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A Perspectiva da Produção de Cuidado pelos Trabalhadores de Saúde Mental

The Perspective of Care Production by Mental Health Workers

La Perspectiva de la Producción de Cuidado por los Trabajadores de Salud Mental

Resumo

O artigo apresenta uma análise sobre como os trabalhadores em saúde mental pensam sobre as práticas de cuidado e como elas são efetivadas cotidianamente. Este trabalho desenvolveu-se a partir de conversas com os profissionais da área, em que estes e a pesquisadora puderam construir coletivamente a arte de contar histórias sobre os processos de trabalho de suas experiências vivas, e de participação em espaços de discussão. Ao olhar para a história da loucura, observa-se uma mudança nas práticas de cuidado, que, atualmente, caminham por limiares da tutela e da liberdade. O cuidado é construído pelos afetos que perpassam os encontros entre usuários e trabalhadores. Um olhar diferenciado nesta relação permitirá que os processos subjetivos promovam novos modos de existência nos sujeitos. Porém, essa rede de afetações pode se deparar com dificuldades cotidianas, precarizações do trabalho e práticas burocráticas, que podem impedir a potencialização dos afetos entre os protagonistas do cuidado. É possível construir um trabalho vivo diante destes obstáculos e transformar as prescrições para modos flexíveis a partir de posturas ética-estética-políticas. Por isso, é preciso atentar-se para que modos de organização enrijecidos não influenciem a relação trabalhador-usuário de forma que impeça o fluxo das afetações.

Cuidado; Trabalhadores; Saúde Mental; Trabalho

Abstract

The article presents an analysis about how the mental health workers think about the care practices e how they are accomplished daily. This work was developed from conversations with professionals in the area, in which theses e the researcher were able to build collectively the art of storytelling about the work processes of their living experiences, and participation in discussion spaces. When looking at the history of madness, there is a change in care practices, which currently go for the protection and freedom thresholds. the care is built by the affections that underlie the meetings between users and workers. A different look this relationship will allow the subjective processes promote new modes of existence in the subject. But, this affectations network may encounter everyday difficulties, bad working conditions and bureaucratic practices, which can prevent the enhancement of affection between the care protagonists. You can build a living working on these obstacles and transform the requirements for flexible modes from ethical-aesthetic-political positions. Therefore, we must pay attention to that stiff modes of organization don’t influence the relationship worker-user form preventing the flow of affectations.

Care; Workers; Mental Health; Work

Resumen

El artículo presenta un análisis de lo que los trabajadores piensan acerca de las prácticas de cuidado de la salud mental y la forma en que estas se llevan a cabo diariamente. Este trabajo se desarrolló a partir de conversaciones con los profesionales, en las que estos y la investigadora pudieron construir colectivamente el arte de contar historias acerca de los procesos de trabajo de sus experiencias de vida, y de la participación en los espacios de discusión. Al mirar la historia de la locura, hay un cambio en las prácticas de cuidado, que actualmente van por el camino de la protección y la libertad. el cuidado es construido por los afectos que subyacen en las reuniones entre usuarios y trabajadores. Una mirada diferente de esta relación va a permitir que los procesos subjetivos promuevan nuevos modos de existencia en el sujeto. Sin embargo, esta red afectos puede encontrar dificultades cotidianas, trabajo precario y prácticas burocráticas, que pueden impedir el aumento de afecto entre los protagonistas del cuidado. Es posible construir un trabajo vivo trabajando sobre estos obstáculos y transformar los requisitos en modos flexibles de posiciones ético-estético-políticas. Por eso, debemos prestar atención para que esquemas de organización rígidos no influyan en la relación trabajador-usuario impidiendo el flujo de afectos.

Cuidado; Trabajadores; Salud Mental; Trabajo

Uma breve história do cuidado com a loucura

Ao olhar para a história da loucura, principalmente a partir do século XVIII, houve um processo de intensificação da relação médico-louco no modo de lidar com a loucura. Segundo Foucault (1982)Foucault, M. (1982). Microfísica do poder (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Graal., anteriormente a isso não havia a hospitalização da loucura, e, na Idade Clássica, a pessoa com sofrimento mental somente era separada da sociedade em casos de perigo extremo. Não havendo perigo, ela seguia pelo mundo das ilusões. A ocupação dos territórios e o contato com a natureza eram formas de cuidado para lidar com as alucinações. Assim, havia a possibilidade de um cuidado em liberdade a partir da habitação dos espaços e dos processos criativos que se engendravam.

