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Tecnologias em transformação: inovação e (re)produção dos objetos entre os Asurini do Xingu

Changing technologies: innovation and (re)production of objects among the Asurini do Xingu

Resumos

Os significados e as implicações das transformações culturais relacionadas aos processos de permanência e mudança nas tecnologias de produção e uso dos objetos, nos mais diversos contextos sociais, são temas de várias pesquisas nas últimas décadas. Essas pesquisas revelaram que as permanências e mudanças nas tecnologias de produção e no uso dos objetos ocorrem em diferentes escalas ao longo do tempo e resultam de fatores sociais, econômicos, políticos e culturais específicos de cada contexto. Também evidenciaram que o entendimento das transformações nas tecnologias implica a apreensão das condições que levaram à mudança ou, ainda, a análise dos processos de inovação. Este artigo contribui com esse debate, descrevendo e analisando alguns aspectos relacionados à produção e à utilização dos objetos pelos Asurini do Xingu, um povo Tupi que vive às margens do rio Xingu, no estado do Pará. Demonstro como as inovações, nas suas práticas tecnológicas, e as apropriações dos bens ocidentais (objetos e matérias-primas), no período pós-contato, podem ser entendidas como uma possibilidade de expressão estética e criativa e, ainda, como uma forma de ação simbólica, carregada de significado identitário.

Asurini do Xingu; Tecnologias; Inovações artefatuais; Contato


The meanings and implications of cultural transformations related to the processes of continuity and change in production technologies and use of objects, in various social contexts, are the subject of several studies in recent decades. These researches revealed that the continuities and changes in production technologies and use of objects occur at different scales over time and result of social, economic, political and cultural factors specific to the context. They also showed that understanding the transformations in technology means the apprehension of the conditions that led to change, or, the analysis of innovation processes. This article contributes to this debate by describing and analyzing some aspects related to the production and use of objects by Asurini do Xingu, a Tupi people living on the banks of the Xingu River in the state of Pará, Brazil. I demonstrate how innovations, in their technological practices, and appropriations of Western goods (objects and raw materials), during the post-contact period, can be understood as a possibility of aesthetic and creative expression, and as a form of symbolic action loaded with identitarian meanings.

Asurini do Xingu; Technologies; Artifact innovations; Contact


ARTIGOS

Tecnologias em transformação: inovação e (re)produção dos objetos entre os Asurini do Xingu

Changing technologies: innovation and (re)production of objects among the Asurini do Xingu

Fabíola Andréa Silva

Universidade de São Paulo/Museu de Arqueologia e Etnologia. São Paulo, São Paulo, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Fabíola Andréa Silva Universidade de São Paulo Museu de Arqueologia e Etnologia Av. Prof. Almeida Prado, 1466 - Cidade Universitária CEP 05508-070, São Paulo, SP, Brasil faandrea@usp.br

RESUMO

Os significados e as implicações das transformações culturais relacionadas aos processos de permanência e mudança nas tecnologias de produção e uso dos objetos, nos mais diversos contextos sociais, são temas de várias pesquisas nas últimas décadas. Essas pesquisas revelaram que as permanências e mudanças nas tecnologias de produção e no uso dos objetos ocorrem em diferentes escalas ao longo do tempo e resultam de fatores sociais, econômicos, políticos e culturais específicos de cada contexto. Também evidenciaram que o entendimento das transformações nas tecnologias implica a apreensão das condições que levaram à mudança ou, ainda, a análise dos processos de inovação. Este artigo contribui com esse debate, descrevendo e analisando alguns aspectos relacionados à produção e à utilização dos objetos pelos Asurini do Xingu, um povo Tupi que vive às margens do rio Xingu, no estado do Pará. Demonstro como as inovações, nas suas práticas tecnológicas, e as apropriações dos bens ocidentais (objetos e matérias-primas), no período pós-contato, podem ser entendidas como uma possibilidade de expressão estética e criativa e, ainda, como uma forma de ação simbólica, carregada de significado identitário.

Palavras-chave: Asurini do Xingu. Tecnologias. Inovações artefatuais. Contato.

ABSTRACT

The meanings and implications of cultural transformations related to the processes of continuity and change in production technologies and use of objects, in various social contexts, are the subject of several studies in recent decades. These researches revealed that the continuities and changes in production technologies and use of objects occur at different scales over time and result of social, economic, political and cultural factors specific to the context. They also showed that understanding the transformations in technology means the apprehension of the conditions that led to change, or, the analysis of innovation processes. This article contributes to this debate by describing and analyzing some aspects related to the production and use of objects by Asurini do Xingu, a Tupi people living on the banks of the Xingu River in the state of Pará, Brazil. I demonstrate how innovations, in their technological practices, and appropriations of Western goods (objects and raw materials), during the post-contact period, can be understood as a possibility of aesthetic and creative expression, and as a form of symbolic action loaded with identitarian meanings.

Keywords: Asurini do Xingu. Technologies. Artifact innovations. Contact.

INTRODUÇÃO

Os significados e as implicações das transformações culturais relacionadas aos processos de permanência e mudança nas tecnologias de produção e uso dos objetos, nos mais diversos contextos culturais, têm sido temas de várias pesquisas nas últimas décadas. Os principais aspectos investigados são: 1) os procedimentos e as escolhas tecnológicas durante o processo de produção (Schiffer e Skibo, 1987; Lemonnier, 1993; Mayor, 1994; Chilton, 1998; Silva, 2000); 2) os processos de transmissão e aprendizagem de conhecimentos (Gosselain, 2008; Bowser e Patton, 2008; Herbich e Dietler, 2008; Wallaert, 2008; Silva, 2010); 3) a organização social e econômica da produção (Arnold, 1989, 1999; Hardin e Mills, 2000; Degoy, 2008; Silva, 2009b); 4) as causas da padronização e da variação/variabilidade dos objetos (Dietler e Herbich, 1989; Rosenthal, 1995; Pryor e Carr, 1995; Longacre, 1999; Silva, 2009a); 5) os modos e as escalas da produção, consumo e distribuição dos objetos (Appadurai, 1986; Graves, 1991; MacEachern, 1998; Arnold, 1999; Silva, 2009b); 6) as redes sociais e os contatos interculturais e sua relação com a variabilidade, o consumo e a distribuição dos objetos (Gosselain, 1992; Dietler e Herbich, 1998; Mills, 2008; Silva, 2009b). Essas pesquisas revelaram que as permanências e mudanças nas tecnologias de produção e o uso dos objetos ocorrem em diferentes escalas ao longo do tempo e resultam de fatores sociais, econômicos, políticos e culturais específicos de cada contexto. Também evidenciaram que o entendimento das transformações nas tecnologias implica a apreensão das condições que levaram à mudança ou, ainda, a análise dos processos de inovação.

