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BRINQUEDOS ALTERNATIVOS EM ESCOLAS INFANTIS DE UMA CIDADE DO INTERIOR DE SÃO PAULO

ALTERNATIVE TOYS FOR CHILDREN IN SCHOOLS OF A SÃO PAULO INTERIOR CITY

RESUMO

Brincar é uma ação criativa que pode contribuir para o desenvolvimento infantil. Porém, mudanças diminuíram as possibilidades de brincar. O objetivo deste estudo foi construir brinquedos com material alternativo para as crianças atendidas em escolas infantis, ampliando as possibilidades do brincar na escola. Etapa a) oficina com 26 professoras; etapa b) estação de brinquedos alternativos com participação das crianças. Na oficina, houve diálogos entre as professoras e foram a confeccionados 38 brinquedos. Na estação, os pre-escolares se beneficiaram mais do brinquedo que os bebês, dado que os pais dos bebês ficaram com eles no colo a maior parte do tempo. As opções de brincar foram ampliadas, além de possibilitar vivências motoras. Os brinquedos alternativos podem ser utilizados na pré-escola como uma opção que propicia diversão e favorece o desenvolvimento de habilidades.

Palavras-chave:
Brincar; Criança; Escola infantil.

ABSTRACT

Play is a creative action that can contribute to child development. However, changes decreased the opportunities to play. The objective of this study was to build alternative toys with alternative materials to children in nursery and preschool to amplify possibilities to play in the school. Step a) workshop with 26 teachers; step b) station of alternative toys with children's participation. In the workshop, there were dialogues among the teachers and the production of 38 toys. At the station, preschoolers got more benefits than babies as the fathers of the babies hold them most of the time. Play options were amplified and it also brought motor experiences. Alternative toys can be used in pre-school as an option that provides fun and favors the development of skills.

Keywords:
Play; Children; Kindergarten.

Introdução

Brincar é uma ação vivida naturalmente pelo ser humano, criança ou adulto11. Winnicott DW. O brincar e a realidade. Rio de Janeiro-RJ: Imago; 1971.),(22. Oliveira PS. Brinquedos artesanais e expressividade cultural. São Paulo-SP: SESC; 1982.; ocorre entre o indivíduo e o meio ambiente e oferece a experiência criativa que começa com o viver criativo, manifestado primeiramente na brincadeira11. Winnicott DW. O brincar e a realidade. Rio de Janeiro-RJ: Imago; 1971.. Acontece no mundo da imaginação, porque passa pelo procedimento de internalização, além de fazer parte da comunicação de pessoas que partilham da mesma cultura33. Goldfeld M. Sócio-interacionismo e surdez. São Paulo-SP: Plexus; 1997..