Os lugares reconhecidos como terapêuticos eram primeiramente a natureza, pois que era a forma visível da verdade; tinha nela mesma o poder de dissipar o erro, de fazer sumir as quimeras. As prescrições dadas pelos médicos eram de preferência a viagem, o repouso, o passeio, o retiro, o corte com o mundo vão e artificial da cidade (Foucault, 1982Foucault, M. (1982). Microfísica do poder (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Graal., p. 120-121).

Com o crescimento e o desenvolvimento das cidades, do social, da política e da economia, outros modos de lidar com a loucura foram surgindo, principalmente, através do saber científico, que começou a se afirmar nos corpos dos loucos. Concomitantemente, esse saber passou a se estruturar e a erguer paredes para tratar o doente mental. Em meados do século XVIII, iniciaram-se o reconhecimento e a institucionalização dos hospitais como espaços terapêuticos, de cuidado das doenças e de conhecimento dessas produções de verdades: “o hospital, estrutura de acolhimento da doença, deve ser um espaço de conhecimento ou um lugar de prova” (Foucault, 1982Foucault, M. (1982). Microfísica do poder (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Graal., p. 119).

Segundo Foucault (1982)Foucault, M. (1982). Microfísica do poder (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Graal., para Esquirol1 1 Esquirol (1772–1840) foi um psiquiatra reformador de asilos e hospícios na França. Fundou o primeiro curso para o tratamento das doenças mentais e lutou pela aprovação da primeira Lei de Alienados na França. Seu trabalho influenciou para a criação do Hospício Nacional Dom Pedro II no Brasil, que foi a primeira instituição a lidar com os doentes mentais. Acreditava que o hospital psiquiátrico poderia curar essas enfermidades mentais (Centro Cultural Ministério da Saúde, 2016). , as internações eram justificadas para dar segurança ao louco e aos seus familiares, por afastamento de influências externas que poderiam alterar o processo terapêutico e por garantir que o louco seja submisso ao médico para a aprendizagem de novas condutas morais. Assim, a hospitalização serviria para “dominar o poder do louco, neutralizar os poderes que de fora possam se exercer sobre eles, estabelecer um poder terapêutico e de adestramento” (Foucault, 1982Foucault, M. (1982). Microfísica do poder (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Graal., p. 126).

A princípio, Esquirol acreditava que o contato com a natureza nas instalações hospitalares tinha efeitos terapêuticos no cuidado com a loucura. Já no século XIX, essas práticas terapêuticas dão espaço a outras formas de tratamento que provocaram um sufocamento da loucura, silenciando-a para dentro dos muros dos hospícios e dominando-a para a submissão às condutas morais dos médicos.

Outro lugar terapêutico usual era o teatro, natureza invertida. Apresentava-se ao doente a comédia de sua própria loucura colocando-a em cena, emprestando-lhe um instante de realidade fictícia, fazendo de conta que era verdadeira por meio de cenários e fantasias, mas de forma que, caindo nesta cilada, o engano acabasse por estourar diante dos próprios olhos daquele que era sua vítima. Esta técnica por sua vez também não tinha desaparecido completamente no século XIX. Esquirol, por exemplo, recomendava que se inventassem processos aos melancólicos, para que sua energia e seu gosto pelo combate fossem estimulados (Foucault, 1982Foucault, M. (1982). Microfísica do poder (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Graal., p. 121).

Para além do sofrimento psíquico, a loucura deveria se enquadrar numa conduta regular, normal e moral desta época. Não haveria mais o julgamento perturbado, “mas como desordem na maneira de agir, de querer, de sentir paixões, de tomar decisões e de ser livre. Enfim, em vez de se inscrever no eixo verdade-erro-consciência, se inscreve no eixo paixão-vontade-liberdade” (Foucault, 1982Foucault, M. (1982). Microfísica do poder (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Graal., p. 121).

Dessa forma, cabia ao hospital psiquiátrico essa conversão moral, ou seja, os loucos deveriam se enquadrar nas regras de comportamento da sociedade, sendo essa a única forma de libertação da imoralidade e perversão. Para Foucault (1982)Foucault, M. (1982). Microfísica do poder (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Graal., poderia haver dois caminhos ali: o da dominação ou da resistência. Ou o louco poderia se opor ao anseio do médico e da sociedade (que tentam o converter para um modo de vida moral) e se deleitar às suas paixões pervertidas e aos seus delírios; ou deixar-se conduzir pelos caminhos da salvação, renunciando aos seus próprios desejos e se submetendo a essa conversão.

