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SOBRE A SEMÂNTICA DE ‘DE VOLTA’: UM EXERCÍCIO EM CONTRADIRECIONALIDADE1 1 Este artigo é resultado de pesquisa realizada na Universidade de Utrecht, entre julho e dezembro de 2018, sob supervisão do Prof. Joost Zwarts.

RESUMO:

Neste artigo, nosso objeto é apresentar uma análise, dentro dos moldes da semântica e da pragmática formal das línguas naturais, da expressão ‘de volta’ no português brasileiro, considerando-a como um modificador de eventos de um tipo particular, um modificador contradirecional. Para tanto, lançamos mão de uma semântica de eventos neo-davidsoniana e da semântica de trajetórias proposta por Zwarts (2005ZWARTS, J. Prepositional aspect and the algebra of paths. Linguistics and Philosophy, Dordrecht, n.28, n.6, p.739-779, 2005., 2008ZWARTS, J. Aspects of a typology of direction. In: ROTHSTEIN, S. (ed.). Theoretical and crosslinguistic approaches to the semantics of aspect. Amsterdam: John Benjamins, 2008. p.79-106.), aliada a uma análise de modificadores de eventos. Na primeira parte deste artigo, apresentamos o domínio da contradirecionalidade, suas distinções e a proposta de Zwarts e Basso (2016)ZWARTS, J.; BASSO, R. M. Counterdirectionality crosslinguistically: comparing Brazilian Portuguese and Dutch. Revista da ABRALIN, [s. l.], v.1, p.19-44, 2016., que trata também do português brasileiro. Na sequência, apresentamos diversos dados relacionados às interpretações de ‘de volta’ para então, na seção seguinte, desenvolvermos nossa proposta específica de análise semântica para essa expressão. Como resultado, propomos uma análise unificada de ‘de volta’ que dá conta de suas interpretações retornativa, responsiva, restitutiva e repetitiva. Além disso, apresentamos uma revisão das conclusões de Zwarts e Basso (2016)ZWARTS, J.; BASSO, R. M. Counterdirectionality crosslinguistically: comparing Brazilian Portuguese and Dutch. Revista da ABRALIN, [s. l.], v.1, p.19-44, 2016. sobre ‘de volta’. Concluímos o presente texto com alguns problemas em aberto.

PALAVRAS-CHAVE:
Contradirecionalidade; Modificadores; Semântica de eventos; Semântica formal; Pressuposição

ABSTRACT:

Within the framework of formal semantics and pragmatics of natural languages, the aim of this paper is to analyse the expression ‘de volta’ in Brazilian Portuguese, considering it as an event modifier of a particular type, a counterdirectional modifier. In order to do this, we develop our analysis using Neo-Davidsonian Event Semantics and the Semantics of Trajectories proposed by Zwarts (2005ZWARTS, J. Prepositional aspect and the algebra of paths. Linguistics and Philosophy, Dordrecht, n.28, n.6, p.739-779, 2005., 2008ZWARTS, J. Aspects of a typology of direction. In: ROTHSTEIN, S. (ed.). Theoretical and crosslinguistic approaches to the semantics of aspect. Amsterdam: John Benjamins, 2008. p.79-106.), allied to an analysis of event modifiers. First, we present the domain of counterdirectionality, its main distinctions and the proposal of Zwarts and Basso (2016)ZWARTS, J.; BASSO, R. M. Counterdirectionality crosslinguistically: comparing Brazilian Portuguese and Dutch. Revista da ABRALIN, [s. l.], v.1, p.19-44, 2016., which also deals with Brazilian Portuguese. Next, we present several data related to the interpretations of ‘de volta’; in the following section, we develop our specific proposal for the semantic analysis of ‘de volta’. As a result, we propose a unified analysis of ‘de volta’ which accounts for its returnative, responsive, restitutive, and repetitive interpretations. We also present a review of the conclusions of Zwarts and Basso (2016)ZWARTS, J.; BASSO, R. M. Counterdirectionality crosslinguistically: comparing Brazilian Portuguese and Dutch. Revista da ABRALIN, [s. l.], v.1, p.19-44, 2016. about ‘de volta’. We conclude this paper with some open issues.

KEYWORDS:
Counterdirectionality; Modifiers; Event Semantics; Formal Semantics; Presupposition

Introdução

Entre os modificadores verbais, há um domínio que pode ser identificado como “contradirecional”, seguindo uma sugestão de Fabricius-Hansen (2001)FABRICIUS-HANSEN, C. Wi(e)der and again(st). In: FERY, C.; STERNEFELD, W. (ed.). Audiatur vox sapientiae: a festschrift for Arnim von Stechow. Berlin: Akademie Verlag, 2001. p.101-130., e que apenas recentemente vem recebendo atenção sistemática por parte de pesquisadores em semântica, pragmática e sintaxe das línguas naturais, como Beck e Gergel (2015)BECK, S.; GERGEL, R. The diachronic semantics of English again. Natural Language Semantics, Dordrecht, n.23, n.3, p.157-203, 2015., Abrusán (2016)ABRUSÁN, M. Presupposition cancellation: explaining the ‘soft-hard’ trigger distinction. Natural Language Semantics, Dordrecht, n.24, n.2, p.165-202, 2016. Disponível em: https://doi.org/10.1007/s11050-016-9122-7. Acesso em: 05 fev. 2019.
https://doi.org/10.1007/s11050-016-9122-...
, Zwarts e Basso (2016)ZWARTS, J.; BASSO, R. M. Counterdirectionality crosslinguistically: comparing Brazilian Portuguese and Dutch. Revista da ABRALIN, [s. l.], v.1, p.19-44, 2016. e Zwarts (2019)ZWARTS, J. From ‘back’ to ‘again’ in Dutch: the structure of the ‘re’ domain. Journal of Semantics, Oxford, v.36, n.2, p.211-240, 2019.. Esse domínio é composto por modificadores que indicam que um dado movimento ou evento é feito em resposta a um movimento ou evento prévio, em sentido contrário ao usual ou convencionado. Conforme defendem Zwarts e Basso (2016)ZWARTS, J.; BASSO, R. M. Counterdirectionality crosslinguistically: comparing Brazilian Portuguese and Dutch. Revista da ABRALIN, [s. l.], v.1, p.19-44, 2016., tal domínio pode ser organizado em diversos significados que se relacionam entre si. Como exemplo de significados que pertencem ao domínio da contradirecionalidade, podemos pensar, no caso do português brasileiro (PB), em predicados verbais que se combinam com itens como ‘ao contrário’ (‘fazer ao contrário’), ‘de trás para frente’ (‘contar de trás para frente’), ‘para trás’ (‘andar para trás’), ‘de volta’ (‘caminhar de volta’) e em vários usos do prefixo ‘re-’, como em ‘retornar’, ‘recolocar’, etc. (cf., CHUMAN, 2015CHUMAN, C. A contradirecionalidade e o prefixo re-. 2015. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Linguística) - Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2015.).

Neste artigo, nosso objetivo é oferecer uma caracterização semântica de um dos elementos do domínio contradirecional do PB, a saber, a expressão ‘de volta’. Para tanto, na primeira seção, caracterizaremos o domínio contradirecional, apresentando alguns dos significados que pertencem a ele, e de que modo o PB, o inglês e o holandês organizam tal domínio, para ilustrar diferentes possibilidades de caminhos de lexicalização. Na seção seguinte, traremos alguns dados referentes ao uso e interpretação de ‘de volta’, que motivarão a análise semântica a ser desenvolvida e defendida na seção “Uma análise semântica para ‘de volta’”. Na conclusão deste artigo, retomaremos o caminho percorrido e apresentaremos alguns dos problemas em aberto.

Sobre o domínio contradirecional

A investigação do domínio da contradirecionalidade partiu da constatação, por diversos pesquisadores, que trabalham em linhas distintas e em momentos diferentes, de que certos itens lexicais, em diferentes línguas do mundo, agregavam uma série de significados aparentemente díspares que, sob um olhar mais detalhado, compartilhavam características em comum. Um exemplo disso é o item ‘back’ do inglês - um item polissêmico, e que, em suas várias interpretações e usos, participa de diferentes classes gramaticais, sendo tratado como preposição, advérbio, partícula verbal e nome. Notemos, por exemplo, as sentenças abaixo:

  • (1)

    Dunworthy stepped backward and crashed into a six-year-old holding a plush Santa. (Connie Willis - The Doomsday Book)

    Dunworthy recuou (i.e., caminhou para trás) e colidiu com uma criança de seis anos segurando um Papai Noel de Pelúcia.

  • (2)

    I counted backwards from 10.

    Eu contei de trás para frente a partir de 10.

  • (3)

    I ran back a few blocks.

    Eu corri de volta alguns quarteirões.

  • (4)

    Someone kicked a ball to John, and he kicked it back.

    Alguém chutou uma bola para John e ele a chutou de volta.

  • (5)

    The explosion made him back awake.

    A explosão o fez acordar de novo/de volta.

  • (6)

    The door closed again.

    A porta fechou de novo.

Com exceção do exemplo (6), back (ou uma forma derivada desse item) aparece com interpretações diferentes em todos os casos. Contudo, há algo em comum entre essas interpretações, que é justamente o que motiva a existência de um domínio “contradirecional”: todas as interpretações envolverem uma trajetória ou um evento que se dá em direção contrária (ou em resposta, em sentido contrário) a uma trajetória ou evento convencional ou inicial.

