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As ascensões da economia do enriquecimento e da extrema direita: uma entrevista com Luc Boltanski e Arnaud Esquerre

The rises of the economy of enrichment and of the extreme right: an interview with Luc Boltanski and Arnaud Esquerre

Resumo

Na presente entrevista com Luc Boltanski e Arnaud Esquerre, abordam-se as duas últimas obras que escreveram em coautoria, nomeadamente Vers l’extrême e Enrichissement. Realizada por ocasião do XIX Congresso da Sociedade Brasileira de Sociologia, em 2019, a entrevista se inicia discutindo a elaboração do Enrichissement, destacando como seus autores foram gradualmente constituindo as chamadas “economias do enriquecimento” como objeto, assim como os desafios metodológicos que tiveram de ser encarados para tanto. Depois, os autores são interpelados quanto às mudanças e permanências que a obra estabelece ante os seus trabalhos anteriores, haja vista as transformações históricas analisadas em O novo espírito do capitalismo e a discussão acerca das relações entre sociologia e crítica social forjadas em De la critique. Por fim, a entrevista avança em direção às imbricações entre a nova classe patrimonial - formada no seio da economia do enriquecimento - e o conservadorismo político despontado pela extrema direita com crescente sucesso eleitoral.

Palavras chaves:
Boltanski; Esquerre; Enriquecimento; Dominação gestionária; Classe patrimonial

Abstract

In this interview with Luc Boltanski and Arnaud Esquerre, we shall approach the last two oeuvres that they wrote together, namely Vers l’Extrême and Enrichissement. Held during the 19th Congress of the Brazilian Sociological Society, in 2019, the interview begins by discussing the preparation of Enrichissement, highlighting how their authors gradually conceived the so-called “economies of enrichment” as object, as well as the methodological challenges that had to be faced in doing so. Following that, the authors are asked about changes and permanencies that this oeuvre establishes in relation to their previous works, given the historical transformations analyzed in The new spirit of capitalism and the discussion about relationships between sociology and social critique forged in De la critique. Finally, the interview moves towards imbrications between the new patrimonial class - formed within the economy of enrichment - and the political conservatism emerging from the extreme right and its growing electoral success.

Keywords:
Boltanski; Esquerre; Enrichment; Managerial domination; Patrimonial class

Introdução

O sociólogo Luc Boltanski se afirmou como referência incontornável na teoria social e sociológica contemporânea. De origem francesa, sua trajetória autoral pode ser vista em perspectiva quanto aos movimentos de ruptura e de reconciliação com relação à sociologia crítica de Pierre Bourdieu, presente desde cedo em sua formação. Em sua tese de doctorat d’État, que veio a se tornar a obra Les cadres - la formation d’un groupe social (1982), ele trata de maneira original a questão da formação e representação de uma “nova classe social”, um grupo social que não é tipicamente nem proletário, nem burguês: os “gerentes” franceses que trazem consigo uma ideologia tecnocrática e meritocrática, de modo que, ao congregarem uma multiplicidade de agentes caracterizados por propriedades sociológicas díspares entre si, não cabem mais no esquema explicativo bourdieusiano calcado nas relações de homologia entre estruturas simbólicas e estruturas objetivas. Entre os anos 1980 e 1990, há a publicação das principais obras que demarcariam o movimento de ruptura, como L’amour et la justice comme compétences (1989) e De la justification (1991), com as quais, na companhia de Laurent Thévenot, Boltanski buscava passar de uma sociologia crítica interessada em desvelar as relações de dominação nas suas formas mais denegadas para uma sociologia pragmática da crítica voltada para a elucidação das competências críticas que os atores ordinários põem em movimento nas situações mais variadas da vida cotidiana. Desse modo, Boltanski renunciava à atitude de corte epistemológico, em que o conhecimento sociológico instaura uma descontinuidade radical em relação ao conhecimento dos atores concernidos, para uma atitude à maneira de uma epistemologia (uma ciência da ciência), seguindo a fabricação do social pelos próprios atores em ação.

Se no início ele buscava colocar entre parênteses o quadro conceitual forjado por Bourdieu, e com o qual ele próprio havia colaborado ativamente nos seus anos de formação - em especial no artigo conjunto “La production de l’idéologie dominante” (1976) - a fim de encampar o seu próprio programa de pesquisa, doravante vai retornando paulatinamente às questões postas por aquela referência primeira. Isso é patente em sua obra em coautoria com Ève Chiapello, de 1999, O novo espírito do capitalismo (2009), na qual exprime esse momento de confronto com três questões sociológicas antes relegadas ao segundo plano (Boltanski, 2002_____. Nécessité et justification. Revue Économique, v. 53 n.2, p. 275-289, 2002.), isto é, a perspectiva histórica, as relações de força e a escala macrossociológica dos fenômenos, mas articulando com as suas preocupações no que se refere a interpelar a vida social na perspectiva da dinâmica entre operações críticas e de justificação. Tal obra seminal, contudo, submeteu o seu aparato analítico a inflexões cruciais, as quais exigiriam um esforço adicional em forjar uma nova constelação de conceitos capazes de dar conta tanto da reconciliação de seu programa com o de Bourdieu, quanto de seu diagnóstico do presente histórico sobre as sociedades capitalistas e democráticas. A obra De la critique: précis de sociologie de l’émancipation (2009), que cunhou o conceito de dominação gestionária como tentativa de atualização da questão da dominação em face da possibilidade da crítica de produzir efeitos na vida social, resulta desse esforço, de modo que as investigações posteriores colocaram à prova o novo modelo analítico ante diferentes objetos.

A entrevista que se segue foi realizada durante o XIX Congresso da Sociedade Brasileira de Sociologia, em Florianópolis. Nela, procuramos interrogar os autores sobre suas obras posteriores a 2013, data da última vinda de Luc Boltanski ao Brasil. Nos últimos anos, ele trabalhou com seu ex-orientando, Arnaud Esquerre, em duas obras bastante distintas que foram o tema da entrevista. A obra mais recente, Enrichissement - une critique de la marchandise (2017), dá continuidade, em larga medida, às preocupações já encaminhadas em O novo espírito do capitalismo, no que se refere às mudanças do capitalismo. E, no entanto, tal como observa Nancy Fraser (2017FRASER, Nancy. A new form of capitalism? A reply to Boltanski and Esquerre. New Left Review, n. 106, p. 57-65, 2017.), trata-se agora de investigar não mais o espírito que anima os partícipes nos mais diversos ramos econômicos, isso porque, a orientação gramatical presente na pluralidade de ordens de grandeza daquele primeiro momento se desloca agora para a investigação das estruturas da mercadoria. Interessados em compreender os efeitos causados pelas recentes mudanças econômicas da Europa Ocidental (desindustrialização, financeirização e gentrificação), eles observam o declínio da economia industrial e o surgimento de uma “economia do enriquecimento” que se baseia na construção de narrativas nacionais e na exploração da história para conferir valor aos objetos. As economias do enriquecimento - como veremos - produzem efeitos ideológicos e materiais decisivos nas relações de força entre classes, países e entre os atores que nela atuam. Atividades como o turismo, os bens de luxo, a arte e a alta gastronomia requerem uma abordagem que demonstre seu funcionamento conjunto, sem a qual não será possível identificar as formas nascentes de exploração e de opressão, pois, segundo os autores, cabe à sociologia oferecer recursos críticos para contribuir à reabilitação de movimentos reivindicatórios e de contestação.