A dominação do outro retrata produção de verdades, justificadas pelo saber científico, a partir do conhecimento do sujeito-objeto e pela confissão dos seus crimes. Assim, o médico do hospital psiquiátrico é aquele que detém o saber sobre a verdade da doença do louco, submete o outro numa certa realidade pelo poder que ele exerce sobre o paciente. Para isso, esse médico dispunha de técnicas morais e rigorosas. Um cuidado de caráter punitivo. Um cuidado que prende, que domina, que catequiza e que faz do médico o conhecedor e detentor de verdades.

Todas as técnicas ou procedimentos efetuados no asilo do século XIX − isolamento, interrogatório particular ou público, tratamentos-punições como a ducha, pregações morais, encorajamentos ou repreensões, disciplina rigorosa, trabalho obrigatório, recompensa, relações preferenciais entre o médico e alguns de seus doentes, relações de vassalagem, de posse, de domesticidade e às vezes de servidão entre doente e médico − tudo isto tinha por função fazer do personagem do médico o “mestre da loucura”; aquele que a faz se manifestar em sua verdade quando ela se esconde, quando permanece soterrada e silenciosa, e aquele que a domina, a acalma e a absorve depois de a ter sabiamente desencadeado (Foucault, 1982Foucault, M. (1982). Microfísica do poder (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Graal., p. 122).

Essa forma de domesticação passa a ser questionada, colocando em xeque o modo pelo qual essas verdades sobre o outro se constituíram. Logo, o que passa a ser “questionado é a maneira pela qual o poder do médico estava implicado na verdade daquilo que dizia, e inversamente, a maneira pela qual a verdade podia ser fabricada e comprometida pelo seu poder” (Foucault, 1982Foucault, M. (1982). Microfísica do poder (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Graal., p. 124).

No findar do século XIX, esse poder psiquiátrico se deparou com o movimento antipsiquiatria, que queria que o sujeito experimentasse a sua própria loucura, garantindo-lhe esse direito de vivência sem invasão do poder-saber médico. Portanto, a antipsiquiatria

pretende desfazer, dando ao indivíduo a tarefa e o direito de realizar sua loucura levando−a até o fim numa experiência em que os outros podem contribuir, porém jamais em nome de um poder que lhes seria conferido por sua razão ou normalidade; mas sim destacando as condutas, os sofrimentos, os desejos de estatuto médico que lhes tinham sido conferidos, libertando-os de um diagnóstico e de uma sintomatologia que não tinham apenas valor classificatório, mas de decisão e de decreto, invalidando enfim a grande retranscrição da loucura em doença mental, que tinha sido empreendida desde o século XVII e acabada no século XIX (Foucault, 1982Foucault, M. (1982). Microfísica do poder (3a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Graal., p. 127–128).

Rotelli (2001)Rotelli, F. (2001). O inventário das subtrações. In F. Rotelli, O. Leonardis, & D. Mauri (Ed.), Desinstitucionalização (2a ed., pp.61-64). São Paulo, SP: Hucitec. afirma que não há trocas sociais nos manicômios, por ser um lugar de privação e funcionar como um dispositivo de tutela, de relações de dependência e de subtração de trocas, sendo um lugar pobre de meios para que novos modos de existência sejam criados.

Na “evidente pobreza dos meios” estes anos serviram para descobrir estas simples verdades e então lutar contra aquelas relações, contra aquela exclusão de relações sociais, recolocá-las gradualmente em discussão e lutar contra aquela privação que era o seu fundamento instrumental: os escravos dos manicômios, gradualmente “libertos” e reinseridos fora da tutela nas trocas sociais, com dinheiro e as possibilidades materiais de participar do contrato social (Rotelli, 2001Rotelli, F. (2001). O inventário das subtrações. In F. Rotelli, O. Leonardis, & D. Mauri (Ed.), Desinstitucionalização (2a ed., pp.61-64). São Paulo, SP: Hucitec., pp. 61-62).