Assim, em (1) temos um movimento feito em direção contrária ao natural, pois o sujeito caminha na direção para a qual suas costas estão voltadas - normalmente, caminhamos para frente, na direção para a qual os olhos apontam e não para a qual as costas apontam, mas em (1) é justamente isto o que acontece: um caminho contra a direção convencional, e na direção para a qual as costas apontam. Esse significado pode ser chamado de retaguarda, e pode ser ilustrado por predicados do PB como ‘andar para trás’ ou ‘caminhar de costas’.

A sentença em (2) ilustra um evento feito no sentido contrário ao que é o usual; no caso, contar “de trás para frente” é exatamente o contrário do que normalmente fazemos quando contamos. Estamos diante do significado retrógrado, encontrado em exemplos do PB como ‘contar de trás para frente’ (contagem regressiva) e ‘pedalar ao contrário’; tal significado pode envolver trajetória ou simplesmente a maneira de um evento se desenrolar.

O significado retornativo refere-se a um movimento de retorno a um lugar anterior, considerando uma trajetória prévia. O exemplo (3) traz o significado retornativo, ao indicar que o sujeito voltou, correndo, alguns quarteirões (na trajetória previamente percorrida), e exemplos do PB seriam ‘voltar’, ‘retornar’, e combinações com ‘de volta’, que veremos com cuidado neste artigo. Por sua vez, a sentença (4) exemplifica o significado responsivo, que ocorre quando um evento é feito em resposta a um evento prévio, e, nesse sentido, é feito em direção oposta - se A faz algo para B (A→B), a resposta será algo feito de B para A (B→ A), ou seja, na direção contrária à do primeiro evento. Para o caso do PB, mais uma vez, ‘de volta’ desempenha um importante papel na expressão desse significado.

O exemplo (5) ilustra o significado restitutivo, que se dá quando uma situação prévia é reestabelecida, ou seja, novamente, temos um movimento contrário, de volta a uma situação anterior, ainda que num domínio mais abstrato pois aqui lidamos com estados-de-coisas2 2 Não entraremos na complexa questão filosófica de definir o que são “estados-de-coisas” neste artigo. Mas é interessante notar, como veremos mais adiante, que podemos tomar “estados-de-coisas” como uma organização específica de particulares e universais que tornam verdadeiras as sentenças de uma língua, segundo uma perspectiva de verdade por correspondência. Como esperamos que fique claro, os detalhes filosóficos, por mais importantes que sejam, não terão impacto em nossa análise semântica. . O exemplo (6) traz o significado repetitivo, em que se pressupõe a existência de um evento prévio da mesma natureza ao qual se retoma, e é assim repetido. A presença do significado repetitivo é importante no domínio da contradirecionalidade porque em diversas línguas o item que expressa esse significado expressa também o significado restitutivo. No caso do PB, para a expressão desses dois significados, os recursos mais comuns são ‘de novo’, ‘outra vez’, e, em algumas situações, ‘de volta’.

Em resumo, considerando o caso de back, temos uma série de significados diferentes, expressos por um mesmo item lexical, que tem como cerne uma noção (abstrata) de retorno, que é, por sua vez, um movimento3 3 Argumentamos, ao longo deste texto, que “movimento” deve ser entendido não somente como movimento espacial, mas também movimento em domínios mais abstratos como eventos e estados-de-coisas. É também por essa generalidade que o domínio contradirecional é interessante. contrário à direção normalmente assumida - só pode haver retorno se previamente houve um movimento, e o retorno tem que ser, necessariamente, em direção contrária.

Zwarts e Basso (2016ZWARTS, J.; BASSO, R. M. Counterdirectionality crosslinguistically: comparing Brazilian Portuguese and Dutch. Revista da ABRALIN, [s. l.], v.1, p.19-44, 2016., p.28) propõem o seguinte quadro para mostrar as relações entre os significados do domínio contradirecional, baseados em relações de significado entre esses vários significados e em padrões de lexicalização atestados:

Ilustração 1
Organização dos significados contradirecionais

Nesse mesmo trabalho, os autores oferecem a seguinte proposta de organização para a expressão desses significados em inglês, holandês e português brasileiro, que serve como amostra das possibilidades de organização lexical dentro da contradirecionalidade:

Ilustração 2
Lexicalização dos significados contradirecionais em inglês
Ilustração 3
Lexicalização dos significados contradirecionais em holandês
Ilustração 4
Lexicalização dos significados contradirecionais no PB

Cada uma dessas línguas seguiu caminhos diferentes na lexicalização desses significados, mas é interessante notar que, para os quatro primeiros significados (retaguarda, retrógrado, retornativo e responsivo), os itens mobilizados pelas três línguas têm clara origem em partes do corpo e em orientação corporal - costas, ‘back’, ‘terug’, trás, frente, voltar, ‘-wards’, ‘achter’4 4 Back, em inglês, tem origem na palavra que se refere às costas, assim como ‘rug’ (que aparece em ‘terug’) e ‘achter’ do holandês, que se referem às costas, ou à parte de trás de algo. . Os significados restitutivo e repetivo, por sua vez, são mais comumente compostos por itens que envolvem a ideia de ocorrência, como ‘vez’, ‘time’, e ‘weer’.

Neste artigo, como dissemos, nosso foco é a expressão ‘de volta’ e sua caracterização semântica. Assim, uma vez exposto o domínio contradirecional e seus principais significados, na seção seguinte, exploraremos alguns dos usos de ‘de volta’ com o intuito de verificar se a classificação de Zwarts e Basso (2016)ZWARTS, J.; BASSO, R. M. Counterdirectionality crosslinguistically: comparing Brazilian Portuguese and Dutch. Revista da ABRALIN, [s. l.], v.1, p.19-44, 2016. é suficiente ou se há outros significados contradirecionais que ‘de volta’ expressa. Feito isso, na seção “Uma análise semântica para ‘de volta’”, com base na análise dos dados a seguir, propomos uma análise semântica para ‘de volta’.

‘De volta’ e seu significado

Há uma série de itens com os quais ‘de volta’ se combina, que são de natureza verbal e nominal. Comecemos por investigar ‘de volta’ combinado com nomes, como nos exemplos abaixo, que não têm pretensão de serem exaustivos:

  • (7)

    jogo de volta

  • (8)

    caminho/trajetória/percurso/rota de volta

  • (9)

    passagem/ticket/bilhete de volta

Para todos esses casos, há o pressuposto de um evento anterior, que, num sentido intuitivo, motiva e licencia o uso da expressão ‘de volta’. Dessa forma, podemos apenas ter o “jogo de volta” se já houver também o “jogo de ida”, que é o contrário do jogo de volta; o mesmo se dá, mutatis mutandis, com os exemplos em (8), que falam da existência de uma trajetória prévia, na direção contrária daquela mencionada pela expressão ‘de volta’, e com os exemplos em (9), que só são felizes se houver uma passagem (ou ticket, ou bilhete) de ida, que envolve uma trajetória contrária à da volta5 5 A oposição com ‘ida’ fica clara também quando consideramos que podemos trocar ‘de volta’ por ‘da volta’ nos exemplos de (7) a (9). .

É importante notar também a simetria presente nesses casos: o jogo da volta só pode ocorrer se envolver os mesmos times (ainda que possa haver variação entre os jogadores); o caminho de volta tem que terminar justamente no ponto em que a ida começou; e uma passagem de volta tem que ter como ponto de chegada justamente a saída da passagem de ida - ainda que haja alguma variação na trajetória total; por exemplo: alguém pode ir de São Paulo a Brasília por Belo Horizonte, mas pode fazer um caminho de volta (para São Paulo) sem necessariamente passar por Belo Horizonte.

Sendo assim, para os casos em (8) e (9), se convencionarmos o início de uma trajetória p como p(0) e seu final como p(1), temos que qualquer trajetória pA, com final pA(1), terá uma contraparte “de volta”, pB, cujo final será pB(1)=pA(0), ainda que possa haver pontos diferentes no meio da trajetória - voltaremos a essas questões mais adiante, bem como a uma formalização mais bem desenvolvida e explícita. Além disso, ainda que tenhamos um nome superficialmente expresso é interessante notar a natureza eventiva dos exemplos - temos ‘jogar’ para (7) e algum verbo de movimento para os casos de (8) e (9), o que evidencia que ‘de volta’ é um modificador que tem eventos como argumentos6 6 Certamente uma análise mais aprofundada cabe aqui, até pelo fato de que diferentes nominalizações podem levar a diferentes significados contradirecionais. Por exemplo, ‘jogo de volta’ é responsivo, mas ‘nado de volta’ pode ser retornativo. Seja como for, nos interessa aqui apenas notar que há sempre um evento envolvido nessas interpretações. .