No atual estado da arte, considera-se a inovação tecnológica como um fenômeno que compreende a invenção e a adoção. A invenção refere-se ao evento da descoberta e da criação de coisas supostamente não conhecidas previamente - objetos tidos como originais pelos seus produtores - e resulta na ruptura com o que é usual ou culturalmente definido como 'o modo tradicional de fazer e usar os objetos'. A adoção consiste na aceitação e no uso do que foi inventado e, ainda, na adaptação ou apropriação de alguma coisa pré-existente (objetos e/ou técnicas). A inovação tecnológica, portanto, é um processo cultural que implica a dialética entre o novo e o pré-existente, a reorganização dos elementos presentes na cultura (material) e a continuidade/descontinuidade dos princípios socioculturais da produção, utilização e distribuição dos objetos. Além disso, toda inovação é motivada por escolhas tecnológicas (individuais ou coletivas) que são engendradas no contexto das práticas sociais de produção e reprodução cultural (Bassala, 1988; van der Leeuw e Torrence, 1989; Lemonnier, 1993; Stark et al., 2008).

A tecnologia, entendida como um corpus de comportamentos e conhecimentos empregados pelo homem na transformação e utilização do mundo material e imaterial (Silva, 2000, p. 21; Ingold, 2001a, p. 315), é um constructo social relacionado às práticas e representações sociais. A técnica, por sua vez, pode ser entendida como sendo uma ação humana efetiva, levada a cabo a partir da inter-relação de elementos, como matéria e não matéria, gestos, energia, objetos, conhecimentos e habilidades (Lemonnier, 1992, p. 4-6; Ingold, 2001a, p. 315; 2001b, p. 20-22). Por isso, as técnicas, assim como outros aspectos da atividade social, podem ser vistas como sendo constituídas pelo habitus, que é entendido como "um sistema de disposições duráveis, princípio inconsciente e coletivamente inculcado para a geração e a estruturação de práticas e representações" (Bourdieu, 1977, p. 72). Segundo este autor, as pessoas desenvolvem disposições para agir de certa maneira por meio de ações que são padronizadas, pela influência das estruturas das condições materiais nas quais as pessoas estão inseridas e/ou vivendo. Porém, ao mesmo tempo em que as práticas são condicionadas pelas estruturas, estas são também remodeladas e transformadas pelas práticas (Dietler e Herbich, 1998, p. 244-248).

Os processos de seleção dos procedimentos técnicos a serem adotados nas ações sobre o mundo material e imaterial e suas transformações - e que são as escolhas tecnológicas - resultam, portanto, de uma percepção socialmente apreendida de 'como e quais coisas devem ou não devem ser feitas e utilizadas'. Além disso, as relações técnicas estão embebidas nas tramas da socialidade humana, na medida em que as atividades técnicas e os instrumentos técnicos mediam relações entre pessoas e entre agências diversas (humanas e não humanas). As tecnologias - para além de suas razões práticas - podem ser entendidas, ao fim e ao cabo, como um modo de produzir significados e relações ou, ainda, como uma forma de ação para a (re)criação do mundo material e simbólico. A sua estabilidade e/ou transformação ocorre pela mediação entre estrutura → ação ou estrutura → agência. As práticas tecnológicas, portanto, não se constituem de preceitos estáticos, pois resultam de dinâmicas culturais e possuem trajetórias históricas (Bassala, 1988; Lemonnier, 1992, 1993; Silva, 2000; Ingold, 2001a, 2001c; Pfaffenberger, 2001).

A percepção dos princípios sociais e simbólicos que regem as ações das pessoas sobre a materialidade é um aspecto importante a ser considerado quando se procura compreender a dinâmica das transformações culturais. Por exemplo, no debate sobre as situações de contato vivenciadas nos contextos coloniais ou pós-coloniais, diferentes pesquisadores procuraram enfatizar a agência das populações nativas na apropriação e na utilização dos bens ocidentais. Consideraram que tais populações, quando incorporam o mundo material ocidental, o fazem nos seus próprios termos, a partir das suas necessidades e intenções particulares. A transformação do seu mundo de bens materiais, portanto, está necessariamente engendrada no esquema cultural pré-existente (Gell, 1986; Thomas, 1991; Sahlins, 1997; Howard, 2000; Velthem, 2000; Gordon, 2006).

No presente artigo, pretendo contribuir com este debate, descrevendo e analisando alguns aspectos relacionados à produção e à utilização dos objetos pelos Asurini do Xingu, um povo Tupi que vive às margens do rio Xingu, no estado do Pará (Figura 1). Os dados que embasam este artigo foram produzidos a partir de minhas pesquisas etnográficas e etnoarqueológicas realizadas entre os anos de 1996 e 2011, somando mais de dois anos em campo. Durante quinze anos, desenvolvi vários projetos, todos financiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), bem como pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), estes últimos em parceria com Regina Polo Müller. Associando os parâmetros do método etnográfico aos da living archaeology - observação participante com o objetivo de verificar a relação entre as atividades humanas e a formação dos registros materiais1 1 Por living archaeology entende-se "o esforço empreendido por um arqueólogo ou etnógrafo de realizar um trabalho de campo em sociedades vivas, dando especial atenção à padronização arqueológica do comportamento naquelas sociedades" (Gould, 1977, p. 360). - , procurei observar e analisar de que maneira as inovações nas práticas tecnológicas dos Asurini e as apropriações dos bens ocidentais (objetos e matérias-primas), no período pós-contato, podem ser entendidas como uma possibilidade de expressão estética e criativa e, ainda, como uma forma de ação simbólica carregada de significado identitário.


