Resumo
Ao longo das décadas de convivência com o feminismo, a psicanálise sofreu pertinentes críticas com relação à suposição da figura paterna como eixo central de sua teoria de constituição subjetiva. O maternalismo, por outro lado, destaca-se como a corrente pós-freudiana que toma o cuidado materno como modelo teórico e prático por excelência. No entanto, endossando uma perspectiva feminista, a centralização da maternidade não deixa de apresentar sérios riscos, pois se conecta diretamente a relações de poder e dominação que contribuem para a circunscrição das mulheres ao âmbito doméstico. Donald W. Winnicott, importante psicanalista britânico e expoente do maternalismo, estabelece a quase exclusividade do cuidado de crianças exercido por mulheres. Embora haja um aumento da discussão sobre o tema nos últimos anos, ainda é escasso o questionamento crítico do papel da paternidade em Winnicott. Este trabalho problematiza a ênfase dada à maternidade por Winnicott, de modo a tensionar sua exclusão da paternidade como possibilidade de cuidados de bebês. A partir do método psicanalítico proposto por Jean Laplanche articulado à função normativa dos discursos de gênero, como formulado por Judith Butler, analisamos dois argumentos winnicottianos sobre a maternidade. Foi possível evidenciar a reafirmação da hierarquia dos gêneros no cuidado com bebês realizada através de recursos essencializantes e apontar alternativas teóricas para a compreensão da evitação do rearranjo dos lugares de cuidado. O desamparo gerado na situação de cuidado destacou-se como um dos sustentáculos da exclusão de homens dessa posição.
Maternidade; Paternidade; Winnicott; Gênero; Psicanálise