Para Foucault (2006)Foucault, M. (2006). Ditos e escritos V: ética, sexualidade e política (2a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Forense Universitária., o cuidado deve ser ético e não pode haver abuso de poder sobre o outro. Na relação com a loucura, o cuidado deve permitir práticas de liberdades, desvencilhando-se do modo asilar. Dessa forma, o cuidado vai se construindo a partir das relações que se estabelecem com o outro, na perspectiva de que o louco possa respirar, sentir, inventar, escolher, gozar da sua própria vida. Exercitar esse pensamento libertador exige um desprendimento moral de um saber a priori da vida alheia, e que também não é nada fácil.

O cuidado de si é ético em si mesmo; porém implica relações complexas com os outros, uma vez que esse êthos da liberdade é também uma maneira de cuidar dos outros; [...] Mas acredito que, no pensamento Greco e romano, o cuidado de si não pode em si mesmo tender para esse amor exagerado a si mesmo que viria a negligenciar os outros ou, pior ainda, a abusar do poder que se pode exercer sobre eles (Foucault, 2006Foucault, M. (2006). Ditos e escritos V: ética, sexualidade e política (2a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Forense Universitária., p. 270 e 273).

Com as formas de um cuidado em liberdade (re)surgidas com o movimento da Reforma Psiquiátrica2 2 Segundo Amarante (2008, p. 13), a Reforma Psiquiátrica Brasileira iniciou no final dos anos 1970, com a formação do Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM), que protagonizou discussão sobre o processo de desinstitucionalização e ansiava por uma transformação da assistência psiquiátrica. , há a preocupação de que o modo tutelador se presentifique nos serviços e nas relações de trabalho. Dessa forma, o pensamento crítico e ético sobre o trabalho a ser realizado se torna fundamental para o exercício desse cuidado em liberdade. Ver o outro como protagonista de sua história e, portanto, capaz de tomar decisões na vida e se responsabilizar por elas.

Nossa preocupação é a de que essas idéias manicomiais ainda se façam presentes, algumas vezes, nos novos serviços em saúde mental e se atualizem em práticas/discursos de exacerbada medicalização, de interpretações violentas, de posturas rígidas e despóticas. Pois o manicômio, em lugar de promover trocas e construções de outros modos de existência, produz ainda, submissão, infantilização e culpa. Claro que como uma nova roupagem. O que poderíamos caracterizar como sendo uma forma de controle contínuo no qual o usuário pode ser dissimuladamente tutelado e controlado ao longo dos dias e a cada instante, uma vez louco sempre louco ou portador de doença. Esse poder de gerir a vida do outro, de administrar a vida do outro, se traduz na expropriação da autonomia e da criação (Lavrador, & Machado, 2002Lavrador, M. C. C., & Machado, L. D. (2002). Loucura e subjetividade. In L. D. Machado, M. C. C. Lavrador, & M. E. B. Barros (Org.), Texturas da psicologia: subjetividade e política no contemporâneo (Vol. 1, pp.45-58). São Paulo, SP: Casa do Psicólogo., pp. 46-47).

No entanto, mesmo com o discurso de permitir ao louco que experimente a sua vida, ele continua sendo subjugado – pelo saber científico. De formas sutis ou não, talvez esse saber se configure nas novas tecnologias de cuidado na loucura e nas relações com o louco. Provavelmente, com uma nova roupagem, como afirma Lavrador e Machado (2002)Lavrador, M. C. C., & Machado, L. D. (2002). Loucura e subjetividade. In L. D. Machado, M. C. C. Lavrador, & M. E. B. Barros (Org.), Texturas da psicologia: subjetividade e política no contemporâneo (Vol. 1, pp.45-58). São Paulo, SP: Casa do Psicólogo.. Daí, pode-se pensar: como tem sido a participação deles nos processos de cuidado?

Enfim, entre os vários questionamentos sobre a implicação deste louco na construção do cuidado e no ato de gerir a sua vida, é necessário entender que os processos de dominação, constituídos pelo saber-poder, são passiveis de reversões. Ou seja, a reversibilidade desses processos pode ocorrer nas relações entre profissional-louco, sendo que a pessoa com o transtorno nem sempre estará numa relação de submissão. Dessa forma, a vida ainda pulsa para este sujeito, podendo ser fraca ou forte, e seu poder sobre suas escolhas e seus desejos continua presente, bem como o seu processo criativo sobre a própria vida.