Passando aos predicados verbos propriamente ditos, ‘de volta’ se combina com praticamente todos os verbos que indicam movimento no PB, como exemplifica a lista abaixo, que também não tem pretensão de ser exaustiva (cf., MEIRELLES; CANÇADO, 2017MEIRELLES, L. L.; CANÇADO, M. A propriedade semântica movimento na representação lexical dos verbos do português brasileiro. Alfa, São Paulo, v.61, n.2, p.425-450, 2017.; RAMMÉ, 2012RAMME, V. A expressão do deslocamento nas línguas naturais: análise da estrutura [Vmaneira + Preploc]. 2012. 144f. Dissertação (Mestrado em Linguística) - Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2012.):

  1. verbos de maneira de movimento: ir, caminhar, nadar, voar, dirigir, rastejar, engatinhar, pedalar, pilotar, navegar, correr, andar, pular, acompanhar, seguir, conduzir

  2. verbos que envolvem movimento (inerentemente direcionado)/deslocamento: jogar, chutar, trazer, levar, carregar, embarcar, cair, arremessar

Os verbos na linha (a) podem ser associados a trajetórias e seu conteúdo lexical veicula diferentes modos de cumprir, desenrolar e chegar ao fim de tais trajetórias (PINKER, 1989PINKER, S. Learnability and cognition: the acquisition of argument structure. Cambridge: MIT Press, 1989.; TALMY, 2000TALMY, L. Toward a cognitive semantics. Cambridge: MIT Press, 2000.). Ao combinarmos quaisquer um desses verbos com ‘de volta’, o resultado é o inverso da trajetória percorrida, ou seja, novamente, se considerarmos que a trajetória denotada por um uso particular do verbo ‘navegar’ como pN, seu começo como pN(0) e seu fim como pN(1), o resultado da combinação com ‘de volta’, ‘navegar de volta’, envolverá a trajetória pNV, que terá a seguinte característica: pNV(1)=pN(0). É importante notar que a trajetória pNV não precisa ser composta por todos os pontos que compõe a trajetória pN - alguém pode navegar por uma dada rota (pN) e voltar por outra (pNV), mas só consideramos como uma volta (e podemos usar ‘de volta’) se o fim de pNV for igual ao início de pN, do mesmo que vimos com os exemplos (8) e (9) acima7 7 Considere um caso em que João foi do ponto A (inicial) ao ponto B (final), passando pelo ponto C, no meio dos dois outros pontos. Suponha agora que ele tenha que ir ao ponto C; mesmo que possamos dizer que João voltou ao ponto C a partir de B, não seria adequado dizer que ele fez uma trajetória ‘de volta’. Note a diferença entre (a) ‘João fez o caminho de volta’ e (b) ‘João fez o caminho de volta até C’. Na situação descrita, somente (b) seria aceitável, e isso se dá porque uma trajetória ‘de volta’ considera o ponto de partida fornecido (ou contextualmente recuperado). Para que esse não seja o caso, é preciso dizer explícitamente qual o novo ponto a ser então considerado. .

Ainda com relação a esses verbos, é interessante notar que ‘de volta’ impõe restrições sobre as trajetórias envolvidas e sua direcionalidade, mas não sobre como elas foram percorridas, como demonstra o exemplo a seguir:

  • (10)

    João foi para a escola de ônibus, mas caminhou de volta.

Em (10), considerando que João saiu e voltou para sua casa, a trajetória de ir para a escola, pE, foi percorrida de ônibus, e a trajetória contrária, de volta/retorno, pEV, foi percorrida a pé; além disso, é bem provável que as rotas percorridas sejam diferentes, pois o caminho do ônibus não precisa ser o mesmo que se faz a pé. De fato, o que importa para licenciar o uso de ‘de volta’ é que pEV(1)=pE(0).

Talvez uma das principais características dos verbos em (a) é que eles sejam agentivos (não-causativos) e envolvam o deslocamento do sujeito da sentença. Os verbos em (b), por sua vez, envolvem movimento de seu objeto, com um sujeito que causa ou desencadeia tal movimento8 8 Há várias outras maneiras de caracterizar os verbos em (a) e (b), como dizer que os em (a) são do tipo PATH-ROUTE, e os em (b) do tipo GOAL. Notamos que essas classificações são ortogonais, e compatíveis, com nossa análise do componente contradirecional. . Apesar dessa diferença, o que parece estar envolvido aqui, como nos casos em (a), é existência de um deslocamento anterior da denotação do objeto da sentença, numa certa direção; em todos esses usos temos deslocamento concreto, no sentido de envolver mudança de localização espacial - o resultado de ‘de volta’ é uma trajetória espacial contrária à que ocorreu primeiro.

Tomemos, por exemplo, a sentença abaixo:

  • (11)

    João chutou a bola de volta para o Pedro.

A sentença (11) só é feliz se houver um evento anterior em que a bola parte de Pedro e vai até João - idealmente, Pedro chuta a bola para João. Somente em tais condições podemos falar que João chutou a bola de volta para o Pedro. Contudo, é importante notar que, novamente, os eventos não precisam ser necessariamente idênticos. Considere um caso em que Pedro lança a bola, com as mãos, para João, e, ao devolvê-la para Pedro, João usa os pés, chutando a bola. Ainda nesse tipo de situação, (11) é uma sentença adequada; o que importa é que a bola parta de Pedro, e volte a ele - ou seja, considerando a trajetória que a bola percorreu de Pedro para João como pBPJ, e seu início como pBPJ(0), a sentença em (11) fala de um evento cuja trajetória, pBJP, tem a seguinte característica: pBJP(1)=pBPJ(0).

Em termos mais técnicos, o uso de ‘de volta’ com verbos de movimento, e com os exemplos nominais com os quais lidamos, (i) pressupõe um evento de movimento anterior, que se desenrola no espaço9 9 Obviamente, verbos como ‘jogar’ têm interpretações não-espaciais, como em “João jogou o argumento de volta para o Pedro”, mas esses casos podem ser interpretados como extensões metafóricas, do domínio espacial para o domínio eventivo ou argumentativo, e seriam assim, como veremos abaixo, casos de sentidos responsivos. Pensamos aqui, contudo, em casos espaciais apenas para salientar justamente que a interpretação espacial pode ser usada, via analogia, em outros domínios (cf. PONTES, 1992; TALMY, 2000; JACKENDOFF, 1983, 1996, entre vários outros). Seja como for, em todos os casos, conforme argumentaremos, o papel de ‘de volta’ será sempre o mesmo. , com uma direcionalidade específica, e (ii) resulta num evento de movimento com direção contrária ao primeiro, ainda que nem a rota nem o modo do movimento precisem ser os mesmos. Diante dessas características, podemos concluir que as interpretações de ‘de volta’ que vimos até aqui se encaixam no significado contradirecional retornativo, e sua descrição semântica envolve a pressuposição de um evento prévio e a realização posterior de um evento em direção contrária10 10 Alguns verbos, como ‘rastejar’, ‘embarcar’, ‘cair’, podem ter também interpretações restitutivas e repetitivas, algo esperado dado que todos esses significados são instanciações do domínio contradirecional, e, como argumentaremos, podem ser expressos por ‘de volta’. .

Antes de explorarmos as pressuposições relevantes e definirmos mais explicitamente o que deve ser tomado como “direção contrária” (ou “reversa”), é importante notar, como os exemplos abaixo mostram, que ‘de volta’ não se combina apenas com verbos de movimento. Considere-se a lista a seguir, que também não tem pretensão de ser exaustiva:

(c) escrever, ligar, mandar, comprar, transferir, receber, remeter, chamar, enviar, falar, bater, olhar

De fato, ‘escrever de volta’, ‘ligar de volta’, ou mesmo ‘comprar de volta’, entre outros, não envolvem uma dimensão espacial. Mas envolvem, num sentido mais abstrato, uma diferença de direcionalidade que pressupõe a existência de um evento anterior. Tomemos a sentença abaixo para ilustrar esse ponto:

  • (12)

    João escreveu de volta para a Maria.

A sentença (12) pressupõe que houve em evento anterior de escrita que partiu de Maria e chegou ao João, ou seja, o evento de escrita, simplificando as coisas, tem uma trajetória que começa em Maria e termina em João, de modo bastante similar ao que vimos com o exemplo (11), acima. Estamos aqui propondo uma extensão de significado para ‘de volta’ - ele passaria a atuar também em domínios eventivos e não apenas espaciais, mas oferecendo a mesma contribuição semântica contradirecional. Se considerarmos tal caracterização, podemos também dizer que ‘escrever de volta’, em (12), fala de um evento que começa em João e termina em Maria - como nos casos dos verbos em (a) e (b), temos a contradirecionalidade garantida nesses casos.

Qual é a semelhança, para os casos dos verbos (c), entre o evento anterior (pressuposto) e o evento contradirecional (veiculado por ‘de volta’)? Eles podem ser diferentes como nos exemplos anteriores? Dito de outra forma, é estritamente necessário, para o uso adequado e feliz de (12), que Maria tenha escrito para João, ou ela pode ter falado com ele, por exemplo?

Pelo menos para o caso de ‘escrever’, parece ser o caso que os eventos envolvidos têm que ser de “escrita”, e o seguinte exemplo ilustra isso:

  • (13)

    A Maria deixou uma mensagem para o João, e ele escreveu de volta.

A intuição diante de (13) é a de que Maria tenha deixado uma mensagem escrita para o João, e por isso ele escreveu de volta. Suponha agora que Maria tenha deixado uma mensagem de voz para João, e ele tenha escrito de volta para Maria - em tal caso, (13) não parece ser adequada.

Mudando para o verbo ‘telefonar’, suponha que Maria tenha ligado para o João - podemos agora usar (13), ou sua variação (13a)?

