Acessibilidade / Reportar erro

Crianças com e sem deficiência auditiva: o equilíbrio na fase escolar

Resumos

a capacidade de manter o equilíbrio é pré-requisito para execução de várias atividades da vida diária. Para a regulação do equilíbrio, o sistema de controle postural necessita de informações quanto às posições relativas dos segmentos do corpo e à magnitude das forças atuantes. As informações são provenientes dos sistemas: visual, somatosensorial e vestibular. Alguns indivíduos com perda auditiva neurossensorial podem ter prejuízos no processo de aquisição de habilidades motoras básicas, em função de problemas no equilíbrio. O objetivo desse estudo foi comparar o equilíbrio entre crianças com deficiência auditiva e ouvintes de nove a 12 anos de idade. A amostra foi composta de 20 crianças, sendo 10 com deficiência auditiva e 10 ouvintes. Para avaliação foi aplicada a Escala de Equilíbrio Pediátrica - EEP (versão brasileira) e o Teste de Alcance. Em relação à EEP, as crianças com deficiência auditiva apresentaram mediana de 55 e as ouvintes de 56 pontos (p=0,007). No Teste de Alcance as crianças com perda auditiva e as ouvintes obtiveram as seguintes medianas: Alcance Anterior - 24/29 (p=0,021); Alcance Lateral Direita - 16/22 (p=0,001); Alcance Lateral Esquerda - 14,5/22 (p=0,002), respectivamente. Os resultados sugerem que as crianças com perda auditiva neurossensorial apresentaram déficit de equilíbrio, em comparação com as crianças ouvintes. Tal fato pode estar relacionado com a perda auditiva neurossensorial, uma vez que crianças com essa deficiência podem apresentar, concomitantemente, alterações de equilíbrio causadas pelo déficit na quantidade e/ou qualidade das informações provenientes do aparelho vestibular. Assim, foi possível identificar que as crianças com deficiência auditiva apresentam alterações no equilíbrio, quando comparadas as crianças ouvintes.

Educação Especial; Criança; Avaliação de Habilidades; Deficiência Auditiva


The ability to maintain one’s balance is a prerequisite for carrying out several daily living activities. To adjust one’s balance, the postural control system requires information about the relative positions of the body segments and the magnitude of the acting forces. The information comes from several systems: visual, vestibular and somatosensory. There may be concerns in the process of acquiring basic motor skills for some individuals with sensorineural hearing impairments, due to problems with balance. The aim of this study was to compare balance in children with and without hearing impairments from nine to 12 years. The sample was made up of 20 children, 10 with and 10 without hearing impairments. The Pediatric Balance Scale - PBC - (Brazilian version) and the Range Test were applied in order to assess balance. Regarding the PBC scores, children with hearing impairment had a mean score of 55, while hearing children presented with a men score of 56 points (p = 0.007). On the Range Test, children with and without hearing impairments had the following mean results: previous range - 24/29 (p=0.021); right lateral reach - 16/22 (p=0.001); left lateral reach - 14.5/22 (p=0.002), respectively. The results suggest that children with sensorineural hearing impairments had balance deficits, compared to hearing children. This fact may be related to sensorineural hearing impairment, since children with hearing impairments can also present alterations in balance caused by deficit in quantity and/or quality of information coming from the vestibular apparatus. Thus, it was possible to identify that children with hearing impairments present alterations in balance, when compared to hearing children.

Special Education; Child; Assessment of Abilities; Hearing Impairment


RELATO DE PESQUISA

Crianças com e sem deficiência auditiva: o equilíbrio na fase escolar

Children with and without hearing impairment: balance during school years

Ariele Troiano RodriguesI; Vanessa BertinII; Leonardo George Victorio VitorIII; Dirce Shizuko FujisawaIV

IDiscente do Curso de Graduação em Fisioterapia da Universidade Estadual de Londrina, Departamento de Fisioterapia da Universidade Estadual de Londrina, UEL, Londrina, PR, Brasil. arieletroiano@hotmail.com

IIDiscente do Curso de Graduação em Fisioterapia da Universidade Estadual de Londrina – Departamento de Fisioterapia da Universidade Estadual de Londrina, UEL, Londrina, PR, Brasil. nessa_bertin@hotmail.com

IIIMestrando em Ciências da Reabilitação pela Universidade Estadual de Londrina – UEL; Bolsista da Fundação Araucária. Departamento de Fisioterapia da Universidade Estadual de Londrina, UEL, Londrina, PR, Brasil. leonardovitor.fisio@yahoo.com.br

IVMestre e Doutora em Educação pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Campus de Marília. Docente do Departamento de Fisioterapia da Universidade Estadual de Londrina, UEL, Londrina, PR, Brasil. dirce_fujisawa@uel.br

