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Dor pós-operatória e analgesia em pacientes submetidos à pinçamento de aneurisma cerebral não roto

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

Avaliação e manuseio adequados da dor pós-operatória são prioridades para uma assistência de qualidade, sobretudo em cirurgias neurológicas. O objetivo deste estudo foi avaliar a dor pós-operatória de pacientes neurocirúrgicos submetidos a pinçamento de aneurisma não roto.

MÉTODOS:

Estudo prospectivo e descritivo realizado em um hospital beneficente do município de Aracaju, Sergipe, Brasil. A casuística foi constituída por 28 pacientes submetidos a craniotomia eletiva para tratamento de aneurisma cerebral não roto por meio de pinçamento. Na análise inferencial foram utilizados os testes de Mann-Whitney, Kruskal-Wallis e Dunn-Bonferroni. Foi adotado nível de significância de 5% em todo o estudo.

RESULTADOS:

A maioria dos pacientes (78,6%) era do sexo feminino, 64,0% apresentaram dor no pós-operatório. Houve diferença significativa quanto ao número de dias com dor pós-operatória entre os pacientes que tinham comorbidades associadas (p=0,04) e cirurgia anterior (p=0,01). A maior parte dos pacientes apresentou cefaleia de intensidade moderada e pulsátil. Não houve registro adequado da dor nos prontuários, os analgésicos mais utilizados foram analgésicos simples e a prescrição de opioides foi incipiente.

CONCLUSÃO:

A avaliação do fenômeno doloroso de forma sistemática deve fazer parte da assistência multiprofissional, conforme as recomendações de instituições nacionais e internacionais da dor.

Descritores:
Analgesia; Aneurisma; Dor; Enfermagem; Mensuração da dor

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

Adequate postoperative pain evaluation and management are priorities for quality assistance, especially after neurological surgeries. This study aimed at evaluating postoperative pain of neurosurgical patients submitted to unruptured brain aneurysm clamping.

METHODS:

Prospective and descriptive study carried out in a charity hospital of the city of Aracaju, Sergipe, Brazil. Sample was made up of 28 patients submitted to elective craniotomy for unruptured brain aneurysm clamping. Mann-Whitney, Kruskal-Wallis and Dunn-Bonferroni tests were used for inferential analysis. Significance level was 5% throughout the study.

RESULTS:

Most patients (78.6%) were females, 64.0% had postoperative pain. There has been significant difference in the number of days with postoperative pain among patients with associated comorbidities (p=0.04) and previous surgery (p=0.01). Most patients had moderate and throbbing headache. There were no adequate pain records and most frequent analgesics were simple analgesics. Opioids prescription was incipient.

CONCLUSION:

Systematic pain evaluation should be part of multiprofessional assistance, in compliance with international and national pain institutions recommendations.

Keywords:
Analgesia; Aneurysm; Nursing; Pain; Pain measurement

INTRODUÇÃO

A dor é uma experiência subjetiva e multidimensional, presente na maioria dos pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos, em especial no pós-operatório de pinçamento de aneurisma11 Ribeiro Mdo C, Pereira CU, Sallum AM, Alves JA, Albuquerque MF, Fujishima PA. Knowledge of doctors and nurses on pain in patients undergoing craniotomy. Rev Lat Am Enfermagem. 2012;20(6):1057-63. English, Portuguese, Spanish.. É um problema desafiador na área de saúde, pois causa sofrimento físico e emocional, que resulta em impacto fisiológico adverso a vários sistemas, com repercussão na recuperação e bem-estar geral do paciente. Apesar de ser considerada o quinto sinal vital, ainda é um parâmetro pouco explorado em algumas instituições hospitalares22 Zorowitz RD, Smout RJ, Gassaway JA, Horn SD. Usage of pain medications during stroke rehabilitation: the Post-Stroke Rehabilitation Outcomes Projects (PSROP). Top Stroke Rehabil. 2005;12(4):37-49.

3 Ribeiro MC, Pereira CU, Sallum AM, Martins-Filho PR, Nunes MS, Carvalho MB. Dor pós-operatória em pacientes submetidos à craniotomia. Rev Dor. 2012;13(3):229-34.
-44 Saha P, Chattopadhyay S, Rudra A, Roy S. Pain after craniotomy: a time for reappraisal? Indian J Pain. 2013;2(1):4-6..

