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Estudo comparativo entre as técnicas de sutura total e serosubmucosa em anastomoses colônicas na presença de um protetor intraluminar em cães

Comparative study of all-layers suture and extramucosal single layer suture with an intraluminal protector in dogs

Resumos

OBJETIVO: Avaliar a cicatrização comparando as técnicas de sutura total e parcial em anastomoses colônicas término-terminais na presença de um protetor intraluminar confeccionado a partir de um dreno de Penrose. MÉTODOS: Foram realizadas anastomoses colônicas em 10 cães nos quais foi suturado a mucosa / submucosa um protetor intraluminar por meio da eversão do segmento intestinal proximal em 10 cm. Os animais foram distribuidos em dois grupos experimentais: Grupo 1 - sutura total e Grupo 2 - sutura serosubmucosa. Os animais foram reoperados com sete dias de pós-operatório para coleta de material e subseqüente análise histopatológica. RESULTADOS: Observamos no exame histopatológico das anastomoses realizadas com sutura serosubmucosa (Grupo 2) uma melhor cicatrização caracterizada por um menor infiltrado inflamatório e por uma maior integridade das camadas intestinais quando comparadas com o Grupo 1. CONCLUSÃO: O uso da técnica de sutura parcial mostrou-se superior a de sutura total nas anastomoses colônicas na presença de protetor intraluminar.

Anastomose cirúrgica; Colon; Cães; Técnicas de sutura; Cicatrização de feridas


BACKGROUND: This study aims to evaluate the colonic anastomotic healing testing of all layers suture and single layer suture using an intraluminal protector. The intraluminal protector was shaped from a Penrose drain and then fixed 10 cm from the superior end of the anastomotic site. METHODS: Colonic anastomoses were done in 10 dogs, which were sutured, in the proximal segment with an intraluminal protector made of Penrose n.3 drain, using interrupted mucosal / submucosal suture. In the subsequent anastomoses, the animals were subdivided in two experimental groups: 1 - in all layers and 2 - extramucosal. In the seventh postoperative day, a tissue fragment was collected for histopathological analysis. RESULTS: Group 2 histopathological examinations had a better scar (extramucosal suture), characterized by a lesser inflammatory process than in animals in which all layers suture was used (group 1). CONCLUSION: The use of extramucosal suture was better than total suture in colonic anastomoses with the presence of an intraluminal protector.

Anastomosis, surgical; Colon; Dogs; Suture Techniques; Wound healing


ARTIGO ORIGINAL

Estudo comparativo entre as técnicas de sutura total e serosubmucosa em anastomoses colônicas na presença de um protetor intraluminar em cães

Comparative study of all-layers suture and extramucosal single layer suture with an intraluminal protector in dogs

Cíntia Lourenço SantosI; Edmundo Jorge AbílioII; André Lacerda de Abreu OliveiraIII; Carlos Magno Anselmo MarianoIV; Anderson Teixeira NunesV; Eulógio Carlos Queiroz de CravalhoV

IDoutoranda em Medicina (Cirurgia Geral) da Universidade Federal do Rio de Janeiro

IIProfessor Associado de Patologia e Clínica Cirúrgica da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, UENF

IIIProfessor Associado de Técnica Cirúrgica da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, UENF

IVMédico Veterinário Autônomo

VProfessor Associado de Anatomia Patológica da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, UENF

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Cíntia Lourenço Santos Av. Senador José Carlos Pereira Pinto, 100, casa 02 Parque Calabouço 28030-620 - Campos dos Goytacazes, RJ e-mail: cintia@uenf.br ou cintiavet@hotmail.com Telefones: (021) 91769041, (021) 26340571, (022) 27236829.

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar a cicatrização comparando as técnicas de sutura total e parcial em anastomoses colônicas término-terminais na presença de um protetor intraluminar confeccionado a partir de um dreno de Penrose.