Brincar é um fim em si mesmo, pode-se brincar por brincar. O componente lúdico da brincadeira faz parte da essência do ser humano e refere-se a uma atividade livre na qual o ser humano pode deixar-se absorver de forma intensa e total, sem interesse material e sem obtenção de lucro44. Huizinga J. Homo Ludens: O jogo como elemento da cultura. 5.ed. São Paulo-SP: Perspectiva; 2007.. É brincando que a criança desenvolve seu próprio conhecimento e se relaciona com o mundo a sua volta, dando significados a ações concretas e progredindo para pensamentos abstratos55. Cristino T. A imitação representativa no brincar da criança surda. Education Acta Scientiarum 2011; 33(1):11-16. DOI:10.4025/actascieduc.v33i1.11130
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Brincar traz a possibilidade do jogo simbólico e forma uma ligação entre a realidade e a fantasia, permitindo que diferentes obstáculos psicológicos possam ser superados através das brincadeiras. A brincadeira colabora diretamente no processo de socialização e favorece a aprendizagem de papéis sociais66. Kishimoto TM. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. 10.ed. São Paulo-SP: Cortez; 2007., contribuindo para o desabrochar da criatividade, da imitação, da memorização e da autonomia77. Atas do II Encontro de Mestrados em Educação da Escola Superior de Educação de Lisboa. A importância do brincar na educação de infância. Acesso em 27/06/2017. Disponível em http://repositorio.ipl.pt/bitstream/10400.21/4565/1/Coelho%26Tadeu.pdf.
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Nessa mesma linha, estudos88. Barbosa-Rinaldi IP, Lara LM, Oliveira AAB. Contribuições ao processo de (re)significação da Educação Física Escolar: Dimensões das brincadeiras populares, da dança, da expressão corporal e da ginástica. Movimento 2009; 15(4):217-242. DOI:10.22456/1982-8918.7221
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),(99. EDUCERE. A criança e o lúdico: A importância do brincar. Acesso em 31/05/2017. Disponível em Disponível em http://www.pucpr.br/eventos/educere .
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afirmam que as brincadeiras valorizam a diversidade cultural humana, contribuem com a ampliação da técnica corporal das crianças, favorece o trabalho em grupo, a cooperação e convivência com o outro e o respeito pelo seu semelhante e apontam as brincadeiras como instrumentos que as crianças podem utilizar para demonstrar seus interesses nas relações com o ambiente social e físico1010. Marques CL. Metodologia do lúdico na prática docente para melhora na aprendizagem na educação inclusiva. Revista Eixo 2012; 1(2):80-91. DOI:10.19123/eixo.v1i2.56
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Embora brincar seja um fim em si mesmo, essa ação pode ser vista também como um meio para outros fins, já que brincar favorece uma série de aspectos do desenvolvimento infantil. Em relação ao conceito de zona proximal, a inter-relação entre desenvolver-se e aprender, analisa possibilidades que o brincar traz para solucionar problemas, imitar, imaginar (“fazer de conta”)1111. Vygotsky LS. A formação social da mente. São Paulo-SP: Martins Fontes; 2007.. Para Vygotsky o homem constitui-se em um ser social, que para desenvolver-se precisa do outro e a relação entre brincar e desenvolvimento são primordiais para a construção de novas aprendizagens1212. Rolim AAM, Guerra SSF, Tassigny MM. Uma leitura de Vygotsky sobre o brincar na aprendizagem e no desenvolvimento infantil. Revista Humanidades 2008; 23(2):176-180. DOI:10.5020/23180714.2008.23.2.%25p
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, explicando-se assim, o interesse de psicólogos e professores nessa ação que pode ser oportunizada a criança na escola.

A inserção de brincadeiras em aulas no ensino infantil podem contribuir para oportunizar vivências que potencializam o diferentes aspectos do desenvolvimento infantil, promovendo interações sociais, autonomia, aquisição de habilidades cognitivas e motoras1313. Tolocka RE, Brolo ALR. Atividades Físicas em instituições de ensino infantil: Uma abordagem bioecológica. Revista Brasileira de Cineantropometria do Desempenho Humano 2010; 12(2):140-147. DOI:10.5007/1980-0037.2010v12n2p140
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. E o brincar fisicamente ativo promove a prática de atividade física, podendo ajudar a prevenir ou amenizar o sedentarismo e doenças associadas1414. Tolocka RE, Horita KY, Oliveira C, Coelho VAC, Santos DCC. Como brincar pode auxiliar no desenvolvimento de crianças pré-escolares. Licere 2009; 12(1):1-21..

Não é a intenção desse estudo aprofundar a discussão entre estes dois pensamentos sobre o brincar, mas sim, ressaltar que tanto observando-se o brincar como um fim em si mesmo, quanto como um meio para potencializar o desenvolvimento humano, o brincar deve estar na escola. O que se procura aqui é apresentar uma maneira de ampliar estas possibilidades, incluindo construção de brinquedos com materiais alternativos, que podem ser encontrados mesmo em escolas com poucos recursos financeiros.