Cartografia como aposta metodológica

A história da loucura aponta para uma grande transformação sobre a relação de práticas de cuidado com a loucura. Percebe-se como foi se constituindo o controle dos corpos, a partir de um saber sobre o outro. A construção da pesquisa sobre a produção de cuidado na atualidade tem como objetivo entender como os trabalhadores em saúde mental pensam sobre esses cuidados e como eles têm sido efetivados cotidianamente.

Numa aposta cartográfica, por considerar as multiplicidades do homem e a vida em constante transformação, essa pesquisa propõe uma escuta ampliada diante das falas desses trabalhadores, num posicionamento ético, estético e político do pesquisador em ação. Ético porque não se trata de um conjunto de regras como um sistema de verdade. Permite-se, assim, escutar as diferenças que passam nas relações que se cruzam na vida. Fala-se de uma afirmação de vida. Estético por causa do processo de criação que se dá a partir desses encontros com as diferenças, com a vida. E político por se tratar de uma luta de forças em nós e que podem obstruir os devires (Rolnik, 1993Rolnik, S. (1993). Pensamento, corpo e devir: uma perspectiva ético/estético/política no trabalho acadêmico. Cadernos de Subjetividade, 1(2), 241-251. Recuperado de http://www4.pucsp.br/nucleodesubjetividade/Textos/SUELY/pensamentocorpodevir.pdf.
http://www4.pucsp.br/nucleodesubjetivida...
).

De acordo com Rolnik (2006Rolnik, S. (2006). Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. Porto Alegre, RS: Sulina., p. 23), “um cartógrafo é antes de tudo um antropófago”, ou seja, um cartógrafo codifica os afetos que atravessam o campo de uma vida. Ele mergulha nas intensidades dos encontros, envolve-se com as pluralidades e é cuidadoso com as linguagens que flutuam, correm, andam, navegam. Quando ele percebe elementos possíveis para a construção das cartografias, apropria-se. “O cartógrafo é um verdadeiro antropófago: vive de expropriar, se apropriar, devorar e desovar, transvalorado. Está sempre buscando elementos/alimentos para compor suas cartografias” (Rolnik, 2006Rolnik, S. (2006). Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. Porto Alegre, RS: Sulina., p. 65).

Ele nunca esquece que há um limite do quanto se suporta, a cada momento, a intimidade com o finito ilimitado, base de seu critério: um limite de tolerância para a desorientação e a reorientação dos afetos, um “limiar de desterritorialização”3 3 Os movimentos de territorialização, desterritorialização e reterritorialização são movimentos que ocorrem na existência. De acordo com Guattari e Rolnik (1986), “a noção de território é entendida aqui num sentido muito amplo, que ultrapassa o uso que dela fazem a etologia e a etnologia. Os seres existentes se organizam segundo territórios que os delimitam e os articulam aos outros existentes e aos fluxos cósmicos. O território pode ser relativo tanto a um espaço vivido, quanto a um sistema percebido no seio do qual um sujeito se sente ‘em casa’. O território é sinônimo de apropriação, de subjetivação fechada sobre si mesma. Ele é o conjunto dos projetos e das representações nos quais vai desembocar, pragmaticamente, toda uma série de comportamentos, de investimentos, nos tempos e nos espaços sociais, culturais, estéticos, cognitivos. O território pode se desterritorializar, isto é, abrir-se, engajar-se em linhas de fuga e ate sair de seu curso e se destruir. A espécie humana está mergulhada num imenso movimento de desterritorialização, no sentido de que seus territórios ‘originais’ se desfazem ininterruptamente com a divisão social do trabalho, com a ação dos deuses universais que ultrapassam os quadros da tribo e da etnia, com os sistemas maquínicos que a levam a atravessar, cada vez mais rapidamente, as estratificações materiais e mentais. A reterritorialização consistirá numa tentativa de recomposição de um território engajado num processo desterritorializante” (Guattari, & Rolnik, 1986, p. 323). . Ele sempre avalia o quanto as defesas que estão sendo usadas servem ou não para proteger a vida.

[…] trata-se, aqui, de avaliar o quanto se suporta, em cada situação, o desencantamento das máscaras que estão nos constituindo, sua perda de sentido, nossa desilusão. O quanto se suporta o desencantamento, de modo a liberar os afetos recém-surgidos para investirem outras matérias de expressão e, com isso, permitir que se criem novas máscaras, novos sentidos (Rolnik, 2006Rolnik, S. (2006). Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. Porto Alegre, RS: Sulina., p. 68).