O controle eficaz do fenômeno doloroso é um direito do paciente que deve ser assegurado para evitar complicações pós-operatórias e internação hospitalar prolongada33 Ribeiro MC, Pereira CU, Sallum AM, Martins-Filho PR, Nunes MS, Carvalho MB. Dor pós-operatória em pacientes submetidos à craniotomia. Rev Dor. 2012;13(3):229-34.,55 Molnár L, Simon E, Nemes R, Fulesdi B, Molnár CJ. Postcraniotomy headache. J Anesth. 2014;28(1):102-11.. Nesse sentido, o manuseio eficaz da dor ocorre quando mensuração e avaliação são realizadas de modo contínuo e sistemático.

O enfermeiro enquanto líder deve exercer o seu papel no controle da dor por meio da avaliação e orientação à sua equipe sobre aspectos importantes do manuseio adequado, além de discutir com a equipe multidisciplinar quando o tratamento analgésico não estiver fundamentado na avaliação do paciente e em diretrizes nacionais e internacionais11 Ribeiro Mdo C, Pereira CU, Sallum AM, Alves JA, Albuquerque MF, Fujishima PA. Knowledge of doctors and nurses on pain in patients undergoing craniotomy. Rev Lat Am Enfermagem. 2012;20(6):1057-63. English, Portuguese, Spanish.,66 Barbosa TP, Beccaria LM, Beccaria RM, Pereira AM. Evaluation of postoperative pain experience in intensive care unit patients. Rev Bras Ter Intensiva. 2011;23(4):470-7..

Embora existam diversas evidências científicas relacionadas ao tratamento eficaz da dor pós-operatória, os pacientes cirúrgicos ainda sofrem com esquemas analgésicos inadequados77 Fanelli G, Berti M, Baciarello M. Updating postoperative pain management: from multimodal to context-sensitive treatment. Minerva Anestesiol. 2008;74(9):489-500.. O uso de terapia analgésica multimodal tem sua eficácia reconhecida por reduzir as doses e efeitos adversos de determinados fármacos, sobretudo os opioides88 Gottschalk A, Yaster M. The perioperative management of pain from intracranial surgery. Neurocrit Care. 2009;10(1):387-402.. Por outro lado, a prática da oligoanalgesia ainda é frequente no cenário de pós-craniotomia99 Rahimi SY, Alleyne CH, Vernier E, Witcher MR, Vender JR. Postoperative pain management with tramadol after craniotomy: evaluation and cost analysis. J Neurosurg. 2010;112(2):268-72..

O estudo justifica-se pela necessidade de buscar estratégias de controle da dor em pacientes submetidos a pinçamento de aneurisma, respeitando as premissas da International Association for the Study of Pain (IASP) e das recomendações do Sistema Único de Saúde (SUS).

O presente estudo objetivou avaliar a dor pós-operatória de pacientes neurocirúrgicos submetidos a pinçamento de aneurisma analisando as variáveis: localização, intensidade, duração, fatores atenuantes e agravantes, bem como, verificar o registro de dor realizado pela equipe de saúde nos prontuários dos pacientes no pós-operatório e a prevalência de dor durante a primeira semana pós-craniotomia.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo prospectivo, descritivo e exploratório com abordagem quantitativa, realizado no período de setembro de 2014 a maio de 2015, na unidade de terapia intensiva e setor de neurocirurgia de um hospital beneficente do município de Aracaju, Sergipe, Brasil.

A casuística foi constituída por 28 pacientes submetidos a pinçamento de aneurisma não roto. Após levantamento do número de pacientes submetidos a craniotomia para pinçamento de aneurisma no período de setembro de 2013 a março de 2014, verificou-se que foram realizadas 32 craniotomias por aneurisma cerebral. Posteriormente a essa etapa, foi realizado o cálculo para a determinação do tamanho amostral1010 Barbetta PA. Estatística aplicada às ciências sociais. 6ª ed. Florianópolis: Editora da UFSC; 2006., no qual se determinou tamanho mínimo de 27 pacientes, conforme a figura 1.

Figura 1
Descrição do cálculo amostral

Foram incluídos pacientes maiores de 18 anos, submetidos a craniotomia eletiva devido a aneurisma cerebral não roto, com escore da escala de coma de Glasgow (ECGl) igual a 15. Evolução para o óbito durante qualquer momento do seguimento foi considerado critério de exclusão. Os pacientes incluídos foram avaliados nos sete primeiros dias de pós-operatório e/ou até a alta hospitalar.