Isto é necessário porque mudanças ocorridas nas últimas décadas provocaram alterações nos hábitos de vida de crianças, diminuindo-lhes as possibilidades de brincar, seja pela diminuição de espaços físicos, aumento de violência urbana ou ida cada vez mais cedo para a escola1515. Kimbro RT, Brooks-Gunn J, Mc-Lanahan S. Young children in urban areas: Links among neighborhood charactestics, weight status, outdoor play and television watching. Social Science & Medicine 2010; 72(5):668-676. DOI:10.1016/j.socscimed.2010.12.015
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Além disto, crianças pequeninas podem permanecer até 10 horas por dia na escola e nelas ficam sujeitas à rotina com atividades predominantemente de higiene e alimentação ou atividades relacionadas ao sono ou televisão sendo poucas as oportunidades de brincar1414. Tolocka RE, Horita KY, Oliveira C, Coelho VAC, Santos DCC. Como brincar pode auxiliar no desenvolvimento de crianças pré-escolares. Licere 2009; 12(1):1-21.),(1616. Bógus CM, Nogueira-Martins MCF, Moraes DEB, Taddei JAAC. Cuidados oferecidos pelas creches: Percepções de mães e educadoras. Revista Nutrição 2007; 20(5):449-514. DOI:10.1590/S1415-52732007000500006
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),(1717. Coelho VAC, Fermino MAS, Tolocka RE. Atividades do cotidiano infantil em uma cidade do interior paulista e suas relações com o brincar. Licere 2012; 15(4):s/n., o que pode prejudicar o desenvolvimento infantil1818. Custódio ZAO, Crepaldi MA, Cruz RM. Desenvolvimento de crianças nascidas pré-termo avaliado pelo Teste de Denver II: Revisão da produção científica brasileira. Psicologia: reflexão e crítica 2012; 25(2):400-406. DOI:10.1590/S0102-79722012000200022
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),(1919. Lima AKP, Lima AO. Perfil do desenvolvimento neuropsicomotor e aspectos familiares de crianças institucionalizadas na cidade do Recife. Revista CES Psicologia 2012; 5:11-25., sendo necessário resgatar possibilidades de brincar, oferecendo oportunidades para isto, dentro da escola.

Assim, o objetivo deste estudo foi construir brinquedos com material alternativo para as crianças atendidas em escolas infantis, ampliando as possibilidades do brincar na escola.

Métodos

Participantes

Trata-se de um estudo de campo2020. Severino AJ. Metodologia do trabalho científico. São Paulo-SP: Cortez ; 2007. realizado em duas etapas, na primeira foi feita uma oficina e na segunda uma estação de brinquedos alternativos. Para a primeira etapa foi feito um convite, através da secretaria de educação do município (do interior de São Paulo), a todos os professores que atuavam com crianças de zero a cinco anos. Dentre os inscritos, foram sorteados 60 professores dos quais 26 participaram efetivamente do estudo.

A segunda etapa refere-se a uma estação de brinquedos alternativos, com a participação de 89 crianças, entre zero e cindo anos de idade, com seus respectivos pais que frequentavam uma das escolas que participou da oficina e concordou com a realização do mesmo, dentro de um evento comemorativo (aniversário da escola).

Procedimentos

O estudo faz parte do referido programa que foi aprovado pelo Conselho de Ética em Pesquisa de uma universidade naquela cidade, com o parecer 13/12. As professoras envolvidas assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, bem como os pais das crianças; a secretaria municipal de educação concedeu autorização para a realização do estudo.

A oficina teve três horas de duração e construiu brinquedos para duas faixas etárias diferentes: a) quatro a 24 meses b) de 25 meses até cinco anos, a partir de materiais recicláveis levados pelas próprias professoras. Estas professoras foram divididas aleatoriamente em dois grupos e neles, participaram de cada uma das oficinas, realizadas em duas salas diferentes, em sistema de rodízio. A oficina incluiu a construção e utilização do brinquedo, bem como debate sobre a utilização dos mesmos. Todos os brinquedos foram inspecionados para não oferecer riscos às crianças.