RESUMO

a capacidade de manter o equilíbrio é pré-requisito para execução de várias atividades da vida diária. Para a regulação do equilíbrio, o sistema de controle postural necessita de informações quanto às posições relativas dos segmentos do corpo e à magnitude das forças atuantes. As informações são provenientes dos sistemas: visual, somatosensorial e vestibular. Alguns indivíduos com perda auditiva neurossensorial podem ter prejuízos no processo de aquisição de habilidades motoras básicas, em função de problemas no equilíbrio. O objetivo desse estudo foi comparar o equilíbrio entre crianças com deficiência auditiva e ouvintes de nove a 12 anos de idade. A amostra foi composta de 20 crianças, sendo 10 com deficiência auditiva e 10 ouvintes. Para avaliação foi aplicada a Escala de Equilíbrio Pediátrica - EEP (versão brasileira) e o Teste de Alcance. Em relação à EEP, as crianças com deficiência auditiva apresentaram mediana de 55 e as ouvintes de 56 pontos (p=0,007). No Teste de Alcance as crianças com perda auditiva e as ouvintes obtiveram as seguintes medianas: Alcance Anterior - 24/29 (p=0,021); Alcance Lateral Direita – 16/22 (p=0,001); Alcance Lateral Esquerda - 14,5/22 (p=0,002), respectivamente. Os resultados sugerem que as crianças com perda auditiva neurossensorial apresentaram déficit de equilíbrio, em comparação com as crianças ouvintes. Tal fato pode estar relacionado com a perda auditiva neurossensorial, uma vez que crianças com essa deficiência podem apresentar, concomitantemente, alterações de equilíbrio causadas pelo déficit na quantidade e/ou qualidade das informações provenientes do aparelho vestibular. Assim, foi possível identificar que as crianças com deficiência auditiva apresentam alterações no equilíbrio, quando comparadas as crianças ouvintes.

Palavras-chave: Educação Especial. Criança. Avaliação de Habilidades. Deficiência Auditiva.

ABSTRACT

The ability to maintain one’s balance is a prerequisite for carrying out several daily living activities. To adjust one’s balance, the postural control system requires information about the relative positions of the body segments and the magnitude of the acting forces. The information comes from several systems: visual, vestibular and somatosensory. There may be concerns in the process of acquiring basic motor skills for some individuals with sensorineural hearing impairments, due to problems with balance. The aim of this study was to compare balance in children with and without hearing impairments from nine to 12 years. The sample was made up of 20 children, 10 with and 10 without hearing impairments. The Pediatric Balance Scale – PBC – (Brazilian version) and the Range Test were applied in order to assess balance. Regarding the PBC scores, children with hearing impairment had a mean score of 55, while hearing children presented with a men score of 56 points (p = 0.007). On the Range Test, children with and without hearing impairments had the following mean results: previous range - 24/29 (p=0.021); right lateral reach - 16/22 (p=0.001); left lateral reach - 14.5/22 (p=0.002), respectively. The results suggest that children with sensorineural hearing impairments had balance deficits, compared to hearing children. This fact may be related to sensorineural hearing impairment, since children with hearing impairments can also present alterations in balance caused by deficit in quantity and/or quality of information coming from the vestibular apparatus. Thus, it was possible to identify that children with hearing impairments present alterations in balance, when compared to hearing children.

Keywords: Special Education. Child. Assessment of Abilities. Hearing Impairment.

1 Introdução

A capacidade de manter o equilíbrio é pré-requisito para a execução de atividades da vida diária, incluindo as escolares em se tratando de crianças. Para Pollock, Durward e Rowe (2000), o equilíbrio ou balance é definido como o estado de um objeto quando a resultante das forças que atuam sobre o mesmo é zero. O equilíbrio permite manter-se sem queda, por outro lado, quando a linha de gravidade ultrapassa os limites da base de sustentação e as estratégias para a sua retomada não ocorrerem, o indivíduo pode cair (WINTER, 1995).

O equilíbrio é fundamental no relacionamento espacial do homem com o ambiente, que exige complexa interação entre os sistemas sensorial e o motor. Os movimentos estáticos e dinâmicos exigem um sistema que dê prioridade aos objetivos comportamentais, que utilizam as informações sensoriais, disponíveis para um controle eficaz e eficiente dos membros e do tronco, para conseguir a orientação e o equilíbrio (HERDMAN, 2002). Para a regulação do equilíbrio, o sistema de controle postural (SNC) necessita de informações quanto às posições relativas dos segmentos do corpo e à magnitude das forças atuantes. Tais informações são oriundas dos sistemas visual, proprioceptivo e vestibular, com a finalidade de manter o alinhamento e a estabilidade (STEINDL et al., 2006). A alteração do sistema visual, proprioceptivo ou vestibular pode levar a perda da capacidade de manter-se em equilíbrio (GANANÇA, 1998).

