O presente artigo é uma tentativa de refletir sobre propriedade e bem viver entre os índios Xikrin Mebêngôkre (Kayapó). Sustenta-se que tais noções devem ser articuladas com um problema indígena filosófico e existencial de magnitude: a diferenciação. Propõe-se que uma das definições do viver bem no mundo social mebêngôkre é manter, em todos os níveis da vida, um determinado quociente de diferença. Esta, por sua vez, vincula-se à questão da propriedade (em especial a propriedade cerimonial), uma vez que o sistema ritual deve ser visto como o mecanismo básico, em nível coletivo, de diferenciação. O estabelecimento de um sistema de repartição de propriedade de tipo totêmico serviria para evitar crises de indiferenciação e, portanto, garantir o bem viver. Sugere-se que o sistema ritual mebêngôkre passou por mudanças históricas importantes que deslocaram um tipo de diferenciação totêmica na direção de um tipo de diferenciação hierárquica, na qual há margem para o desenvolvimento de relações rivalitárias no interior das comunidades e entre elas.
Amazônia; Propriedade; Bem-viver; Diferenciação; Ritual