Nessa obra, de um lado, eles avançam o conceito de exploração forjado em O novo espírito ao propor a identificação e descrição do conjunto de grupos (servidores, criadores e rentistas) que entretêm relações assimétricas para com as remunerações na economia do enriquecimento, mas sendo todos eles necessários para o seu funcionamento global; de outro, recuperam o legado de Fernand Braudel ao cunhar o conceito de capitalismo integral ao final do livro, isto é, o processo de valoração que perpassa todas as estruturas da mercadoria por eles identificadas, no sentido de que a extração de valor não se esgota apenas na esfera da produção (mais-valia absoluta e relativa), mas também se acrescenta na esfera da circulação (mais-valia mercantil), sendo replicada, incessantemente, nos mercados financeiros e nos setores industriais.

Diferentemente de Enrichissement, Vers l’extrême: extension des domaines de la droite (2014), pequeno opúsculo político que acompanha a ascensão da extrema direita ao longo de diversos domínios de representação - ou seja, não só na política, mas também simbólicos (teatro, cinema, literatura, filosofia e ciências sociais) -, mediante a coordenação de atores, à primeira vista insulados. Sobretudo circunscrito à conjuntura política francesa mais recente, o livro habita o mesmo pano de fundo daqueles processos macrossociológicos que configuram a economia do enriquecimento. Por outro lado, trata-se de uma questão eminentemente política, voltada para a compreensão da presente situação excepcional na qual a extrema direita passa a atestar força eleitoral inequívoca. A proposta mais consequente da obra identifica a posição dual que as reivindicações postas pela extrema direita ocupam, de tal modo a canalizar os interesses pela reindustrialização e pela restituição das garantias por parte do antigo proletariado, cada vez mais precarizado com a globalização e, ao mesmo tempo, a atender aos interesses da classe patrimonial, à medida que igualmente explora a identidade e a narrativa nacionais francesas.

Assim, a proposta da entrevista foi de reconstruir o percurso intelectual posterior a De la critique e como compreender essa virada política e analítica que os autores tomaram nos últimos anos ao se interessarem por objetos eminentemente atuais. Nós propomos, visto a proximidade temporal das obras, tentar compreender a unidade delas, ou seja, como o processo de enriquecimento e a ascensão da extrema direita poderiam se imbricar e como compreendê-las na sequência de um empreendimento teórico de fôlego, a exemplo daquele apresentado em De la critique. Como se verá, ambas as obras expõem uma longa reflexão que joga nova luz a fenômenos prementes e interroga uma série de áreas da sociologia, tanto clássica como em suas linhagens mais contemporâneas. É como se os autores nos revelassem uma concepção de trabalho intelectual, cujas condições institucionais de realização são hoje cada vez mais difíceis. Além do notável trabalho teórico em torno da atualização dos conceitos em face da prova do presente histórico - ou em termos de uma “ontologia do presente” -, uma série de rotinas e expedientes (seminários, grupos de pesquisa e conversas informais), não raramente “amadores”, é relatada por eles como parte do processo de construção de um programa de pesquisas.

Entrevista

- Entrevistadores: Inicialmente, gostaria de me dirigir ao Sr. Boltanski, pois creio que a primeira vez que eu o vi foi em 2013, na Universidade de São Paulo, se não me engano a última vez em que o senhor veio ao Brasil. Nessa época, o senhor tinha acabado de publicar Énigmes et complots (2013), [mas] falava bastante sobre De la critique (2009). Todas as suas conferências no Brasil trataram desse livro. Logo depois vocês dois publicaram Vers l’extrême e, em seguida, Enrichissement. Qual seria o fio condutor na trajetória desse período? O que há de comum nos escritos depois de 2013, após essa última visita ao Brasil?

- Boltanski: Realmente num trabalho de sociologia há sempre uma parte de interesses que se mantém. Desde a época em que eu trabalhava no Les cadres, há um interesse pelas operações críticas, pelo fazer operações críticas e também há um novo interesse sobre o capitalismo. [Tudo isso] envolve aquilo que eu teria escrito antes: Les cadres, Le nouvel esprit du capitalisme. Também há um interesse por… como poderia te dizer?

- Esquerre: Enfim, eu te digo isso vendo de fora, um dos princípios entre Énigmes et complots e Enrichissement é o princípio da incerteza.

- Boltanski: Sim, se você preferir há uma linha teórica que é geral. Ontem falamos um pouco disso num fórum improvisado por Frédéric Vandenberghe, que nos interrogou sobre a modelização. Nesse momento, discorremos um pouco acerca da maneira pela qual se concebe a sociologia como elucidação das competências dos atores. Se você concordar, isso se mantém de um tema para outro. Mas em relação aos próprios campos, devo dizer que jamais teria sido capaz de ficar num mesmo campo, como é o caso de certos sociólogos. Eu não estou criticando. Eu sou preguiçoso demais para isso... Falávamos disso com Arnaud: um dos interesses do ofício de sociólogo é o de estar ao mesmo tempo nas bibliotecas e nos livros, bem como encontrar pessoas e conhecer mundos novos. Tendo em vista o mundo do enriquecimento, Arnaud o conhece muito bem, porque ele já trabalhou no Ministério da Cultura antes de ingressar no Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS). Já eu conheço um pouquinho, visto que meu irmão1 1 Trata-se do artista plástico Christian Boltanski, escultor, fotógrafo, pintor e cineasta, considerado hoje um dos mais consagrados artistas contemporâneos. Em 2012 fez sua primeira mostra individual no Brasil e, em 2014, inaugurou obra inédita no Sesc Pompeia, produzida a partir de sua percepção de São Paulo. é um artista plástico bastante conhecido e nós conversamos frequentemente, logo, tenho muitos informantes nesse universo. Então é isso, não há um sistema: não somos Hegel, porque não há um sistema que procuramos desenvolver. Aliás, nem mesmo somos Bourdieu, que procurava sempre desenvolver o mesmo sistema a partir de diferentes exemplos. Essa não é nossa maneira de trabalhar. A nossa maneira está no oposto: ir em direção aos espaços que não conhecemos, na esperança de que aquilo que sabemos não funcione. Assim, será preciso inventar alguma coisa nova.

- Entrevistadores: É que quando lemos Vers l’extrême, logo observamos alguns traços ou pistas da sociedade do enriquecimento...

- Boltanski: Nós os escrevíamos juntos, os dois livros ao mesmo tempo.

- Esquerre: Já havíamos começado o trabalho do Enrichissement quando escrevemos Vers l’extrême. De manhã discutíamos em torno do Enrichissement, ao meio dia íamos almoçar falando de política e, à tarde, voltávamos a trabalhar no Enrichissement. Portanto diríamos que Enrichissement é o livro da manhã e da tarde, enquanto o Vers l’extrême é o livro do almoço - e dessa maneira terminamos este mais rápido. Mas esses livros seguem juntos, de modo que Vers l’extrême é, de certa maneira, um complemento político de Enrichissement.