O formulário de coleta continha dados sobre o perfil sócio-demográfico e clínico do paciente. Adicionalmente, existiam informações sobre presença, localização e intensidade da dor após a cirurgia, perguntas específicas sobre características de cefaleia pós-operatória, analgesia administrada, registro da dor pelos profissionais, além da escala visual numérica (EVN) da dor.

A coleta de dados foi realizada por meio da seleção dos prontuários dos pacientes. Após essa etapa, foi realizada a análise documental seguida de entrevista. Os pacientes foram avaliados do primeiro ao sétimo dia de pós-operatório, e/ou até a alta hospitalar, nos casos em que a alta hospitalar ocorreu em um período inferior a sete dias.

Para avaliar a intensidade da dor, foi utilizada a EVN da dor. Foi solicitado ao paciente que informasse o local da dor, identificasse na escala sua intensidade e mencionasse os fatores agravantes e atenuantes do processo doloroso, bem como as características da cefaleia.

Uma vez ao dia, antes e após uma hora da administração do analgésico (prescrito de rotina pelo médico assistente da instituição), foi efetuada avaliação sobre a intensidade da dor. Os pacientes que não receberam analgesia e/ou não referiram dor também foram avaliados uma hora após a primeira avaliação e questionados sobre a presença de dor.

A pesquisa seguiu as recomendações da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, e todos os pacientes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de Sergipe (CAAE: 32813114.8.0000.5546).

Análise estatística

Na análise descritiva, as variáveis foram expressas por meio de frequência simples e percentual (quando categóricas) ou média e desvio padrão (quando contínuas ou ordinais). Na análise inferencial, foram utilizados os testes de Mann-Whitney (para duas médias independentes), Kruskal-Wallis (três ou mais médias independentes) e Dunn-Bonferroni (múltiplas comparações). Para todo o estudo foi utilizado o nível de significância de 5% e o software utilizado foi o R Core Team 2015.

RESULTADOS

Foram elegíveis para o estudo 28 pacientes submetidos a pinçamento de aneurisma, os quais foram entrevistados até o 3º dia de pós-operatório (DPO). Ao longo do seguimento, 10 pacientes receberam alta hospitalar, restando 18 pacientes avaliados até o 7º DPO.

A maioria dos pacientes (78,6%) era do sexo feminino, com idade ≥ 45 anos (67,9%), casados (53,6%) e sem antecedentes patológicos (67,9%). A cefaleia prevaleceu na totalidade dos pacientes. O número de dias com dor pós-operatória foi significativamente diferente entre os pacientes que tinham comorbidades associadas e aqueles que realizaram cirurgia. O tempo médio de internação na unidade de terapia intensiva foi de 2,8 dias (Tabela 1).

Tabela 1
Dados sócio-demográficos e número de dias relacionados à presença de dor no pós operatório de pinçamento de aneurisma. Aracaju, SE, Brasil, 2015

Dentre os entrevistados, 64,0% apresentaram dor no pós-operatório. A prevalência da cefaleia foi mais elevada no 1º DPO e menor no 7º (Figura 2).

Figura 2
Prevalência da dor pós-operatória no pinçamento de aneurisma, Aracaju, SE, Brasil, 2015.

A maior parte dos pacientes apresentou cefaleia de intensidade moderada, pulsátil, localizada na região frontotemporal (48,0%) e frontal (20,0%). Os principais sintomas associados a esse tipo de dor foram náuseas, vômitos e distúrbios do sono (Tabela 2).

Tabela 2
Presença da cefaleia pós-operatória de acordo com a localização, características, intensidade, fatores agravantes e sintomas associados, Aracaju, SE, Brasil, 2015.

A dor pós-operatória esteve presente em grande parte dos dias do seguimento, porém não houve registro adequado da dor nos prontuários. Os médicos foram os profissionais que registraram a dor de maneira mais apropriada, em detrimento dos enfermeiros. Os analgésicos simples foram os mais utilizados, com prescrição incipiente de opioides. As prescrições "se necessário" sofreram uma variação de 3,5% no 1º e 64,0% no 7º DPO (Tabelas 3 e 4).