OS OBJETOS DOS ASURINI DO XINGU

Ao andarmos pela aldeia Kuatinemu, podemos observar uma profusão de objetos espalhados pelas áreas de atividades domésticas e coletivas, no interior das casas, na tavyva (casa comunal onde são realizadas as performances rituais e o enterramento dos mortos) e nas áreas de descarte. Estes objetos podem ser divididos em três grupos: 1) os que são produzidos com matérias-primas e técnicas próprias dos Asurini e cujo conhecimento da manufatura é transmitido entre as gerações; 2) as inovações artefatuais que se referem aos objetos produzidos a partir de uma adaptação ou da incorporação de matérias-primas e/ou técnicas ocidentais; 3) e os industrializados, oriundos do mundo ocidental.

Os Asurini sempre foram reconhecidos por uma "produção artesanal altamente sofisticada e de difícil elaboração" e que "se caracteriza por uma alta preocupação de cunho estético" (Ribeiro, 1982, p. 44). A arte gráfica deles, por exemplo, é realizada com extrema maestria e sua aplicação nos objetos coloca em destaque o conteúdo intrínseco das formas, revelando aspectos da sua cosmologia (Müller, 1990, 1992; Silva, 2000).

Na sua organização tecnológica2 2 A organização tecnológica refere-se à seleção e à integração das estratégias adotadas pelas populações no que concerne ao fazer, usar, transportar e descartar objetos e obter as matérias-primas necessárias para a sua produção e manutenção (Nelson, 1991). , desde o momento da obtenção das matérias-primas até a manufatura e o uso dos objetos, os Asurini estabelecem uma cooperação entre homens e mulheres, definindo diferentes atribuições para ambos os sexos na realização de tais atividades. É da responsabilidade das mulheres a produção dos vasilhames de cerâmica, dos adornos corporais em fios de algodão (faixas, grinalda, bandoleira, cinto, braçadeira, jarreteira, tornozeleira), da cordoaria e dos objetos de uso cotidiano em fios de algodão (cordões, redes e tipoias) e da pintura corporal. Aos homens cabe a produção dos adornos corporais feitos de fibras vegetais, dentes, ossos, penas e talas vegetais (colares, pulseiras, brincos, tembetás e aros emplumados), da cordoaria em fibras vegetais (cordas e corda de arco), dos utensílios em madeira (fuso, tear, colher, banco, ferramentas, pilão e mão de pilão, canoas e remos), das armas (arcos, flechas), dos objetos rituais (yapema, chocalhos, flauta, escarificador), da casa comunal (tavyva) e da maioria dos trançados em fibras e talas vegetais (abanos, esteiras, cestos, peneiras). Alguns artefatos podem, eventualmente, ser produzidos por ambos os sexos, como as cuias, os trançados expedientes e alguns adornos corporais de fibra de algodão e de semente3 3 Inventários da cultura material Asurini são encontrados em Ribeiro (1982, p. 43, 49-52) e Müller (1990, p. 209-215). . Cabe ressaltar que homens e mulheres dedicam grande parte do seu tempo à produção de objetos para uso cotidiano, ritual ou para a comercialização.

A estrutura de ensino-aprendizagem e de transmissão de conhecimentos sobre as técnicas de produção desses diferentes conjuntos artefatuais Asurini e da arte gráfica é baseada na relação entre instrutor e aprendiz (Silva, 2009a, 2009b, 2010). O processo de aprendizagem desenvolve-se por meio da observação e do exercício prático e repetitivo, por parte do aprendiz, das etapas de elaboração dos objetos e grafismos e, normalmente, é circunscrito ao grupo doméstico; mas isso pode variar conjunturalmente4 4 Devido à regra de casamento uxorilocal, os instrutores preferenciais são: avós maternos, tios maternos, pais e outros indivíduos de gerações mais velhas que pertençam ao grupo doméstico ou residencial. Eventualmente, quando há um expert em uma determinada atividade, ele pode se tornar o instrutor de indivíduos pertencentes a diferentes grupos domésticos. . Durante o processo de ensino-aprendizagem, o instrutor investe na constante verbalização, demonstração e correção dos procedimentos técnicos e dos seus resultados, em cada etapa da cadeia operatória5 5 Por cadeia operatória entende-se a "série de operações envolvidas na transformação das matérias-primas (incluindo o nosso próprio corpo) pelos seres humanos" (Lemonnier, 1992, p. 26). , e o aprendiz procura apreender os conhecimentos e gestos de seu instrutor na tentativa de produzir um objeto que seja considerado ikatu (bonito). Essa dinâmica de aprendizagem Asurini ilustra o argumento de Ingold (2001c, 2001d), de que o conhecimento de uma tecnologia é passado entre as gerações pelo engajamento do noviço, que incorpora (embodiment) o conhecimento. Ou seja, de que é a conjunção da mente e do corpo que define, juntos, a habilidade para reproduzir alguma coisa. Sendo assim, percepção e ação estão no cerne da aquisição e prática do conhecimento tecnológico (Ingold, 2001d, 2001e). É importante dizer, ainda, que o aprendizado de alguns objetos, por exemplo, dos vasilhames cerâmicos e da cestaria expediente, inicia-se na infância, por volta dos cinco anos de idade. Geralmente, como recurso didático, os Asurini utilizam a elaboração de miniaturas para facilitar aos aprendizes o desenvolvimento da sua própria percepção e o domínio das regras de proporcionalidade dos objetos, que é um dos aspectos centrais da estética Asurini (Silva, 2009a, 2010).

A reprodução da cultura material ocorre a partir de um processo de aprendizagem longo e controlado para cada objeto, terminando apenas quando o aprendiz tem autonomia para realizar todas as etapas da sequência de produção, dominando as diferentes técnicas necessárias para tanto. Quanto mais velho o indivíduo, maior o seu compromisso em dominar estes saberes e transmiti-los às novas gerações. A exemplo de outros povos amazônicos, entre os Asurini, os mais habilidosos artesãos são também aqueles que têm o maior conhecimento das performances rituais, das estratégias de subsistência, da tradição oral e, comumente, são líderes espirituais e políticos; estes saberes dão a eles o status de adultos e de pessoa Asurini (Hugh-Jones, 2009, p. 48; Silva, 2011, p. 184-187).