- Entrevistadores: É realmente interessante poder ler todos os artigos2 2 Antes da publicação de Enrichissement, foram publicados diversos artigos em revistas que mostram a elaboração do livro. Entre eles, cabe mencionar: Luc Boltanski & Arnaud Esquerre (2014a: 5-72; 2015: 75-83; 2016a: 41-58; 2016b: 31-54). Este último artigo provocou uma réplica de Nancy Fraser (2017: 57-65). que vocês publicaram desde 2014 até a publicação de Enrichissement. Podemos verificar o vai e vem do pensamento, os diálogos com Nancy Fraser na New Left Review, a construção de uma maneira de pensar e do próprio livro em desenvolvimento. Portanto, constitui uma obra cuja construção foi bem pública, principalmente quando a comparamos a um livro já finalizado. Vocês poderiam comentar sobre o processo de elaboração desse livro? As dificuldades, as mudanças de opinião? Pensamos, por exemplo, na forma tendência que não está presente nos primeiros artigos e depois vocês admitem tê-la descoberto. Vocês poderiam falar um pouco mais sobre isso?

- Esquerre: De início, em termos metodológicos, levamos muito tempo para compreender sobre o que trabalhávamos, isto é, as mudanças que nos cercavam e que atingiam todas essas atividades, como o turismo, o luxo e a arte. Mas encontrávamos dificuldades por três razões. Primeiramente, o que é tão próximo de nós é aquilo que é difícil de pensar que devemos tomá-lo como objeto. Em seguida, é que todas as atividades estão dispersas, estão separadas, tal como é explicado no livro. Nesse sentido, estabelecer a relação entre elas não era evidente. E, finalmente, algo relacionado às duas questões anteriores, não havia um quadro estatístico que nos permitisse acumular dados para manter uma coerência. Portanto, levamos tempo para juntar os elementos. Fizemos seminários, seminários de pesquisa para os quais convidávamos um grande número de pessoas que nos permitiram evoluir paulatinamente.

- Boltanski: Nós não estávamos também muito satisfeitos com o que encontrávamos no universo teórico circundante, quer seja a sociologia clássica, quer seja a pragmática, e [por isso] precisávamos trabalhar para encontrar novos suportes teóricos. Notadamente, dois aportes que não tínhamos até então foram Lévi-Strauss e a sua ideia de grupo de transformação e também o emprego da matemática - o que veio por acaso. [Isso porque] um matemático me contactou, um matemático filosófico ou filósofo. Ele se interessa também pela filosofia da matemática e é especialista na Teoria das Categorias. Ele leu De la justification e me escreveu para propor que seria um bom exemplo para implementar a teoria das categorias, então lhe respondi: “nós estamos fazendo outro livro que está igualmente entre estruturalismo e pragmatismo, você não gostaria de trabalhar conosco?”. E, de repente, um novo plano de abordagem que não tínhamos utilizado, nenhum de nós anteriormente, foi empregado.

Um segundo ponto que foi complicado foi o ajuste em relação, digamos, ao marxismo. Atualmente pensamos em outros problemas que vão além da economia, nos quais o marxismo não nos é mais útil. Mas, no domínio da troca ou da produção, o marxismo pode permanecer interessante. E, no entanto, nesse caso, a contribuição foi de Braudel, o que foi um pouco acidental. Nós tínhamos lido O capitalismo de Braudel fazia muito tempo. Relendo, vimos que claramente as ideias de “mais-valor mercantil” e de “deslocamento” se encaixavam muito bem no livro. Assim, como é frequente em nossa maneira de trabalhar, acontece ao mesmo tempo um vai e vem entre as novas áreas, as ferramentas que podemos já ter forjado antes e que experimentamos de novo, normalmente para ver que elas não funcionam tão bem, mas ainda assim retomamos - como é o caso, assim, [dos conceitos] de “prova” e “justificação” para “preço” e “valor”. Ocorrem, por exemplo, pesquisas de inovações teóricas, como na música. Você sabe, na música a inovação funciona frequentemente ao transcrever e ao replicar os quadros que vêm dos músicos clássicos. Por exemplo, as formas musicais de Webern, ele as transcreveu. É isso que tentamos fazer e muitas vezes trabalhamos assim, procurando objetos mais antigos, reaplicando-os. Faz muito tempo que eu passei uma temporada em Princeton, no Institute for Advanced Study. Foi a única vez em que vi cientistas que, poderíamos dizer, das ciências mais duras: os físicos teóricos e matemáticos. E os matemáticos criticavam muito os físicos, porque eles diziam que em relação aos físicos, principalmente aqueles que são da física aplicada, eles consideram que tudo aquilo que foi feito três anos antes, hoje já é velho, não os interessa mais. Enquanto os matemáticos diziam: “nós vamos à biblioteca o tempo todo, lemos livros dos séculos XVII e XVIII e encontramos elementos para inovar”. Eu penso que é muito importante na sociologia não ficar sempre no último gadget. É necessário conhecer a literatura e sobre o que se passa no pequeno domínio no qual trabalhamos e no nível mais abrangente, mas também é importante pensar a disciplina em si mesma, nos seus elementos teóricos que podem ser reajustados sobre aquilo que pode ainda ser feito.

- Esquerre: Um outro elemento na construção do livro foi uma discussão que tivemos quase até o final da sua escrita, que se referia a saber se tínhamos um livro ou dois livros pela simples razão de que há uma modelização, a qual chamamos de “estrutura da mercadoria”. Por outro lado, há uma dimensão histórica que é dupla, isto é, há ao mesmo tempo o estabelecimento da economia do enriquecimento que vai ganhando importância em relação à economia industrial. Assim, era extremamente complexo articular a dimensão histórica e a dimensão da modelização enquanto estrutura da mercadoria. De certa maneira, isso foi resolvido quando nos conscientizamos da importância da forma standard (ou padrão) na estrutura da mercadoria que se apresentou, de tal modo que a forma standard provocou essa estruturação da mercadoria. Naquele momento, mesmo que não estivesse presente no livro, havia uma história na qual, inicialmente, apareciam as estruturas da mercadoria a partir do surgimento da forma standard. Na sequência, num momento que datamos ainda no século XIX, bem como no final do século XX, notadamente a partir dos anos 1980, o desenvolvimento dessa economia do enriquecimento apoia-se naquilo que chamamos de forma coleção. Era uma discussão muito presente entre nós de saber como articular. Se você preferir, trata-se de um problema clássico a articulação entre estrutura e história, se você preferir. Mas pouco articulado, embora apareça na maioria dos livros. Ou seja, se você tomar um livro como, por exemplo, A distinção 3 3 Ver Pierre Bourdieu (2007). , você não encontra história...

- Boltanski [interrompendo]: Não mesmo. Em O novo espírito do capitalismo, a articulação se dava através da noção de cité, retomada do De la justification. Era uma ideia de uma nova cité associada a um conjunto de conflitos ocorridos entre os anos 1970 e 1990. É verdade que na maioria dos livros, mesmo os de história, não se encontra isso.

- Entrevistadores: No prefácio do livro vocês dizem que há um eixo histórico e um eixo analítico. Mas na quarta parte, intitulada “Os contornos da sociedade do enriquecimento”, é justamente a que vocês menos discutem em suas apresentações e artigos, ao focarem os grupos sociais que começam a aparecer nessa formação da economia do enriquecimento. Portanto, quem se beneficia dessa economia do enriquecimento? Em qual eixo o senhor colocaria essa parte? É uma parte mais histórica, eu imagino. Por que exatamente ela é tratada com menos frequência [nos artigos e nas palestras]?