A estação de brinquedos foi realizada em um sábado pela manhã, em que foram oferecidas três estações para brincadeiras, sendo duas sem utilização de materiais e uma com os brinquedos alternativos construídos na oficina. Foram analisados apenas os dados da estação com brinquedos alternativos, objeto de estudo. Foram utilizados os seguintes brinquedos: bolinhas de jornal, caixas de papelão de vários tamanhos e chocalhos de garrafa pet, que também seriam os pinos para o boliche, e caixas menores utilizadas como obstáculos. As brincadeiras realizadas foram: arremesso de bolas em caixas de diferentes tamanhos e distâncias, jogo de boliche, travessias em túneis e obstáculos.

Os brinquedos alternativos foram colocados no espaço e as crianças puderam escolher onde queriam brincar e quantas vezes elas queriam participar daquela brincadeira enquanto estivessem na estação. No boliche, havia aproximadamente 85 garrafas de vários tamanhos, que estavam soltas, lacradas e com grãos dentro e foram utilizadas com, aproximadamente, 70 bolinhas de jornal; o túnel estava a frente com fitas prendendo as caixas no chão para que não saíssem do lugar; após a saída do túnel, três caixas menores foram usadas para servir de obstáculos para se chegar a marcação de onde outras 40 bolinhas disponíveis puderam ser arremessadas dentro de três caixas de tamanhos diferentes e também em distâncias diferentes.

Antes do início foi dito aos pais e as crianças quais as brincadeiras previstas, o tempo que o grupo teria para brincar e foi incentivado que os pais ou responsável brincassem junto com as crianças.

Todas as atividades foram gravadas com uma câmera filmadora e os dados transferidos para um computador e transformados em imagens digitais *.avi, através do software Pinacle Movie Box e as cenas foram observadas quadro a quadro com uso de slow motion (câmera lenta), quando necessário. Dados da oficina, tais como materiais utilizados, brinquedos construídos, descrição de brincadeiras sugeridas, habilidades motoras envolvidas (manipulação, equilíbrio e locomoção), agrupamentos sociais que estas propiciaram e locais em que os brinquedos poderiam ser usados, foram registrados em uma ficha, em que também foram transcritas as falas ocorridas durante o debate.

Em outra ficha foram anotados dados sobre a participação das crianças, tais como com quem realizou a brincadeira, tempo de permanência na atividade, interesse pelo brinquedo. Foram anotadas situações nas quais a criança preferiu não brincar ou utilizou o brinquedo de forma diferente da sugerida, bem como a participação ou não dos pais.

Resultados e discussão

A oficina de montagem dos brinquedos

Para a oficina, as professoras trouxeram os seguintes materiais: caixas de papelão, garrafas pet, barbantes, copos plásticos, caixas de sabonete, latas. Com esses materiais foram construídos 38 brinquedos, dentre eles diferentes túneis, chocalhos, carrinhos, caminhões, bonecos, dominós, jogo da memória, telefone sem fio, boliche, bilboquês, binóculo, vai-e-vem, bolinhas, objetos para usar como obstáculos, animais, caixa de sensações, móbiles, dentre outros. As tabelas 1 e 2 mostram os materiais e brinquedos construídos, bem como sugestões de brincadeiras que as professoras lhes atribuíram.

Tabela 1
Confecção de brinquedos alternativos e sugestão de brincadeiras para bebês e toddlers
Tabela 2
Confecção de brinquedos alternativos e sugestão de brincadeiras para pre-escolares

Após a construção dos brinquedos, debateu-se a utilização dos mesmos, bem como a necessidade da criança de brincar dentro da escola.

No debate algumas professoras explicitaram que as brincadeiras indicadas possibilitam a vivência de diferentes papéis sociais, entre os quais foram citados: motorista de carro ou caminhão, maquinista (trem), engenheiro ou pedreiro, jardineiro, mãe ou pai, pára-quedista, jogador de diferentes esportes e de jogos de salão, cuidador de animais, dentre outros.