Desenhando com a cartografia, esse trabalho utilizou como ferramenta metodológica a narrativa. Durante as conversas com os profissionais da saúde mental, a pesquisadora e os trabalhadores puderam construir coletivamente a arte de contar histórias sobre os processos de trabalhos, das experiências vivas de um corpo, sem buscar um relatório com explicações, pois a narrativa “não está interessada em transmitir o ‘puro em si’ da coisa narrada como uma informação ou um relatório. Ela mergulha a coisa na vida do narrador para em seguida retirá-la dele” (Benjamin, 1994Benjamin, W. (1994). O Narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In W. Benjamin (Ed.), Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura (3a ed., Vol. 1, pp. 197-221). São Paulo, SP: Brasiliense., p. 205).

E nessa arte de contar histórias, a construção dela se deu coletivamente, já que ela não se faz individualmente, pois as experiências coletivas e as muitas afetações do ouvinte e do narrador fazem parte desse processo narrativo. E, ao tecer as histórias no âmbito da saúde mental, depara-se com os movimentos de luta, de resistência, de aprisionamentos.

Contar histórias sempre foi a arte de contá-las de novo, e ela se perde quando as histórias não são mais conservadas. Ela se perde porque ninguém mais fia ou tece enquanto ouve a história. Quanto mais o ouvinte se esquece de si mesmo, mais profundamente se grava nele o que é ouvido. Quando o ritmo do trabalho se apodera dele, ele escuta as histórias de tal maneira que adquire espontaneamente o dom de narrá-las. Assim se teceu a rede em que está guardado o dom narrativo. E assim essa rede se desfaz hoje por todos os lados, depois de ter sido tecida, há milênios, em torno das mais antigas formas de trabalho manual (Benjamin, 1994Benjamin, W. (1994). O Narrador: considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In W. Benjamin (Ed.), Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura (3a ed., Vol. 1, pp. 197-221). São Paulo, SP: Brasiliense., p. 205).

Durante a construção dessa pesquisa, houve o desejo de manter o discurso vivo das conversas com os profissionais da área. A aposta desta pesquisa foi poder dar visibilidade aos processos criativos do trabalho em meio às dificuldades e aos desafios. Foi ouvir dessas pessoas seus pensamentos sobre o seu trabalho e criar, juntos, se possível, outras formas de luta cotidiana nele. E, a partir disso, refletir sobre o cuidado e as práticas de saúde que perpassam nas relações de trabalhadores/usuários.

Foram realizadas conversas com nove profissionais da saúde mental da Grande Vitória, ES, e para a análise, identificaram-se as falas como Profissional 1, Profissional 2, ..., Profissional 9 e foram criados nomes fictícios dos usuários citados durantes as conversas para preservar a identificação delas.

A participação em movimentos sociais, como o Núcleo Estadual da Luta Antimanicomial4 4 O Núcleo Estadual da Luta Antimanicomial é uma organização que não consta um respaldo jurídico. Não há uma lei que o institui como um Núcleo, direcionando funções e regras. Não existe uma hierarquia organizacional. No entanto, isso não impede que o Núcleo se posicione aos assuntos referentes à saúde mental e que seja respeitada como tal. Os encontros são mensais, não há um local fixo. Ele é aberto e é formado por trabalhadores, usuários, familiares, gestores, estudantes e outros que têm o desejo de lutar pela liberdade, autonomia e afirmação dos direitos das pessoas com transtorno mental. e o Movimento Cidadão em Defesa dos Direitos Humanos e das Políticas Sociais5 5 O Movimento Cidadão em Defesa dos Direitos Humanos e das Políticas Sociais foi um movimento de resistência criado por trabalhadores, estudantes, usuários, docentes e militantes dos direitos humanos e das políticas sociais, em 2013 no Espírito Santo, que visava promover discussões e enfrentamentos às políticas e práticas higienistas implementadas pelas gestões municipais e estadual deste estado. , também permitiu uma melhor compreensão sobre algumas questões que perpassam nas políticas sociais e que refletem nos processos e práticas de cuidado. Além de contribuir na construção da/na narrativa a partir das trocas nesses espaços em que se encontram trabalhadores, usuários, familiares, estudantes e demais pessoas que se sensibilizam com a temática de saúde mental.