O sistema vestibular fornece informações sobre o movimento e a posição da cabeça em relação à gravidade e outras forças inerciais. Assim, contribui com informações importantes para a sensação e a percepção do movimento e da posição do corpo como um todo (HERDMAN, 2002). O aparelho vestibular é situado no ouvido interno, e as vibrações estimulam os receptores, que sofrem transdução para impulsos nervosos que vão alcançar o SNC, via nervo acústico (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2008). Quando o aparelho vestibular apresenta algum tipo de distúrbio, o equilíbrio da pessoa pode ser afetado, assim, interferindo no processo de aquisição de habilidades motoras básicas, como é o caso de alguns indivíduos com perda auditiva neurossensorial (MOR et al., 2001).

A deficiência auditiva pode afetar o desenvolvimento cognitivo, aprendizagem, linguagem e inclusão social da criança, além da privação sensorial, provocando consequências biopsicossociais. A função auditiva estabelece a comunicação com o ambiente e o equilíbrio, que participa de todas as funções motoras e posturais (MELCHIOR et al., 2009).

Formigoni (1998) ressaltou que crianças pequenas com alteração vestibular, frequentemente, são inquietas, devido à procura de uma posição de conforto e de segurança, o que leva a uma dificuldade de concentração e à dispersão, comprometendo a escolarização. Em muitos casos, as crianças podem apresentar alterações de equilíbrio, com manifestações, tais como, quedas e esbarrões, podendo assim, ter dificuldade de brincar, andar de bicicleta, ou de tirar as rodas de apoio, andar sobre o muro, pular corda ou amarelinha, usar os brinquedos em parques infantis.

Com isso, as crianças que apresentam manifestações e consequências dos distúrbios vestibulares em sua vida diária, podem apresentar comprometimento cognitivo e isolamento social, que influenciam direta e negativamente em seu desenvolvimento (GANANÇA et al., 1997). Dessa forma, o objetivo do presente estudo foi compararar o equilíbrio entre crianças com deficiência auditiva e ouvintes na faixa etária entre nove e 12 anos. Destaca-se que o equilibrio será avaliado de maneira funcional, já que, caso haja alteração, pode influenciar diretamente na realização de atividades de vida diária e escolares.

2 Método

O estudo realizado foi do tipo transversal, vinculado ao projeto de pesquisa "Reação de Equilíbrio: avaliação em crianças com e sem alterações sensoriais e motoras", aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos do Hospital Universitário da Universidade Estadual de Londrina - UEL, Paraná (Parecer N. 020/10). Todas as crianças do estudo participaram mediante a autorização de seus pais ou responsáveis, conforme a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido.

Os critérios de inclusão foram crianças com deficiência auditiva neurosensorial (leve a profunda) e sem, na faixa etária entre nove e 12 anos. Os critérios de exclusão foram a presença de quaisquer outros distúrbios associados, tais como, cegueira, microcefalia, deficiência física, retardo mental e a presença de doenças crônicas ou sequelas neurológicas.

Para a avaliação do equilíbrio dos participantes da pesquisa foi utilizada a Escala de Equilíbrio Pediátrica (EEP), versão traduzida para o português por Ries et al. (2012). A EEP é uma versão infantil para a fase escolar e proposta para crianças com deficiência motora leve a moderada, trata-se de modificação da Escala de Equilíbrio de Berg (EEB), que tem como propósito avaliar o risco de quedas em pessoas idosas. A EEB foi proposta por Berg et al. (1992), validada no Brasil por Miyamoto et al. (2004), já a EEP foi proposta por Franjoine, Gunther e Taylor (2003). A opção pela EEP foi por ser de baixo custo, de fácil administração e seguro para as crianças. Assim como vários outros testes clínicos de avaliação do equilíbrio, a EEB vem sendo muito utilizado, principalmente, para determinar o risco de perda da independência e de quedas. A Escala de Equilíbrio de Berg atende várias propostas: descrição quantitativa da habilidade de equilíbrio funcional, acompanhamento do progresso dos pacientes e avaliação da efetividade das intervenções na prática clínica e em pesquisas (BERG; NORMAN, 1996).

Na versão pediátrica, os itens foram reordenados em uma sequência funcional, o tempo para a manutenção das posturas estáticas foi reduzido, e as instruções e os equipamentos sugeridos foram modificados. A EEP avalia o equilíbrio funcional (estático e dinâmico), baseado em 14 itens comuns da vida diária de crianças. Os 14 itens contidos na EEP avaliam atividades funcionais, que podem ser executados de forma segura e independente por uma criança, dentro de sua casa, escola ou comunidade (FRANJOINE et al., 2003). O escore máximo que pode ser alcançado é 56, cada item possui uma escala ordinal de cinco alternativas com pontuação de 0-4 (RIES et al., 2012).