Tabela 3
Presença e registro de dor no pós-operatório de pinçamento de aneurisma. Aracaju, SE, Brasil, 2015
Tabela 4
Intensidade da dor e analgésico administrado no pós-operatório de pinçamento de aneurisma. Aracaju, SE, Brasil, 2015

DISCUSSÃO

A adequação da analgesia e o alívio da dor são direitos inalienáveis dos pacientes, tendo em vista que, após o pinçamento de aneurisma, o fenômeno doloroso é um dos sintomas mais prevalentes. Portanto, o manuseio adequado da dor é fundamental para a recuperação pós-operatória e propiciar o retorno precoce das atividades da vida diária.

Os profissionais de enfermagem têm papel fundamental no alívio da dor desses pacientes, pois estão diretamente relacionados ao cuidado durante todo o ciclo de assistência diária, sendo responsáveis pelo auxílio na escolha do analgésico a ser administrado, quando avaliam corretamente a intensidade da dor referida pelo paciente.

Resultados desta pesquisa indicaram que o sexo feminino foi predominante. Tais dados corroboram estudos que objetivaram investigar a prevalência, intensidade e registro de dor na primeira semana após a cirurgia1111 de Oliveira Ribeiro Mdo C, Pereira CU, Sallum AM, Martins-Filho PR, Santana JM, da Silva Nunes M, et al. Immediate post-craniotomy headache. Cephalalgia. 2013;33(11):897-905.,1212 Smitherman TA, Burch R, Sheikh H, Loder E. The prevalence, impact and treatment of migraine and severe headaches in the United States: a review of statistics from national surveillance studies. Headache. 2013;53(3):427-36.. A possível explicação para esses resultados pode estar associada às diferenças de sexo quanto aos fatores de risco para doenças cardiovasculares. As alterações que ocorrem durante o ciclo de vida da mulher, relacionadas a modificações hormonais, podem ter contribuído para o desenvolvimento de alterações vasculares, culminando com a formação de aneurismas.

A média de idade dos pacientes foi de 47,6 anos. Pesquisas realizadas com pacientes submetidos a craniotomia obtiveram resultados semelhantes99 Rahimi SY, Alleyne CH, Vernier E, Witcher MR, Vender JR. Postoperative pain management with tramadol after craniotomy: evaluation and cost analysis. J Neurosurg. 2010;112(2):268-72.

10 Barbetta PA. Estatística aplicada às ciências sociais. 6ª ed. Florianópolis: Editora da UFSC; 2006.
-1111 de Oliveira Ribeiro Mdo C, Pereira CU, Sallum AM, Martins-Filho PR, Santana JM, da Silva Nunes M, et al. Immediate post-craniotomy headache. Cephalalgia. 2013;33(11):897-905.,1313 Kim YD, Park JH, Yang S, Kim S, Hong JTK, Sung JH, et al. Pain assessment in brain tumor patients after elective. Brain Tumor Res Treat. 2013;1(1):24-7.. As doenças crônicas não transmissíveis ocorrem com maior frequência na quarta década de vida. Acredita-se que o acesso à rede de atenção à saúde de maneira preventiva, com diagnóstico precoce e tratamento definitivo em tempo oportuno, evitou complicações neurológicas, sequelas e comprometimento das condições de saúde e, por conseguinte, propiciou a redução dos dias de internação hospitalar dos pacientes.

O tipo de dor mais prevalente foi a cefaleia de intensidade moderada, sendo compatível com o descrito por outros autores1414 Ribeiro MC, Pereira CU, Sallum AM, Lopes JR, Alves JA, Carvalho MB. Las consecuencias del dolor en pacientes sometidos a craneotomía elective. Rev Chil Neurocir. 2012;38(2):105-9.

15 Fernández-Galinski DL, Gordo F, López GS, Pulido C, Real J. Conocimientos y actitudes de pacientes y personal sanitario frente al dolor postoperatorio. Rev Soc Esp Dolor. 2007;14(1):3-8.
-1616 Durieux M, Himmelseher S. Pain control after craniotomy: off balance on the tightrope? J Neurosurg. 2007;106(2):207-9.. Outro estudo evidenciou que após o tratamento cirúrgico de aneurismas, há maior risco de o paciente desenvolver cefaleia1717 Magalhães JE, Azevedo-Filho HR, Rocha-Filho PA. The risk of headache attributed to surgical treatment of intracranial aneurysms: a cohort study. Headache. 2013;53(10):1613-23.. A cefaleia pós-operatória é um sintoma comum em pacientes após craniotomia, o que exige uma abordagem multidisciplinar, com vistas a reduzir sequelas neurológicas, tempo de internação e custos hospitalares. Além disso, pode propiciar melhor qualidade assistencial e satisfação aos pacientes e seus familiares.