Tem sido argumentado que replicar objetos - seja por artesãos experientes, seja por aprendizes - , na prática, é uma forma de recriá-los, pois todo objeto que é (re)produzido é, em última instância, um exemplar original e não uma réplica. Ele resulta do envolvimento mútuo entre o artesão, a materialidade e o meio; em outras palavras, surge da prática e da experiência do artesão no mundo (Ingold, 2001b, 2001d, 2001e). Assim, no caso dos Asurini, pode-se compreender a reprodução das técnicas e a produção dos objetos como resultados da dinâmica que se estabelece entre os preceitos da tradição tecnológica/tradição de produção6 6 Entendo tradição tecnológica ou tradição de produção como um conjunto de "disposições compartilhadas que regem as escolhas tecnológicas na cadeia operatória de produção" (Hegmon, 1998, p. 255). e a experiência criativa dos artesãos.

Para alguns autores, quanto maior for o controle do instrutor sobre o aprendiz durante o processo de aprendizagem e elaboração de um objeto, maior será a semelhança estilística entre os objetos por eles produzidos (Pryor e Carr, 1995 p. 280; Roe, 1995, p. 51). Na aldeia Asurini, investiguei quais seriam os resultados desta conduta de ensino-aprendizagem controladora, com o objetivo de verificar como ela influencia a ocorrência de variabilidade e padronização em alguns dos conjuntos artefatuais (Silva, 2000, p. 75-87, 2008, 2009a, 2009b, 2010). Minhas observações etnográficas e experimentos estatísticos demonstraram que, no caso dos objetos cerâmicos e dos trançados, existia uma significativa padronização tecnológica entre aqueles produzidos pelos artesãos mais experientes e que normalmente a semelhança entre os objetos era maior entre aqueles produzidos por indivíduos que viviam em um mesmo grupo doméstico. Por outro lado, em se tratando de objetos produzidos por indivíduos menos experientes e mais jovens, esta padronização era menos visível e se observava maior variabilidade nestes conjuntos. No entanto, as etapas da cadeia operatória e o modo como eram definidas e executadas pelos diferentes indivíduos - independentemente da geração e do grupo doméstico ao qual eles pertenciam - revelaram-se extremamente semelhantes, ou seja, essas práticas definiam uma tradição tecnológica/tradição de produção. Destas observações, verifiquei e concluí que, entre os Asurini, a padronização e a variabilidade dos conjuntos artefatuais resulta, por um lado, da dinâmica do processo de ensino-aprendizagem, que visa, em última instância, a reprodução de artefatos considerados ikatu (bonitos) e, por outro, da habilidade dos artesãos, que é obtida por meio de um exercício de tempo e dedicação.

Obviamente, a padronização tecnológica observada entre os artesãos mais experientes não significa que os objetos são indistinguíveis entre si. Ao contrário, os Asurini são extremamente zelosos em definir a autoria das suas produções (Müller, 1990; Silva, 2000). Os cânones da tradição estética não impedem o exercício criativo e a manifestação de gostos e habilidades individuais, aspecto que tem sido observado em outras sociedades ameríndias amazônicas (ver, por exemplo, Vidal, 1992; Velthem, 2000; Barcelos Neto, 2002). Quando as obras de diferentes artesãos são analisadas com detalhe, vislumbram-se diferenças no acabamento, nas tramas dos trançados, nas combinações e na distribuição dos motivos da arte gráfica, nos tamanhos e nas morfologias dos objetos (Silva, 2000, 2009a). Tais idiossincrasias estilísticas, que ocorrem apesar da padronização tecnológica, são as marcas que diferenciam os artesãos Asurini e seus objetos. Ou seja, as marcas transformam os objetos em extensões daqueles que os produziram.

Para diferentes povos amazônicos, os objetos pessoais trazem consigo as qualidades e as subjetividades dos seus donos, sendo considerados partes e, ao mesmo tempo, diferenciadores de pessoas (Santos-Granero, 2009; Erikson, 2009; Turner, 2009; Miller, 2009; Walker, 2009; Silva, 2011). Quando alguém morre entre os Asurini, seus objetos (por e para ele produzidos e/ou utilizados) são destruídos ou colocados sobre a sepultura, no interior da tavyva, ou ainda guardados como lembrança pelos entes queridos. Isso acontece porque os objetos retêm a subjetividade daquele que morreu e, dependendo da situação, os Asurini podem querer reter ou não este objeto junto de si.

A incorporação dos bens industrializados acompanha esta mesma lógica cultural de pertencimento e de subjetivização dos objetos, na medida em que esses, em sua maioria, são de propriedade individual7 7 Exceções são, por exemplo, o freezer, comprado com o dinheiro da associação indígena; a máquina de espremer açaí, doada pela Fundação Ipiranga; os equipamentos e materiais que ficam na escola indígena e que foram adquiridos com recursos da Secretaria de Educação; algumas embarcações doadas pela Associação Linguística Evangélica Missionária (ALEM) e por outras fundações; e as máquinas de cortar grama, doadas pela Fundação Nacional do Índio, que são vistas como de posse e uso coletivos. , seja pela compra ou pelo uso. Isso não significa que eles não possam ser usados coletivamente, no interior do grupo doméstico ou por meio do empréstimo entre os membros do grupo residencial, como acontece com os objetos não industrializados. Os Asurini entendem que os objetos industrializados são, em primeira instância, objetos dos brancos, pois foram produzidos por eles. Por diversas vezes, os Asurini pediram para eu descrever o modo de fazer algo, como uma garrafa térmica, uma miçanga, uma sandália ou um motor. Várias vezes eu observei alguns deles desmontando e remontando objetos para entender seu funcionamento e como eram feitos. No entanto, os objetos dos brancos passam a ser considerados como objetos dos Asurini à medida que são usados por alguém, tornando-se posse desta pessoa e, assim, uma extensão dela, independentemente do seu produtor8 8 Trata-se de uma situação que lembra o que foi descrito para os Kayapó, que consideram as mercadorias como nêkrêtch e, no geral, como posses individuais adquiridas pelo seu valor de uso, mas que não demandam o estabelecimento de relações sociais com o seu produtor, vendedor ou doador (Gordon, 2006; Turner, 2009; Lea, 2012). . Sobre as sepulturas Asurini, há vários machados e outros instrumentos industrializados, juntamente com cerâmicas, cestos e outros objetos ditos tradicionais. Além disso, a reciclagem dos bens industriais, principalmente em termos da matéria-prima para a (re)elaboração dos objetos tradicionais, também é um dos modos de transformar os objetos dos brancos em objetos dos Asurini. Finalmente, cabe dizer que a incorporação dos objetos industrializados, por um lado, dá a eles a possibilidade de expandir o seu mundo material pelo acesso a outras materialidades e, por outro, proporciona o surgimento de inovações artefatuais e a recriação do seu saber fazer e da sua estética.