- Boltanski: Porque é mais sociológico! O que nos interessava era chegar aos limites da relação entre sociologia e economia. Mas é preciso levar em conta que Enrichissement é um programa de pesquisa. É um programa de pesquisa que poderia se aplicar em diferentes domínios, e esperamos que seja esse mesmo o caso. Contudo, qual a razão de os contadores do Estado não levarem em conta essa economia? Podemos dizer que é um programa crítico em relação à economia, na medida em que, na esfera dos conceitos, os problemas por ela abordados são inteiramente construídos a partir de uma economia industrial, tais como custos de produção. Ao passo que, pouco a pouco, o trabalho iniciado a partir dos anos 1970, principalmente pela economia das convenções4 4 A assim chamada economia das convenções emerge nos anos 1970 e em torno de pesquisadores que atuavam no Institut National de la Statistique et des Études Économiques (INSEE), reunindo autores, entre os quais, Alain Desrosières, Laurent Thévenot e Robert Salais. Ao emergir como crítica às tradições regulacionista e institucionalista, o enfoque da economia das convenções recai sobre as modalidades de qualificação de coisas e pessoas, partindo da premissa de que a racionalidade dos atores econômicos é restringida por formas convencionais e, por isso, não apenas pautada pelo autointeresse (Dosse, 2018). , traz à tona também conceitos como custos de transação ou os trabalhos sobre os mercados de segunda mão. Mesmo assim, pensamos que a economia continua muito relacionada à produção industrial e calcada numa oposição notável entre os bens e os serviços que, evidentemente, não têm mais sentido em relação a uma economia do enriquecimento. Desse modo, pensamos que existe um trabalho muito importante a ser feito, mas que exigiria grandes pesquisas sobre as mudanças propriamente sociais, no sentido mais clássico do termo, produzidas precisamente devido a esse deslocamento econômico.

No começo, sugerimos isso em termos regionais, pois as regiões que eram mais ricas se tornaram bastante pobres, enquanto as regiões que estavam em direção a uma economia rural tradicional em declínio, tais como as montanhosas, mudaram completamente de economia. De maneira anedótica, se você pegar como exemplo um vilarejo do departamento do Gard, onde havia oliveiras, cabras, queijos e assim por diante, agora resta uma velha senhora com suas cabras. De resto, são residências de veraneio de ricos aposentados ou de pessoas que trabalham em Frankfurt ou em Amsterdam, que vêm quando têm tempo para passar uma temporada. Desse modo, você constata um outro conjunto de trabalhadores que se instalam, que são pedreiros para reformar as casas, ou como um jardineiro intitulado “antiquário de árvores”, pois você pode comprar árvores antigas dele para replantá-las, sobretudo para ele fazer esse trabalho, dado que as pessoas de Amsterdam ou de Frankfurt não têm tempo para tal atividade. Além disso, existem as pessoas que trabalham em restaurantes, pessoas do serviço pessoal, entregadores de pizza etc. Assim, pensamos que o livro está muito aquém do que poderia ser mostrado quanto aos efeitos relacionados às transformações sociológicas. Mas nós dois o fizemos de maneira artesanal, sem ajuda de uma grande equipe. Para isso, seria preciso desenvolver um trabalho bem mais consequente em termos do número de colaboradores e de financiamento.

- Entrevistadores: Quando o lemos pela primeira vez... o livro é imenso no sentido material e, ao mesmo tempo, se percebe que há ainda muito a ser feito. Eu diria mesmo que o livro tem quase um aspecto normativo ao exigir índices, indicadores sociais [para determinar e visualizar a economia de enriquecimento]. Igualmente, os diagnósticos sobre as possibilidades de ação tanto em Enrichissement como nos artigos que o antecipam parecem consideravelmente mais restritivos do que antes. Nos trabalhos anteriores, como no caso de O novo espírito do capitalismo ou De la critique, me parece que havia uma visão mais antifatalista. Principalmente neste último, quanto à capacidade da sociologia pragmática da crítica contribuir para a emancipação. Não falamos mais de uma incorporação seletiva da crítica estética nos dispositivos de dominação, mas, ao contrário, os pressupostos que constituem a experiência da arte mesma se transformaram numa outra forma de acumulação capitalista. Além disso, também há essa nova forma de capitalismo, que vocês qualificam como integral, que é um adjetivo bastante forte. Desse modo, gostaria de perguntar como a sociologia pode contribuir à crítica das injustiças sociais? Pois me parece que o horizonte para a ação é muito mais restritivo ao final do livro, mas diria que pode ser certa leitura [nossa]...

- Esquerre: Uma questão que se coloca no livro é a do “exterior”. Uma questão que discutimos bastante quando escrevemos o livro, a saber: deve-se partir do exterior para se poder fazer a crítica, para poder imaginar um outro mundo possível. Portanto, muito frequentemente, em diversos trabalhos, essa exterioridade está enraizada em algo bastante antigo, ou até mesmo em algo mais recente. Eu penso, por exemplo, em trabalhos como os de Rancière, que estão bastante na moda. Ele propôs uma posição artística ou do artista como se a arte ou a posição do artista fosse um meio de resistência ao capitalismo. Com efeito, partimos de uma posição realista: da maneira pela qual essas atividades poderiam ser compreendidas no cerne da economia do enriquecimento. Assim, os pontos de apoio que pareciam óbvios, que seriam a posição do artista em relação às finanças ou à economia industrial, desaparecem de repente. Eis, então, a questão: quais são os pontos de apoio que podemos nos valer para fazer uma crítica em relação à forma vigente do capitalismo integral? Não temos resposta para isso, ainda que o que esteja formulado ou apresentado nesse livro ofereça algumas pistas. Além disso, compartilhamos da ideia de que um trabalho de sociólogo é aquele que te oferece outra compreensão do mundo ao terminar de lê-lo. Isto é, o mundo que está ao seu redor, você o compreende diferentemente, embora seja aquele em que você vive diariamente. Ao compreendê-lo diferentemente, você pode ter uma outra relação com esse mundo. Acredito que uma das questões do livro estava relacionada a isso.