  • (13a)

    ? A Maria telefonou para o João, e ele escreveu de volta.

Novamente, esse não parece ser o caso. Assim para os verbos em (c), os eventos envolvidos exigem um grau de semelhança11 11 É importante falar em “semelhança” e não em “identidade”, porque Maria pode ter deixado um bilhete em papel para o João, e ele pode ter escrito de volta para ela um e-mail, por exemplo, mas os dois casos são caracterizados como eventos de “escrita”. Como notou um parecerista anônimo, a quem agradecemos pela observação, pode ser possível aceitar casos como o de (13a); a razão para tanto é provavelmente porque consideramos, ainda que diferentes, que os eventos descritos fazem parte de uma todo composto por eventos com “direções” diferentes. Assim, se estivermos considerando uma mesma conversa entre João e Maria, podemos aceitar que uma dos eventos seja via telefone e o outro via carta, por exemplo. maior do que aqueles envolvidos nos casos de (a) e (b)12 12 Uma possível explicação para tanto pode estar no fato de que os casos em (a), (b), e os casos nominais que vimos estão claramente ligados à dimensão espacial, e é uma trajetória espacial (e seu reverso) que garantem o uso de ‘de volta’, mais do que a especificidade do evento realizado. Ao passarmos para o domínio de eventos que não envolvem movimento no espaço, não temos mais uma trajetória espacial “concreta” para assegurar a semelhança entre as trajetórias envolvidas, e assim tal semelhança deve ser garantida também pelos tipos de eventos envolvidos, que devem ter um alto grau de semelhança. Outra possibilidade é que os eventos envolvidos para os casos em (a) e (b) são todos de movimento, e assim caem sob um mesmo evento “guarda-chuva” de movimento, o que não é caso para os itens em (c). Obviamente, tais explicações são apenas esboços, que precisam ser mais bem desenvolvidas, mas que ilustram alternativas possíveis para essa questão. .

Usando a descrição dos significados contradirecionais que expusemos na seção 1, podemos ver que os verbos do grupo (c) devem ser classificados como expressando o significado responsivo, que se refere a uma ação (ou evento) feita em resposta a uma outra ação prévia. Não estamos diante de eventos que se desenvolvem no espaço, mas sim num ambiente mais abstrato que envolve eventos e uma certa direcionalidade na relação entre os participantes desses eventos. Assim, se João transfere dinheiro de volta para Pedro, é porque Pedro primeiro transferiu dinheiro para João, ou seja, de Pedro para João e depois de João para Pedro - é sobre essa direcionalidade que ‘de volta’ opera quando combinado com verbos do conjunto (c), e podemos falar aqui, grosso modo, de ações que se dão em direções opostas. Considerando que “Pedro transfere dinheiro para João” tem a trajetória pTPJ, e que “João transfere dinheiro de volta para Pedro” tem a trajetória pTJP, o resultado é pTJP(1)=pTPJ(0) - mobilizando a ideia de (contra)direcionalidade para eventos, conseguimos manter um mesmo significado básico para ‘de volta’ e explicar os casos apresentados.

Contudo, diferentemente do que afirmam Zwarts e Basso (2016)ZWARTS, J.; BASSO, R. M. Counterdirectionality crosslinguistically: comparing Brazilian Portuguese and Dutch. Revista da ABRALIN, [s. l.], v.1, p.19-44, 2016., os exemplos abaixo, em (d), mostram que ‘de volta’ expressa também o significado contradirecional restitutivo:

(d) pegar, pedir, pagar, dar, mudar, enfiar, atrair, colocar

Considere a sentença (14), abaixo:

  • (14)

    João1 pegou seu1 livro de volta.

Para entendermos (14), não é o caso pensarmos numa trajetória espacial (como num significado retornativo) nem num evento de “reposta” (como num significado responsivo) - para João pegar seu livro de volta basta que o livro não esteja com João. Assim que João pegar o livro de volta, o estado de “João estar com seu livro” será restituído, conforme descrevemos ser o funcionamento desse significado contradirecional. Em outras palavras, voltamos a um estado anterior - considere o momento t0 em que João tem seu livro (JL) e considere o momento posterior t1 em que João não tem seu livro (J~L); o que ‘de volta’ faz é indicar que o estado t0 é novamente o caso, ou seja, indica que “percorremos” de volta uma rota de estados indo de t1(J~L) para t0(JL). Tomando t0 como o início de uma trajetória pJL e t1 como seu fim, a trajetória com ‘de volta’, pJLV, terá como característica pJLV(1) = pJL(0), ou seja, ao final de pJLV João terá seu livro de volta, como era em t0.

Uma descrição semelhante vale para ‘atrair de volta’, ‘colocar de volta’, ‘mudar de volta’ etc. - em todos esses casos, o resultado é a restituição de um estado anterior/ prévio, mas sem envolver trajetória espacial ou uma “resposta” a um evento prévio. Verbos como ‘pagar’ e ‘dar’ podem ter tanto interpretação responsiva como restitutiva, a depender de informações contextuais. Contudo, essa fluidez de significados não deve ser vista como um problema: nossa análise de ‘de volta’ garantirá que ele tem sempre um mesmo significado básico e todas essas possibilidades de interpretação estão dentro do domínio contradirecional.

A literatura em semântica reconhece a tempos a ambiguidade que existe entre os itens que expressam o significado restitutivo e o significado repetitivo (cf. DOWTY, 1979DOWTY, D. Montague grammar and word meaning. Dordrecht: Reidel, 1979.; KLEIN, 2001KLEIN, W. Time and again. In: FERY, C.; STERNEFELD, W. (ed.). Audiatur vox sapientiae: a festschrift for Arnim von Stechow. Berlin: Akademie-Verlag, 2001. p.267-286., entre vários outros). De fato, um item como ‘de novo’ no PB apresenta tal ambiguidade, como podemos ver no exemplo abaixo:

  • (15)

    A porta abriu de novo.

Com (15), podemos ter a leitura de que a porta novamente se abriu (repetição de evento), ou de que a porta está novamente aberta (restituição de estado). Dado que ‘de volta’ tem interpretação restitutiva, e dado a íntima relação entre esses dois significados, podemos nos perguntar se ‘de volta’ tem também interpretação de repetição. A resposta é positiva, ainda que esse significado talvez não seja o mais comum para ‘de volta’. Considere-se o exemplo abaixo:

  • (16)

    O exercício tá todo errado! Faz de volta!

A interpretação mais usual para (16) é a de repetição, segundo a qual o exercício deve ser feito novamente - note que não há trajetória espacial, resposta ou mesmo restituição de estado anterior, mas simplesmente repetição de evento. Sempre que há restituiçãorepetição, e nesse sentido uma repetição envolve a ideia de algo irá começar novamente, e para começar novamente, devemos retornar ao início de uma trajetória, seja ela no domínio espacial ou no domínio dos eventos, o que coloca a repetição dentro domínio da contradirecionalidade.

Finalmente, para encerrarmos essa descrição preliminar dos dados, há ainda três casos interessantes que devemos considerar, são eles: ‘estar de volta’, ‘ter de volta’ e ‘querer de volta’. Considere as sentenças abaixo, retiradas de canções brasileiras populares:

  • (17)

    Estou de volta pro meu aconchego… (Dominguinhos, “De volta pro aconchego”)

  • (18)

    … quem me dera ao menos uma vez ter de volta todo o ouro… (Legião Urbana, “índios”)

A sentença (17), e obviamente variações com a estrutura ‘estar de volta’, envolve trajetória espacial e pode ser agrupada com os exemplos em (a). A peculiaridade de (17) é que ela envolve o alcance de um ALVO de um verbo de movimento que não é pronunciado - não sabemos qual foi a trajetória p original nem como a trajetória de volta, pV, foi percorrida, mas sabemos que (17) expressa que pV(1)=p(0)13 13 Há uma série de usos e extensões metafóricas aqui, e provavelmente em outros casos com ‘estar de volta’, que envolvem a pessoa retornar à sua casa, sua origem, suas raízes, etc., que nem sempre são espaciais, mas ainda assim envolvem uma ideia de percurso ou jornada, que pode ser subsumida no que chamamos de trajetória. Uma definição mais clara e precisa desses casos é certamente interessante, mas nos levaria para muito longe da tarefa de fornecer uma descrição abrangente para ‘de volta’ e seus usos contradirecionais. .

Por sua vez, a construção ‘ter de volta’, em (18) e em demais estruturas, tem uma interpretação próxima ao que vimos para os casos em (d), ou seja, temos aqui um significado contradirecional restitutivo - ‘ter de volta’ é restaurar um estado anterior, que pode envolver ou não algum tipo de posse (cf., ‘ter de volta minha poupança’ vs. ‘ter de volta toda a minha paz’).

