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A educação infantil e a questão da escola: o caso da França

Early childhood education and the school question: the French case

La educación infantil y la cuestión de la escuela: el caso de Francia

Resumos

Nos últimos trinta anos, a prioridade dada a uma lógica escolar para justificar a pré-escola coincide com uma dupla mudança na instituição. A primeira diz respeito às relações que a escola maternal mantém com a escolarização obrigatória e com as estruturas de cuidados para as crianças pequenas. A outra refere-se às reformas do currículo escolar e ao desenvolvimento dos processos de avaliação. A escola maternal, local de acolhimento, de cuidados e de preparação para a escola, tornou-se institucionalmente uma verdadeira escola. A difusão das comparações internacionais contribuiu para essas mudanças.

pré-primário; primeira infância; currículo; França


In the last thirty years, priority given to a school rationale meant to justify pre-schooling has coincided with a twofold change within the institution. The first change is about the relations the nursery school maintains with compulsory schooling and with the structure necessary for taking care of small children. Another one relates to school curriculum reforms and to the development of assessment processes. Nursery school - a place where small children are welcomed and taken care of as well as educated and prepared for school - has become a school in its own right, as far as the institution itself is concerned. The dissemination of international comparisons has contributed to such changes.

preschool; early childhood; curriculum; France


Los últimos treinta años, la prioridad dada a una lógica escolar para justificar la pre-escuela coincide con un doble cambio en la institución. El primero de ellos se refiere a las relaciones que la escuela maternal mantiene con la escolarización obligatoria y con las estructuras de cuidados para los niños pequeños. El otro se refiere a las reformas del currículo escolar y al desarrollo de los procesos de evaluación. La escuela maternal, sitio de acogida, de cuidados y de preparación para la escuela, se convirtió institucionalmente en una verdadera escuela. La difusión de las comparaciones internacionales contribuyó para estos cambios.

preprimaria; pequeña infância; currículo; Francia


OUTROS TEMAS

La educación infantil y la cuestión de la escuela: el caso de Francia

Pascale Garnier

Professora de Ciências da Educação na Universidade Paris 13 (França) e membro das redes de sociologia da infância da European Sociological Association - ESA - e da International Association of French Speaking Sociologists - AISLF pascale.garnier@univ-paris13.fr

RESUMO

Nos últimos trinta anos, a prioridade dada a uma lógica escolar para justificar a pré-escola coincide com uma dupla mudança na instituição. A primeira diz respeito às relações que a escola maternal mantém com a escolarização obrigatória e com as estruturas de cuidados para as crianças pequenas. A outra refere-se às reformas do currículo escolar e ao desenvolvimento dos processos de avaliação. A escola maternal, local de acolhimento, de cuidados e de preparação para a escola, tornou-se institucionalmente uma verdadeira escola. A difusão das comparações internacionais contribuiu para essas mudanças.

Palavras-chave: pré-primário; primeira infância; currículo; França

ABSTRACT

In the last thirty years, priority given to a school rationale meant to justify pre-schooling has coincided with a twofold change within the institution. The first change is about the relations the nursery school maintains with compulsory schooling and with the structure necessary for taking care of small children. Another one relates to school curriculum reforms and to the development of assessment processes. Nursery school - a place where small children are welcomed and taken care of as well as educated and prepared for school - has become a school in its own right, as far as the institution itself is concerned. The dissemination of international comparisons has contributed to such changes.

Keywords: preschool; early childhood; curriculum; France

RESUMEN

Los últimos treinta años, la prioridad dada a una lógica escolar para justificar la pre-escuela coincide con un doble cambio en la institución. El primero de ellos se refiere a las relaciones que la escuela maternal mantiene con la escolarización obligatoria y con las estructuras de cuidados para los niños pequeños. El otro se refiere a las reformas del currículo escolar y al desarrollo de los procesos de evaluación. La escuela maternal, sitio de acogida, de cuidados y de preparación para la escuela, se convirtió institucionalmente en una verdadera escuela. La difusión de las comparaciones internacionales contribuyó para estos cambios.

Palabras clave: preprimaria; pequeña infância; currículo; Francia

APÓS O PROGRAMA STARTING STRONG DA OECD (2001, 2006), é cômodo apresentar o sistema francês de educação infantil como um sistema dividido, ao mesmo tempo institucionalmente e conforme a idade das crianças. De um lado, os serviços para as crianças de menos de 2-3 anos e as atividades de lazer são colocados sob a responsabilidade do Ministério dos Assuntos Sociais e da Família e correspondem a estruturas muito variadas (creches, centros de recreação, creches familiares, atendimento em domicílio) (RAYNA, 2007). De outro lado, a quase totalidade das crianças de 3 a 6 anos frequenta a escola maternal,

No entanto, a escola maternal é uma "escola", a começar pela denominação. Surgida durante a efêmera Segunda República de 1848, ela foi adotada pelos republicanos em 1881, em lugar de "sala de asilo", que marcava as origens filantrópicas de uma instituição destinada a acolher e moralizar as crianças das classes urbanas pobres (LUC, 1997).II É como escola que ela participa da implementação do ensino primário que os republicanos promovem nessa época: uma escola obrigatória a partir dos 6 anos, gratuita e laica. Ao mesmo tempo, desde o final do século XIX, os atores (atrizes) da escola maternal continuaram insistindo em distingui-la de uma "escola no sentido ordinário da palavra", como reivindicava a primeira inspetora geral, Pauline Kergomard (2009 [1886]). "Maternal", ela é um local de transição e de mediação entre a família e a escola; o modelo da professora que cuida de crianças pequenas é o de uma "mãe inteligente e dedicada", precisa Kergomard. Eis o paradoxo central deste artigo: se a escola maternal sempre foi uma escola, toda uma série de transformações consagra esse caráter escolar nos últimos trinta anos.

Tal paradoxo permite analisar e ilustrar, a partir do caso da escola maternal na França, uma pressão mais geral sobre a educação da pequena infância em termos de eficácia e de equidade relativas ao futuro escolar dos alunos. Nossa postura aqui não é a de criticar, mas, sim, de construir um quadro de análise desses processos de escolarização e de mostrar como eles se opõem a outras concepções de educação infantil.

A primeira parte deste artigo se propõe a explicitar o posicionamento teórico de uma sociologia da crítica, que torna possível uma exterioridade relativa em face dos exaltados debates provocados por essa evolução. Mostramos como é possível objetivá-la, construindo uma grade de análise geral. A segunda parte está centrada nas transformações institucionais do lugar da escola maternal em relação à escolarização obrigatória e às estruturas destinadas aos pequeninos. A terceira parte continua esse trabalho de objetivação, estudando as transformações do currículo oficial da escola maternal e o desenvolvimento das avaliações dos efeitos de frequentar a escola maternal sobre os resultados escolares dos alunos. A quarta situa essa evolução no contexto internacional e mostra a pluralidade atual das escalas de avaliação da educação da primeira infância, quando as comparações internacionais se tornam sinônimo de classificação dos sistemas educativos nacionais.1 1 Na medida em que nossa análise diz respeito às transformações institucionais da escola maternal, privilegiamos os textos legais, regulamentos, relatórios e discursos oficiais que definem a escola maternal e seus atores. Sem pretender ser exaustivos, também fazemos referência a trabalhos de pesquisa ou posicionamentos profissionais a respeito, com o risco de colocar em um mesmo plano discursos heterogêneos. (Nota da Autora - N. A.)