O CONTATO, A INCORPORAÇÃO DOS BENS INDUSTRIALIZADOS E A INOVAÇÃO DOS OBJETOS

Desde antes do contato oficial, em 1971, os Asurini já incorporavam bens industrializados por meio de investidas fortuitas aos acampamentos de seringueiros, caçadores e moradores da região. Quando foram contatados pelo padre missionário Anton Lukesch, este descreveu o fascínio dos Asurini pelos objetos do mundo dos brancos - especialmente os de ferro - e elencou alguns de seus pertences industrializados (por exemplo, placas de alumínio, contas, botões, miçangas, enxadas, facas, facões, pregos, cavadores, objetos de vidro e plástico) (Lukesch, 1976, p. 92-119).

De lá para cá, o número de objetos industrializados na vida dos Asurini do Xingu cresceu substancialmente, assim como a demanda por eles. Os objetos industrializados mais comuns e de primeira necessidade, segundo eles, são as ferramentas e os instrumentos de metal (facões, facas, agulhas, cavadores, enxadas, pás, limas, pregos), as armas de fogo, as roupas, os calçados (sandálias e botas), os vasilhames de plástico e alumínio (panelas, bacias, térmicas, utensílios de mesa), os equipamentos, máquinas e materiais para as atividades de subsistência (ralador de mandioca, motor de barco, motosserra, materiais de caça e pesca) e os objetos e materiais de conforto pessoal e doméstico (mosquiteiros, redes, espelhos, miçangas, fibras de algodão, aviamentos). Nos últimos dez anos, bens como fogões, freezers e televisores passaram a ocupar o topo da lista dos mais desejados. A maior parte do dinheiro, adquirido com o comércio de objetos, a prestação de serviços e as aposentadorias, é destinada à compra destes bens industrializados. Alimentos e bebidas industrializados também são muito apreciados pelos Asurini, mas não serão abordados neste artigo.

Esta profusão de bens industrializados e o contato cada vez mais intenso dos Asurini com o mundo dos brancos têm gerado transformações na cultura material, que se manifestam de diferentes formas, envolvendo a substituição e/ou transformação de objetos, procedimentos técnicos e matérias-primas: 1) a criação de novos objetos e/ou recriação de objetos tradicionais a partir de matérias-primas, objetos e ferramentas industrializados; 2) a diversificação dos suportes, dos pigmentos e das matérias-primas para a arte gráfica; 3) a substituição dos artefatos e de ferramentas tradicionais por artefatos industrializados; 4) a aquisição de bens e matérias-primas industrializadas e aprendizagem de novos procedimentos técnicos.

Exemplos do que foi descrito acima podem ser observados: 1) na substituição das partes inferiores dos fusos de tecer algodão, que comumente eram feitas de cabaça, semente de tucum ou argila, por suportes retirados de embalagens plásticas (Figura 2); na elaboração de colares com matérias-primas industrializadas, como canos de PVC e embalagens plásticas diversas (por exemplo, embalagem de esparadrapo, suporte de linha de pesca etc.), em substituição aos colares confeccionados com sementes, ossos e dentes de animais; na elaboração de adornos com miçanga com uso semelhante aos adornos feitos com fios de algodão no tear manual; na confecção de vasilhas cerâmicas imitando caçarolas, jarras, fruteiras, vasos e frascos de perfume; 2) na utilização de miçangas para a produção de pulseiras e outros adornos, com as diferentes combinações da arte gráfica Asurini e que tradicionalmente eram elaborados apenas sobre a superfície da cerâmica, na pintura corporal, nas cuias e nos trançados marchetados; 3) na substituição de agulhas, perfuradores de osso e amoladores de pedra por instrumentos industrializados de mesma funcionalidade (por exemplo, agulhas, amoladores e perfuradores de metal); na substituição dos vasilhames cerâmicos de uso cotidiano e ritual pelas panelas de alumínio; 4) na aquisição crescente de matérias-primas industrializadas, como tecidos e pigmentos, utilizados na confecção e decoração de roupas e que proporcionam às mulheres o aprendizado das técnicas de costura à mão ou com máquina e de pintura em tecido; na aquisição de equipamentos que levam ao aprendizado de princípios de mecânica e eletricidade, por meio da prática e experimentação (por exemplo, motores de barco, raladores de mandioca e motosserras).


Um aspecto marcante da história dos Asurini do Xingu diz respeito às perdas que sofreram no contingente populacional nos primeiros anos do contato, e que geraram um desequilíbrio na pirâmide etária (Müller, 1984-1985, p. 97-100, 1990, p. 49-49). Foi somente a partir do final dos anos oitenta que essa situação começou a ser revertida, na medida em que as mulheres passaram a gerar filhos desde a puberdade, elevando a média de crianças por grupo doméstico, e houve um aumento da expectativa de vida, graças ao suporte da medicina ocidental. No final do ano de 2011, o grupo contava em torno de 146 indivíduos. Müller (2002, p. 204) chamou a atenção para o fato de que, mesmo com uma recuperação demográfica, nos últimos anos, ainda há quantitativamente menos adultos "com maior experiência da cultura tradicional", e muitos jovens e crianças que "têm assim entre seus pares experiências variadas de identidade, socialização, integração social, participação cultural, língua falada" (Müller, 2002, p. 206). Atualmente, a maioria dos indivíduos que residem na aldeia Kuatinemu tem menos de 25 anos de idade. Este fato influencia diretamente a estrutura de transmissão e aprendizagem de conhecimentos para a produção da cultura material, pois a existência de poucas pessoas das gerações mais velhas, com conhecimento para ensinar às gerações mais novas, faz com que técnicas e determinados tipos de objetos tradicionais desapareçam ou sejam reproduzidos em escalas quantitativas menores e, às vezes, substituídos por objetos industrializados. A concentração dos conhecimentos técnicos em poucos indivíduos gera, por um lado, uma restrição na transmissão desses conhecimentos e, por outro, pode conduzir à perda dos mesmos e dos próprios objetos, quando da morte de alguns indivíduos. Esse processo foi chamado de "amnésia cultural" por Roe (1995, p. 48), relativo ao esquecimento ou desaparecimento de um determinado cânone estilístico ou protótipo de objeto (modelo ou padrão) relacionado com um indivíduo ou grupo de pessoas.

