Carmen
Eh, amigo, que estás tu a fazer?
José
Faço uma corrente para prender o meu alfinete!
Carmen
Ah sim? O teu alfinete, Alfineteiro da minha alma…
José
Que olhares! Que descaramento!
Esta flor teve o mesmo efeito
de uma bala que me acertasse!
O seu perfume é forte, é bonita a flor!
E esta mulher…
Se é verdade que há feiticeiras
esta por certo é uma delas.
Carmen
No caminho empurro-te,
(em voz baixa a José)
empurro-te com toda a força que puder…
Deixa-te derrubar …
o resto é comigo!
Carmen
Dançaremos
(em voz baixa a José)
a seguidilha,
bebendo manzanilla.
José
Tu não me compreendeste…
Carmen, é o recolher;
Preciso regressar ao
quartel para a revista.
Carmen
Ao quartel! Para a revista!
Ah, na verdade sou muito tonta!
Esforço-me o mais que posso,
faço esforços
para divertir o senhor!
Cantava… dançava…
Creio, Deus me perdoe,
um pouco mais e amá-lo-ia…
Ta ra ta ta, é a corneta
que toca!
Vai-se embora, já foi!
Foge pois, canário!
(…)
Carmen
Não, tu não me amas, não!
Porque se tu me amasses,
para ali, para ali seguir-me-ias.
Carmen
És dos nossos agora?
José
Não tenho outro remédio.
José
Minha mãe… vejo-a…
(sem deixar de olhar Micaela)
sim, volto a ver a minha aldeia !
Oh! recordações de outrora !
doces recordações da terra !
Oh!, recordações amadas !
(…)
Minha mãe…vejo-a…
Volto a ver a minha aldeia !
Micaela
Sua mãe, ele volta a vê-la
Volta a ver a sua aldeia !
Oh! recordações de outrora !
Recordações da terra !
José
Quem sabe de que demônio
(olhos fixos na fábrica de cigarro)
irei ser presa!
Mesmo de longe, a minha mãe me defende
e esse beijo que me manda
afasta o perigo e salva seu filho!
Carmen
Para onde me levas?
José
Para a prisão e nada posso fazer.
Carmen
Não poderás fazer mesmo nada?
José
Não, nada! Obedeço a meus superiores.
Carmen
Pois bem, sei muito bem
que, apesar dos teus superiores,
farás tudo aquilo que eu queira,
e fá-lo-ás porque me amas!
José
Amar-te, eu?
Carmen
Sim, José!
A flor que eu te ofereci,
bem sabes, a flor da feiticeira,
já podes deitá-la fora,
O feitiço atuará!
José
Separarmo-nos, Carmen
Escuta, se voltas a dizer isso!…
Carmen
Matavas-me se calhar?
Que olhar; não respondes nada….
Que me importa? No fim de contas
é o destino que decide.
(…)
Carmen
Ouros, espadas… a morte!
Li bem…
As cartas são sinceras e nunca irão mentir!
Se tiveres de morrer,
se a temível palavra
estiver escrita pelo destino,
recomeça vinte vezes…
a carta impiedosa
repetirá: morte.
Sempre! Sempre! Sempre a morte!
Zuñiga
Estás a ouvir-nos, que tens a responder?
Carmen
Tra la la la la la la la
corta-me, queima-me,
que eu nada te direi;
tra la la la la la la la,
eu desafio tudo, o fogo,
o ferro e até o céu!
José
Cala-te! Disse-te que não falasse!
Carmen
Não falo…
canto para mim mesma,
e penso…não é proibido pensar,
penso em certo oficial,
que me ama, e que por mim,
sim, eu bem poderia amar!
Escamillo
E se dissessem que te amam?
Carmen
Responderia que é melhor não me amar.
Escamillo
Não é uma resposta terna;
concentro-me em ter esperança e esperar.
Carmen
É permitido esperar, é doce ter esperança.
Carmen
O amor é um pássaro rebelde
que ninguém pode aprisionar
de nada serve chamá-lo
Pois só vem quando quer.
De nada servem ameaças ou súplicas
Carmen
O amor que julgavas surpreender
bateu asas e voou…
O amor está longe, podes esperá-lo,
Já não o esperas… aí está ele…
A tua volta, depressa, depressa,
Ele vem, ele vai e depois volta…
Julgas tê-lo apanhado, ele foge,
Julgas que fugiu, ele te segura
Amor! Etc.
Carmen
O amor é um menino cigano,
que nunca conheceu qualquer lei.
Se não me amares, eu te amarei;
se eu te amar, toma cuidado!.. etc.
Carmen
Pedes o impossível;
Carmen nunca mentiu;
a sua alma continua inflexível.
Entre ela e ti, tudo terminou.
Nunca menti;
entre nós tudo acabou.
José
Eu não ameaço, imploro, suplico;
o nosso passado, Carmen,
o nosso passado, esqueço-o,
sim, vamos os dois juntos
começar uma nova vida
longe daqui, sob outros céus!
(…)
José
Carmen, ainda é tempo,
é tempo, sim, é tempo ainda….
Oh minha Carmen, deixa-me salvar-te,
a ti, a quem adoro,
e salvar-me contigo!
Carmen
Por que te ocupas
ainda de um coração
que já não é teu?
Não, este coração já não é teu!
É em vão que dizes “adoro-te”!
Não obterás nada,
Não, nada de mim.
Ah, é em vão…
Não obterás nada de mim.
José
Então já não me amas ?
Então já não me amas ?
Carmen
Não, já não te amo.
José
Mas eu, Carmen, eu te amo ainda;
Carmen; Carmen, eu te adoro !
Carmen, eu te amo, eu te adoro !
………………….
Mas não me deixes,
Oh, minha Carmen….
Ah ! não me deixes !
Carmen
Carmen nunca cederá!
Nasceu livre
e livre morrerá.
José
Esse homem que aclamam,
é teu novo amante !
Carmen
Deixa-me! Deixa-me!
José
Pela minha alma,
não passarás,
Carmen, é a mim que tu seguiras!
Carmen
Deixa-me, Don José…
Não te seguirei.
José
Vais encontrar-te com ele,
Diga-me… ama-o portanto?
Carmen
Amo-o!
Amo-o e perante a própria morte,
repetirei que o amo.
José
Nesse caso, a salvação da minha alma,
tê-la-ei perdido …
Não, pelo meu sangue, não irás !
Carmen, é a mim que tu seguirás!
Carmen
Não, não. Nunca!
José
Estou cansado de te ameaçar!
José
Pela última vez, demônio,
queres seguir-me ? …
José
Pois bem, maldita…
(com um punhal na mão avançando sobre Carmen)
(Carmen recua… José a persegue… Enquanto isso, fanfarra e coro na Praça.)
Coro
Toureiro, em guarda!
Toureiro, toureiro,
E pensa bem,
Sim, pensa que ao tourear
Um negro olhar te contempla,
E que o amor te espera
Toureiro, o amor te espera.
(José apunhalou Carmen, que cai morta… As portas abrem-se. A multidão sai da praça.)