Para o caso de ‘querer de volta’, a análise que propomos para essa estrutura é que ela traz um verbo elidido, que pode pertencer a qualquer uma das classes que distinguimos acima, e por isso não podemos analisar somente ‘querer de volta’:

  • (19)

    querer ir de volta - retornativo/repetitivo

  • (20)

    querer chutar de volta - responsivo

  • (21)

    querer ter de volta - restitutivo

  • (22)

    querer fazer de volta - repetitivo

Como resumo dessa análise descritiva, podemos dizer que ‘de volta’ tem usos retornativos, responsivos, restitutivos e, talvez menos comumente, repetitivos, cobrindo uma grande quantidade das possibilidades do domínio contradirecional que mostramos acima. Além disso, ‘de volta’ pressupõe eventos semelhantes àqueles com os quais se combina14 14 O mesmo vale, como dissemos, para os casos de ‘de volta’ combinados com nomes. que ocorrem em momentos anteriores. Um outro componente importante e ao qual já aludimos é o fato de ‘de volta’ falar de eventos que se dão em direção contrária ao evento pressuposto, e, para podermos capturar todos os seus usos, devemos definir o que temos que entender por “direção contrária” ou “reversa”.

Lidamos com esse tópico na próxima seção, com o objetivo de oferecer uma descrição semântica para ‘de volta’.

Uma análise semântica para ‘de volta’

A formalização que usaremos para descrever o significado de ‘de volta’ envolve a noção de trajetória, a ideia de contrário (aplicado a trajetória) e certas pressuposições. Portanto, talvez o primeiro ponto sobre o qual precisamos nos deter seja justamente uma teoria sobre trajetória.

Em seu influente trabalho, Zwarts (2005)ZWARTS, J. Prepositional aspect and the algebra of paths. Linguistics and Philosophy, Dordrecht, n.28, n.6, p.739-779, 2005., com base em noções advindas da “teoria de vetores espaciais”15 15 A teoria dos vetores espaciais é uma abordagem proposta para lidar com a semântica de expressões espaciais locativas simples e modificadas por sintagmas de medida, como ‘3 metros atrás da casa’. Muitas das noções da proposta teórica que apresentamos aqui são oriundas da VSS e, portanto, têm com ela uma série de relações. (VSS, na sigla em inglês; cf., ZWARTS, 1997ZWARTS, J. Vector as relative positions: a compositional semantics of modified PPs. Journal of Semantics, Oxford, n.14, p.57-86, 1997.; ZWARTS; WINTER, 2000ZWARTS, J.; WINTER, Y. Vector space semantics: a model-theoretic analysis of locative prepositions. Journal of Logic, Language and Information, Dordrecht, n.9, p.169-211, 2000.), assume que uma trajetória é uma sequência ordenada de pontos espaciais, que pode ser capturada formalmente como uma função contínua, no intervalo dos números reais, entre [0,1]; o ponto inicial de uma trajetória p é formalizado como p(0) e o ponto final como p(1), e quaisquer pontos entre 0 e 1 são partes intermediárias da trajetória. Assim como o conjunto de pontos mobilizado para lidar com preposições locativas na VSS, as trajetórias p fazem parte do domínio espacial P, ao lado do domínio E (para indivíduos e eventos16 16 Trata-se de uma simplificação ontológica considerar eventos e indivíduos num mesmo domínio. Uma ontologia mais rica, contudo, é perfeitamente compatível com a análise que oferecemos aqui. ) e T (para valores de verdade). A denotação de preposições direcionais, como ‘para o parque’, ‘pelo hospital’ e ‘do trabalho’, são conjuntos específicos de trajetórias.

Para relacionar trajetórias aos eventos de movimentos, Zwarts (2005)ZWARTS, J. Prepositional aspect and the algebra of paths. Linguistics and Philosophy, Dordrecht, n.28, n.6, p.739-779, 2005., em consonância com ideias de Verkuyl (1993)VERKUYL, H. A Theory of Aspectuality: the interaction between temporal and atemporal structure. Cambridge: Cambridge University Press, 1993. e Krifka (1998)KRIFKA, M. The origins of telicity. In: ROTHSTEIN, S. (ed.). Events and grammar. Dordrecht: Kluwer, 1998. p.197-235., entre outros, postula a função temática TRACE - se e é um evento e p uma trajetória, TRACE(e) relaciona o desenvolvimento do evento e à trajetória p (que é denotação do PP direcional). Esquematicamente, temos o seguinte (ZWARTS, 2005ZWARTS, J. Prepositional aspect and the algebra of paths. Linguistics and Philosophy, Dordrecht, n.28, n.6, p.739-779, 2005., p.17):

  • (23)

    [[V PP]] = {e ∈ [[V]]: TRACE(e) ∈ [[PP]]}

Além disso, como defende Zwarts (2008)ZWARTS, J. Aspects of a typology of direction. In: ROTHSTEIN, S. (ed.). Theoretical and crosslinguistic approaches to the semantics of aspect. Amsterdam: John Benjamins, 2008. p.79-106., há diversos tipos de trajetórias que podem ser tomadas como a denotação de sintagmas preposicionais direcionais, e suas propriedades têm reflexos em características aspectuais de predicados verbais. Não entraremos, contudo, nessas discussões pois precisamos apenas de uma definição de trajetória e de como relacioná-la com predicados verbais, como em (23). Como pode ser notado, na seção acima, já utilizamos um pouco dessa formalização que aqui foi apenas explicitada.

Considerando que ‘de volta’ indica direção contrária no domínio espacial e eventivo, o próximo passo na descrição dessa construção é explorar o que devemos entender por “contrário” ou “reverso”. Estamos diante do que Zwarts (2019ZWARTS, J. From ‘back’ to ‘again’ in Dutch: the structure of the ‘re’ domain. Journal of Semantics, Oxford, v.36, n.2, p.211-240, 2019., p. 224) chama de relação REVERSE, e define como adaptamos abaixo:

  • (24)

    para quaisquer duas trajetórias p e p’, REVERSE(p, p’) se somente se

    1. p(0)=p’(1); e

    2. há um ponto j ∈ (0,1] e um ponto i ∈ [0,1) tal que p(j)=p’(i)

Já vimos, ainda que informalmente, a primeira das condições na seção acima, e ela garante que uma trajetória reversa (i.e., que se dê ao contrário de uma trajetória prévia) deve terminar onde a trajetória original se inicia. Por sua vez, o ponto (ii) demanda que haja um outro ponto j não-inicial em p que coincida com algum outro ponto não-final em p’ - isso garante, por exemplo, a leitura de “looping”, em que alguém refaz um percurso (p(0)=p’(1) e p(1)=p’(0)), e também que as trajetórias não sejam necessariamente idênticas17 17 Conforme nota Zwarts (2019, p.223-224), em uma sentença como “João saiu de São Paulo, mas veio de volta para Porto Alegre” o ponto inicial da trajetória para São Paulo não precisa ser Porto Alegre, que é o ponto final da trajetória da volta. Mas, em casos como esse, podemos assumir que algum elemento contextual irá fornecer a informação de que a trajetória relevante tem, de fato, início em Porto Alegre. .

Como podemos notar, de posse de uma teoria sobre trajetórias, podemos defini-las bem como definir operações sobre elas, e foi o que fizemos até aqui. Devemos agora tratar das pressuposições associadas à expressão ‘de volta’. Para tanto, é preciso também explicitar o tratamento dado aos significados contradirecionais mobilizados. Seguindo o que mobilizamos até aqui, Zwarts (2019ZWARTS, J. From ‘back’ to ‘again’ in Dutch: the structure of the ‘re’ domain. Journal of Semantics, Oxford, v.36, n.2, p.211-240, 2019., p.218) sugere que podemos tratar cada um dos significados vistos na seção 1 como modificadores de eventos:

RETAGUARDA, RETRÓGRADO, … = λEλe [E(e) Λ …(e)…]

“E” representa o conjunto de eventos denotado por um dado predicado verbal e “e” representa um subconjunto desses eventos que tem a propriedade contradirecional selecionada - tudo isso se dá numa representação semântica neo-davidsoniana. Ou seja, cada um dos significados contradirecionais é um modificador que toma eventos e retorna eventos com alguma especificação contradirecional - assim, [[RETAGUARDA]], por exemplo, denota um conjunto de conjuntos de eventos, ao passo que ‘andar’ denota um conjunto de eventos. Se considerarmos ‘de costas’ como uma expressão que “atualiza” retarguarda, a expressão ‘andar de costas’ denota o conjunto de eventos de andar em sentido contrário ao usual, com as costas “indo na frente”.

Usando as ferramentas da VSS, como os eixos axiais e a função FRONT, que opera sobre um vetor ligado ao movimento (concreto ou abstrato) relacionado ao verbo, aliados a uma função de direção DIR(e,t), como abaixo, mais algumas assunções básicas da semântica de eventos, é possível definir em (25), em princípio, o significado de RETAGUARDA, como em (26) (cf. ZWARTS, 2019ZWARTS, J. From ‘back’ to ‘again’ in Dutch: the structure of the ‘re’ domain. Journal of Semantics, Oxford, v.36, n.2, p.211-240, 2019., p. 221):

  • (25)

    ∀t [t ∈ φ) → -FRONT(TEMA(e), t) = DIR(e, t)]

  • (26)

    RETAGUARDA = λEλe [E(e) Λ ∀t [t ∈ τ(e)) → -FRONT(TEMA(e), t) = DIR(e, t)]]

Com (25), temos que o desenrolar de um evento e (τ(e)) se dá com o TEMA do evento tendo as costas à frente (-FRONT(TEMA(e), t)), “guiando” a direcionalidade do evento (DIR(e, t))18 18 Para aplicar “FRONT” ao TEMA, é preciso primeiramente considerar as coordenas espaciais do TEMA numa semântica de vetores, por exemplo, pois “FRONT”, sendo uma função espacial, pode aplicar-se somente a vetores ou a pontos do domínio P Tais operações são previstas na VSS e compatíveis com a análise aqui desenvolvida. De modo semelhantes, podemos dizer que a direção do evento e é determinada por um vetor que relaciona o desenrolar desse evento com um tempo; no caso, o vetor se caracteriza por ter como início “as costas” (i.e., “-FRONT”). .