MÉTODOS: Foram realizadas anastomoses colônicas em 10 cães nos quais foi suturado a mucosa / submucosa um protetor intraluminar por meio da eversão do segmento intestinal proximal em 10 cm. Os animais foram distribuidos em dois grupos experimentais: Grupo 1 - sutura total e Grupo 2 - sutura serosubmucosa. Os animais foram reoperados com sete dias de pós-operatório para coleta de material e subseqüente análise histopatológica.

RESULTADOS: Observamos no exame histopatológico das anastomoses realizadas com sutura serosubmucosa (Grupo 2) uma melhor cicatrização caracterizada por um menor infiltrado inflamatório e por uma maior integridade das camadas intestinais quando comparadas com o Grupo 1.

CONCLUSÃO: O uso da técnica de sutura parcial mostrou-se superior a de sutura total nas anastomoses colônicas na presença de protetor intraluminar.

Descritores: Anastomose cirúrgica; Colon; Cães; Técnicas de sutura; Cicatrização de feridas

ABSTRACT

BACKGROUND: This study aims to evaluate the colonic anastomotic healing testing of all layers suture and single layer suture using an intraluminal protector. The intraluminal protector was shaped from a Penrose drain and then fixed 10 cm from the superior end of the anastomotic site.

METHODS: Colonic anastomoses were done in 10 dogs, which were sutured, in the proximal segment with an intraluminal protector made of Penrose n.3 drain, using interrupted mucosal / submucosal suture. In the subsequent anastomoses, the animals were subdivided in two experimental groups: 1 - in all layers and 2 - extramucosal. In the seventh postoperative day, a tissue fragment was collected for histopathological analysis.

RESULTS: Group 2 histopathological examinations had a better scar (extramucosal suture), characterized by a lesser inflammatory process than in animals in which all layers suture was used (group 1).

CONCLUSION: The use of extramucosal suture was better than total suture in colonic anastomoses with the presence of an intraluminal protector.

Key words: Anastomosis, surgical; Colon; Dogs; Suture Techniques; Wound healing.

INTRODUÇÃO

As anastomoses colônicas constituem um campo de grande interesse e preocupação na cirurgia. A atenção se deve em parte pelas graves e não raras complicações associadas a tais anastomoses. A deiscência da anastomose, com conseqüente formação de fístulas persiste como uma das piores complicações neste tipo de cirurgia1-4 e a obtenção de um método seguro de anastomose, com taxas reduzidas de complicações ainda é um ideal a ser alcançado.

Nos últimos dois séculos, a cicatrização de anastomoses colônicas vem sendo estudada intensamente por vários autores, com ênfase nas técnicas de sutura e de materiais empregados na confecção das anastomoses 3- 6, bem como melhor compreensão de diversos fatores sobre a cicatrização1, 2, 7, 8 .

A cicatrização da anastomose depende de um balanço delicado entre a síntese e lise do colágeno. Nos primeiros dias do pós-operatório, a lise supera a síntese tornando esse período crítico e mais susceptível à deiscências7. Diversos fatores interferem na cicatrização anastomótica, dentre eles, a presença de infecção é incriminada como a principal causa de deiscências2. Estudos mostram que anastomoses contaminadas apresentam uma pior cicatrização, com menores concentrações de colágeno e que os riscos de ruptura são maiores2, 9-11. Segundo Irvin, o principal contribuinte para a infecção em uma anastomose é o contato direto das fezes com a linha de sutura, e que não ocorre apenas por contaminação bacteriana, mas também devido à força de cisalhamento exercida pelo conteúdo luminar10, 12.

Diversas técnicas têm sido estudadas visando prevenir infecções e consequentemente as complicações tão comuns nas operações de cólon. Um dos métodos empregados é a utilização de suturas serosubmucosas, que evita o contato entre fio de sutura e o conteúdo fecal13. Outra técnica que tem se mostrado útil na diminuição das complicações de anastomoses é a utilização de um protetor intraluminar. Os protetores isolam a linha de sutura do conteúdo fecal, promovendo proteção durante o período de colagenólise, que ocorre no início da cicatrização, diminuindo desta forma as deiscências com conseqüentes extravasamentos e formação de fístulas14.