Tomando por objeto a situação francesa, o desafio deste artigo é, portanto, o de construir uma grade de análise dos debates e das transformações da educação de crianças pequenas quando submetida a exigências crescentes de eficácia e de equidade escolar.

QUADRO TEÓRICO: UMA SOCIOLOGIA DA JUSTIFICAÇÃO

Visto que a escola maternal é, mais do que nunca, objeto de debates na França, ninguém duvida de que a análise de sua evolução pode ser, igualmente, objeto de acaloradas controvérsias interpretativas. Da mesma forma, nossa investigação se situa no contexto de uma sociologia da crítica (BOLTANSKI; THÉVENOT, 2006; BOLTANSKI, 2010), ou seja, de uma sociologia que faz do trabalho de crítica e de justificação dos atores um objeto de estudo, atenta às suas relações com seu próprio trabalho interpretativo.2 2 Vale observar que, embora nossa análise retome a postura teórica de uma sociologia da crítica, focalizando as operações críticas e de justificação dos atores e supondo uma pluralidade de princípios de acordo, ela não retoma a axiomática das cidades e de diferentes regimes de ação formalizada pelo trabalho de Boltanski e Thevenot (2006). (N. A.) Essa opção teórica permite considerar a escola maternal como uma forma de "bem comum", submetida a uma exigência de justificação, e analisar as tensões atuais como uma concorrência entre três diferentes princípios de justificação de seu fundamento.

Um primeiro princípio de justificação da escola maternal refere-se ao acolhimento de crianças, no sentido da proteção e de cuidados (care) que, particularmente, sua pouca idade exige. Daí decorre toda uma gama de preocupações relativas aos pais: acesso das mulheres ao mercado de trabalho, igualdade homem-mulher, conciliação vida familiar-vida profissional, integração social etc. O acolhimento de crianças pequenas é aqui uma questão em que estão imbricadas políticas familiares, de emprego, políticas sociais etc. Mas a essa preocupação acrescenta-se imediatamente a da educação, com finalidades, objetivos e procedimentos pedagógicos variáveis conforme as concepções de criança e do papel do adulto que estão em jogo. Se, de um ponto de vista internacional, pode-se observar o peso crescente das lógicas de mercado (DAHLBERG; MOSS; PENCE, 2007) e o deslocamento de um "discurso do care" para um "discurso pedagógico" (MOSS, 2006), a situação francesa faz surgir um terceiro registro de justificação, que diz respeito ao caráter escolar das aprendizagens necessárias para o sucesso da criança. Longe de se resumir a uma simples sucessão desses três princípios de justificação, a história da escola maternal pode ser lida como a de sua acumulação sucessiva, seu declínio específico e sua importância relativa conforme os contextos.

De fato, se esses três princípios são concorrentes, eles também podem ser objeto de diferentes compromissos. De maneira geral, um compromisso reflete um acordo para evitar uma eventual divergência, sem que se tenha estabelecido recorrendo a provas que privilegiem uma única lógica de justificação: "a situação de compromisso continua sendo heterogênea, mas a divergência é evitada" (BOLTANSKI; THÉVENOT, 2006). Envolvendo princípios de justificação heterogêneos, um compromisso é, por definição, frágil. Para que se sustente, não se deve tentar esclarecê-lo; mais ainda, "o esforço para estabilizar o compromisso, fornecendo-lhe uma base sólida, acaba por exercer o efeito inverso", destacam os autores. Uma expressão do que seria um compromisso para a escola maternal pode ser encontrada nas Orientações Oficiais de 1977, que lhe atribuem um "papel triplo: educativo, propedêutico e de cuidados". A escola maternal é, então, uma forma de educação pré-escolar, definida como a educação das crianças pequenas antes da escolaridade obrigatória (PLAISANCE; RAYNA, 1997). Representa uma montagem heterogênea, uma junção de lógicas diferentes, todas legítimas e indispensáveis às demais, em que se trata, ao mesmo tempo, de acolher e proteger as crianças pequenas, de educá-las, no sentido de favorecer seu desenvolvimento global, e de prepará-las para a escolaridade obrigatória. Essas três lógicas, necessariamente conjugadas, ou até mesmo inseparáveis, justificam na época a pertinência da escola maternal.

Desde mais de trinta anos, esse compromisso vem sendo progressivamente questionado. Ao mesmo tempo, uma única lógica de justificação é institucionalmente privilegiada: a que marca o caráter escolar da escola maternal. O antigo compromisso aparece, então, como uma mistura confusa e a pluralidade de princípios de justificação como uma fonte de ambiguidades. De um lado, essa dominação de um princípio de justificação escolar da escola maternal relativiza, ou mesmo pressupõe, os demais princípios de justificação referentes ao cuidado e à educação. De outro lado, ela coincide com as avaliações que privilegiam critérios diretamente escolares desde os anos 1970. Um registro de justificação e de qualificação da escola maternal como uma verdadeira "escola" é, ao mesmo tempo, descritivo e normativo; e é acompanhado necessariamente de um conjunto de objetos e de princípios de avaliação referentes a um mesmo "mundo": o da escola. Reduzida à questão do futuro escolar das crianças, essa avaliação da escola maternal contribui, por sua vez, para que ela se transforme em uma "primeira escola", e deixe de ser apenas uma preparação para a escola.

Mas o que faz exatamente a "escola"? Quais são os critérios que podem objetivar um processo de escolarização da escola maternal? O "mundo da escola" se define tanto por suas diferenças em relação a outros mundos como pelos objetos que lhe são próprios. Esse mundo é, ao mesmo tempo, uma instituição política e uma forma particular de socialização das crianças. É, portanto, por uma dupla série de transformações externas (relativas à posição da escola maternal com respeito à escolarização obrigatória e às estruturas de cuidados e de educação da primeira infância) e internas (relativas ao seu currículo) que é preciso demarcar as diferentes dimensões de um processo de escolarização. Veremos que o ponto de articulação das evoluções institucional e curricular da escola maternal está justamente na questão de seu papel nos percursos escolares dos alunos.