Também foi utilizado para avaliação do equilíbrio das crianças o Teste de Alcance, proposto por Duncan et al. (1990), inicialmente, desenvolvido para populações adultas. Esse teste mede a distância de que um indivíduo é capaz de atingir a frente, a partir de uma posição em pé, base fixa de apoio, sem perda de equilíbrio. Tal distância é uma aproximação razoável de uma medida de plataforma de força (padrão ouro), do centro pé da excursão de pressão, confiável e viável para administrar em uma clínica com adultos (DUNCAN et al., 1990). O teste de alcance pediátrico permite avaliar os limites de estabilidade nas direções anteroposterior e mediolateral na posição de pé, também de fácil utilização na prática, e a sua confiabilidade e validade foi demonstrada por Bartlett e Birmingham (2003). No teste de alcance as crianças foram instruídas a inclinar-se para frente, movendo somente seus tornozelos, o máximo possível, mantendo os pés fixos no chão, em seguida, deslocar-se para a lateral esquerda e depois para a lateral direita, tanto quanto possível, mantendo-se por três segundos na posição. Os membros superiores da criança permanecem em flexão de ombro para o teste de alcance anterior, e em abdução de ombro direito e esquerdo no lateral. No teste proposto por Duncan et al. (1990) a mensuração do deslocamento anterior e lateral direito e esquerdo é realizada com uma fita métrica fixada na parede, ao lado do paciente. Já na versão infantil, a fita métrica é fixada sobre o terceiro metacarpiano da mão, com o punho cerrado, e posicionado sobre o ombro da criança, mais especificamente, no acrômio, que mensura a variação entre a posição inicial e final, portanto o deslocamento. Em ambas as versões a mensuração é realizada em centímentros (cm). No presente estudo, o teste de alcance foi realizado seguindo as observações de Vitor (2012), que utilizou o teste de alcance conforme as orientações de Duncan et al. (1990), mesmo sendo a população composta de crianças, devido a dificuldade na mensuração pelo avaliador com a fita métrica no ombro da criança e a presença de retrações musculares nos membros superiores em participantes com paralisia cerebral, que interferem na manutenção e execução do teste.

As avaliações foram realizadas individualmente nas salas de aula e contava com a presença de uma professora da escola, já que em alguns momentos era necessário o seu auxílio para a comunicação com as crianças. Na avaliação por meio da EEP e o teste de alcance, os materiais utilizados foram: cronômetro, fita métrica, cadeira e step. Todos os itens da EEP foram demonstrados e explicados, inicialmente, para o participante, caso não houvesse duvidas na forma de execução, eram realizados, conforme a sua sequência. Da mesma forma, o teste de alcance seguiu da demonstração, explicação e realização, sendo que durante a sua execução eram fornecidos incentivos com a finalidade de a criança buscar o maior deslocamento possível. Tanto a EEP, quanto o teste de alcance, foram realizados com a criança com os pés desnudos, o avaliador mantinha-se próximo à criança por medida de segurança e executados duas vezes, tendo sido considerado sempre o maior valor de pontuação e deslocamento. Durante a coleta de dados foram estabelecidos dois períodos de intervalos para descanso, na metade dos itens da EEP e após o seu termino, antes do início do teste de alcance, para que não ocorresse a fadiga, que iriam interferir do desempenho da criança. Ainda, os avaliadores foram treinados, previamente, para a realização da coleta de dados com as crianças participantes.

A amostra foi por conveniência, mas esclarece-se que todas as crianças com deficiência auditiva, dentro dos critérios de inclusão, da escola que atende, especificamente, alunos com perda auditiva, foram inseridas na coleta de dados do estudo. Após o término do estudo, foi encaminhado relatório para a escola sobre o desempenho na EEP e no teste de alcance de cada criança participante, e nos casos de identificação de déficit, seguiu-se de orientação com a finalidade de promover a melhora do equilíbrio.

A análise estatística utilizou o teste de Shapiro-wilk para verificação da normalidade dos dados. O teste de Mann Whitney U foi realizado para a comparação dos resultados. Os dados estão apresentados por meio de média e desvio padrão e mediana e seus intervalos interquartílicos. A significância estatística foi estabelecida em 5% (P<0,05).