Muitos trabalhos têm sido realizados utilizando variados tipos de protetores intraluminares, mostrando seus benefícios sobre a cicatrização anastomótica 14-20, e estes, em sua maioria, associam a técnica do uso do protetor intraluminar à sutura serosubmucosa para a subseqüente anastomose14,15, 18 . Estudos comparativos entre tipos de sutura realizados para a confecção das anastomoses associados ao uso do protetor intraluminar ainda não foram realizados. Se o protetor facilita a cicatrização por isolar o conteúdo fecal da linha de sutura, este pode amenizar os efeitos deletérios do contato do fio de sutura com a luz intestinal no caso da utilização da técnica de sutura total. Desta forma, o presente estudo propõe comparar as técnicas de sutura total com a de sutura parcial em anastomoses colônicas na presença de um protetor intraluminar.

MÉTODO

O projeto foi executado segundo as Normas para o uso de animais para experimentação do COBEA, sendo aprovado pelo Comitê de Ética da Fundação Educacional Dom André Arcoverde.

Foram utilizados 10 cães, provenientes da Fundação Educacional Dom André Arcoverde, sendo cinco machos e cinco fêmeas pesando entre 8kg e 12 kg e com idade aproximada de um ano. Os animais foram submetidos a um período de observação de 15 dias, para adaptação ao manejo e alimentação padronizada, realização de hemograma e pesquisa para hemocitozoários e tratamento antiparasitário.

Após este período de adaptação, os animais em jejum prévio de 24h, foram pré-anestesiados com acepromazina na dose de 0,1mg/kg por via intramuscular e induzidos a com tiopental sódico a 2,5% na dosagem de 10 mg/kg por via intravenosa. Após a indução anestésica, foi realizado um bloqueio regional epidural lombossacro com lidocaína a 2%, e administração de Cetoprofeno (Profenid)® na dose de 1mg/kg objetivando uma analgesia preventiva e um menor volume anestésico utilizado. Os animais foram mantidos no plano 3, estágio 4 pela anestesia inalatória com halotano na concentração 1,5% a 2%, em circuito valvular semifechado com absorvedor de CO2.

Foi realizada tricotomia na região ventral do abdome, sendo a anti-sepsia com iodo-povidona. A laparotomia fez-se por uma incisão mediana de aproximadamente cinco centímetros de comprimento. Após o acesso à cavidade abdominal, o colón esquerdo foi exposto e ordenhado para retirar seu conteúdo fecal e a seguir formam colocados clampes intestinais. Foi realizada uma enterotomia em uma área menos vascularizada objetivando evitar hemorragias e ligaduras da arcada vascular com intuito de não promover isquemias na região da anastomose. O segmento proximal foi evertido em aproximadamente 10 cm, onde foi suturado à mucosa / submucosa um protetor com padrão de sutura com pontos simples separados, com fio cirúrgico 4-0 de poliglactina 910 (Vicryl – Ethicon®) – (Figura 1). O protetor intraluminar foi previamente confeccionado a partir de dreno de Penrose estéril número 3, cortado em aproximadamente 15 cm e diminuído seu diâmetro distal com um ponto de nylon 2-0. Após a disposição do protetor intraluminar no segmento proximal intestinal, este foi revertido e aproximado ao segmento distal para a anastomose subseqüente (Figura 2).



A partir deste ponto os procedimentos foram diferenciados por grupos da seguinte forma:

- Grupo 1: - Sutura total - A anastomose foi realizada com sutura simples, pontos separados, perfurante total.

- Grupo 2: Sutura serosubmucosa - A anastomose foi realizada com sutura simples, pontos separados, com padrão de sutura de Lembert (excluindo a camada mucosa).

Após o término da enteroanastomose, o omento foi colocado sobre o sítio anastomótico e fixado com um ponto simples em ambos os grupos experimentais.

A laparrorafia foi realizada com fio de "mononylon" 2-0 com sutura em pontos em "X" separados, sendo em seguida suturado o subcutâneo com fio categute simples 2-0 com padrão contínuo e a pele com sutura contínua e fio "nylon" 2-0.