As brincadeiras trazem benefícios como desenvolver a comunicação e expressão verbal, além de reconhecer seus papéis sociais1111. Vygotsky LS. A formação social da mente. São Paulo-SP: Martins Fontes; 2007., e podem ser utilizadas pelas crianças para evidenciar seus interesses nas relações com o ambiente e que o ‘faz de conta’, além de estimular a imaginação, auxilia na construção da autoconfiança e amizades1010. Marques CL. Metodologia do lúdico na prática docente para melhora na aprendizagem na educação inclusiva. Revista Eixo 2012; 1(2):80-91. DOI:10.19123/eixo.v1i2.56
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Discutiu-se também que as brincadeiras permitem diferentes agrupamentos sociais, as professoras indicaram atividades para ser realizadas individualmente, em duplas ou quartetos, utilizando estes brinquedos, sendo que estas poderiam ser praticadas em outras formações também, estimulando relações interpessoais e isto permite o desenvolvimento de competências em estabelecer e manter relações sociais na construção e modificação do próprio ambiente físico, social e simbólico2121. Bronfenbrenner U, Ceci S. Nature-nurture reconceptualized in developmental perspective: A bioecological model. Psychological Review 1994; 101(4):568-586. DOI:10.1037/0033-295X.101.4.568
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Nota-se também, que os brinquedos citados podem estimular as sensações (percepção visual, auditiva, olfativa e cinestésica), a imaginação e as habilidades cognitivas, como por exemplo: comparar cores, objetos, formas, profundidade e tamanhos, realizar cálculos para acertar salvos, dentre outros1313. Tolocka RE, Brolo ALR. Atividades Físicas em instituições de ensino infantil: Uma abordagem bioecológica. Revista Brasileira de Cineantropometria do Desempenho Humano 2010; 12(2):140-147. DOI:10.5007/1980-0037.2010v12n2p140
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Além disto, as brincadeiras descritas nas tabelas 1 e 2 possibilitam atividades de locomoção e manipulação. Não houve sugestão para exploração de atividades de equilíbrio, entretanto percebe-se que a habilidade de equilibrar objetos pode ser estimulada com diversos brinquedos, por exemplo, alguns deles podem ser utilizados como marcos para realização de “poses” de equilíbrio, em brincadeiras do tipo “estátua” (em que a criança imita uma estátua, sendo estimulada a manter-se imóvel em pose de sua escolha) ou em brincadeiras de imitar posicionamento de animais ou posição de objetos.

Verifica-se também que das brincadeiras sugeridas, 31 podem levar a vivência de habilidades de coordenação fina (pinça e empunhaduras) e 22 brinquedos podem propiciar habilidades manipulativas grossas, tais como arremessar, engatinhar, andar, saltar e lançar, além dos 15 brinquedos que poderiam requisitar estes dois tipos de habilidade, privilegiando habilidades de segurar, lançar, engatinhar, caminhar, correr e saltar. Algumas dessas habilidades, como engatinhar e caminhar, por exemplo, são consideradas essenciais, pois contribuem para o pleno desenvolvimento2222. Gallahue DL, Ozmun J. Compreendendo o desenvolvimento motor: Bebês, crianças, adolescentes e adultos. São Paulo-SP: Phorte; 2005..

Considerando-se que estudos têm mostrado que nas escolas infantis as crianças estão passando boa parte de seu dia e têm poucas oportunidades de brincar com vivência de habilidades motoras2323. Reverdito R, Costa SVC, Oliveira EJ, Tolocka RE. O cotidiano da criança na Instituição de Ensino: Espaço e tempo disponível para atividades lúdico-motoras. Pensar a Prática 2013; 2:355-371. DOI:10.5216/rpp.v16i2.16809
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),(2424. Carvalho AM, Alves MMF, Gomes PLD. Brincar e educação: Concepções e possibilidades. Psicologia em Estudo 2005; 10(2): 217-226. DOI:10.1590/S1413-73722005000200008
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, a inserção de atividades com estes brinquedos na escola é importante porque amplia as possibilidades de tais vivências.