3 Resultados

Foram avaliadas 20 crianças, com idade entre nove a 12 anos, constituindo-se dois grupos, com e sem deficiência auditiva, e dez participantes em cada um. O grupo de participantes com perda auditiva neurossensorial foi constituído de oito crianças com perda auditiva profunda e duas crianças com perda auditiva leve e moderada, sendo sete meninas e três meninos. O grupo de crianças ouvintes foi de cinco meninas e cinco meninos. As crianças avaliadas com perda auditiva apresentaram a média da idade de 10,4 (+/- 0,966 anos). Já o grupo de crianças sem perda auditiva, a média da idade foi de 9,8 (+/- 0,632 anos).

Os resultados da EEP evidenciaram melhor performance das crianças ouvintes em relação às com perda auditiva neurossensorial, visto que obtiveram maior valor de mediana (Gráfico 1), com diferença estatisticamente significante (P=0,007). Os participantes com deficiência auditiva não obtiveram a nota máxima nos itens 8, 9 e 14, que são, respectivamente, ficar de pé sem apoio com um pé a frente do outro, de pé em uma perna só (apoio unipodal) e alcançando com o braço esticado enquanto está de pé. A pontuação dos itens 8 e 9 variou entre 2 e 4, sendo que somente três participantes obtiveram escore inferior a quatro, os demais não apresentaram dificuldade na realização da tarefa. A pontuação do item 14 variou entre 3 a 4, sendo que somente dois participantes obtiveram o escore máximo de quatro pontos.


Nessa amostra, as crianças com perda auditiva obtiveram diferença estatisticamente significante para o alcance anterior e alcance lateral direito e esquerdo menor, quando comparadas as crianças ouvintes (Tabela 1).

4 Discussões

Embora a amostra seja reduzida, os resultados encontrados no presente estudo mostraram diferenças entre os grupos, no que se refere ao equilíbrio postural. O grupo das crianças ouvintes apresentou maiores pontuações que o das crianças com deficiência auditiva. Os resultados confirmam trabalhos realizados por outros autores (ARAÚJO; MEIRA JUNIOR; CANTARELLI 2001; MELCHIOR et al. 2009; SILVA et al. 2011), nos quais as crianças com perda auditiva neurossensorial apresentaram déficit de equilíbrio, em comparação com as crianças ouvintes. Tal fato pode estar relacionado com a perda auditiva neurossensorial, uma vez que crianças com deficiência auditiva podem apresentar, concomitantemente, alterações de equilíbrio causadas pelo déficit na quantidade e/ou qualidade das informações provenientes do aparelho vestibular (AZEVEDO; SAMELLI 2009). Suarez et al. (2007) sugerem que a criança com deficiência auditiva utiliza, primariamente, as informações somatosensoriais e visuais para a manutenção do controle postural.

O desempenho das crianças com deficiência auditiva na EEP foi aquém nos itens 8, 9 e 14. Em relação aos itens 8 e 9, as tarefas solicitadas constituem-se em atividades desafiadoras em relação ao equilíbrio, pois reduzem a base de sustentação. Já o item 14, em que a criança precisava deslocar-se a frente sem tirar os pés do apoio, com os braços em flexão de ombro a 90º, promovendo o deslocamento do centro de gravidade, provavelmente, a obtenção de pontuação três pela maioria das crianças foi influenciada pelas características antropométricas das mesmas, visto que a distância estabelecida na EEP para o escore quatro é idêntica ao da Escala de Berg. Assim, os resultados da EEP demonstraram que, as crianças com deficiência auditiva apresentam dificuldades na execução de algumas atividades funcionais que requerem menor base de sustentação.

Conforme Shumway-Cook e Woollacott (2003) na amplitude de escore entre 56 a 54 na EEP, cada ponto a menos é associado a um aumento de 3 a 4% no risco de quedas. De 54 a 46, a alteração de um ponto é associada ao aumento de 6 a 8%, sendo que abaixo de 36 pontos o risco de quedas é quase de 100%. Com o resultado dessa amostra, pode-se concluir que as crianças ouvintes não possuem risco de quedas, já as crianças com perda auditiva têm alterações no seu equilíbrio, que ocasionam aumento de 3 a 4% no risco de quedas.

O teste de alcance anterior repetia a execução do item 14 da EEP, sendo acrescido o deslocamento lateral esquerdo e direito. Os resultados identificaram que o limite de estabilidade nas direções anteroposterior são maiores (24 cm.) que os laterais direito (16 cm.) e esquerdo (14,5 cm.) nas crianças com deficiência auditiva, porém menores do que nos participantes ouvintes. Ainda, os resultados apontam também que o grau de mobilidade e o limite que o indivíduo consegue alcançar, sem utilizar a estratégia do passo, é menor nas crianças com deficiência auditiva quando comparadas as ouvintes. Wernick-Robinson, Krebs e Giorgetti (1999) sugerem em seu estudo que somente o teste de alcance, que mensura a distância do deslocamento do membro superior, não avalia o equilíbrio dinâmico, sendo indispensável a observação das estratégias (tornozelo, quadril ou outra) de movimento utilizadas na sua realização, pois essa informação irá auxiliar o terapeuta no delineamento do problema que causa a limitação funcional. Em nosso estudo não foi avaliado a resposta qualitativa durante a execução do teste de alcance, ou seja, a descrição das estratégias utilizadas, portanto não foi possível identificar as causas da dificuldade apresentadas pelas crianças.