No pós-operatório os animais foram colocados em canis individuais permanecendo em jejum completo por 12 horas após a operação, quando foi liberada a ingestão de água "ad libitum". A partir de 24 horas de pós-operatório foi oferecida refeição pastosa de ração comercial, duas vezes ao dia. Nos três dias subseqüentes do pós-operatório foi administrada dipirona sódica de 12h em 12h.

Foram realizadas diariamente avaliações clínicas analisando os seguintes parâmetros: temperatura retal, freqüência respiratória, freqüência cardíaca, coloração de mucosas e aspecto da ferida cirúrgica. Os animais foram também observados quanto à presença de vômito e a manutenção do apetite.

O tempo de permanência do protetor intraluminar foi verificado por exames fecais diários.

Os animais foram reoperados com sete dias de pós-operatório, em que se expôs a região anastomosada. Foi observado o aspecto externo das anastomoses assim como a presença de aderências e deiscências. Foi realizada uma enterotomia longitudinal na face antimesentérica para a visão do aspecto interno da anastomose, bem como a presença de fístulas e estenose. Foi retirado um fragmento de aproximadamente 5 cm de comprimento e 1,5cm de largura, disposto em um pedaço de papel filtro e fixado em formol a 10% para posterior análise microscópica.

Os fragmentos colônicos foram processados em parafina, microtomizados e corados pela coloração hematoxilina & eosina, e analisados em microscópio óptico (de luz).

Os animais receberam cuidados no pós-operatório e após a completa recuperação foram encaminhados para a adoção.

Os dados foram analisados segundo o teste "t" para médias, pelo programa estatístico SAEG, USA. As diferenças entre médias foram consideradas como significativas com valores de p inferiores a 0,05.

RESULTADOS

Avaliações clínicas

Nos animais de ambos os grupos não houve alterações na freqüência cardíaca e respiratória dos animais. Os animais 6 e 8, pertencentes ao Grupo 1, apresentaram hipertermia no segundo dia do pós-operatório. Nos animais do Grupo 2, não houve alterações na temperatura.

Tempo de permanência do protetor intraluminar

O tempo médio de permanência do protetor intraluminar foi de 5,1 dias, variando entre três e seis dias. Dois animais (um de cada grupo) perderam o protetor no terceiro, um do Grupo 2 no quarto, dois do Grupo 1 e um do Grupo 2 no quinto e dois, um de cada Grupo, perderam o protetor no sexto dia de pós-operatório. Não houve diferença estatística significativa entre o tempo de permanência do protetor nos Grupos 1 e 2, de acordo com o teste "t" (P>0,05).

Avaliação macroscópica

No segundo dia de pós-operatório, dois animais, sendo um de cada grupo, apresentaram evisceração. Estes animais foram eutanasiados e necropsiados, quando se evidenciou a presença de fístulas no sítio anastomótico em ambos animais.

O exame macroscópico foi realizado quando o cólon foi reaberto para coleta do material no período transcirúrgico das reoperações (sete dias após a primeira operação). Com relação ao aspecto externo da anastomose, não foi notada diferença macroscópica entre os animais do Grupo 2.

Com exceção dos animais que morreram, não foi observada a presença de vazamentos, fístulas ou abscessos em nenhum dos grupos. Um animal do Grupo 1 apresentou aderência da bexiga, útero e intestino delgado. Um animal do Grupo 2 apresentou aderência do intestino delgado ao sítio anastomótico. Em apenas um animal do Grupo 2 foi observado um estreitamento da anastomose que, no entanto, não comprometia o trânsito intestinal.

Internamente, não foram observadas diferenças no aspecto macroscópico das anastomoses, a não ser a presença dos pontos em contato com o lúmen intestinal no Grupo 1.