- Boltanski: Sim, entendo que a questão do exterior é bastante importante. Em relação à sua questão sobre as injustiças sociais, penso que, em relação ao livro, precisaria desenvolver ou estimular dois tipos de crítica. Uma primeira crítica seria: as pessoas que trabalham na economia do enriquecimento poderiam fazer valer suas demandas em relação a um melhor tratamento em termos de condições de trabalho, segurança, finanças etc.? Isso é algo que nos perguntamos no último capítulo acerca dos “criadores”, que é um setor no qual as características do capitalismo moderno se desenvolvem profundamente, ou seja, um nível de insegurança muito grande e um nível em que não se pode distinguir facilmente entre a venda da força de trabalho e a venda de si mesmo. É uma situação na qual a concorrência entre as pessoas torna bastante difícil uma solidariedade mínima que permita pressionar os empregadores. Trata-se um pouco do retorno ao começo do capitalismo industrial, no qual observamos uma forte concorrência entre artesãos arrancados do artesanato e trabalhadores. Consideramos o que estava sendo feito nesse campo, em especial os trabalhos de uma ex-aluna que fez sua tese comigo, Irène Pereira5 5 Ver Irène Pereira (2009). , que era uma militante anarquista e escreveu sobre como atualmente é difícil mobilizar ativamente para a luta as pessoas que trabalham no domínio da cultura - e, portanto, tentamos entender o por quê. Uma das razões para isso é, evidentemente, o amor pela cultura e sua enorme dificuldade de a distinguir... um pouco como os trabalhadores do século XIX chamados “os perfeitos”, que eram apaixonados pelo trabalho industrial e, ao mesmo tempo, buscavam desenvolver formas de revolta. Logo, esse é o primeiro ponto. Ou seja, não nos cabe ensinar aos outros como eles devem lutar, mas podemos lhes dar os argumentos para fazê-lo. Há também outro ponto central, no qual o livro pode contribuir, que é ativar uma crítica sobre a divisão internacional do trabalho. Evidentemente, essa economia do enriquecimento se desenvolve nos países ricos da Europa e é uma economia para os ricos, mas não estamos de forma alguma em um domínio, como bem dissemos, em uma temática pós-industrial, no qual toda a economia se tornaria seja coletiva, seja do enriquecimento. Ao contrário, pensamos que jamais houve tantos objetos [advindos da economia industrial] no nosso entorno: mesas, cadernos etc. Certamente, trata-se de uma divisão internacional do trabalho, de modo que é por isso que começamos o livro pela desindustrialização, o que levou a fabricar objetos na China ou no Brasil, no caso da agricultura.

- Entrevistadores: Mas, para um país emergente, temos uma taxa de desindustrialização importante.

Boltanski: Esse é um ponto importante e também o que significa ter uma economia focada apenas nos ricos? Ao menos a economia industrial nos países da Europa nos anos 1950 tinha algo, meio mito e meio realidade pós-fordista, que os ganhos de produtividade seriam redistribuídos e permitiriam aos trabalhadores de comprar mercadorias - o que era em parte verdade, tais como os equipamentos domésticos, os carros etc. Atualmente há um dualismo completo se pensarmos, por exemplo, no nível de alimentação, porque existe uma alimentação orgânica para os ricos e depois uma alimentação industrial [para os pobres]. Assim, na minha visão, os recursos críticos oferecidos pelo livro são importantes, mas o problema é que não nos encontramos diante de movimentos críticos nos quais se desenvolveriam tais recursos, ainda que haja a esperança de que eles se aproveitem do livro para se desenvolverem. Ademais, essa economia do enriquecimento é muito frágil, uma vez que boa parte depende de agradar turistas estrangeiros. É preciso que eles estejam contentes e seguros. Para destruir uma economia industrial é preciso uma dezena de bombardeiros, mas para destruir a economia do enriquecimento basta certa insegurança. É suficiente uma bomba nos espaços públicos todos os meses. A Tunísia, por exemplo, experimentou de fato isso com o turismo.

- Esquerre: Ou a França com os atentados...

- Entrevistadores: Nesse sentido, seus objetos são sempre europeus ou mesmo franceses na maior parte do tempo. Mas, diversas vezes, nos seus trabalhos, vocês têm um interesse pelos objetos do Sul [Global]. Vocês dão muitos exemplos disso... Assim, quando citam frequentemente a hiperinflação argentina, principalmente no De la critique. Qual o lugar que o Sul [Global] ocupa na teoria de vocês, nos seus trabalhos? Como se apropriam ou dialogam com ele? No Enrichissement não vemos muito bem...

- Esquerre: Há duas ordens de resposta a essa pergunta. Uma primeira ordem de resposta seria que desde os anos 1980 e 1990, mas especialmente com a virada pragmática e o desenvolvimento das teorias de Bruno Latour e de Philippe Descola, temos interesse que no trabalho sociológico haja um princípio de simetria. Esse princípio parte da ideia que simetrizando, simetrizamos as posições de todos. Parece-me que uma atitude importante é que, por humildade, nós nos autorizamos pouco a falar das coisas em geral sobre outras partes do mundo, porque consideramos que o que conhecemos melhor é a nossa sociedade e que outros conhecem melhor a sociedade deles, portanto não vamos falar em nome deles, das coisas que eles sabem. Eu acho que há um princípio muito importante em relação a isso. Isso dito, em relação ao Enrichissement a situação é um pouco diferente, no sentido que esse tipo de economia se desenvolveu particularmente na Europa, principalmente na França e na Itália. E quando olhamos os grandes grupos, sobretudo em termos de luxo, são principalmente empresas francesas, italianas, suíças. Assim, há uma hipótese que da mesma forma que havia na Inglaterra uma economia industrial ou, enfim, das premissas de uma economia industrial, consideramos que a França e a Itália são casos interessantes para desenhar os contornos, os princípios da economia do enriquecimento.

- Boltanski: Estou totalmente de acordo com o que disse Arnaud. Eu acrescentaria que não tenho certeza se conceitos, como a oposição Norte-Sul, sejam sempre adequados. Mas eu não trabalhei suficientemente nessa área, porque isso consiste em hierarquizar os países, o que não é completamente falso. Há hierarquias de poder entre os países, evidentemente, mas isso não leva em conta as hierarquias sociais dentro desses países. Foi muito utilizada durante o entreguerras, na Europa, essa hierarquia de poder misturada com as hierarquias sociais, particularmente com a ideia de que havia povos proletários. Era uma noção importante no fascismo, que defendia os povos proletários, mas defendia também as oligarquias locais. Logo, acredito que essa oposição Norte-Sul tem uma dimensão real e uma dimensão ideológica muito importante, que torna o seu uso muito difícil para um trabalho sociológico preciso e empírico como este que tentamos fazer.

- Esquerre: Isso dito, aconteceu de discutirmos com Marie-France [Garcia-Parpet] que trabalhou recentemente sobre a cachaça6 6 Ver Marie-France Garcia-Parpet & Patricia Alves Ramiro (2018: 75-91). , reutilizando os modelos estabelecidos em Enrichissement para mostrar as transformações a partir dos anos 1990 e, particularmente, a valorização das atividades onde havia plantações, com visitação turística. Há toda uma narrativa associada e penso que a dimensão programática do livro aparece aí, sem dúvida, com suas variações próprias. Estamos muito felizes com o trabalho de Marie-France, uma pesquisa relacionada ao que ela sabe fazer, pois é isso, cabe aos pesquisadores fazerem pesquisas e ver como isso ajuda a compreender outro tipo de situação.

- Boltanski: Que fez também um livro sobre os vinhos da França, que é formidável7 7 Ver Marie-France Garcia-Papet (2009). .

- Entrevistadores: Vocês pensam que haveria algum tipo de limite para o desenvolvimento dessa economia do enriquecimento? Haveria um ponto máximo que ela poderia atingir? Eu sei que é uma pergunta hipotética...