TRANSIÇÕES INSTITUCIONAIS DO PRÉ-ESCOLAR AO ESCOLAR

Falar de escolarização supõe caracterizar as transformações da posição específica da escola maternal no sistema das instituições escolares e dos equipamentos de acolhimento das crianças pequenas (CHAMBOREDON; PRÉVOT, 1973). Pode-se, então, compreender esse processo de escolarização como declínio de uma autonomia relativa da escola maternal em face do ensino obrigatório (a partir dos 6 anos), mas também como distanciamento de outras estruturas de acolhimento da primeira infância. Assim, o qualificativo "escolar" adquire sentido, antes de tudo, enquanto característica posicional da escola maternal. Prost (1981) analisou os anos 1960-1970 como os de um distanciamento relativo do maternal em relação ao ensino elementar. Inversamente, as transformações desses últimos trinta anos fazem do maternal uma "escola de pleno exercício", conjugando uma articulação da escola maternal com a escola elementar e um distanciamento das demais estruturas pré-escolares no que diz respeito à questão do acolhimento das crianças de 2 anos.

ARTICULAÇÃO ENTRE O MATERNAL E A ESCOLA OBRIGATÓRIA

O desenvolvimento da escola maternal deve muito a toda uma linhagem de inspetoras gerais e departamentais militantes, a uma associação profissional fortemente mobilizadora (a associação geral das professoras de escolas maternais fundada em 1921). Preocupadas em se diferenciar da filantropia social encarnada pela "sala de asilo", essas funcionárias procuraram também fazer prevalecer suas concepções educacionais na escola elementar: "é a escola maternal bem compreendida que deve forçar as portas da escola primária", ressalta Kergomard (2009 [1886]). Essa configuração se desfaz a partir de 1972, com o fim do concurso e da formação de um corpo de inspeção feminino específico para a escola maternal. Desde 1991, os inspetores da educação nacional supervisionam simultaneamente escolas maternais e elementares em circunscrições mistas.

Partilhando o mesmo estatuto que os professores do primário, o corpo docente das escolas maternais também perde sua especificidade. De um lado, deixa de ser exclusivamente feminino em 1977; de outro lado, sua formação específica é reduzida pelas reformas da formação profissional de professores que, desde 1989, afetam tanto o ensino primário como o secundário. Nos textos oficiais, a professora do maternal tornou-se "professora de escola", em 1990, e "especialista em aprendizagens escolares", em 2002, do mesmo modo que os professores do secundário. Nos Institutos Universitários de Formação de Professores, criados em 1989, a formação específica para a escola maternal é cada vez mais reduzida (BOUYSSE, 2005), e as reformas atuais elevam o nível de recrutamento de licenciatura para mestrado, ao mesmo tempo em que reduzem a formação profissional inicial e contínua. Desde 1992, os funcionários também tiveram seu estatuto, nível de recrutamento e qualificação reavaliados. Recrutados por concurso, com um certificado profissional "Primeira Infância", criado em 1991, eles são reconhecidos como "membros da comunidade educativa". Essas transformações para os professores e funcionários, respectivamente, mantêm uma forte hierarquia social entre as duas categorias, delineando uma nova divisão do trabalho na escola maternal. Em vez de uma fronteira separando o trabalho educativo, atribuído às professoras, e o trabalho de limpeza e de higiene, atribuído aos funcionários, essa divisão passa por uma partilha de tarefas entre o ensino e a educação, enquanto os serviços gerais podem ser delegados a terceirizados (GARNIER, 2010a).

Uma preocupação de continuidade entre a grande section, último ano da escola maternal, e o cours préparatoire, primeiro ano da escola elementar, é objeto de textos institucionais desde meados dos anos de 1970, quando todos os alunos passam a ter acesso a um "colégio único" - processo fortemente impulsionado pela Lei de Orientação sobre a Educação de 1989, que divide o conjunto da escolaridade primária em três ciclos para tentar conjugar adaptação à diversidade dos alunos e eficácia, tornando menos rígidas as classificações de idade na escola (GARNIER, 1998). O último ano da escola maternal, a grande section, faz parte do "ciclo das primeiras aprendizagens" que começa com a entrada no maternal, mas também participa do "ciclo das aprendizagens fundamentais", que prossegue nos dois primeiros anos da escola elementar. Além disso, no intuito de prevenir o fracasso escolar, a política das zonas de educação prioritária, lançada em 1981, enfatiza a "pré-escolarização precoce", a partir dos 2 anos de idade, de crianças de famílias carentes dos meios urbano e rural. Os sucessivos relançamentos de políticas de educação prioritária em 1990, 1998 e 2006 levam a um relativo abandono dessa vertente da prevenção do fracasso escolar. Ao mesmo tempo, desde o início dos anos 1980, a questão da escolarização das crianças de 2 anos permanece no centro de fortes polêmicas.

AS CRIANÇAS DE 2 ANOS: UM DESAFIO PEDAGÓGICO E POLÍTICO

Após a generalização da escola maternal para todas as crianças de 3, 4 e 5 anos, esta acolhe cada vez menos crianças de 2 anos. De fato, a frequência da quase totalidade das crianças de 5 anos efetivou-se em 1970, das de 4 anos em 1980, e das de 3 anos em 1995. Nessa data, a frequência das crianças de 2 anos atinge 35,5%. Desde o início dos anos 2000, vem regredindo e chega a 13,6% em 2010. Na ausência de uma política voluntarista, as variáveis demográficas desempenharam um papel importante; reduziram a escolarização das crianças de 2 anos a uma "variável de ajuste" em relação ao conjunto do ensino primário e das políticas de restrição orçamentária (SUCHAT, 2009). Em recuo e muito variável, segundo os departamentos,III a questão das crianças de 2 anos está no centro dos projetos atuais de transformação das relações entre a escola maternal e o acolhimento das crianças menores.

Desde o início dos anos 1980, os debates sobre a pré-escolarização das crianças de 2 anos opõem concepções diferentes da escola maternal: de um lado, o acolhimento dos menorzinhos representa uma via de renovação da escola maternal, direcionando-a mais às especificidades das crianças pequenas; de outro, inúmeras críticas denunciaram a inadaptação da escola maternal para as crianças dessa idade. Um relatório recente encomendado pelo ministério da Educação Nacional preconiza que se encontrem outras soluções de acolhimento para crianças de 2 anos afora a escola maternal: "Manter na escola um dia inteiro crianças de 2 anos é desviar a escola maternal de sua verdadeira missão; é transformá-la em creche na maior parte da jornada escolar" (BENTOLILA, 2007). Em um contexto persistente de penúria e de fortes disparidades territoriais (BAILLEAU, 2009), a questão das formas de acolhimento das crianças menores inscreve-se atualmente em uma problemática econômica e societária de seus custos e modalidades de financiamento. Ao lado da escolarização quase sistemática das crianças a partir de 3 anos, o acolhimento daquelas de 2 anos é objeto de um "novo serviço público" criado em 2008, os "jardins do despertar", para responder às necessidades das crianças que são "meio pequenas" para a escola maternal, mas também "meio grandes" para a creche. Hoje, esses estabelecimentos ainda são muito raros, mas, livrando-a do peso dos menorzinhos, esse projeto permite "reafirmar a identidade e os objetivos da escola maternal como primeira escola" (PAPON; MARTIN, 2008). Financiadas pelas coletividades locais e pelos pais, essas estruturas já são vistas como o sinal de um descompromisso do Estado em matéria de educação pré-escolar.