Avaliação microscópica

Na avaliação microscópica dos animais do Grupo 1, foi observado processo de cicatrização com grande infiltrado neutrofílico e pouca reação ao fio cirúrgico (Figura 3). A mucosa apresentava-se invariavelmente destruída e ulcerada com infiltrado inflamatório intenso.


No Grupo 2, foi observado o processo cicatricial com escasso infiltrado inflamatório, pouca reação ao fio cirúrgico e a camada mucosa encontrou-se invariavelmente íntegra ou em vias de regeneração (Figura 4).


DISCUSSÃO

As operações intestinais se desenvolveram gradualmente de um nível místico para um nível científico ao longo dos séculos. Os princípios de aposição das superfícies serosas com suturas serosubmucosas, estabelecidas por Lembert, em 1826, e a descoberta da importância da camada submucosa por Halsted em 1887, estabeleceram os pilares das suturas intestinais, e seus fundamentos persistem até hoje.

A infecção é implicada como a principal causa de deiscências nas anastomoses2. Uma das estratégias utilizadas para prevenir a infecção é a utilização de suturas que não penetram a camada mucosa13. De fato, no grupo em que se utilizou a sutura serosubmucosa (Grupo 2), o infiltrado inflamatório era quase inexistente.

Os efeitos deletérios do bolo fecal não estão relacionados apenas ao seu grande conteúdo em microorganismos, mas também pelo estresse mecânico à anastomose exercido no trânsito intestinal. O bolo fecal distende localmente o intestino, e quando a cicatrização está em uma fase mais precoce, a distensão pode também causar isquemia na anastomose, podendo-se esperar vazamentos na face antimesentérica. A atividade da colagenase pode ser excessivamente aumentada pela infecção local se fezes estão retidas na anastomose13.

A utilização de protetor intraluminar tem sido proposta com o intuito de isolar a linha de sutura do conteúdo fecal, permitindo uma melhor condição de cicatrização. O protetor isola a linha de sutura do conteúdo fecal, protegendo a anastomose não só de seu conteúdo em microorganismos, mas também do estresse de cisalhamento exercido pelas fezes, permitindo assim, uma melhor condição de cicatrização14, 21. Oliveira14, utilizando submucosa de suíno como protetor intraluminar, observou uma maior concentração de colágeno na região da anastomose e um menor índice de complicações com o uso desta técnica. Porto19, utilizou um dreno de Penrose como protetor em 15 pacientes humanos, não havendo nenhum caso de morbi-mortalidade, considerando o seu uso como vantajoso, pois possuía um custo reduzido, e estava ao alcance de qualquer cirurgião.

Neste trabalho, escolhemos o dreno de Penrose como protetor porque além das vantagens de custo e acessibilidade descritas ele se encontra disponível em diversos diâmetros, o que facilita a sua adequação ao cólon do animal. Além disso, os drenos de Penrose são disponíveis em embalagens estéreis e individuais, que facilitam o seu armazenamento, e podem estar prontamente disponíveis caso exista a necessidade.

O protetor intraluminar protege a anastomose do conteúdo fecal especialmente durante o período de colagenólise, permitindo assim, melhores condições de cicatrização21. Nas anastomoses realizadas com sutura total houve um grande infiltrado inflamatório com grande contaminação. A presença do protetor intraluminar protegeu a anastomose do conteúdo fecal no período subseqüente a realização da operação, mas não influenciou no fato de que, no momento da realização da anastomose, o fio de sutura (no caso da sutura total) entrasse em contato com a camada mucosa que se encontrava contaminada. O fio, ao passar por esta camada carreia resíduos, o que justifica a contaminação. O que não podemos afirmar, mas nos deixa a suspeita, é de que sem a presença do protetor a contaminação ocorrida com a sutura total poderia ser ainda maior, já que haveria continuidade na contaminação pela permanência do contato das fezes com o fio de sutura.

Embora no grupo em que foi realizada sutura total apresentasse um infiltrado inflamatório exuberante em suas lâminas, o que poderia estar relacionado a um maior número de complicações, como deiscências e vazamentos, não existiu diferença nessas complicações entre os dois grupos experimentas. Este fato pode estar relacionado à presença do protetor intraluminar que, ao conduzir o conteúdo fecal por seu interior evitando seu contato com a linha de sutura, diminui assim os riscos de vazamentos e deiscências.