- Esquerre: Não, não. Há limites muito concretos. Falamos pouco disso no livro, mas há limites que estão relacionados à organização do espaço e da população. Em cidades como Veneza e Barcelona, que são extremamente modificadas pela economia do enriquecimento, vemos esses limites aparecerem. É verdade que falamos pouco. Isso precisaria de um desenvolvimento específico pela razão de que, se uma cidade está totalmente patrimonializada, se o preço dos imóveis aumenta, ela está voltada para o acolhimento de turistas. Quer dizer, na verdade há uma capacidade, de um lado, de receber os turistas que é problemática e, de outro, que mais ninguém pode ali viver. Os moradores permanentes devem morar fora da cidade, daí o problema que nelas se coloca premente, mas muito premente, em relação ao que é comum: dos bens comuns ou dos comuns. Então a situação de Veneza ou de Barcelona é exemplar, quando enxergamos muito claramente o problema do limite da economia do enriquecimento. Em Paris estamos em uma situação fronteiriça, principalmente no que concerne ao metrô, aos imóveis, à transformação de certos bairros. Vemos esses problemas que se colocarão nos próximos anos. Principalmente no centro de Paris.

- Boltanski: Há sem dúvida também uma saturação simbólica. O enriquecimento desenvolve a ideia de uma mais-valia proibida (plus-value défendue), quer dizer, o capitalismo está sempre no limite do que é mercantilizável e do que não é mercantilizável. E no caso da economia do enriquecimento, uma das excitações dessa economia, para parte dos compradores, é a de descobrir algo que ainda não foi completamente patrimonializado, totalmente enriquecido, assim dando a impressão de participar no trabalho de enriquecimento. Claramente, a partir de certo patamar, esse tipo de lucro diminui. Novamente usemos o exemplo das cidades invadidas pelos turistas: há um paradoxo do turista, principalmente do turista amador, que está preocupado com a economia do enriquecimento, ao dizer que gostaria de ir a um lugar não turístico. É um paradoxo estranho, porque, no momento em que ele vai, o local torna-se turístico. Mas certamente isso constitui um limite relativo à extensão. Além disso, visto que se trata de uma economia voltada para os ricos, a extensão da economia do enriquecimento vai depender do crescimento da riqueza num nível internacional e do crescimento das desigualdades. Logo não é nem um pouco certo que ela vai poder se desenvolver no mesmo ritmo.

­- Entrevistadores: Vocês desenvolvem, tanto em Vers l’extrême como em Enrichissement, o surgimento de uma classe patrimonial que estaria, ao mesmo tempo, na origem da ascensão de certo tipo de nacionalismo. Vocês poderiam retomar um pouco esse movimento? Por que essa classe patrimonial tenderia a ir para a direita no espectro político?

- Esquerre: É uma classe patrimonial que tem patrimônio. E acontece que, para valorizar esse patrimônio numa economia do enriquecimento, ela utiliza o passado, ou mais especificamente, uma narrativa do passado. E essa narrativa do passado, em verdade, se refere a uma história que deve se vincular ao território e às personagens. Todo o problema disso é que há uma tendência de ela [a narrativa] ser conservadora e nacionalista, o que ilumina de maneira bastante diferente. Faz-se muito pouco a conexão entre nacionalismo e economia para além da ideia de que haveria um patriotismo econômico que defenderia as indústrias. Então, geralmente, se inverte a relação entre nacionalismo e economia, de tal maneira que, por medo da globalização, o discurso que se quer nacionalista exigiria um tipo de protecionismo para defender um nacionalismo econômico. Temos uma análise que esclarece de maneira muito diferente a narrativa nacionalista, vinculando-a com as desigualdades econômicas e com essa classe chamada patrimonial. A razão é que para essa economia do enriquecimento, para valorizar esse patrimônio, para aumentar esse patrimônio, para aumentar o seu valor e o preço desse patrimônio, é necessário uma narrativa do passado e que é nacionalista, voltada para um conservadorismo local, mesmo que em pequena escala local. Por exemplo, as grandes marcas de luxo são a imagem de uma França eterna. E há questões muito importantes para os historiadores franceses atuais, há numerosas polêmicas bem significativas sobre a escrita da história e sobre o que chamamos a “narrativa nacional”.

- Boltanski: O que faz mesmo que no interior desse universo haja aqueles que lucram com a economia do enriquecimento e aqueles que trabalham na economia do enriquecimento, tendo como resultado tensões importantes. As pessoas que possuem patrimônio têm interesse, ou melhor, têm tendência a nacionalizar seu patrimônio. Por exemplo, se você possui um castelo numa região tradicional da França e vai transformá-lo em um hotel de luxo com investimentos importantes, você não tem interesse de que trabalhadores estrangeiros venham morar ao lado, nem que se forme um acampamento de ciganos ou de magrebinos etc. Isso porque retiraria valor do lugar. Contudo, as pessoas que trabalham na economia do enriquecimento não são nacionalistas, há toda uma parte da crítica da extrema direita dirigida aos “bobos”8 8 Termo francês que é a junção das palavras bourgeois (burguês) e bohème (boêmio). Serve para classificar as classes médias altas intelectualizadas e escolarizadas. , que são amplamente trabalhadores do enriquecimento, no sentido de que eles seriam insuficientemente nacionalistas e seriam hors-sol 9 9 Termo de difícil tradução, composto dos termos hors (fora) e sol (solo), que designa a pessoa ou um grupo que parece estar completamente desconectado da realidade nacional e dos constrangimentos (sobretudo econômicos) da vida cotidiana. , uma vez que iriam de uma exposição em Nova York a outra em Paris etc. Assim todas essas divisões atravessam o mundo dessa nova economia.

- Esquerre: E outra tensão é a arte contemporânea; quer dizer, ao mesmo tempo a arte contemporânea entra na economia do enriquecimento, mas, com sua entrada, há o aumento dessa narrativa, dessa exploração permanente do passado.

- Entrevistadores: Mas quando vemos as tensões no livro, ao mesmo tempo vocês insistem muito sobre a solidariedade das ações na economia do enriquecimento. Como podemos compreender, esse equilíbrio tenso para que a economia do enriquecimento funcione, digamos, enquanto acordo político?

- Esquerre: A questão é muito mais ao inverso: porque quando funciona em conjunto não aparece como funcionando dessa forma? O problema, de fato, está relacionado ao estatuto da arte, cujo pressuposto é de que ela deve ficar de fora da mercantilização. E especialmente com as ideias de que o capitalismo uniformizaria a arte, retomando teorias do tipo da Escola de Frankfurt. Então, o funcionamento da economia do enriquecimento está extremamente ligado, por isso digo que a questão se formularia ao inverso.