Entretanto, foi identificado que a funcionalidade é afetada, visto que o equilíbrio é fundamental para que a criança possa agir de maneira independente em suas atividades diárias como brincar, correr, manipular objetos e explorar o ambiente, tanto no domicílio, quanto na escola, que podem trazer repercussão sobre a sua qualidade de vida. Melo et al. (2011) revelam que todas as crianças com deficiência auditiva apresentam desvios posturais, o que também é mais um fator negativo no ambiente escolar, pois quando grave, pode induzir, as pessoas perceberem, equivocadamente, uma deficiência severa, e, automaticamente, acabam tratando-as diferentemente, motivo que gera sensação de exclusão ou discriminação pela criança podendo dificultar seu aprendizado (ARAÚJO; OMOTE 2005).

Uma das propostas, é iniciar programas ou treinamentos que irão contribuir para o equilíbrio, (Exemplo: jogos com bola, trampolim acrobático, dança, entre outros), para que possam desenvolver estratégias posturais para superar ou compensar as eventuais dificuldades, sendo que essas atividades podem ser introduzidas em práticas de educação física. (CAMPOS, 2003).

Além disso, a utilização de testes clínicos, como por exemplo, a EEP e o teste de alcance, são válidos, visto que proporcionam informações sobre o equilíbrio da criança, inclusive nas crianças com deficiência auditiva. Entretanto, o padrão ouro na avaliação do equilíbrio é a plataforma de força. A plataforma de força é amplamente utilizada na avaliação quantitativa do equilíbrio na posição de pé, que fornece dados sobre o centro de pressão (NARDONE; SCHIEPPATI 2010). De Kegel et al. (2010) concluem que os testes clínicos e a posturografia devem ser utilizados na avaliação do equilíbrio de crianças com deficiência auditiva, visto que fornecem informações diferentes e complementares.

O presente estudo mostra que na prática clínica e nas escolas, a EEP e o teste de alcance podem ser utilizados para a avaliação do equilíbrio, visto que possibilitaram identificar os déficits e o risco de quedas nas crianças com deficiência auditiva. Salienta-se também que, a EEP e o teste de alcance por serem simples e de rápida aplicação podem ser aplicados, por outro lado, a plataforma de força não é de fácil acesso, geralmente, disponíveis em grandes centros e laboratórios de pesquisa. Os resultados da EEP e do teste de alcance podem indicar a necessidade de intervenção ou de atividades que proporcionem a melhora do equilíbrio e de cuidados quanto ao risco de quedas, informações importantes a própria criança, aos pais e professores.

No entanto, sendo o equilíbrio uma habilidade passível de ser desenvolvida e aperfeiçoada por meio de experiências corporais, podem ser melhoradas mediante a intervenção por meio de atividades que a promovam. A intervenção com a finalidade de promover o desenvolvimento motor com indivíduos com perda auditiva não requer grandes adaptações e podem ter o objetivo de levá-los a desenvolver a autoconfiança, a melhora da coordenação geral e do equilíbrio, bem como, da velocidade de reação e da agilidade (AMADEU, 2001). Montezuma et al. (2011) realizaram a intervenção na escola por meio da dança do tipo jazz dance em adolescentes com deficiência auditiva, e compararam a coordenação corporal por meio do teste KTK, que envolve o equilíbrio, o ritmo, a lateralidade, a velocidade e a agilidade, e obtiveram a melhora de quase todos os sujeitos. Assim, a intervenção ou atividades podem ser incorporadas no dia-a-dia das escolas e instituições que atendem indivíduos com perda auditiva, visando melhorar o equilíbrio postural (NANDI; LUXON 2008).

Mancini e Horak (2010) apontam os problemas dos testes clínicos, dentre as limitações da Escala de Berg, que originou a EEP, e o teste de alcance, está a não identificação da sua causa, mas os autores também referem que ambos apresentam boa confiabilidade. Assim, considera-se que uma das limitações do estudo foi a utilização de somente testes clínicos e funcionais para avaliação do equilíbrio, sem os dados quantitativos da plataforma de força, alem disso, o tamanho da amostra reduzido.