Sem suprimir diretamente a escolarização das crianças de 2 anos, a política atual preconiza uma clara divisão entre a escola maternal e a oferta de serviços diversificados para os menores de 3 anos. Ao mesmo tempo, recoloca a questão das continuidades a desenvolver dentro de um sistema "dividido", pois os raros trabalhos iniciados a partir dos anos 1980 sobre a articulação entre a escola maternal e as estruturas de acolhimento dos pequeninos, como a creche, não tiveram respaldo institucional. Da mesma maneira, uma parceria interministerial iniciada em 1990 entre o Ministério da Educação e o Ministério dos Assuntos Sociais e da Família não permitiu desenvolver estruturas de acolhimento para as crianças de 2-3 anos, "estruturas-ponte" que preparam para a entrada no maternal, em princípio focadas nos meios sociais mais desfavorecidos. Essa parceria interministerial continua pouco desenvolvida, devido à força das tradições de uma ação pública setorial e de uma centralização administrativa, na França.

Apesar das políticas de descentralização (NEUMAN, 2009), lançadas no início dos anos 1980, o papel das autoridades locais, no que diz respeito diretamente à escola, circunscreve-se aos recursos que colocam à disposição dos estabelecimentos. A forte centralização da escola na França é também um obstáculo ao princípio de sua integração nas comunidades locais e a uma verdadeira participação democrática dos pais. Essa dificuldade, observada desde os anos 1970 por especialistas internacionais (OECD, 1971), é ainda maior atualmente devido a injunções institucionais que privilegiam um modelo de relações assimétricas entre profissionais, especialistas do ensino e pais, cuja colaboração é requisitada para contribuir para o sucesso escolar dos filhos (GARNIER, 2010b).

TRANSFORMAÇÃO DO CURRÍCULO OFICIAL

O termo "escolar" designa um modo de socialização particular das crianças que é próprio à escola. Vincent, Lahire e Thin (1994) nos permitem caracterizar sua unidade e inteligibilidade em relação a regras impessoais.IV A "forma escolar", produto de uma dinâmica histórica particular, caracteriza-se por uma relação social específica, a relação pedagógica, por formas de aprendizagem descontextualizadas visando aos saberes objetivados, codificados e sistematizados, pelo privilégio concedido a uma cultura escrita e, mais amplamente, uma relação escritural-escolar com a linguagem e com o mundo. Nesse sentido, a escolarização do maternal pode ser analisada como uma transformação de seu currículo que valoriza as aprendizagens cognitivas e linguageiras. Além disso, coincide com produção de uma "cultura escolar", resultado de todo um trabalho específico de seleção, hierarquização e didatização dos saberes que são objeto de ensino. Acompanhando os trabalhos de Bernstein (1975) sobre as diferentes formas de recorte e enquadramento dos saberes escolares, as transformações da escola maternal podem ilustrar a passagem de uma "pedagogia invisível" própria à pequena infância a uma "pedagogia visível", com uma forte compartimentalização, hierarquização e especialização dos saberes próprios à escola.3 3 Pode-se distinguir esse processo de escolarização e uma transformação dos modelos educacionais estudados por Plaisance (1986) entre 1945 e 1980, em ligação com a evolução das características sociais de seu público e do corpo docente. No momento em que a escola maternal é frequentada essencialmente pelas crianças dos meios populares, predomina um modelo "produtivo", centrado na visibilidade das produções dos alunos. A partir do final dos anos 1950, à medida que o maternal passa a receber as classes médias e superiores, logo se consolida um modelo "estético", que valoriza a criatividade da criança, e depois um modelo "expressivo", que valoriza o desabrochar e a socialização da criança. (N. A.)

AS APRENDIZAGENS LINGUAGEIRAS E COGNITIVAS: CHAVES DO SUCESSO ESCOLAR

Até os anos de 1970, o desenvolvimento da escola maternal e suas mudanças de modelos educacionais são acompanhados de uma forte estabilidade institucional: um mesmo programa vigora entre 1921 e 1977. Com o reforço da continuidade em face da escolaridade obrigatória, a escola maternal foi integrada nos novos processos de elaboração dos programas nacionais escolares a partir de 1986. A implantação de uma política de ciclos reforça a integração dos programas da escola maternal aos programas da escolaridade obrigatória. Esses programas de 1995, 2002 e 2008 apresentam uma divisão das aprendizagens em cinco "áreas de atividade" que prefiguram as disciplinas escolares do ensino elementar e a sua hierarquia socioinstitucional. Enquanto em 1995 se valorizam o "viver junto" e as aprendizagens linguageiras estruturadas, em 1999 a linguagem por si só é objeto de um texto oficial no qual se torna "prioridade" do maternal, situada "no centro das aprendizagens". A partir de 2002, o domínio da língua figura no topo das atividades no maternal. No programa de 2008, ela é objeto de injunções bastante detalhadas para construir uma progressão das aprendizagens entre petite, moyenne e grande section.

Por sua vez, "as atividades físicas" que ocupavam simbolicamente a primeira categoria de atividades nos textos oficiais da escola maternal entre 1887 e 1986 aparecem na terceira posição dos programas posteriores a 1995. Inicialmente valorizados por sua função higiênica e disciplinar, depois em razão de seu papel no desenvolvimento cognitivo e social das crianças, os exercícios ou atividades físicas veem sua importância diminuir. A hierarquia de atividades no maternal está mais próxima daquela da escola elementar, onde "a educação física" nunca deixou de figurar no último lugar das disciplinas inscritas no programa. Aliás, a cultura corporal e artística permanece à margem da "base comum" de conhecimentos e competências que todos os alunos devem ter adquirido ao final da escolaridade obrigatória, instituída pela lei de 2005 para o futuro da escola. No maternal, assim como no conjunto da escolaridade obrigatória, essa marginalização pode ser entendida como uma atenuação do ideal de um desenvolvimento global da pessoa e de uma cultura comum em proveito de uma concepção governada pelo interesse econômico (DEROUET, 2006).

Sem dúvida, a brincadeira e, mais ainda, uma pedagogia da brincadeira educativa, através da qual Prost (1981) discernia uma especificidade do maternal nos anos 1960-1970, não são imediatamente condenadas. Porém já reduzida e submetida a uma lógica educativa (BROUGÈRE, 1997), a importância da brincadeira na escola maternal é mais uma vez diminuída na medida em que é usada, antes de tudo, como uma introdução à aprendizagem escolar. Para melhor instrumentalizar os alunos em vista de sua escolaridade futura, para reduzir efetivamente as desigualdades sociais desde o maternal, as pesquisas hoje valorizam mais o domínio das competências cognitivas e linguageiras do que a socialização e o desenvolvimento afetivo por vezes apresentados como pré-requisitos para as aprendizagens. Assim, o que está em jogo é manifestamente o peso crescente de uma avaliação dos alunos que hierarquiza fortemente suas competências socialmente esperadas, conjugada a uma avaliação da escola maternal em termos de efeitos sobre a escolaridade futura.