Um exemplo do que foi relatado acima pode ser observado com relação à transmissão das técnicas de produção de alguns objetos trançados: 1) aros emplumados (akiwitá), arcos (ivyrapara) e cestos platiformes (miaawakwatiat), manufaturados com a técnica do trançado marchetado; 2) cestos estojiformes (patuá), manufaturados com a técnica do trançado horizontal dobrado; 3) peneiras (piripema) de talas de arumã, produzidas com a técnica do trançado cruzado quadriculado ou xadrezado; 4) cestos cargueiros (arakurina e manakusinga) e os abanadores (tapekwapiri, tapekwa e tapekwasiat), manufaturados com a técnica do trançado cruzado em diagonal ou sarjado - os dados sobre os tipos de cestos, as técnicas de manufatura e uma reflexão sobre a variabilidade formal, quantitativa e espacial dos objetos trançados podem ser encontrados no texto de Silva (2009a). Atualmente, há somente quatro velhos artesãos que dominam todas essas técnicas com perfeição e têm procurado transmiti-las aos jovens interessados em aprendê-las - principalmente a técnica do trançado marchetado, que é utilizada para produzir os arcos e os aros emplumados rituais, que são objetos comercializáveis. No entanto, tanto os velhos quanto os jovens manifestam sua preocupação com relação 'à falta de tempo' - devido à idade avançada dos artesãos e às muitas ocupações dos jovens no cotidiano - para adquirir todo o conhecimento e a prática necessários à (re)produção destes objetos. Tem sido interessante observar que o decréscimo na produção de objetos trançados a partir da técnica do marchetado - de mais difícil aprendizagem - fez com que os grafismos, antes feitos na cestaria, passassem a ser reproduzidos nas pulseiras feitas de miçangas (Figura 3). Além disso, vários objetos trançados têm sido substituídos por objetos industrializados: 1) chapéus e bonés substituem os akiwitá; 2) peneiras de fibras plásticas substituem as de tala de arumã; 3) caixas de ferramentas e mochilas substituem os cestos estojiformes; 4) malas, bolsas, mochilas e armários substituem os cestos cargueiros; 5) tampas plásticas e de alumínio substituem os abanadores de palha.


Nos últimos anos, diferentes grupos de indivíduos e instituições com os mais variados interesses econômicos, políticos, científicos, sociais e religiosos vêm atuando junto aos Asurini. Essa nova realidade influencia nas transformações apontadas anteriormente, mas fundamentalmente tem desencadeado uma demanda na produção de objetos comercializáveis, os quais, sem dúvida, são os principais meios para a inovação tecnológica, seja na matéria-prima, nas técnicas ou na forma.

Recentemente, as mulheres e as meninas Asurini incorporaram novas matérias-primas e técnicas para decorar tecidos de algodão com as inúmeras combinações do tayngava9 9 Isso foi incentivado pelos membros da Fundação Ipiranga, uma entidade privada que vem atuando junto aos Asurini do Xingu na comercialização dos objetos por eles produzidos. Ela define os objetos a serem comercializados e gerencia a demanda e o escoamento da produção, bem como estabelece o preço de compra de todos os produtos. Esta entidade é responsável pela criação e administração do Museu do Índio do Pará, em Belém. . Elas facilmente se adaptaram à superfície plana dos tecidos e às texturas da tinta acrílica, mas negligenciaram a utilização de pincéis industrializados, conservando o uso da tala de jufuyva10 10 A tala de jufuyva (planta leguminosa) é utilizada como instrumento na pintura das vasilhas cerâmicas e do corpo; é o pincel das mulheres Asurini. para pintar (Figura 4). Durante o trabalho, algumas desenham margens nas beiradas do tecido para delimitar o campo do desenho, outras fazem os traços livremente, mas sempre seguindo o princípio que Müller (1990, p. 240) chamou de "geometrização do infinito".


Estimulados pelas demandas, gostos e modelos externos, os Asurini também vêm recriando o design de uma série de artefatos para a comercialização. Isso pode ser observado na elaboração dos bancos que tradicionalmente são utilizados no cotidiano da aldeia ou nos rituais. Eles são feitos em uma peça única de madeira (mogno), muito alisada e sem pintura. Para o comércio, este objeto é transformado, adquirindo novas formas e decoração. Pode ser elaborado com dois assentos e/ou pintado com pigmento de jenipapo, tornando-se, neste caso, um objeto de adorno, haja vista que o jenipapo se desprende da superfície da madeira (Figura 5). O mesmo ocorre com os cestos chamados muyryru, feitos com a técnica do trançado enlaçado com trama flexível e que servem para guardar miudezas. Apesar da maior parte deles ser produzida de forma tradicional, alguns artesãos já fazem inovações, como aumentar o tamanho e/ou realizar um acabamento na borda do cesto que o torna mais resistente ao uso. As vasilhas cerâmicas e os arcos rituais também foram adaptados para o comércio, mas neste caso, eles diminuíram de tamanho para facilitar o transporte. O comércio também estimulou o surgimento de objetos antes não existentes nos conjuntos artefatuais dos Asurini, como é o caso das pequenas bolsas e adornos de cabeça feitos com miçangas e das miniaturas de bordunas pintadas com jenipapo.