Neste trabalho, não foi avaliada diretamente a quantidade de colágeno e sim, de uma maneira geral, a presença do tecido de granulação. Observamos que mesmo havendo um infiltrado inflamatório exuberante no grupo de sutura total, não foi notada diferença entre a magnitude do tecido de granulação entre os dois grupos experimentais. Esse achado pode talvez estar correlacionado com a presença do protetor intraluminar que, embora não tenha impedido a contaminação inicial, pode ter diminuído a contaminação subseqüente.

A sutura de Lembert, por propiciar uma melhor aposição das superfícies serosas, produz resultados com menor formação de aderências. Apenas dois casos de aderência ocorreram em nosso trabalho: uma pequena aderência do intestino delgado no Grupo 2 e uma aderência um pouco maior envolvendo o útero, bexiga e intestino delgado em um animal do Grupo 1, não havendo assim diferença entre os dois grupos experimentais. Em nosso experimento, realizamos a transposição do omento sobre a anastomose em ambos os grupos. O omento possui a capacidade de estimular uma neovascularização, permitir uma nova drenagem linfática e potencializar o processo cicatricial22. Além disso, quando utilizamos o omento, promovemos uma aderência entre ele e a região colônica em que foi realizada a anastomose, diminuindo as chances de que aderências não orientadas acontecessem, o que podemos desta forma relacionar ao pequeno número de aderências observadas neste nosso estudo.

O tempo médio de permanência do protetor intraluminar foi de cinco dias. Três animais (um do Grupo1 e dois do Grupo 2) permaneceram com o protetor por um tempo inferior a cinco dias, que é o tempo mínimo preconizado para que este seja efetivo na proteção da anastomose no período mais crítico da cicatrização colônica que vai do terceiro ao quinto dia de pós-operatório14. Embora nesses animais a proteção proporcionada pelo protetor possa não ter sido efetiva, não existiu diferença entre o tempo de permanência do protetor entre os grupos, não influenciando assim na resposta final de comparação entre as duas técnicas. Existem controvérsias na literatura sobre o tempo em que o protetor permaneceu no período pós-cirúrgico. Porto, utilizou um dreno de Penrose como protetor e este foi eliminado entre 10 e 16 dias. Ruiz23et al., utilizaram um preservativo de látex evertendo o segmento pré-anastomótico em 5 cm observando uma eliminação entre 10 a 15 dias no pós-cirúrgico. Pisoni18, também com o uso de preservativo relatou a eliminação entre 8 e 14 dias. Esses estudos foram em seres humanos. Um estudo experimental em cães15, foi realizado com submucosa de suíno aplicada a 5 cm da região pré-anastomótica que foi eliminada precocemente (em torno de três dias). A utilização do mesmo tipo de protetor, também em cães, com eversão do segmento pré-anastomótico em 10 cm, observou a sua eliminação entre cinco e oito dias14.

No presente estudo, no que concerne aos parâmetros de regeneração da mucosa e infecção, a técnica de sutura extramucosa mostrou-se superior à técnica de sutura total, mesmo na presença do protetor intraluminar.

Recebido em 10/11/2006

Aceito para publicação em 15/01/2007

Conflito de interesses: nenhum

Fonte de financiamento: nenhuma

Trabalho realizado na Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro - UENF, Hospital Veterinário - HVET, Laboratório de Sanidade Animal - LSA, Centro de Ciências e Tecnologias Agropecuárias - CCTA, Campos dos Goytacazes, RJ, em parceria com a Fundação Educacional Dom André Arcoverde, Centro de Ensino Superior de Valença na Faculdade de Medicina Veterinária, Valença – RJ.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Set 2007
    • Data do Fascículo
      Ago 2007

    Histórico

    • Recebido
      10 Nov 2006
    • Aceito
      15 Jan 2007
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