Juntando as peças, e ignorando o tempo, a sentença (27) é analisada com em (27’):

  • (27)

    João andou de costas.

(27’) [[João andou]] = ∃(e)[ANDAR(e) Λ TEMA (e, joão)]19 19 O fechamento existencial se deve ao morfema temporal do verbo; novamente, uma assunção comum da semântica de eventos que não tem relação direta com nosso tema.

[[de costas]] = λEλe [E(e) Λ ∀t [t ∈ τ(e)) → -FRONT(TEMA(e), t) = DIR(e, t)]]

[[de costas]]([[João andou]]) =

λEλe [E(e) Λ ∀t [t ∈ τ(e)) → -FRONT(TEMA(e), t) = DIR(e, t)]](∃(e)[ANDAR(e) Λ TEMA (e, joão)]) =

∃(e)[ANDAR(e) Λ TEMA (e, joão) Λ ∀t [t ∈ τ(e)) → -FRONT(TEMA(e), t) = DIR(e, t)]]

(em prosa: há um evento de andar, cujo tema é João, e durante o desenrolar desse evento, sua direção está orientada para as costas do seu tema).

Ao considerar o significado retornativo, Zwarts (2019ZWARTS, J. From ‘back’ to ‘again’ in Dutch: the structure of the ‘re’ domain. Journal of Semantics, Oxford, v.36, n.2, p.211-240, 2019., p.223-224) propõe a seguinte caracterização (abaixo mostramos uma versão adaptada):

RETORNATIVO = λEλe: ∃e’[e’ < e Λ E’(e’) Λ REVERSE(LPATH(e), LPATH(e’))]. [E(e)]

Na fórmula acima, o trecho entre os dois pontos e o ponto final é pressuposto, e, como podemos ver, há três informações pressupostas, que explicitamos a seguir:

∃e’[e’ < e = esta primeira parte fala da existência de um evento e’ que é anterior ao evento e sobre o qual se asserta20 20 Usamos aqui “assertar” em oposição a “pressupor”. na fórmula;

E’(e’) = esta linha afirma que o evento e’ é o do tipo E’; trata-se de dizer que os eventos e e e’ são próximos ou semelhantes. Isso é importante para dar conta de casos como (10), em que precisamos de eventos que envolvem movimento sem serem necessariamente idênticos, e (13) em que precisamos de eventos mais semelhantes, como eventos que sejam identificados como “escrever”;

REVERSE(LPATH(e), LPATH(e’)) = esta linha garante que o evento assertado se dá ao contrário daquele pressuposto, como o que vimos em (24). Além disso, “LPATH” indica explícitamente que se trata de uma trajetória espacial - voltaremos a esse ponto adiante.

Finalmente, a parte da asserção simplesmente traz a existência de um evento e que tem a propriedade de ser retornativo.

Usando a fórmula sugerida, analisemos o seguinte exemplo:

  • (28)

    João dirigiu de volta.

(28’) [[João dirigiu]] = ∃(e)[DIRIGIR(e) Λ AGENTE(e, joão)]

[[de volta]] = λEλe: ∃e’[e’ < e Λ E’(e’) Λ REVERSE(LPATH(e), LPATH(e’))].[E(e)] [[de volta]]([[João dirigiu]]) =

λEλe: ∃e’[e’ < e Λ E’(e’) Λ REVERSE(LPATH(e), LPATH(e’))]. (∃(e)[DIRIGIR(e) Λ AGENTE(e, joão)])

∃(e). ∃e’[e’ < e Λ movimento21 21 Aqui e nos outros exemplos de derivação, deixaremos o evento em minúsculo para representar que se trata de um evento pressuposto cujas especificidades só serão contextualmente resolvidas. ’(e’) Λ REVERSE(LPATH(e), LPATH(e’))]. [DIRIGIR(e) Λ AGENTE(e, joão)])

(em prosa: existe um evento e, e existe um evento pressuposto e’ anterior semelhante a e que se dá direção contrária de e e é um evento de dirigir cujo agente é João)

Ademais, podemos testar a existência do conteúdo pressuposicional através do teste conhecido como “p-família” (cf., CHIERHIA, 2003CHIERHIA, G. Semântica. Campinas: Ed. da Unicamp; Londrina: Eduel, 2003., p.186), ou seja, se A pressupõe B, então (i) uma interrogação feita com A pressupõe B, (ii) a negação de A pressupõe B, e (iii) uma sentença condicional que A em seu antecedente pressupõe B. Tomando a sentença (29) como A, e (29a) como o pressuposto B, podemos ver que (29b), (29c) e (29d) pressupõe B assim como (29):

  • (29)

    João caminhou de volta.

  • (29a)

    Houve um evento anterior de deslocamento de João, que pode ter ou não ter sido uma caminhada, e que se deu numa certa direção.

  • (29b)

    João caminhou de volta?

  • (29c)

    João não caminhou de volta.

  • (29d)

    Se João caminhou de volta, então não veio ninguém com ele.

Propomos que essa análise dá conta dos casos nominais que vimos na seção anterior, bem como dos verbos em (a) e (b) - obviamente, com os devidos ajustes, mas em todos os casos, temos uma trajetória espacial envolvida.

Ao passarmos para os casos em (c) apresentados na seção “‘de volta’ e seu significado”, notamos que não temos mais uma trajetória espacial, mas sim dois eventos relacionados de modo que um se dá como resposta e em direção contrária a um evento prévio; trata-se do significado responsivo. Para capturar essa diferença, e manter a mesma denotação de ‘de volta’ que usamos no exemplo (28’), Zwarts (2019ZWARTS, J. From ‘back’ to ‘again’ in Dutch: the structure of the ‘re’ domain. Journal of Semantics, Oxford, v.36, n.2, p.211-240, 2019., p.225) sugere que o que se altera são os tipos de trajetória relacionados por REVERSE, que agora não mais se dão no espaço (i.e., LPATH) mas sim no domínio dos eventos, ou seja, teríamos aqui APATH (“A” para ‘action’, ação). A fórmula oferecida pelo autor é a seguinte:

RESPONSIVO = λEλe: ∃e’[e’ < e Λ E’(e’) Λ REVERSE(APATH(e), APATH(e’))]. [E(e)]

Tal estratégia, ainda que certamente bastante simplificada, dá conta da intuição de que mudamos do domínio espacial para o dos eventos, e por isso temos um tipo diferente de trajetória para esses casos, mas com ‘de volta’ desempenhando o mesmo papel. Vejamos a análise do exemplo a seguir:

  • (30)

    Pedro telefonou de volta para a Maria.

(30’) [[Pedro telefonou para a Maria]] = ∃(e)[TELEFONAR(e) Λ AGENTE(e, pedro) Λ TEMA(e, maria)]

[[de volta]] = λEλe: ∃e’[e’ < e Λ E’(e’) Λ REVERSE(APATH(e), APATH(e’))]. [E(e)] [[de volta]]([[Pedro telefonou para a Maria]]) =

λEλe: ∃e’[e’ < e Λ E’(e’) Λ REVERSE(APATH(e), APATH(e’))]. (3(e) [TELEFONAR(e) Λ AGENTE(e, pedro) Λ TEMA(e, maria)])

∃e: ∃e’[e’ < e Λ telefonar’(e’) Λ REVERSE(APATH(e), APATH(e’))]. [TELEFONAR(e) Λ AGENTE(e, pedro) Λ TEMA(e, maria)])

(em prosa: existe um evento e, e existe um evento pressuposto e’ anterior semelhante a e que se dá direção contrária de e, ou seja, trata-se de um evento de telefonar que “parte” de Maria e “chega” em Pedro, e e é um evento de telefone que “parte” de Pedro e “chega” em Maria)22 22 Poderíamos, por exemplo, sugerir que os papeis temáticos de AGENTE e TEMA estão sistematicamente associados ao que chamamos de início (“partir”) e fim (“chegar”) das trajetórias abstratas presentes aqui. Contudo, tal afirmação, ainda que razoável, carece de uma investigação mais aprofundada que não faremos aqui.

Como apontado na seção anterior, a principal diferença entre casos como (28) e (30) é que os eventos relacionados em (30) devem ter um grau maior de semelhança, e por isso o evento pressuposto em (30) deve poder também ser classificado como “telefonar”.