Essas inovações exemplificam e reforçam a tese de que as transformações tecnológicas ocorrem a partir de objetos e conhecimentos pré-existentes e que as pessoas, ao traduzirem suas estratégias e interesses em características particulares da cultura material, também traduzem, em seus próprios termos, as relações entre matéria e ação, bem como os efeitos destas relações (Bassala, 1988; Lemonnier, 1993). Os Asurini, ao engendrarem suas inovações tecnológicas, transformam, montam e desmontam os objetos e materiais que eles acabam de conhecer e, ao mesmo tempo, deliciam-se em (re)fazer seus próprios objetos, de modo a reinventá-los a partir de partes e materiais de outros já existentes, o que faz lembrar a descrição do bricoleur (Lévi-Strauss, 1962).

Todas essas ações são feitas a partir de seus próprios conhecimentos e preceitos estéticos, mas, ao mesmo tempo, também recriando-os. Quando, por exemplo, os Asurini são solicitados a explicar a razão de terem substituído os colares de dentes de macaco (buykyrirá) - de uso ritual e feminino - pelo material dos canos brancos de PVC, que os permitem reproduzí-los com perfeição, dizem que os antigos colares demandam um trabalho exaustivo para conseguir os dentes do animal e, além disso, com o tempo, amarelam (Figura 6). Os colares de PVC, além de serem feitos com matéria-prima de fácil aquisição - canos quebrados são abundantes pela aldeia - , são também de fácil e duradoura manutenção, pois podem ser lavados com água sanitária ou sabão em pó (dois produtos industrializados), que os deixam 'sempre branquinhos e bonitos para a festa'; além disso, estes colares de PVC 'são mais leves para dançar'. O mesmo ocorre em relação aos colares de mumbaka, feitos da combinação de contas de coco de inajá e ossos da perna da ave mutum. Nesse caso, as contas são substituídas por outras feitas de embalagens plásticas de esparadrapo (brancas) ou linhas de pesca (azuis e vermelhas). Para os Asurini, o efeito estético é o mesmo e eles os utilizam no contexto ritual sem qualquer distinção em relação aos colares tradicionais (Figura 7). Fato interessante é que eles não comercializam estes colares de PVC e contas plásticas, pois, segundo eles, 'os brancos só querem comprar os verdadeiros colares Asurini'.



Como demonstrado em diferentes trabalhos (por exemplo, Bassala, 1988; van der Leeuw e Torrence, 1989), as inovações artefatuais ocorrem por diferentes razões, por exemplo, a criatividade dos artesãos, os antagonismos entre instrutor e aprendiz, o contato com outros povos, as transformações na estrutura de ensino-aprendizagem, as demandas do mercado e da comercialização, as mudanças no padrão de subsistência e a transformação na organização social da produção. Normalmente, elas partem de artesãos experientes e a condição de sua manutenção ou rejeição está ligada ao prestígio social e, ao mesmo tempo, à adequação dessas inovações ao contexto sociocultural e ao sistema de representações no qual elas se inserem. No caso Asurini, como venho procurando demonstrar, as razões e a forma como a incorporação dos bens industrializados ocorre e a maneira como as inovações se manifestam são variadas. Também são diversas as motivações para inovar, incorporar e reproduzir estes bens, que são transformados em 'coisas de Asurini' e servirão para o consumo interno e externo.

Alguns autores têm refletido sobre a aquisição de objetos dos 'outros', nas ontologias ameríndias, como uma forma de 'predação', no sentido de apropriação, através e/ou na forma de objetos, das capacidades e dos poderes de seus donos originais (Hugh-Jones, 2009; Gordon, 2006). Na cosmologia e na discursividade Asurini, os bens materiais foram adquiridos por intermédio do roubo, da transferência, da aprendizagem e da reprodução de coisas feitas por outros ou a eles pertencentes (por exemplo, espíritos, ancestrais míticos, animais, demiurgos, inimigos, conforme Müller, 1990, 1992; Silva, 2000). Portanto, na dinâmica de apreensão dos bens industrializados e do surgimento das inovações artefatuais, o que parece ser relevante para os Asurini é poder fazer e usar as coisas à sua maneira e, nesse sentido, transformar a potência e as capacidades das coisas dos brancos na (re)produção e transformação da sua própria cultura. Como tem sido evidenciado em algumas cosmologias ameríndias, incluindo a Asurini, a "cultura não é o produto da invenção, mas da transferência" (Viveiros de Castro apud Hugh-Jones, 2009, p. 34).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nas últimas décadas, com o renovado interesse pelo estudo da cultura material, tem sido revelada a complexa relação entre pessoas e objetos, seja no cotidiano, seja nas cosmologias dos povos ameríndios. Nesse novo contexto de reflexão sobre os objetos, são priorizadas diferentes perspectivas ou questões (Santos-Granero, 2009, p. 3): 1) a vida subjetiva dos objetos e a objetivação de pessoas; 2) a vida social dos objetos; 3) a história de vida dos objetos. A partir disso, tem se procurado vislumbrar as teorias nativas sobre a materialidade e a pessoalidade, e um aspecto que aparece nesses trabalhos é o caráter transformacional dos objetos e dos corpos nas ontologias ameríndias.

Em alguns contextos, como no caso dos Asurini do Xingu, a reprodução e transmissão do saber cultural são realizadas, entre outras, a partir da confecção e decoração dos seus objetos. Nesse sentido, produzir, usar e armazenar os objetos possibilita reafirmar a sua visão de mundo e pensar sobre si mesmos, contribuindo na construção e manutenção da sua identidade e alteridade (Müller, 1990; Silva, 2000).

Assim, "participar nos rituais e se exercitar esteticamente na confecção dos objetos e decoração do corpo é mais do que um aprendizado de capacidades expressivas. Essas ações sociais reafirmam o ethos Asurini e são definidoras de identidade enquanto performances que reelaboram os conteúdos da cultura" (Müller, 2002, p. 197). Nesse sentido, a performance de apreender e transformar as coisas e o conhecimento dos brancos em coisas e conhecimentos dos Asurini pode ser entendida como uma forma de afirmar a sua prórpia identidade em relação a este 'outro' e, ao mesmo tempo, de assimilá-lo e transformá-lo em si mesmo. Como já foi evidenciado em outros contextos ameríndios, entre os Asurini, a alteridade também é a condição para a construção da sua própria identidade. Além disso, conforme salientou Vidal (2001, p. 42):

Situações históricas novas propiciam e muitas vezes exigem a formulação de novos significados ou a recriação de símbolos tradicionais (...). Assim, cada cultura se mantém nesta tensão provocada pela articulação entre tradição e inovação (...). Essa tensão é vivenciada coletivamente através do tempo, e seu produto dá, a cada cultura em particular, sua própria face.