Estudos futuros sobre o tema devem ser realizados por meio de outras modalidades de avaliação, como por exemplo, a plataforma de força, por ser padrão ouro na avaliação de equilíbrio e também acrescentando outros aspectos, como as avaliações posturais e da (dinâmica) marcha. Ainda, outros estudos poderiam investigar o efeito de um programa de treinamento sobre o equilíbrio dos indivíduos com perda auditiva. Sabe-se que, os indivíduos com deficiência auditiva podem desenvolver estratégias posturais para superar ou compensar as dificuldades de equilíbrio. Dessa forma, também pode-se ampliar a faixa-etária avaliada no estudo para investigar possível efeito da idade sobre o equilíbrio postural (CAMPOS, 2003).

5 Considerações finais

Os participantes com perda auditiva neurossensorial apresentaram menores pontuações na EEP e medidas no Teste de Alcance, ou seja, apresentaram equilíbrio comprometido, quando comparadas as crianças ouvintes da mesma faixa etária. Tal fato demonstra que as crianças com deficiência auditiva podem requerer atenção, por parte dos professores e dos pais, durante a realização de atividades que promovam instabilidade e redução da base de apoio na escola e no domícilio. Por outro lado, programas de intervenção podem ser instituídos nas escolas com a finalidade de melhora do equilíbrio para crianças com perda auditiva, com a finalidade de diminuir os riscos de queda e promover qualidade de vida.

Destaca-se que ambos os testes foram instrumentos que possibilitaram a identificação de déficits de equilíbrio em crianças com perda auditiva, portanto podem ser utilizados na avaliação motora dessa população. A facilidade de aplicação e o tempo reduzido para a EEP e o teste de alcance possibilitam que ambos possam ser utilizados na área da saúde e educação, visto que possibilitam avaliar o equilíbrio.