AVALIAÇÃO DA ESCOLA MATERNAL, AVALIAÇÃO DOS ALUNOS

Desde os anos 1970, com a conclusão das reformas estruturais do ensino secundário, o desejo de reduzir as desigualdades sociais diante da escola leva a colocar acima da escolaridade obrigatória e das aprendizagens propriamente escolares a esperança de compensar as diferenças entre as socializações familiares. Daí o desenvolvimento de uma dupla série de avaliações visando a mensurar o valor propriamente escolar da escola maternal: as que consistem em mostrar seu peso no sucesso escolar posterior; e as que estudam sua capacidade para reduzir as desigualdades sociais diante da escola. A partir dos anos 1970, com a extensão da frequência a todos os meios sociais, a diversidade dos alunos aparece como um dado da escola maternal, do mesmo modo que para a escolaridade obrigatória. O desafio fundamental passa a ser o de sua democratização que, para retomar os termos da lei relativa à educação de 1975, se impõe para "prevenir as dificuldades escolares, diagnosticar as deficiências e compensar as desigualdades". Assim, apenas seu papel no sucesso escolar é objeto de avaliações institucionais e a escola maternal é integrada, através das ferramentas de totalização que são as estatísticas, no conjunto da escolaridade dos alunos. Até os anos 1990 (NORVEZ, 1990), o otimismo do discurso institucional sobre os benefícios escolares fundamenta-se nas estatísticas relativas ao conjunto da escolarização na escola maternal. Mais tarde, à medida que as análises estatísticas se centram nos efeitos diferenciados para as crianças de 2 anos, surgem as controvérsias: primeiramente, sobre os efeitos de mais longo ou menos longo prazo da frequência precoce para o sucesso escolar; depois, sobre os efeitos equalizadores de uma frequência que supostamente beneficiaria sobretudo as famílias carentes (FLORIN, 2007; SUCHAUT, 2009).

Nos anos 1970, quando a prevenção das dificuldades da criança se torna uma de suas missões, aparecem igualmente as primeiras críticas de um diagnóstico precoce e de uma escola maternal francesa não igualitária. Na trilha dos trabalhos de Bourdieu, os críticos voltam a questionar a noção de deficiência sociocultural e as práticas da escola maternal que, em nome do desenvolvimento e do desabrochar da criança, veiculam conteúdos implícitos muito diferenciadores socialmente. Mais recentemente, a crítica se prende aos mal-entendidos criados pela noção de atividade na escola maternal, quando ela não é explicitamente relacionada com conteúdos de saber (BAUTIER, 2006; JOIGNEAUX, 2009). Se, nessa perspectiva, o sucesso escolar depende de uma utilização reflexiva da linguagem e dos procedimentos de objetivação de saberes, trata-se então de propor desde o maternal uma construção mais apurada de situações de aprendizagem, para tornar a criança capaz de distinguir "o fazer" e "o aprender". A importância das aprendizagens linguageiras e cognitivas no currículo oficial é igualmente reforçada pelo desenvolvimento das pesquisas sobre os saberes que a escola maternal deve transmitir, de maneira que eles sejam efetivamente objetivados, explicitados e codificados para permitir seu domínio reflexivo e simbólico pelos alunos. A continuidade institucional entre a escola elementar e a escola maternal favorece o desenvolvimento de uma reflexão didática derivada das disciplinas escolares do ensino secundário. Enfim, o deslocamento das referências teóricas, principalmente a partir da tradução em francês dos trabalhos de Vygotski (1985), revaloriza o papel do adulto como mediador de saberes, em face de uma "pedagogia de desenvolvimento", de inspiração piagetiana, veiculada pelas instruções oficiais de 1977.

Definidas como alunos, as crianças também são objeto de uma crescente avaliação. Com a lei de 1989, ao mesmo tempo em que se cria um dispositivo nacional de avaliação na escola elementar e no ingresso ao collège, há uma injunção inédita sobre a avaliação das competências dos alunos da escola maternal. Uma "cartilha de competências" lançada em 1990 deve avaliar a criança durante todo o maternal, nas diferentes áreas de atividades. Desde 1991, o ministério publica uma lista das "competências a adquirir em cada ciclo", que se soma às Orientações para a escola maternal de 1986 e depois é integrada aos programas. Proveniente do mundo empresarial, esse "modelo de competências" (ROPÉ; TANGUY, 2000) desempenha um papel decisivo na própria possibilidade de uma avaliação das crianças pequenas. Em particular, ele faz convergir uma escola maternal que até então recusa notas e classificações escolares, cujas práticas de avaliação são difusas e implícitas, às vezes referentes a normas de desenvolvimento da criança, com o ensino elementar, no qual predomina uma avaliação por notas e exercícios escritos. A partir de 2001, implantam-se ferramentas de avaliação e de apoio à aprendizagem dos alunos para a grande section e o cours préparatoire em nível nacional. A escola maternal, por sua vez, encontra-se inscrita em uma empresa de construção de indicadores e de padrões que faz parte de uma nova gestão e regulação dos sistemas escolares (VAN ZANTEN, 2004).

O PRISMA DAS COMPARAÇÕES INTERNACIONAIS

Ainda que a escola maternal esteja fortemente inscrita na tradição da escola primária republicana (BROUGÈRE, 2002), suas atrizes não deixaram de afirmar sua especificidade e sua excelência, difundindo-a como um modelo de educação infantil para os demais países. Hoje, retrospectivamente, é possível questionar esse "modelo quase mítico" (BOUYSSE, 2005) de uma "escola que o mundo inteiro inveja". Esse questionamento é concomitante com o desenvolvimento de arenas internacionais que consagram a educação de crianças pequenas como desafio fundamental das políticas públicas.