- Boltanski: Mas você sabe, você tem um fenômeno. É muito interessante. Eu não tinha pensado nisso antes. Sua pergunta é que me fez pensar. Do meio do século XIX até os anos 1960, se teve na França um fenômeno muito interessante comparativamente que foi a sacralização da literatura. Não da arte, mas da literatura e dos literatos que se supunha estarem acima das divisões sociais e políticas. E eu estava lendo um livro recente sobre Proust, ele que era meio judeu e que tinha como um de seus melhores amigos e mais antigos admiradores Léon Daudet, filho de Alphonse Daudet, um escritor de extrema direita, antissemita e ligado à Action Française10 10 A Action Française se refere a um movimento contrar-revolucionário monarquista e orleanista que tomou forma quando do caso Dreyfus, no qual defendeu a condenação sumária do suposto crime de traição do capitão Alfred Dreyfus com base em argumentos explicitamente antissemitas. Na obra Vers l’extrême (2014b), os autores analisam a mudança semântica que ocorreu da Action Française para o Front National, propondo que o significante judeu de outrora foi substituído pelo significante “bobo”. . Então, num dado momento, Léon Daudet diz: “Eu acredito mais na literatura do que na política. Então tanto faz que seja Proust. Eu sou um grande antissemita. Mas tanto faz que Proust seja judeu ou não, porque a literatura está acima disso”. Creio que, atualmente, de uma forma bem misteriosa para mim, complexa pelo menos, há a transposição dessa atitude, que não está mais presente na literatura, visto que não é mais sacralizada ou divinizada, mas para a arte, notadamente a arte contemporânea. Você concorda?

- Esquerre: Absolutamente.

- Entrevistadores: Há um conceito que parece que o senhor abandonou recentemente que é o de dominação gestionária. Ele não ajudaria a explicar esse fenômeno?

- Boltanski: Ah, mas então, algumas vezes, deixamos de lado alguma coisa não porque ela está errada, mas porque ela está muito badalada! [risos] Logo não é mais tão interessante. Essas análises que comecei com Bourdieu, quando escrevemos sobre a ideologia dominante, faz agora várias décadas, são muito difundidas. O que tentamos descrever e, acredito, continua ainda muito pertinente e também muito reconhecido, mas não é tão empolgante de analisar sempre a mesma coisa... Suas perguntas são muito interessantes e me fazem pensar… Tem um elemento que é muito importante, pois esse modo de dominação gestionária está muito vinculado à ideia de crescimento e estava muito relacionada à dificuldade de questionar uma economia fundada na [ideia] do crescimento industrial e da redistribuição. Contudo, hoje, temos dois fenômenos novos: a ecologia, que faz com que o argumento do crescimento, que convencia a todos há 40 anos, tenha muito mais dificuldades a convencer. E se tem outro argumento que é a questão das finanças, quer dizer, os constrangimentos que vão ser postos sobre a economia serão atribuídos a restrições financeiras compreendidas por todos como falsas questões. Se é verdade ou não, é outro problema. Mas a mudança de tom faz com que a sacralidade dos argumentos gestionários de boa gestão e do imperativo de crescimento econômico, eu penso, são muito mais difíceis de serem utilizados pelos políticos como era há 40 anos. E, ainda assim, era o começo da ecologia. Os anos 1970! Mas apesar de tudo, no geral, quando fizemos esse dicionário da ideologia dominante, nos divertimos muito recortando as frases dos políticos dos anos 1970. Acredito que hoje seria ainda mais ridículo tentar se expressar nessa linguagem.

- Entrevistadores: Mas ainda é atual não?

- Boltanski: Sim, ainda é atual. Mas eu penso que é mais atual na América Latina. Mariana Heredia11 11 Ver Mariana Heredia (2015). , na Argentina, mostrou como há uma linguagem econômica que funciona em qualquer regime político. Mas eu temo que, na França, o nível da crítica geral torne muito difícil uma aplicação inalterada dos mesmos esquemas.

- Entrevistadores: Finalmente, para terminar, gostaria de saber como o projeto do pragmatismo estruturalista ajudou vocês no Enrichissement? Gostaria que vocês o comparassem principalmente com as outras abordagens pragmáticas da sociologia francesa contemporânea.

- Esquerre: Bom, isso volta um pouco às questões que vocês nos perguntaram no início sobre como fizemos, ao mesmo tempo, uma abordagem histórica, que “modeliza”, e outra que tenta levar em consideração a ação dos atores. Portanto, se tem essas três dimensões que tentamos agregar, considerando que poderiam fortalecer a disciplina sociológica, mais do que uma única abordagem na qual faltariam elementos que estão simplesmente no mundo. Assim, as abordagens pragmáticas, tais como se apresentam hoje, são muito interessantes, são muito úteis, só que muitas vezes elas não têm a dimensão histórica e lhes falta uma visão mais geral. Mas nas visões que são mais gerais ou somente históricas falta explicar, de maneira mais concreta, como as coisas acontecem. O programa do estruturalismo pragmático tentou dar conta do conjunto dessas dimensões, sobretudo levando em consideração que o estruturalismo tinha dois sentidos: um cognitivo e outro de estrutura social.

- Boltanski: Essa conclusão do livro é um pouco a explicação de um procedimento que é muito mais antigo, que desenvolvemos desde os anos 1990. Na França, vocês sabem que os rótulos são postos pelos outros, não por aqueles que praticam uma ou outra abordagem. Assim nos puseram o rótulo de pragmatistas, sendo que nossa influência pragmatista mais importante era a linguística12 12 Trata-se, sobretudo, de autores como John Austin e Ludwing Wittgenstein, e não os autores da assim chamada filosofia pragmatista americana, a exemplo de John Dewey, Herbert Mead e William James, os quais vêm sendo retomados por sociólogos franceses contemporâneos. . Mas, desde o início, quisemos fazer alguma coisa que era uma junção dessas duas abordagens: estruturalista e pragmática. Diria simplesmente duas coisas: de um lado, o estruturalismo que nos interessa é, digamos, um estruturalismo cognitivo inspirado em Lévi-Strauss, ele mesmo inspirado em Jakobson, logo, da linguística, e não da noção que gostaria de trabalhar agora, até mesmo porque ela é muito complicada, confusa e utilizada de modo impreciso, que é a de estrutura social. Precisamente no sentido braudeliano, que seria uma mistura de direito, de economia, de parentesco e que iria querer dizer, na verdade, como a trabalhamos esse ano [2018-2019] em nosso seminário: estrutura social é pensada sempre em oposição a acontecimento. Como sendo o que é duro em relação ao que acontece. Nós não estamos contentes, não gostamos dessa oposição. Mas mantemos o estruturalismo cognitivo [barulho de crianças]. Vejam, é pragmático esse barulho! Nós o mantemos por duas razões. Aprendemos muito, há 30 anos, com a chegada na França da etnometodologia e do interacionismo simbólico, ambos inspirados na pragmática, como Goffman etc. Mas nossa posição é que essa armadura teórica demanda demais dos atores. Ela demanda dos atores mais do que eles podem fazer e se vivêssemos todo tempo num mundo pragmático, estaríamos esgotados. Vocês sabem, como as crianças. Foram feitos trabalhos sobre crianças dessa idade [aponta para as crianças de cinco a sete anos que brincam no hall do hotel], se você faz um adulto fazer todos os gestos que uma criança faz, mesmo se for um atleta, ao cabo de meia hora ele estará completamente esgotado. Aqui, é parecido. Se você quer que um ser humano viva unicamente no pragmatismo, fazendo tudo na situação, interpretando tudo, ele não conseguirá. Por outro lado, as posições que centram tudo no código puramente estruturalista, não atribuem suficientemente ação para os seres humanos. Elas retiram deles a capacidade de plasticidade, de ajustamento, de microinterpretação etc. Logo, são observações muitos simples, de bom senso que fazem que, para nós, o desenvolvimento da sociologia repouse, em larga medida, num plano teórico, na capacidade de articular, como é o caso na linguística onde, apesar de tudo, há a articulação entre o que provém do código e o que provém da situação de enunciação, chegando em análises do mesmo tipo. Logo, no Enrichissement, a dimensão pragmática é a análise da troca à prova em certas circunstâncias, levando em conta que o preço vai mudar segundo as circunstâncias. E a dimensão estruturalista é para que possamos sair da incerteza da situação - afinal, um dos interesses da pragmática é colocar em primeiro plano a incerteza das situações -, e para sair delas é necessário que vendedor e comprador possam ter elementos estruturais de referência (bordage) que lhes sejam comuns.

