/artigo-dor-oncolgica-os-cuidados-de.html Acesso em 22/05/2015.
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Além disso, o enfermeiro tem competências amplas que contribuem para o restabelecimento do paciente. Dentre essas terapias destacam-se a musicoterapia, a massagem terapêutica, a estimulação de pensamentos que aliviem a dor, a aromaterapia e o posicionamento para conforto2929 Rossato LM, Jacob Y. Dor crônica em crianças com tumores ósseos. Rev Mineira Enf. 2006;10(3):287-91..

A educação permanente é fundamental no gerenciamento da dor pela enfermagem porque os avanços tecnológicos são constantes, o desenvolvimento de técnicas e equipamentos para analgesia é crescente, fato que exige atualização da equipe para o diagnóstico, acompanhamento e intervenção3030 Romanek FA, Avelar MC. A multidimensionalidade da dor no ensino de Enfermagem em atendimento pré-hospitalar, às vítimas de trauma. Rev Dor, 2012;13(4):350-5.,3131 Paula GR, Reis VS, Ribeiro FA, Gagliazzi MT. Assistência de enfermagem e dor em pacientes ortopédicos na recuperação anestésica, no Brasil. Rev Dor. 2011;12(3):265-9..

CONCLUSÃO

É indiscutível a importância de se estabelecer a dor como 5º sinal vital, principalmente em oncologia, visto que o impacto da doença é global. A monitorização sistemática da dor mostra ser um recurso que facilita a comunicação entre a equipe de saúde e o paciente, colabora com a sobrevida e a QV do paciente e ainda reduz o seu período de permanência nas instituições hospitalares.

Pode-se concluir que a dor interfere de forma negativa nas atividades da vida diária de um indivíduo, precisando de imediato entendê-la como sinal vital e intervir adequadamente.

A enfermagem presta cuidados no manuseio da dor de modo limitado acarretando um gerenciamento inadequado do sintoma álgico e aquém da demanda dos pacientes.

A maioria dos profissionais enfermeiros não domina o mecanismo do quadro doloroso, baseando-se em parâmetros comportamentais para a identificação da dor no paciente, em virtude do desconhecimento das escalas de mensuração da dor e também fundamentam as ações terapêuticas de enfermagem antiálgicas no modelo médico. Esses achados mostram a necessidade de instaurar processos educativos de forma emergencial para que os enfermeiros possam desenvolver uma qualificação periódica e atualizada de enfermagem oncológica para a problemática da dor.

Em meio às reflexões, suscita-se ainda a proposta de uma reestruturação nos currículos de graduação do curso de enfermagem, incluindo a temática da dor e seus afins, com o propósito de subsidiar os estudantes no gerenciamento da dor no processo de cuidar.

Reitera-se que o paciente necessita de acolhimento, apoio familiar e cuidado numa perspectiva ampla de intervenções de enfermagem, para que desenvolva estratégias de enfrentamento à doença, controle da dor e garanta seu bem-estar.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    11 Dez 2014
  • Aceito
    16 Out 2015
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