Muitas destas brincadeiras constam do repertório de atividades “Brincadeira tem hora”2525. Faculdade de Educação Física da Universidade Estadual de Campinas. Brincadeira tem hora. Acesso em 04/08/2015. Disponível em Disponível em http://fefnet172.fef.unicamp.br/hotsites/brincadeiratemhora/index.htm .
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e do Museu dos Brinquedos do Instituto Cultural Luiza Azevedo Meyer2626. Museu dos Brinquedos. Acesso em 27/06/2017. Disponível em http://www.museudosbrinquedos.org.br/.
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. Além das brincadeiras citadas pelas professoras durante o debate, verifica-se que outras brincadeiras tradicionais podem ser realizadas com estes brinquedos e isto pode levar ao resgate da cultura popular e o intercâmbio de brincadeiras realizadas em diferentes regiões do Brasil2727. Carvalho AM, Pontes F. Brincar é cultura. In: Carvalho AM, organizadora. Brincadeira e cultura: Viajando pelo Brasil que brinca, volume I. São Paulo-SP: Casa do Psicólogo; 2003..

Foram ainda citadas ideias sobre a necessidade de educar para o lazer2828. Marcellino NC. Lazer e Educação. 6a.ed. Campinas-SP: Papirus; 2000., onde a construção do brinquedo junto com as crianças e escolha de como utiliza-lo em diferentes brincadeiras, bem como a guarda e manutenção dos mesmos pode levar a autonomia.

Verificou-se nesse debate a tendência das professoras em analisar a necessidade de brincar, sob o ponto de vista de aprender e desenvolver-se1111. Vygotsky LS. A formação social da mente. São Paulo-SP: Martins Fontes; 2007.),(2929 Piaget J. A formação do símbolo na crianças. Rio de Janeiro-RJ: Zahar; 1975.),(3030. Bronfenbrenner U. The bioecological theory of human development. In: Bronfenbrenner U, organizador. Making human beings human: Bioecological perspectives on human development. Sage Publication Inc; 2005.. No entanto, houve também acolhimento sobre a reflexão de que brincar por brincar é um direito da criança, que precisa ser atendido e que há necessidade também de promover ações que levem a criança a ter autonomia para brincar2828. Marcellino NC. Lazer e Educação. 6a.ed. Campinas-SP: Papirus; 2000..

Oficina de brinquedos com as crianças na escola

Embora todas as crianças estivessem acompanhadas por seus pais ou responsáveis, considerando-se todos os rodízios, as imagens gravadas revelaram que apenas 18 pais participaram efetivamente das atividades apresentadas, ou seja, brincaram junto com as crianças. Alguns ficaram apenas ficaram observando as atividades e outros nem mesmo isto fizeram, apenas conversavam com as outras pessoas presentes, sendo eles os pais das crianças com menos que dois anos.

Observou-se, também, que as atividades estavam previstas para incluir os bebês e as crianças maiores juntas para a realização das atividades, contudo alguns pais não deixaram os bebês irem ao solo para brincar, mesmo este estando limpo e sem objetos perigosos, e as atividades organizadas de maneira a evitar riscos de colisões. Estes pais limitavam-se a pegar um brinquedo e colocá-lo na mão do bebê. Isto pode ter ocorrido porque os pais não estão mais acostumados a brincar com seus filhos e tem destinado pouco tempo para isto3131. Faria MCM, Brolo ALR, Tolocka RE. Análise das oportunidades de lazer no cotidiano infantil. In: Silva KNP, Silva JAA, organizadore. Recreação, esporte e lazer - Espaço, tempo e atitude. Recife-PE: Instituto Tempo Livre; 2008.),(3232. Faria MCM, Brolo ALR, Horita KY, Tolocka RE, Santos DCC, Silva JVP. Atividades Motoras cotidianas e suas influências no desenvolvimento de pré-escolares. Movimento 2010; 16:1-8. DOI:10.22456/1982-8918.4991
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, o que sugere a necessidade de campanhas educativas sobre o direito e a necessidade da criança brincar, bem como oferta de atividades deste tipo dentro das escolas, para incentivar e apoiar os pais a brincarem também.