A ESCOLA MATERNAL NO CENÁRIO INTERNACIONAL

Até os anos 1980, a escola maternal representava, aos olhos dos seus profissionais, um modelo exemplar de educação infantil para os outros países (HERBINIÈRE-LEBERT; LÉANDRI, 1954). Essa excelência era definida comparativamente por cinco características: a longa tradição de uma educação pré-escolar na França; uma instituição dependente de um ministério da Educação (por oposição a serviços voltados à saúde ou à assistência social); o acesso gratuito, amplamente aberto às crianças desde os 2 anos; funcionários com um estatuto equivalente ao das escolas primárias e com formação especializada; e, finalmente, um "método" eclético, aberto às experiências estrangeiras (Froebel, Montessori, Decroly e outros). Nessa obra de proselitismo, ressaltamos de forma muito particular a intensidade e a duração do investimento no cenário internacional de Simone Herbinière-Lebert, inspetora geral de escolas maternais, responsável pela organização do Congresso Internacional da Infância em Paris em 1931, membro fundadora da Organização Mundial para a Educação Pré-Escolar - Omep - , criada em 1948, e presidente de 1950 a 1954, responsável pelo relatório consagrado à educação pré-escolar para o Bureau Internacional de l'éducation - BIE - , em 1961, encarregada das relações entre a Omep e a Unesco até 1977. Por mais de trinta anos, ela também divulgou as "novidades da Omep" junto à associação geral das professoras da escola maternal, contribuindo tanto para o desenvolvimento do comitê francês para a educação pré-escolar como para sua repercussão junto às autoridades da educação nacional.4 4 Daí um discurso oficial de celebração nacional da pré-escola, que não está isento de simplificações históricas: "A organização mundial para a educação pré-escolar (Omep) foi fundada em 1948 por iniciativa da França e fez progredir a ideia da pré-escolarização como ajuda às crianças; ela permitiu difundir a pré-escola francesa no mundo inteiro", afirma o Ministério da Educação em 1986, em um texto sobre o papel e as missões da pré-escola divulgado em forma de livro de bolso. (N. A.) Esse investimento no cenário internacional contribui, em retorno, para a valorização da escola maternal na França, como que por um "efeito bumerangue" (KECK; SIKKINK, 1998), por meio do qual uma causa se desenvolve no cenário nacional graças a sua circulação transnacional. Em uma época em que a questão primordial é a da pertinência do acolhimento das crianças pequenas fora do contexto familiar (maternal), esse proselitismo francês liga estreitamente um discurso universalista sobre a importância da educação desde os primeiros anos da vida, os valores humanistas e a paz, e um discurso que celebra uma forte identidade nacional, em que a escola maternal francesa aparece como parte de um patrimônio nacional.

A partir dos anos 1970, essa presença relativa da escola maternal francesa em nível internacional se dilui, quando a aposentadoria dessa pioneira e o crescente empreendimento de uma lógica escolar caminham ao lado de um desenvolvimento de arenas internacionais que traduzem um aumento das preocupações públicas relativas à educação pré-escolar e sua extensão efetiva. Assim, o Centre pour les recherches et l'innovation dans l'enseignement - Ceri - criado, em 1968, dentro da OCDE; lança em 1971 um programa de estudos sobre a educação pré-escolar. Inicialmente centrado na questão das desigualdades sociais de sucesso escolar e no desenvolvimento cognitivo, ele difunde as primeiras avaliações dos programas de educação compensatória, como o Head Start, lançado nos Estados Unidos em 1965 (LITTLE; SMITH, 1971), e só posteriormente expande sua problemática para a questão do acolhimento e da educação das crianças pequenas (GASS, 1975). Em 1971, em Veneza, o Conselho da Europa organiza o primeiro simpósio sobre "a educação pré-escolar na Europa", cuja repercussão é reforçada na França por Mialaret (1971), pioneiro do desenvolvimento das ciências da educação, presidente da Omep de 1975 a 1979. No âmbito da Unesco, o desenvolvimento das ações para uma educação ao longo da vida se afirma a partir dessa época (KAMERMAN, 2006). Esse desenvolvimento leva a valorizar a educação infantil, primeira etapa dessa educação, como faz, por exemplo, o trabalho de Faure (1972), ex-ministro da Educação Nacional na França. Por meio desse desenvolvimento das arenas internacionais, o proselitismo do modelo francês de uma educação pré-escolar é questionado no momento mesmo em que a escola maternal é submetida a exigências escolares crescentes.

A PLURALIDADE DAS ESCALAS DE MEDIDA DA ESCOLA MATERNAL FRANCESA

O desenvolvimento de atores transnacionais como a Unesco, a Unicef, a OCDE e a Europa, seu investimento na área da educação da primeira infância foi acompanhado do desenvolvimento de comparações internacionais baseadas em indicadores estatísticos, e às vezes, inclusive, limitadas apenas ao seu aspecto quantitativo. As comparações internacionais participam de uma globalização dos sistemas de educação da primeira infância, requerendo por meio da construção de classificações e de hierarquias entre os países, padrões idênticos; supondo, pela definição de "boas práticas", formas de equivalência entre estruturas nacionais; ou ainda difundindo os resultados de pesquisas científicas com focos universalistas e positivistas. Acrescente-se que os princípios de justificação que permitem julgar a educação de crianças pequenas são múltiplos. Através deles, pode-se mostrar que a pertinência da escola maternal ainda põe em jogo os três registros em que se fundamentou: os cuidados, a educação e a escolarização da primeira infância.

Quando se julga globalmente a acessibilidade das estruturas de acolhimento para crianças pequenas, do ponto de vista da proteção da infância, das políticas familiares, do emprego e da igualdade homem-mulher, a classificação da França é mais satisfatória em relação a outros países (UNICEF, 2008). Inversamente, do ponto de vista educacional que é privilegiado pelo programa Starting strong da OCDE (RAYNA; BENETT, 2005), que inclui a França em 2006, a escola maternal é objeto de múltiplas críticas. Os especialistas recomendam uma abordagem global das crianças, que respeitem mais suas necessidades, suas estratégias naturais de aprendizagem, seus direitos e seus interesses, em vez de se centrar quase que exclusivamente em suas capacidades cognitivas e seus resultados escolares (OECD, 2006). Segundo Mahon (2006), é preciso acrescentar que essa perspectiva educativa não é a única desenvolvida pela OECD. Como organização complexa, ela é permeada por redes de atores heterogêneos: as preocupações relativas à educação da primeira infância, promovendo uma visão centrada nas crianças, em seus direitos e suas competências, concorrem com a questão do acolhimento e dos cuidados das crianças pequenas, trazidas pela direção do emprego, do trabalho e das questões sociais. A importância cada vez maior das pesquisas periódicas Pisa dentro da OECD e sua ampla repercussão internacional têm enfatizado recentemente um terceiro foco das políticas da primeira infância, que as relaciona estreitamente aos sistemas escolares de cada país. Assim, a exploração estatística dos resultados do Pisa em 2009 levou a formular a seguinte pergunta: "a participação da educação pré-primária se traduz por melhores resultados na escola?" (OECD, 2011). A comparação entre a França e os Estados Unidos permite ilustrar em particular o interesse de oferecer uma educação pré-escolar a todas as crianças, mas completando essa afirmação em termos da qualidade dessa frequência, avaliada com base em critérios da ratio crianças/profissional e do montante do investimento financeiro por criança. É também desse ponto de vista de uma política que privilegia a eficácia e a equidade dos serviços educacionais, segundo a qual o investimento no período pré-escolar é fundamental para reduzir as desigualdades sociais e culturais, que se coloca a comparação internacional da agência europeia Eurydice (EACEA, 2009).