- Entrevistadores: Finalmente uma última pergunta. No fim de Vers L’extrême, vocês retomam uma expressão de Foucault dizendo que gostariam de fazer uma “ontologia do presente”. O que vocês querem dizer com isso?

- Boltanski: Ah, mas essa era a última. Então, vamos lá! É ele o foucaultiano! [Aponta para Esquerre].

- Esquerre: O projeto sociológico... O que a disciplina sociológica pode trazer é apenas uma compreensão do mundo no qual estamos. E penso que é justamente isso que nos propusemos a fazer no Enrichissement, ou, enfim, o que propomos regularmente nos diferentes tipos de trabalho que fazemos, mas particularmente no Enrichissement. E eu penso que isso está no coração do projeto sociológico.

- Entrevistadores: Agradecemos imensamente pela entrevista. Esperamos também contribuir com esse projeto sociológico de compreensão de nosso mundo ao divulgar este diálogo tão instigante.

Referências

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  • _____. Les cadres: la formation d’un groupe social. Paris: Les Éditions de Minuit, 1982.
  • BOLTANSKI, Luc; CHIAPELLO, Ève. O novo espírito do capitalismo. São Paulo: Martins Fontes, 2009 [1999].
  • BOLTANSKI, Luc; ESQUERRE, Arnaud. Enrichissement: une critique de la marchandise. Paris: Gallimard, 2017.
  • _____. L’énigmatique réalité des prix. Sociologie, v. 7, p. 41-58, 2016a.
  • _____. The economic life of things. New Left Review, n. 98, p. 31-54, 2016b.
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  • _____. La “collection”, une forme neuve du capitalisme la mise en valeur économique du passé et ses effets. Les Temps Modernes, n. 679, p. 5-72, 2014a.
  • _____. Vers l’extrême: extension des domaines de la droite. Bellevaux, FR: Éditions Dehors, 2014b.
  • BOLTANSKI, Luc; THÉVENOT, Laurent. De la justification: les économies de la grandeur. Paris: Galimard, 1991.
  • BOURDIEU, Pierre. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo: Editora Edusp, 2007.
  • BOURDIEU, Pierre; BOLTANSKI, Luc. La production de l’idéologie dominante. Actes de la Recherche en Sciences Sociales, n. 2-3, p. 3-73, 1976.
  • DOSSE, François. O império do sentido: a humanização das ciências humanas. São Paulo: Editora Unesp, 2018.
  • FRASER, Nancy. A new form of capitalism? A reply to Boltanski and Esquerre. New Left Review, n. 106, p. 57-65, 2017.
  • GARCIA-PAPET, Marie-France. Le marché de l’excellence : les grands crus à l’épreuve de la mondialisation. Paris: Les Éditions du Seuil, 2009.
  • GARCIA-PARPET, Marie-France; RAMIRO, Patricia Alves. La “cachaça”: boisson d’esclave ou boisson d’élite? Réconversions de “senhores de engenho” do Brejo de l’État de Paraíba au Brésil. Psihologia Socială, n. 42, p. 75-91, Bucareste, 2018.
  • HEREDIA, Mariana. Cuando los economistas alcanzaron el poder: o cómo se gesto la confianza en los expertos. Buenos Aires: Siglo Veintiuno, 2015.
  • PEREIRA, Irène. Un nouvel esprit contestataire: la grammaire pragmatiste du syndicalisme d’action directe libertaire. Thèse de doctorat en sociologie dirigée par Luc Boltanski, directeur de programme à l’École des Hautes Etudes en Sciences Sociales (Ehess), 2009. Disponível em: <https://tel.archives-ouvertes.fr/tel-00392699/document>.
    » https://tel.archives-ouvertes.fr/tel-00392699/document
  • 1
    Trata-se do artista plástico Christian Boltanski, escultor, fotógrafo, pintor e cineasta, considerado hoje um dos mais consagrados artistas contemporâneos. Em 2012 fez sua primeira mostra individual no Brasil e, em 2014, inaugurou obra inédita no Sesc Pompeia, produzida a partir de sua percepção de São Paulo.
  • 2
    Antes da publicação de Enrichissement, foram publicados diversos artigos em revistas que mostram a elaboração do livro. Entre eles, cabe mencionar: Luc Boltanski & Arnaud Esquerre (2014a: 5-72; 2015: 75-83; 2016a: 41-58; 2016b: 31-54). Este último artigo provocou uma réplica de Nancy Fraser (2017: 57-65).
  • 3
    Ver Pierre Bourdieu (2007).
  • 4
    A assim chamada economia das convenções emerge nos anos 1970 e em torno de pesquisadores que atuavam no Institut National de la Statistique et des Études Économiques (INSEE), reunindo autores, entre os quais, Alain Desrosières, Laurent Thévenot e Robert Salais. Ao emergir como crítica às tradições regulacionista e institucionalista, o enfoque da economia das convenções recai sobre as modalidades de qualificação de coisas e pessoas, partindo da premissa de que a racionalidade dos atores econômicos é restringida por formas convencionais e, por isso, não apenas pautada pelo autointeresse (Dosse, 2018).
  • 5
    Ver Irène Pereira (2009).
  • 6
    Ver Marie-France Garcia-Parpet & Patricia Alves Ramiro (2018: 75-91).
  • 7
    Ver Marie-France Garcia-Papet (2009).
  • 8
    Termo francês que é a junção das palavras bourgeois (burguês) e bohème (boêmio). Serve para classificar as classes médias altas intelectualizadas e escolarizadas.
  • 9
    Termo de difícil tradução, composto dos termos hors (fora) e sol (solo), que designa a pessoa ou um grupo que parece estar completamente desconectado da realidade nacional e dos constrangimentos (sobretudo econômicos) da vida cotidiana.
  • 10
    A Action Française se refere a um movimento contrar-revolucionário monarquista e orleanista que tomou forma quando do caso Dreyfus, no qual defendeu a condenação sumária do suposto crime de traição do capitão Alfred Dreyfus com base em argumentos explicitamente antissemitas. Na obra Vers l’extrême (2014b), os autores analisam a mudança semântica que ocorreu da Action Française para o Front National, propondo que o significante judeu de outrora foi substituído pelo significante “bobo”.
  • 11
    Ver Mariana Heredia (2015).
  • 12
    Trata-se, sobretudo, de autores como John Austin e Ludwing Wittgenstein, e não os autores da assim chamada filosofia pragmatista americana, a exemplo de John Dewey, Herbert Mead e William James, os quais vêm sendo retomados por sociólogos franceses contemporâneos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Set 2021
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2021

Histórico

  • Recebido
    29 Mar 2021
  • Aceito
    18 Jun 2021
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