A brincadeira colabora diretamente no processo de socialização1111. Vygotsky LS. A formação social da mente. São Paulo-SP: Martins Fontes; 2007. em que, por exemplo, meninos e meninas, aprendem a ajudar e competir em jogos coletivos. Isto pode ser observado durante a atividade do boliche, em que, espontaneamente, as crianças começaram a competir, querendo derrubar mais garrafas do que os outros e atenderam à solicitação das professoras para ajudar a levantar as garrafas que foram derrubadas e a recolher as bolinhas que estavam espalhadas, colocando-as em uma caixa para continuar a brincadeira. O mesmo foi observado na atividade de arremessar nas caixas.

Quanto aos bebês que estavam no chão, apenas pegaram uma bolinha e ficaram segurando, como também observado em alguns estudos2929 Piaget J. A formação do símbolo na crianças. Rio de Janeiro-RJ: Zahar; 1975.. Os bebês que estavam no colo só observavam a atividade.

As crianças ampliavam as possibilidades de ação nas atividades, espontaneamente. Por exemplo, no boliche elas jogavam as bolinhas nas garrafas com força, para que estas ao caírem fizessem mais barulho e derrubassem outras; no túnel algumas das crianças passavam devagar para se esconderem dos pais ou responsável que as observava; nos obstáculos, além de pularem as caixas, faziam ziguezague entre elas; ao arremessar as bolinhas nas caixas, várias crianças preferiram ou ultrapassar ou ficar aquém da linha demarcada para o arremesso. Em alguns momentos as garrafas do boliche viraram chocalhos em que cada criança pegava pelo menos uma garrafa para sacudir, porém uma em especial segurou duas, uma em cada mão, para fazer mais barulho que as outras, e outra criança deitou em cima do chocalho. Isto evidenciou que os materiais utilizados causaram curiosidade e levaram a descoberta de novos sons e possibilidades motoras.

Pode-se afirmar, então, que os brinquedos trouxeram possibilidades para as crianças explorarem o mundo ao seu redor, aflorando a imaginação3333. Morejón K, Freitas SN, Munhóz MA. O brinquedo na estimulação essencial como suporte para o desenvolvimento da linguagem de crianças com necessidades especiais. Revista Educação 2000; 15:s/p. DOI: 10.5902/1984686X
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Ocorreu também que as brincadeiras ofereceram possibilidades de vivências que podem auxiliar no desenvolvimento infantil e através destes brinquedos as crianças puderam criar as suas próprias brincadeiras1313. Tolocka RE, Brolo ALR. Atividades Físicas em instituições de ensino infantil: Uma abordagem bioecológica. Revista Brasileira de Cineantropometria do Desempenho Humano 2010; 12(2):140-147. DOI:10.5007/1980-0037.2010v12n2p140
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Ou seja, a utilização de brinquedos, confeccionados a partir de materiais alternativos, pode ser uma alternativa eficaz para lidar com a falta de recursos materiais em algumas situações e desenvolver a criatividade, desde que os materiais sejam construídos considerando-se os itens básicos de segurança para a criança3434. Assumpção CO, Arruda DP, Souza TMF. Utilização de materiais alternativos nas aulas de educação física: Exercitando a criatividade. Anuário da Produção Acadêmica Docente 2009; 3(4):271-279..

Conclusões

Em um cenário onde há escassez de oportunidades para brincar na escola, verifica-se que para amplia-las pode-se recorrer a construção de brinquedos com materiais alternativos. Essa construção em forma de oficina possibilita a discussão e o desvelar sobre inúmeras possibilidades do brincar, tanto teóricas quanto práticas,

Um evento aproximando pais e professores, oportunizando o brincar para as crianças com materiais alternativos pode constituir-se se em uma opção para que crianças de até cinco anos de idade possam brincar na escola, e ao mesmo tempo vivenciando ações que favorecem o desenvolvimento de suas habilidades, auxiliando-as a se tornarem autônomas e criativas, além de serem de baixo custo e permitirem a difusão cultural.

Agradecimentos:

CNPq, CAPES.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2018

Histórico

  • Recebido
    04 Ago 2015
  • Revisado
    28 Maio 2017
  • Aceito
    26 Set 2017
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