Por meio das diferentes escalas de medida que adotam, essas avaliações mostram claramente que o registro da justificação escolar da escola maternal se impôs na França, sem para isso eliminar registros de justificação relativos ao seu papel de acolhimento e de cuidado, e sua importância educativa. As avaliações comparativas internacionais põem em jogo escolhas políticas complexas, como a questão das relações entre "quantidade" e "qualidade" das políticas da primeira infância, a questão também da tradução de uma "qualidade" em indicadores padronizados e cifrados. Uma visão mais próxima das práticas no âmbito de estudos comparativos qualitativos mostra igualmente a preponderância do escolar sobre a escola maternal atual em contraste com outros países. É o caso, por exemplo, de um estudo comparativo do acolhimento de filhos pequenos de migrantes, realizada no contexto da pesquisa Children Crossing Borders (BROUGÈRE; GUENIF-SOUILAMAS; RAYNA, 2008). Se uma comparação de tipo etnográfico com base em práticas locais coloca a questão de sua representatividade em relação a um espaço nacional, ela tem o mérito de desconstruir e pôr em perspectiva o caráter cultural das identidades nacionais, particularmente aquelas que, como a da França, afirmam sua vocação universalista.

CONCLUSÃO

Procuramos, neste artigo, caracterizar o que constitui, no contexto francês, um processo de escolarização da educação de crianças pequenas. Em primeiro lugar, mostramos a mudança das relações da escola maternal com a escolaridade obrigatória, seu alinhamento progressivo com a organização da escola elementar, em termos de inspeção, de corpo docente, de divisão do trabalho, de continuidade pedagógica. Apresentamos as transformações recentes que envolvem o acolhimento das crianças de 2 anos e que reforçam as fronteiras entre a escola maternal a partir dos 3 anos e as estruturas para os pequeninos. Em segundo lugar, as reformas do currículo escolar foram analisadas para caracterizar a mudança de hierarquia, de divisão e de enquadramento especificamente escolar das aprendizagens dos alunos, sobretudo o peso do domínio da língua. Em seguida, enfatizamos o desenvolvimento dos processos de avaliação, no nível dos alunos e no nível dos efeitos, em termos de eficácia e de equidade, da frequência da escola maternal sobre o posterior sucesso escolar dos alunos. Todas essas mudanças permitem objetivar o uso de um registro de justificação escolar da pertinência da escola maternal, como mostram também alguns estudos comparativos qualitativos sobre as práticas pedagógicas. Nesse contexto, a participação dos pais só é considerada na medida em que contribui para o futuro escolar da criança. A participação das crianças é igualmente reduzida na aprendizagem de seu "ofício de aluno", privilegiando o foco no futuro em uma concepção da criança plenamente inscrita no presente. Assim, a reflexão sobre o bem-estar, sobre as capacidades e os direitos das crianças só pode se desenvolver criticando essa gestão escolar ou, mais amplamente, qualquer forma de "normatização" da educação infantil. Acrescente-se que essa concepção das crianças como verdadeiros "atores" de sua educação e essa promoção de uma educação dita holística não excluem pressupostos ideológicos e sociais que já apareciam nos trabalhos de Bernstein (1975) e Chamboredon (1975). Elas não deixam de criar novas formas de influência sobre as crianças e os adultos (DAHLBERG, 2009). Isso significa que não se pode escapar a uma compreensão da complexidade dos fatos educativos, de suas ambivalências constitutivas, dos compromissos que eles tecem entre diferentes registros de justificação, como entre diferentes concepções da criança e das relações entre crianças e adultos.

Para concluir, é impossível não relacionar essa predominância do escolar sobre a educação das crianças pequenas com uma cultura da escola que, na França, é parte constitutiva de uma definição da cidadania, a de uma igualdade formal e abstrata, da indiferença às diferenças transformada em princípio político. É impossível também não relacioná-la com a importância decisiva dos resultados escolares no acesso ao emprego, o futuro profissional e, mais amplamente, a inserção social dos jovens. O sistema escolar francês se distingue por seu caráter profundamente desigual e elitista, como mostram particularmente as comparações internacionais (DURU-BELLAT, 2007; BAUDELOT; ESTABLET, 2009). É impossível, enfim, não relacionar essa predominância do escolar com uma paixão pela igualdade e um questionamento recorrente sobre as exigências de equidade do sistema educacional francês (DUBET; DURU-BELLAT, 2007). Nisso, a situação francesa ilustra bem, levando-as ao paroxismo, as pressões escolares sobre a educação das crianças pequenas, perceptíveis hoje sob as formas mais eufemísticas em outros locais, inclusive em países como a Suécia (JÖNSSON; SANDELL; TALBERG-BROMAN, 2011) ou o Japão (HOSHI WATANABE, 2010), cujas tradições educacionais da primeira infância ignoram uma preparação para a escola.

A preocupação com a justiça e a eficácia na França parece monopolizada pela questão da escola, ao ponto de tudo conduzir a isso e de ocultar outros registros de justificação da pertinência da escola maternal: o do acolhimento e cuidado das crianças e o de sua educação. Colocada no cenário internacional, a situação francesa revela tensões entre a internacionalização e a globalização das questões de uma educação pré-escolar, e singularidades nacionais que fazem parte de tradições culturais e políticas relativas tanto ao papel respectivo do Estado e das famílias na educação da criança como às concepções da cidadania e da criança.

TRADUÇÃO DENISE RADANOVIC VIEIRA

REVISÃO TÉCNICA MOYSÉS KUHLMANN JR.

Do original: GARNIER, Pascale. L'éducation des jeunes enfantes et la question de l'école: le cas de la France. Revista Española de Educación Comparada, v. 21, p. 59-84, 2013. ISSN 1137-8654. Disponível em: <http://www.uned.es/reec/pdfs/21-2013/03%20_garnier.pdf>.

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  • A educação infantil e a questão da escola: o caso da França