Uma estratégia semelhante pode ser usada para tratarmos do significado restitutivo, ou seja, devemos novamente pensar em qual domínio se encontram as trajetórias relevantes. Para esse caso, sugeriremos um domínio de estado-de-coisas, e que as trajetórias desse domínio sejam denominadas EPATH, seguindo a descrição que fizemos para esses casos anteriormente. Assim, definimos o significado restitutivo, simplesmente, como23 23 Essa não é, por exemplo, a saída proposta por Zwarts (2019) nem por Beck e Gergel (2015) para lidar com o sentido restitutivo; esses pesquisadores propõem lidar com escalas e eventos escalares. Aqui, optamos por lidar com estados-de-coisa pois nem todo sentido restitutivo está combinado com predicados (verbais) escalares; nosso exemplo (31) mostra isso. :

RESTITUTIVO = λEλe: ∃e’[e’ < e Λ E’(e’) Λ REVERSE(EPATH(e), EPATH(e’))]. [E(e)]

O que está em jogo aqui é retornar a um estado-de-coisas anterior, mas a análise é um pouco mais complexa, pois é necessário relacionar o evento realizado com o estado-de-coisas que ele restaura, e é justamente esse o papel que atribuímos a EPATH. Tomemos o exemplo a seguir:

  • (31)

    Maria pegou seu livro de volta.

A interpretação que buscamos aqui é algo como: Maria pegar seu livro de volta restaura o estado-de-coisas de Maria estar com seu livro. Intuitivamente, (31) pressupõe: (i) o livro já esteve com a Maria e (ii) o livro não está (mais) com a Maria. Ao proferir (31), afirma-se que o livro está com a Maria novamente, restabelecendo um estado anterior. O evento e’ pressuposto é um evento de posse24 24 Uma alternativa seria considerar estados separados de eventos na ontologia, e assim ao invés de falar em “evento de posse”, poderíamos falar em “posse” ou “estado de posse”. Novamente, essa distinção ontológica não é contrária à nossa análise, pois ‘de volta’ teria o mesmo papel, porém, segundo esta alternativa, teríamos uma trajetória percorrida num domínio de eventos. Nossa opção aqui, contudo, é continuar a falar somente em eventos para ressaltar a semântica de ‘de volta’ sem uma exploração mais aprofundada de questões ontológicas. , cujo EPATH consiste em:

EPATH(e’) = p(0)ter_o_livro / p(1)não_ter_o_livro

Em outras palavras, seu começo é ter posse do livro, e seu final é não ter mais posse do livro. Como nos outros casos, REVERSE resulta num EPATH para e que é o contrário do EPATH para e’:

EPATH(e) = p(0)não_ter_o_livro / p(1)ter_o_livro

Conforme a paráfrase intuitiva dada acima sugere, ao proferir (31) num contexto feliz, o EPATH do evento e’ pressuposto foi “percorrido”, ou seja, Maria não tem mais o livro; por sua vez, a asserção de (31) envolve um evento e, similar ao pressuposto, cuja trajetória se dá em direção contrária ao evento pressuposto e’, ou seja, ao final do EPATH de e Maria tem o livro.

(31’) [[Maria pegou seu livro]] = ∃(e)[PEGAR(e) Λ AGENTE(e, maria) Λ TEMA(e, livro_da_maria)]

[[de volta]] = λEλe: ∃e’[e’ < e Λ E’(e’) Λ REVERSE(EPATH(e), EPATH(e’))]. [E(e)] [[de volta]]([[Maria pegou seu livro]]) =

λEλe: ∃e’[e’ < e Λ ter_o_livro’(e’) Λ REVERSE(EPATH(e), EPATH(e’))]. (3(e) [PEGAR(e) Λ AGENTE(e, maria) Λ TEMA(e, livro_da_maria)])

O papel de ‘de volta’, mais uma vez, é o mesmo, o que vai mudar, como nos outros casos, é o domínio em que se desenrolam as trajetórias envolvidas - agora em um domínio mais conceituai, mais abstrato.

O último caso que devemos investigar é aquele em que ‘de volta’ pode ser usado para expressar o significado repetitivo, que é sempre muito próximo do restitutivo. Como mencionamos, esse provavelmente não é o significado contradirecional mais usualmente associado à expressão ‘de volta’, mas sua existência pode ser também entendida nos mesmos moldes que vimos acima; seguindo uma sugestão de Zwarts (2019ZWARTS, J. From ‘back’ to ‘again’ in Dutch: the structure of the ‘re’ domain. Journal of Semantics, Oxford, v.36, n.2, p.211-240, 2019., p.226-227), podemos representar o significado repetitivo, como:

REPETITIVO = λEλe: ∃e’[e’ < e Λ E’(e’)]. [E(e)]

A ênfase não é mais no estado-de-coisas que um dado evento traz à tona, mas sim a realização de um dado evento que pressupõe a existência de um evento similar prévio. Nesse caso, já não há mais trajetórias envolvidas, mas ainda assim devemos considerar que o significado repetitivo faz parte do domínio contradirecional pois, em várias línguas os itens que expressam o significado repetitivo expressam também vários dos outros significados desse domínio. Ainda assim, é possível conceber que refazer um evento significa voltar ao início de um dado processo e começá-lo novamente, ou seja, há, ainda que de um modo mais distante, um caminho sendo percorrido ao contrário na concepção de fazer de novo, refazer ou ainda recomeçar. Em nossa análise, repetir um evento impõe menos restrições do que, por exemplo, retornar um evento de movimento, responder a um evento que não envolve necessariamente movimento espacial, ou mesmo restabelecer um estado.

Diante do exposto, podemos retomar o esquema para o PB proposto por Zwarts e Basso (2016)ZWARTS, J.; BASSO, R. M. Counterdirectionality crosslinguistically: comparing Brazilian Portuguese and Dutch. Revista da ABRALIN, [s. l.], v.1, p.19-44, 2016., e refazê-lo como abaixo, em que os significados retornativo, responsivo, restitutivo e repetitivo podem ser expressos por ‘de volta’:

Ilustração 5
Lexicalização dos significados contradirecionais no PB

Com relação à análise semântica, podemos oferecer uma única análise para os significados retornativo, responsivo e restitutivo abstraindo os diferentes tipos de trajetória envolvidos na relação pressuposto REVERSE, notada somente como PATH, chegando à seguinte estrutura:

[[de volta]] = λEλe: ∃e’[e’ < e Λ E’(e’) Λ REVERSE(PATH(e), PATH(e’))]. [E(e)]

Nos três usos, ‘de volta’ é um modificador de eventos que carrega pressuposições específicas relacionando o evento pressuposto e o assertado, de modo que a trajetória de um deles, em algum domínio conceituai, ocorre no sentido reverso da trajetória do outro.

A interpretação repetitiva, por sua vez, de modo simplificado, é uma extensão metafórica que “apaga” a necessidade de relacionar trajetórias diferentes de dois eventos, mas mantém o restante das pressuposições. Num certo sentido, um evento de repetição é um tipo menos restrito de evento retornativo, no qual a restrição de reversão de trajetória não é observada.

Passemos às conclusões e aos problemas em aberto.

Conclusão

Neste artigo, lidamos com a interpretação semântica da expressão ‘de volta’ no português brasileiro. Oferecemos uma análise desse item dentro da semântica de eventos das línguas naturais, que situa ‘de volta’ como um tipo particular de modificador de evento - um modificador contradirecional. Dentre as seis possibilidades de modificação contradirecional que expusemos, ‘de volta’ pode realizar quatro delas. Propusemos que três (retornativo, responsivo e restitutivo) dos significados contradirecionais de ‘de volta’ estão relacionados de forma próxima, e que o significado repetitivo é uma versão com menos restrições desses significados.

Nossa análise unifica diversos significados aparentemente diferentes de forma clara e orgânica, sem lançar mão de noções ad hoc, mobilizando conceitos e ideias independentemente motivadas. Chegamos assim a uma descrição formal simples e compositional, dentro dos moldes da semântica formal, de uma estrutura bastante comum do português brasileiro. Além disso, nossa análise pode ser vista como um argumento a favor da ideia de que os domínios espaciais, eventivos e de estados-de-coisas estão ligados por relações como, por exemplo, metáforas e analogias, e assim um mesmo item pode atuar em “camadas” diferentes da hierarquia espaço < tempo/ evento < estados-de-coisas/situação.

Entre os problemas em aberto, podemos mencionar que seria interessante explorar as condições que permitem a leitura repetitiva de ‘de volta’ e quais são as relações entre essa expressão e os usos contradirecionais do verbo ‘voltar’, bem como explorar possíveis diferenças de interpretação relacionadas à posição sintática de ‘de volta’. São temas que certamente merecem uma investigação futura.