A característica da cefaleia que mais prevaleceu foi a pulsátil, com predominância nas regiões frontal e frontotemporal. Estudo que investigou a cefaleia pós-craniotomia constatou que dentre as características mais frequentes estão as que começam no primeiro dia após a cirurgia, localizadas no mesmo lado e no local da incisão cirúrgica, e melhoram no decorrer da semana1818 Rocha-Filho PA. Post craniotomy headache: a clinical view with a focus on the persistent form. Headache. 2015;55(5):733-8.. Outro trabalho que analisou a incidência de dor aguda pós-craniotomia, descreveu a dor pulsátil como prevalente e demonstrou que a intensidade e localização da dor dependem do tipo de abordagem cirúrgica1919 Gray LC, Matta BF. Acute and chronic following craniotomy: a review. Anaesthesia. 2005;60(7):693-704.. No presente estudo, prevaleceram as cirurgias supratentoriais. Acredita-se que a localização da dor na região frontotemporal está relacionada a esse tipo de abordagem e localização da incisão cirúrgica.

O tipo de dor mais prevalente foi a moderada, o que requer o uso de opioides fracos associados a analgésicos de primeira classe, conforme preconizado pela escada analgésica da Organização Mundial da Saúde (OMS). No entanto, foi observada inconsistência no uso desses fármacos, o que diverge das premissas da IASP e da OMS2020 International Association for Study of Pain (IASP). Consensus development conference statement: the integrated approach to the management of pain. Accid Emerg Med. 1994;6(3):491-2.,2121 World Health Organization (WHO). Cancer pain relief: with a guide to opioid availability. 2nd ed. WHO Library: Geneva; 1996.. Dados semelhantes foram obtidos em outras pesquisas, nas quais prevaleceu o uso de analgésicos que não proporcionaram um manuseio adequado da dor88 Gottschalk A, Yaster M. The perioperative management of pain from intracranial surgery. Neurocrit Care. 2009;10(1):387-402.,99 Rahimi SY, Alleyne CH, Vernier E, Witcher MR, Vender JR. Postoperative pain management with tramadol after craniotomy: evaluation and cost analysis. J Neurosurg. 2010;112(2):268-72.,1515 Fernández-Galinski DL, Gordo F, López GS, Pulido C, Real J. Conocimientos y actitudes de pacientes y personal sanitario frente al dolor postoperatorio. Rev Soc Esp Dolor. 2007;14(1):3-8.,1616 Durieux M, Himmelseher S. Pain control after craniotomy: off balance on the tightrope? J Neurosurg. 2007;106(2):207-9..

A persistência da dor pode provocar várias alterações neurovegetativas, neurológicas e diminuição de oferta de oxigênio aos tecidos. Portanto, o seu manuseio adequado torna-se necessário, com vistas à redução desses efeitos deletérios. A dor aguda tratada de maneira inadequada pode evoluir para cronificação, tornando-se uma doença com prejuízos nas atividades de vida diária, necessitando uma abordagem interdisciplinar para propiciar melhoria na qualidade de vida dos pacientes.

Os principais sintomas associados à dor foram náuseas e vômitos. Resultados semelhantes foram encontrados em pesquisas recentes que objetivaram avaliar a incidência de náuseas e vômitos no pós-operatório de craniotomia2222 Ryu JH, Lee JE, Lim YJ, Hong DM, Park HP, Han JI, et al. A prospective, randomized, double-blind, and multicenter trial of prophylactic effects of ramosetronon postoperative nausea and vomiting (PONV) after craniotomy: comparison with ondansetron. BMC Anesthesiology. 2014;63(1):1-8.. Os vômitos prejudicam a recuperação neurocirúrgica dos pacientes, tendo em vista que ocorre aumento da pressão intracraniana, com riscos de hemorragias encefálicas, bem como desequilíbrio hidroeletrolítico. Dessa maneira, os profissionais da saúde devem utilizar estratégias sistemáticas para prevenção desses sintomas.