Essa dinâmica entre a tradição e a inovação aparece em todos os momentos da vida dos Asurini e não apenas na elaboração de sua cultura material. Nesse caso, porém, a convivência dos objetos ditos tradicionais, das inovações artefatuais e dos objetos industrializados revela a capacidade Asurini para a constante transformação. No processo Asurini "de ser isto e aquilo" (Müller, 1990, p. 273-279), o melhor exemplo é o que vimos na casa do pajé Moreyra, o maior de todos os pajés e artesãos e o melhor conhecedor das performances rituais. Sua casa é o lugar onde sempre ficam guardadas as flautas durante o ritual do turé, onde são preparados os jovens kawirau para o ritual do kawara e, como não poderia deixar de ser, foi o lugar onde se guardou a primeira televisão com antena parabólica da aldeia. Assim, este artigo objetivou mostrar que a incorporação de bens industrializados e as inovações tecnológicas, para os Asurini do Xingu, não significam o final da sua riqueza cultural, mas, ao contrário, são sinônimos de vitalidade e (re)criação cultural.

AGRADECIMENTOS

Agradeço aos Asurini do Xingu, pelos muitos anos de convívio e aprendizado. À FAPESP e ao CNPq, pelos auxílios financeiros para a realização de minhas pesquisas na Terra Indígena Kuatinemu, nos últimos dezesseis anos, por meio dos projetos "Cultura material e dinâmica cultural: um estudo etnoarqueológico sobre os processos de manutenção e transformação de conjuntos tecnológicos entre os Asurini do Xingu" (Processos FAPESP 2004/06782-1 e 05/60226-6) e "Cerâmicas e trançados, música e dança dos Asurini do Xingu" (Edital MCT/MMA/SEAP/SEPPIR/CNPq 26/2005), respectivamente. À Regina Polo Müller, pela parceria de trabalho ao longo desses anos, por meio do projeto "Documentação e transmissão dos saberes tradicionais dos Asurini do Xingu" (PNPI-IPHAN/MINC - Edital 001/2005), e pelo acesso aos objetos de sua coleção etnográfica. A Francisco Silva Noelli, pela leitura e revisão do texto.

Recebido em 10/10/2012

Aprovado em 26/06/2013

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  • Endereço para correspondência:
    Fabíola Andréa Silva
    Universidade de São Paulo
    Museu de Arqueologia e Etnologia
    Av. Prof. Almeida Prado, 1466 - Cidade Universitária
    CEP 05508-070, São Paulo, SP, Brasil
  • 1
    Por
    living archaeology entende-se "o esforço empreendido por um arqueólogo ou etnógrafo de realizar um trabalho de campo em sociedades vivas, dando especial atenção à padronização arqueológica do comportamento naquelas sociedades" (Gould, 1977, p. 360).
  • 2
    A organização tecnológica refere-se à seleção e à integração das estratégias adotadas pelas populações no que concerne ao fazer, usar, transportar e descartar objetos e obter as matérias-primas necessárias para a sua produção e manutenção (Nelson, 1991).
  • 3
    Inventários da cultura material Asurini são encontrados em Ribeiro (1982, p. 43, 49-52) e Müller (1990, p. 209-215).
  • 4
    Devido à regra de casamento uxorilocal, os instrutores preferenciais são: avós maternos, tios maternos, pais e outros indivíduos de gerações mais velhas que pertençam ao grupo doméstico ou residencial. Eventualmente, quando há um
    expert em uma determinada atividade, ele pode se tornar o instrutor de indivíduos pertencentes a diferentes grupos domésticos.
  • 5
    Por cadeia operatória entende-se a "série de operações envolvidas na transformação das matérias-primas (incluindo o nosso próprio corpo) pelos seres humanos" (Lemonnier, 1992, p. 26).
  • 6
    Entendo tradição tecnológica ou tradição de produção como um conjunto de "disposições compartilhadas que regem as escolhas tecnológicas na cadeia operatória de produção" (Hegmon, 1998, p. 255).
  • 7
    Exceções são, por exemplo, o
    freezer, comprado com o dinheiro da associação indígena; a máquina de espremer açaí, doada pela Fundação Ipiranga; os equipamentos e materiais que ficam na escola indígena e que foram adquiridos com recursos da Secretaria de Educação; algumas embarcações doadas pela Associação Linguística Evangélica Missionária (ALEM) e por outras fundações; e as máquinas de cortar grama, doadas pela Fundação Nacional do Índio, que são vistas como de posse e uso coletivos.
  • 8
    Trata-se de uma situação que lembra o que foi descrito para os Kayapó, que consideram as mercadorias como
    nêkrêtch e, no geral, como posses individuais adquiridas pelo seu valor de uso, mas que não demandam o estabelecimento de relações sociais com o seu produtor, vendedor ou doador (Gordon, 2006; Turner, 2009; Lea, 2012).
  • 9
    Isso foi incentivado pelos membros da Fundação Ipiranga, uma entidade privada que vem atuando junto aos Asurini do Xingu na comercialização dos objetos por eles produzidos. Ela define os objetos a serem comercializados e gerencia a demanda e o escoamento da produção, bem como estabelece o preço de compra de todos os produtos. Esta entidade é responsável pela criação e administração do Museu do Índio do Pará, em Belém.
  • 10
    A tala de
    jufuyva (planta leguminosa) é utilizada como instrumento na pintura das vasilhas cerâmicas e do corpo; é o pincel das mulheres Asurini.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Jan 2014
    • Data do Fascículo
      Dez 2013

    Histórico

    • Recebido
      10 Out 2012
    • Aceito
      26 Jun 2013
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