  • 1
    Este artigo é resultado de pesquisa realizada na Universidade de Utrecht, entre julho e dezembro de 2018, sob supervisão do Prof. Joost Zwarts.
  • 2
    Não entraremos na complexa questão filosófica de definir o que são “estados-de-coisas” neste artigo. Mas é interessante notar, como veremos mais adiante, que podemos tomar “estados-de-coisas” como uma organização específica de particulares e universais que tornam verdadeiras as sentenças de uma língua, segundo uma perspectiva de verdade por correspondência. Como esperamos que fique claro, os detalhes filosóficos, por mais importantes que sejam, não terão impacto em nossa análise semântica.
  • 3
    Argumentamos, ao longo deste texto, que “movimento” deve ser entendido não somente como movimento espacial, mas também movimento em domínios mais abstratos como eventos e estados-de-coisas. É também por essa generalidade que o domínio contradirecional é interessante.
  • 4
    Back, em inglês, tem origem na palavra que se refere às costas, assim como ‘rug’ (que aparece em ‘terug’) e ‘achter’ do holandês, que se referem às costas, ou à parte de trás de algo.
  • 5
    A oposição com ‘ida’ fica clara também quando consideramos que podemos trocar ‘de volta’ por ‘da volta’ nos exemplos de (7) a (9).
  • 6
    Certamente uma análise mais aprofundada cabe aqui, até pelo fato de que diferentes nominalizações podem levar a diferentes significados contradirecionais. Por exemplo, ‘jogo de volta’ é responsivo, mas ‘nado de volta’ pode ser retornativo. Seja como for, nos interessa aqui apenas notar que há sempre um evento envolvido nessas interpretações.
  • 7
    Considere um caso em que João foi do ponto A (inicial) ao ponto B (final), passando pelo ponto C, no meio dos dois outros pontos. Suponha agora que ele tenha que ir ao ponto C; mesmo que possamos dizer que João voltou ao ponto C a partir de B, não seria adequado dizer que ele fez uma trajetória ‘de volta’. Note a diferença entre (a) ‘João fez o caminho de volta’ e (b) ‘João fez o caminho de volta até C’. Na situação descrita, somente (b) seria aceitável, e isso se dá porque uma trajetória ‘de volta’ considera o ponto de partida fornecido (ou contextualmente recuperado). Para que esse não seja o caso, é preciso dizer explícitamente qual o novo ponto a ser então considerado.
  • 8
    Há várias outras maneiras de caracterizar os verbos em (a) e (b), como dizer que os em (a) são do tipo PATH-ROUTE, e os em (b) do tipo GOAL. Notamos que essas classificações são ortogonais, e compatíveis, com nossa análise do componente contradirecional.
  • 9
    Obviamente, verbos como ‘jogar’ têm interpretações não-espaciais, como em “João jogou o argumento de volta para o Pedro”, mas esses casos podem ser interpretados como extensões metafóricas, do domínio espacial para o domínio eventivo ou argumentativo, e seriam assim, como veremos abaixo, casos de sentidos responsivos. Pensamos aqui, contudo, em casos espaciais apenas para salientar justamente que a interpretação espacial pode ser usada, via analogia, em outros domínios (cf. PONTES, 1992PONTES, E. Espaço-Tempo na língua portuguesa. São Paulo: Pontes, 1992.; TALMY, 2000TALMY, L. Toward a cognitive semantics. Cambridge: MIT Press, 2000.; JACKENDOFF, 1983JACKENDOFF, R. Semantics and cognition. Cambridge: MIT Press, 1983., 1996JACKENDOFF, R. The architecture of the linguistic-spatial interface. In: BLOOM, P.; PETERSON, M. A.; NADEL, L.; GARRETT, M. F. (org.). Language and space. Cambridge: MIT Press, 1996. p.1-30., entre vários outros). Seja como for, em todos os casos, conforme argumentaremos, o papel de ‘de volta’ será sempre o mesmo.
  • 10
    Alguns verbos, como ‘rastejar’, ‘embarcar’, ‘cair’, podem ter também interpretações restitutivas e repetitivas, algo esperado dado que todos esses significados são instanciações do domínio contradirecional, e, como argumentaremos, podem ser expressos por ‘de volta’.
  • 11
    É importante falar em “semelhança” e não em “identidade”, porque Maria pode ter deixado um bilhete em papel para o João, e ele pode ter escrito de volta para ela um e-mail, por exemplo, mas os dois casos são caracterizados como eventos de “escrita”. Como notou um parecerista anônimo, a quem agradecemos pela observação, pode ser possível aceitar casos como o de (13a); a razão para tanto é provavelmente porque consideramos, ainda que diferentes, que os eventos descritos fazem parte de uma todo composto por eventos com “direções” diferentes. Assim, se estivermos considerando uma mesma conversa entre João e Maria, podemos aceitar que uma dos eventos seja via telefone e o outro via carta, por exemplo.
  • 12
    Uma possível explicação para tanto pode estar no fato de que os casos em (a), (b), e os casos nominais que vimos estão claramente ligados à dimensão espacial, e é uma trajetória espacial (e seu reverso) que garantem o uso de ‘de volta’, mais do que a especificidade do evento realizado. Ao passarmos para o domínio de eventos que não envolvem movimento no espaço, não temos mais uma trajetória espacial “concreta” para assegurar a semelhança entre as trajetórias envolvidas, e assim tal semelhança deve ser garantida também pelos tipos de eventos envolvidos, que devem ter um alto grau de semelhança. Outra possibilidade é que os eventos envolvidos para os casos em (a) e (b) são todos de movimento, e assim caem sob um mesmo evento “guarda-chuva” de movimento, o que não é caso para os itens em (c). Obviamente, tais explicações são apenas esboços, que precisam ser mais bem desenvolvidas, mas que ilustram alternativas possíveis para essa questão.
  • 13
    Há uma série de usos e extensões metafóricas aqui, e provavelmente em outros casos com ‘estar de volta’, que envolvem a pessoa retornar à sua casa, sua origem, suas raízes, etc., que nem sempre são espaciais, mas ainda assim envolvem uma ideia de percurso ou jornada, que pode ser subsumida no que chamamos de trajetória. Uma definição mais clara e precisa desses casos é certamente interessante, mas nos levaria para muito longe da tarefa de fornecer uma descrição abrangente para ‘de volta’ e seus usos contradirecionais.
  • 14
    O mesmo vale, como dissemos, para os casos de ‘de volta’ combinados com nomes.
  • 15
    A teoria dos vetores espaciais é uma abordagem proposta para lidar com a semântica de expressões espaciais locativas simples e modificadas por sintagmas de medida, como ‘3 metros atrás da casa’. Muitas das noções da proposta teórica que apresentamos aqui são oriundas da VSS e, portanto, têm com ela uma série de relações.
  • 16
    Trata-se de uma simplificação ontológica considerar eventos e indivíduos num mesmo domínio. Uma ontologia mais rica, contudo, é perfeitamente compatível com a análise que oferecemos aqui.
  • 17
    Conforme nota Zwarts (2019ZWARTS, J. From ‘back’ to ‘again’ in Dutch: the structure of the ‘re’ domain. Journal of Semantics, Oxford, v.36, n.2, p.211-240, 2019., p.223-224), em uma sentença como “João saiu de São Paulo, mas veio de volta para Porto Alegre” o ponto inicial da trajetória para São Paulo não precisa ser Porto Alegre, que é o ponto final da trajetória da volta. Mas, em casos como esse, podemos assumir que algum elemento contextual irá fornecer a informação de que a trajetória relevante tem, de fato, início em Porto Alegre.
  • 18
    Para aplicar “FRONT” ao TEMA, é preciso primeiramente considerar as coordenas espaciais do TEMA numa semântica de vetores, por exemplo, pois “FRONT”, sendo uma função espacial, pode aplicar-se somente a vetores ou a pontos do domínio P Tais operações são previstas na VSS e compatíveis com a análise aqui desenvolvida. De modo semelhantes, podemos dizer que a direção do evento e é determinada por um vetor que relaciona o desenrolar desse evento com um tempo; no caso, o vetor se caracteriza por ter como início “as costas” (i.e., “-FRONT”).
  • 19
    O fechamento existencial se deve ao morfema temporal do verbo; novamente, uma assunção comum da semântica de eventos que não tem relação direta com nosso tema.
  • 20
    Usamos aqui “assertar” em oposição a “pressupor”.
  • 21
    Aqui e nos outros exemplos de derivação, deixaremos o evento em minúsculo para representar que se trata de um evento pressuposto cujas especificidades só serão contextualmente resolvidas.
  • 22
    Poderíamos, por exemplo, sugerir que os papeis temáticos de AGENTE e TEMA estão sistematicamente associados ao que chamamos de início (“partir”) e fim (“chegar”) das trajetórias abstratas presentes aqui. Contudo, tal afirmação, ainda que razoável, carece de uma investigação mais aprofundada que não faremos aqui.
  • 23
    Essa não é, por exemplo, a saída proposta por Zwarts (2019)ZWARTS, J. From ‘back’ to ‘again’ in Dutch: the structure of the ‘re’ domain. Journal of Semantics, Oxford, v.36, n.2, p.211-240, 2019. nem por Beck e Gergel (2015)BECK, S.; GERGEL, R. The diachronic semantics of English again. Natural Language Semantics, Dordrecht, n.23, n.3, p.157-203, 2015. para lidar com o sentido restitutivo; esses pesquisadores propõem lidar com escalas e eventos escalares. Aqui, optamos por lidar com estados-de-coisa pois nem todo sentido restitutivo está combinado com predicados (verbais) escalares; nosso exemplo (31) mostra isso.
  • 24
    Uma alternativa seria considerar estados separados de eventos na ontologia, e assim ao invés de falar em “evento de posse”, poderíamos falar em “posse” ou “estado de posse”. Novamente, essa distinção ontológica não é contrária à nossa análise, pois ‘de volta’ teria o mesmo papel, porém, segundo esta alternativa, teríamos uma trajetória percorrida num domínio de eventos. Nossa opção aqui, contudo, é continuar a falar somente em eventos para ressaltar a semântica de ‘de volta’ sem uma exploração mais aprofundada de questões ontológicas.

Agradecimento

Esta pesquisa foi financiada pela FAPESP (2017/21110-0).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Set 2019
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2019

Histórico

  • Recebido
    05 Fev 2019
  • Aceito
    31 Mar 2019
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