    Early childhood education and the school question: the French case
  • I I A écolle maternelle corresponde aproximadamente à pré-escola brasileira, mas o ingresso ocorre aos 3 anos, admitindo-se a matrícula também aos 2 anos de idade. No texto, mantém-se a denominação escola maternal, ou simplesmente maternal, como lá é chamada, considerando-se as peculiaridades dessa instituição e sua história. (Nota do revisor técnico - N. R.) II Cabe salientar que a escola maternal é muito mais uma continuidade das "salas de asilo" do que uma nova instituição. A mudança de denominação pelos republicanos, em 1881, prestou-se muito mais à intenção de dissociar a instituição da monarquia. A destinação às crianças pobres é uma peculiaridade das instituições de educação infantil, naquele período, mas a Salle d´Asile, criada em 1833, já definia uma proposta educacional para aquela instituição, pensada por Jean-Marie Denis Cochin (LUC, Jean-Noël. La diffusion des modèles de préscolarisation en Europe dans la première moitié du XIX e siècle. Histoire de L´Éducation, n. 82, p. 189-206, mai 1999; KUHLMANN JR., M. Relações sociais, intelectuais e educação da infância na história. In: SOUZA, Gizele de (Org.). Educar na infância: perspectivas histórico-sociais. São Paulo: Contexto, 2010. v. 1, p. 81-97). (N. R.) III França é dividida em 26 regiões administrativas que, por sua vez, se subdividem em 100 departamentos. (N. R.) IV VINCENT, Guy; LAHIRE, Bernad; THIN, Daniel. Sobre a história e a teoria da forma escolar. Educ. Rev., Belo Horizonte, n. 33, jun. 2001. Disponível em: < http://educa.fcc.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-46982001000100002&lng=pt&nrm=iso>. (N. R.) colocada sob a responsabilidade do Ministério da Educação Nacional, que estabelece os programas, a organização e a regulamentação, supervisionando-a por meio de uma inspeção escolar, e que recruta, remunera e é responsável pela formação dos professores. Como ocorre com a escola primária, obrigatória a partir dos 6 anos, a infraestrutura e os funcionários das escolas maternais são administrados pelas autoridades locais (FRANCIS, 2008). Por mais útil que seja esta breve apresentação, o ponto de vista das comparações internacionais tende a ocultar os debates, por vezes bastante exaltados, provocados pela educação da primeira infância em cada país. É o que ocorre na França, onde as tensões se concentram principalmente nas exigências escolares cada vez maiores da escola maternal.
  • V V Etapas que acolhem, respectivamente, as crianças de 3, 4 e 5 anos e antecedem a entrada na escola primária. (N. R.) Essa prioridade marca também uma clara mudança de orientação: trata-se de privilegiar a aquisição de competências e de conhecimentos relativos ao domínio da língua em detrimento da comunicação e da expressão dos alunos. Justificado pelo "recuo de nosso sistema educacional nas classificações internacionais", o programa de 2008 pretende tornar mais precoce a aprendizagem das bases da leitura, por exemplo, incluindo, desde a
    moyenne section, as atividades de análise fonológica preparatórias à aprendizagem do código alfabético. As avaliações internacionais das aquisições dos alunos constituem aqui uma referência inédita para legitimar a busca de uma maior eficácia escolar da escola maternal.
  • II colocada sob a responsabilidade do Ministério da Educação Nacional, que estabelece os programas, a organização e a regulamentação, supervisionando-a por meio de uma inspeção escolar, e que recruta, remunera e é responsável pela formação dos professores. Como ocorre com a escola primária, obrigatória a partir dos 6 anos, a infraestrutura e os funcionários das escolas maternais são administrados pelas autoridades locais (FRANCIS, 2008). Por mais útil que seja esta breve apresentação, o ponto de vista das comparações internacionais tende a ocultar os debates, por vezes bastante exaltados, provocados pela educação da primeira infância em cada país. É o que ocorre na França, onde as tensões se concentram principalmente nas exigências escolares cada vez maiores da escola maternal. A
    écolle maternelle corresponde aproximadamente à pré-escola brasileira, mas o ingresso ocorre aos 3 anos, admitindo-se a matrícula também aos 2 anos de idade. No texto, mantém-se a denominação escola maternal, ou simplesmente maternal, como lá é chamada, considerando-se as peculiaridades dessa instituição e sua história. (Nota do revisor técnico - N. R.)
    II Cabe salientar que a escola maternal é muito mais uma continuidade das "salas de asilo" do que uma nova instituição. A mudança de denominação pelos republicanos, em 1881, prestou-se muito mais à intenção de dissociar a instituição da monarquia. A destinação às crianças pobres é uma peculiaridade das instituições de educação infantil, naquele período, mas a Salle d´Asile, criada em 1833, já definia uma proposta educacional para aquela instituição, pensada por Jean-Marie Denis Cochin (LUC, Jean-Noël. La diffusion des modèles de préscolarisation en Europe dans la première moitié du XIX
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    Educar na infância: perspectivas histórico-sociais. São Paulo: Contexto, 2010. v. 1, p. 81-97). (N. R.)
    III França é dividida em 26 regiões administrativas que, por sua vez, se subdividem em 100 departamentos. (N. R.)
    IV VINCENT, Guy; LAHIRE, Bernad; THIN, Daniel. Sobre a história e a teoria da forma escolar.
    Educ. Rev., Belo Horizonte, n. 33, jun. 2001. Disponível em: <
  • VV Essa prioridade marca também uma clara mudança de orientação: trata-se de privilegiar a aquisição de competências e de conhecimentos relativos ao domínio da língua em detrimento da comunicação e da expressão dos alunos. Justificado pelo "recuo de nosso sistema educacional nas classificações internacionais", o programa de 2008 pretende tornar mais precoce a aprendizagem das bases da leitura, por exemplo, incluindo, desde a moyenne section, as atividades de análise fonológica preparatórias à aprendizagem do código alfabético. As avaliações internacionais das aquisições dos alunos constituem aqui uma referência inédita para legitimar a busca de uma maior eficácia escolar da escola maternal. Etapas que acolhem, respectivamente, as crianças de 3, 4 e 5 anos e antecedem a entrada na escola primária. (N. R.)
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    Na medida em que nossa análise diz respeito às transformações institucionais da escola maternal, privilegiamos os textos legais, regulamentos, relatórios e discursos oficiais que definem a escola maternal e seus atores. Sem pretender ser exaustivos, também fazemos referência a trabalhos de pesquisa ou posicionamentos profissionais a respeito, com o risco de colocar em um mesmo plano discursos heterogêneos. (Nota da Autora - N. A.)
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    Vale observar que, embora nossa análise retome a postura teórica de uma sociologia da crítica, focalizando as operações críticas e de justificação dos atores e supondo uma pluralidade de princípios de acordo, ela não retoma a axiomática das cidades e de diferentes regimes de ação formalizada pelo trabalho de Boltanski e Thevenot (2006). (N. A.)
  • 3
    Pode-se distinguir esse processo de escolarização e uma transformação dos modelos educacionais estudados por Plaisance (1986) entre 1945 e 1980, em ligação com a evolução das características sociais de seu público e do corpo docente. No momento em que a escola maternal é frequentada essencialmente pelas crianças dos meios populares, predomina um modelo "produtivo", centrado na visibilidade das produções dos alunos. A partir do final dos anos 1950, à medida que o maternal passa a receber as classes médias e superiores, logo se consolida um modelo "estético", que valoriza a criatividade da criança, e depois um modelo "expressivo", que valoriza o desabrochar e a socialização da criança. (N. A.)
  • 4
    Daí um discurso oficial de celebração nacional da pré-escola, que não está isento de simplificações históricas: "A organização mundial para a educação pré-escolar (Omep) foi fundada em 1948 por iniciativa da França e fez progredir a ideia da pré-escolarização como ajuda às crianças; ela permitiu difundir a pré-escola francesa no mundo inteiro", afirma o Ministério da Educação em 1986, em um texto sobre o papel e as missões da pré-escola divulgado em forma de livro de bolso. (N. A.)
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Jun 2014
    • Data do Fascículo
      Mar 2014
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