Recebido em: 07/06/2013

Reformulado em: 09/01/2014

Aprovado em: 07/04/2014

  • AMADEU, P. A. O surdo e a ginástica acrobática. Revista Arqueiro, Rio de Janeiro, n. 4, p. 23-25, 2001.
  • ARAÚJO, R. C. T.; OMOTE, S. Atribuição de gravidade à deficiência física em função da extensão do acometimento e do contexto escolar. Revista Brasileira de Educação Especial, Marília, v.11, n.2, p.241-254, 2005.
  • ARAÚJO, S. M.; MEIRA JUNIOR, C. M.; CANTARELLI, E. M. Equilíbrio estático em crianças portadoras de deficiência auditiva neurossensorial. Caderno UniABC de Educação Física, Santo André, v. 16, p. 56-70 , 2001.
  • AZEVEDO, M. G.; SAMELLI, A. G. Estudo comparativo do equilíbrio de crianças surdas e ouvintes. Revista CEFAC, São Paulo, v. 11, supl.1, p.85-91 , 2009.
  • BARTLETT, D.; BIRMINGHAM, T. Validity and Reliability of a Pediatric Reach Test. Pediatric Physical Therapy, London, Ontario, Canada, v. 15, p. 84-92, 2003.
  • BERG, K. O.; NORMAN,  K. E. Functional assessment of balance and gait. Clinics in Geriatrics Medicine, Providence, Rhode Island, EUA, v. 12, n. 4, p. 705-723, 1996.
  • BERG, K. O. et al. Measuring balance in the elderly: validation of an instrument. Canadian Journal of Public Health, Montreal, Canada, v.83, Suppl 2, S7-S11, 1992.
  • CAMPOS, C. Efeitos de um programa de treinamento com trampolim acrobático sobre o equilíbrio de crianças surdas. Revista Sobama, São Paulo, v. 8, n. 1, p. 21-26, 2003.
  • DUNCAN, P. W. et al. Functional reach: a new clinical measure of balance. Journal of Gerontology, Durham, North Carolina, EUA, v. 45(6); p. 192-7, 1990.
  • FORMIGONI, L. G. A avaliação vestibular na criança. In: GANANÇA, M. M. (Org.). Vertigem tem cura? São Paulo: Lemos Editorial, 1998.
  • FRANJOINE, M. R.; GUNTHER, J. S.; TAYLOR, M. J. Pediatric Balance Scale: A Modified Version of the Berg Balance Scale for the School-Age Child with Mild to Moderate Motor Impairment. Pediatric Physical Therapy Amherst, New York, EUA, v. 15, p. 114-128, 2003.
  • GANANÇA, M. M. Vertigem tem cura? São Paulo: Lemos Editorial, 1998.
  • GANANÇA, M. M. et al. Tratamento da vertigem na criança. Pediatria Moderna, São Paulo, v. 33, n. 1, p. 7-22, 1997.
  • HERDMAN, S. J. Reabilitação Vestibular Barueri: Editora Manole, 2002.
  • JUNQUEIRA, L. C.; CARNEIRO, J. Histologia Básica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.
  • KEGEL, A. et al. Construct validity of the assessment of balance in children who are developing typically and in children with hearing impairments. Physical Therapy, Ghent, Belgium, v. 90, n. 12, p. 1783-1794, 2010.
  • MANCINI, M.; HORAK, F. B. The relevance of clinical balance assessment tools to differentiate balance deficits. European Journal of Physical and Rehabilitation Medicine, v. 46, Beaverton, Oregon, EUA, n. 2, p. 239-248, 2010.
  • MELCHIOR, C. K. et al. Avaliação do equilíbrio de crianças com deficiência auditiva por meio da escala de desenvolvimento motor. Revista de Terapia Manual, Londrina, v. 7(32), p.270-277 , 2009.
  • MELO, R. S. et al. Avaliação postural da coluna vertebral em crianças e adolescentes com deficiência auditiva. Arquivos Internacionais de Otorrinolaringologia. São Paulo, v.15(2), p.195-202, 2011.
  • MIYAMOTO, S. T. et al. Brazilian version of the Berg Balance Scale. Brazilian Journal of Medical and Biological Research, São Paulo, v. 37(9), p.1411-1421, 2004.
  • MONTEZUMA, M. A. L. et al. Adolescentes com deficiência auditiva: a aprendizagem da dança e a coordenação motora. Revista Brasileira de Educação Especial, Marília, v. 17, n. 2, p. 321-334, 2011.
  • MOR, R.; TAGUCHI, K.C.; FIGUEIREDO, J. F. F. R. Vestibulometria e fonoaudiologia: Como realizar e interpretar. São Paulo: Lovise, 2001.
  • NANDI, R.; LUXON, L. M. Development and assessment of the vestibular system. International Journal of Audiology, Londres,  v. 47, n. 9, p. 566-577, 2008.
  • NARDONE, A.; SCHIEPPATI, M. The role of instrumental assessment of balance in clinical decision making. European Journal of physical and rehabilitation medicine, Novara, Itália, v. 46, n. 2, p. 221-237, 2010.
  • POLLOCK, A. S.; DURWARD, B. R.; ROWE, P. J. What is balance? Clinica Rehabilitation, Edinburgh, Glasgow, Escócia, v. 14, p. 402-406, 2000.
  • RIES, L. G. K. et al. Adaptação cultural e análise da confiabilidade da versão brasileira da Escala de Equilíbrio Pediática (EEP). Revista Brasileira de Fisioterapia, São Carlos, v. 16, n. 3, 2012.
  • SILVA, E. G. O. et al. Avaliação do equilíbrio em portadores de deficiência auditiva. Neurobiologia, Recife, v. 74, p. 3-4, 2011.
  • SHUMWAY-COOK, A.; WOOLLACOTT, M. H. Controle Motor: Teoria e Aplicações Práticas. São Paulo: Manole, 2003.
  • STEINDL, R. M. D. et al. Effect of age and sex on maturation of sensory systems and balance control. Developmental Medicine and Child Neurology, Innsbruck, Áustria, v. 48, p. 477–482, 2006.
  • SUAREZ, H. et al. Balance sensory organization in children with profound hearing loss and cochlear implants. International Journal of Pediatric Otorrhinolaryngology, Montevideu, Uruguai, v. 71, p. 629-637, 2007.
  • VITOR, L.G.V. Controle postural de crianças em desenvolvimento típico e com paralisia cerebral 2012. 59f. Dissertação (Mestrado em Ciências da Reabilitação) – Departamento de Fisioterapia, Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2012.
  • WERNICK-ROBINSON, M.; KREBS, D.E.; GIORGETTI, M. M. Functional reach: does it really measure dynamic balance? Archives Physical Medicine Rehabilitation, Boston, MA, USA, v. 80, p. 262-269, 1999.
  • WINTER D.A. Human balance and posture control during standing and walking. Gait Posture, Waterloo - Ontario, Canada, v. 3, p. 193–214, 1995.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jul 2014
  • Data do Fascículo
    Jun 2014

Histórico

  • Aceito
    07 Abr 2014
  • Revisado
    09 Jan 2014
  • Recebido
    07 Jun 2013
Associação Brasileira de Pesquisadores em Educação Especial - ABPEE Av. Eng. Luiz Edmundo Carrijo Coube, 14-01 Vargem Limpa, CEP: 17033-360 - Bauru, SP, Tel.: 14 - 3402-1366 - Bauru - SP - Brazil
E-mail: revista.rbee@gmail.com