Outro sintoma associado à dor foi alteração do padrão do sono2323 Finan PH, Goodin BR, Smith MT. The association of sleep and pain: an update and a path forward. J Pain. 2013;14(12):1539-52.. Esse distúrbio está relacionado a fadiga, depressão e transtornos de saúde mental, podendo refletir de forma negativa no prognóstico dos pacientes. Desse modo, o sono adequado pode melhorar a recuperação clínica, diminuir a ansiedade e a sonolência diurna excessiva.

Embora a dor estivesse presente durante todo o pós-operatório, os registros nos prontuários foram incipientes. Estudos recentes também constataram esse fato33 Ribeiro MC, Pereira CU, Sallum AM, Martins-Filho PR, Nunes MS, Carvalho MB. Dor pós-operatória em pacientes submetidos à craniotomia. Rev Dor. 2012;13(3):229-34.,1111 de Oliveira Ribeiro Mdo C, Pereira CU, Sallum AM, Martins-Filho PR, Santana JM, da Silva Nunes M, et al. Immediate post-craniotomy headache. Cephalalgia. 2013;33(11):897-905.,2424 Kiekkas P, Gardeli P, Bakalis N, Stefanopoulos N, Adamopoulou K, Avdulla C, et al. Predictors of nurses' knowledge and attitudes toward postoperative pain in Greece. Pain Manag Nurs. 2015;16(1):2-10.. Os médicos foram os profissionais que registraram a dor de forma adequada. Em contrapartida, somente um enfermeiro registrou a dor. A documentação das atividades da saúde deve fazer parte da rotina profissional, tendo em vista a garantia do respaldo ético-legal. Esse dado é preocupante, pois a falta do registro sugere uma avaliação precária do fenômeno doloroso e, por conseguinte, um manuseio insatisfatório.

Enfermeiros devem avaliar e registrar a dor de forma adequada, pois quando realizam uma mensuração correta, são capazes de identificar divergências em relação ao tratamento analgésico estabelecido, e questionar a implementação de uma analgesia adequada2525 Peón AU, Diccini S. [Postoperative pain in craniotomy]. Rev Lat Am Enfermagem. 2005;13(4):489-95. Portuguese..

O padrão de prescrição "se necessário" (S/N) esteve presente em muitos prontuários dos pacientes. Esse formato de prescrição delega à equipe de enfermagem a responsabilidade do manuseio da dor do paciente, pois quando existem vários analgésicos prescritos nessa condição, a escolha do analgésico a ser administrado, em muitas situações, é realizada pela enfermagem2525 Peón AU, Diccini S. [Postoperative pain in craniotomy]. Rev Lat Am Enfermagem. 2005;13(4):489-95. Portuguese..

A avaliação sistemática da dor não esteve presente no estudo, uma vez que os registros realizados pela equipe de enfermagem relatavam apenas presença ou ausência de dor e os analgésicos simples foram a opção de escolha que prevaleceu, mesmo em casos de dor moderada à intensa.

Devido à magnitude do fenômeno doloroso, é necessário que profissionais da saúde busquem atualização constante com o objetivo de proporcionar à sua equipe uma educação continuada efetiva com vistas a um atendimento de qualidade1515 Fernández-Galinski DL, Gordo F, López GS, Pulido C, Real J. Conocimientos y actitudes de pacientes y personal sanitario frente al dolor postoperatorio. Rev Soc Esp Dolor. 2007;14(1):3-8.,2626 Oliveira RM, Leitão IM, Silva LM, Almeida PC, Oliveira SK, Pinheiro MB. Dor e analgesia pós-operatória: análise dos registros em prontuários. Rev Dor. 2013;14(4):251-5..

CONCLUSÃO

A maioria da amostra foi constituída por mulheres, com comorbidades associadas como hipertensão e diabetes. O tipo de dor mais prevalente foi a cefaleia de intensidade moderada e caráter pulsátil. Os analgésicos simples foram os mais utilizados e houve subnotificação do fenômeno doloroso.

  • Fontes de fomento: não há.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2017

Histórico

  • Recebido
    26 Abr 2016
  • Aceito
    18 Jan 2017
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