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Tempo e melancolia: república, modernidade e cidadania negra nos contos de Astolfo Marques (1876-1918)

Time and melancholy: Republic, modernity and black citizenship in the short story of Astolfo Marques (1876-1918)

A história da Proclamação da República na periferia setentrional do Império brasileiro (1822-1889), assim como as especificidades de suas consequências culturais na região, ainda carece de análises mais detalhadas. No Maranhão de fin de siècle, a crise econômica do sistema agroexportador, somada à crise política do trabalho escravo, legou às primeiras décadas do regime republicano uma intensa luta social em torno da definição dos limites da cidadania, na qual a subalternização racial da população negra é um ponto decisivo. O presente trabalho é uma aproximação desses impasses através da obra ficcional do escritor negro maranhense Raul Astolfo Marques (1876-1918). Filho de uma cafusa livre, o autor é fruto da geração de descendentes escravos que se debateu com a fragilidade da liberdade conquistada na Abolição e do formalismo da igualdade outorgada em 15 de Novembro de 1889. Uma parte significativa da sua literatura poderia ser entendida como uma tentativa sistemática de interpretar essas esperanças e frustrações. O tema da República comparece ao longo de toda a sua trajetória intelectual em textos como "Abnegação" (1901), "A última sessão" (1903), "O discurso do Fabrício" (1903), "A opinião da Euzébia" (1904), "De coroa e barrete" (1908) e "Reis republicanos" (1916). Resta dizer que A nova aurora (1913), seu único romance, é inteiramente dedicado à descrição dos primeiros meses de implantação do regime republicano. Na primeira parte do ensaio indagamos quais "versões da história" e episódios significativos orientam a reconstrução ficcional das consequências do 15 de Novembro na periferia do Brasil, focalizando o conto "O discurso do Fabrício" e a crônica "A última sessão". No segundo momento, abordamos o tratamento literário dado pelo autor ao problema da política pública republicana no governo Rodrigues Alves (1902-1906), período auge da ideologia sanitarista no país e com tremendo impacto no Maranhão, devido à eclosão da peste bubônica no início de 1904. Nesse sentido, articulando texto, pré-texto e contexto, visa-se desvendar os caminhos de uma escolha literária orientada por um ambiente cultural cada vez mais insulado e periférico no jogo político oligárquico nacional, de hegemonia paulista e mineira, mas também mediado por relações de dependência socioeconômica e subordinação racial.

República; Modernidade; Cidadania; Maranhão; Intelectuais negros


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