A produção de cuidado pelos trabalhadores da saúde mental

A partir desses encontros com os trabalhadores da saúde mental, tanto nas conversas quanto nos movimentos sociais, ampliou-se a escuta para compreender sobre o que é o cuidado para eles e qual o sentido disso no trabalho cotidiano deles. Sabendo que essa arte do cuidado pode atravessar caminhos cujos limiares são sensíveis à liberdade ou à tutela, esses profissionais falaram sobre as afetações, histórias que compõem o seu entendimento sobre lidar com o outro e que permitiram a construção dessa pesquisa.

Há uma preocupação com relação ao modo de cuidado, para que este não seja pautado na doença ou no diagnóstico. Ao diminuir o sujeito nisso, pode-se interromper um processo de subjetivação para novos modos de existência na vida e nos espaços que ele ocupa. E esses modos de existência ultrapassam os moldes de cura que muitos desejam impor no cuidado à loucura. E isso é questionado pelo Profissional 2.

[...] Nesse sentido, a gente não cura, não conserta o defeito. Tem um mito na sociedade muito grande de que conserta esse defeito igual você quebra um braço. Você engessa e, daí a pouco, [es]tá consertado. Quando a gente fala de psiquismo, de, sei lá, de saúde mental, a gente [es]tá falando de um campo muito aberto, que não comporta unicamente esse defeito orgânico. Não é uma questão de neurotransmissor, é regular a dopamina do sujeito, a noradrenalina, a serotonina. Você [es]tá falando da vida dele, então, enfim, é muito mais ampla a questão e não sei como passar isso pra sociedade ou até que ponto a sociedade pode ouvir isso ou qual o papel da psiquiatria nisso, na mídia, enfim... de tentar incluir a questão da loucura unicamente na questão de doença, de psiquiatria, de organicidade e não de modos de vida... Que a gente vê muito louco solto por aí. Muito louco vivendo por aí numa boa, que ninguém pensa em interná-los, por que que alguns caem nessa rede de internar?

[...] vai sair da internação, vamos dizer, trocou a peça, recauchutou, sei lá. Quando você corrigir, [...] ele vai sair normal, vai acabar a doença dele. Acho que tem um mito, assim, de alguma maneira, a gente não consegue ampliar que a questão da loucura não é unicamente um distúrbio biológico, orgânico que você corrige com hospital, com remédio... (Profissional 2).

A loucura não é um defeito que precisa ser consertado. Olhar para a pessoa com o transtorno como algo defeituoso impede a nossa percepção dele como um sujeito que ocupa territórios, como um ser social. Ele não é somente saúde. Há uma rede de desejos e afetações que o constituem como um ser. Uma produção desejante que constrói e que desconstrói formas de ocupar territórios e, assim, vai modificando e criando outras possibilidades, pois, de acordo com Deleuze e Guattari (2010Deleuze, G., & Guattari, F. (2010). O anti-édipo. São Paulo, SP: Editora 34., p. 386), esse desejo que não tem pessoa ou coisas como objeto, mas possuem meios inteiros que ele percorre, vibrações e fluxos de qualquer natureza que ele esposa e introduz cortes, capturas, desejo sempre nômade e migrante. E o cuidado em saúde mental também se constrói entre as relações de afetos.

Para Franco e Merhy (2013Franco, T. B., & Merhy, E. E. (2013). O reconhecimento de uma produção subjetiva do cuidado. In T. B. Franco & E. E. Merhy (Ed.), Trabalho, produção do cuidado e subjetividade em saúde (Vol. 1, pp. 151-171). São Paulo, SP: Hucitec., p. 165), “o cuidado em ato é dado mais pelos afetos que circundam os encontros entre trabalhadores e usuários”. Por isso, os trabalhadores desta pesquisa relatam a importância de um olhar diferenciado e de igual para igual, que faz toda a diferença nessa relação. Um olhar que, algumas vezes, é muito difícil para os trabalhadores, mesmo para aqueles que apresentam uma formação específica – para trabalhar em saúde mental é preciso ter desejo. Porém, às vezes, nos surpreendemos com o que os encontros em saúde mental podem nos proporcionar. Quando esse olhar desejoso e essas atitudes espontâneas surgem de profissionais sem formação ou prática nessa área e permitem um bom encontro, aguçando o afeto e se sensibilizando com o outro, a potência de vida pode inundar essa relação terapêutica. Como afirmam os Profissionais 7 e 3:

[...] é permanente, porque, assim, existe um fio condutor nesse cuidado que ele passa na afetividade, mas ele passa também pela verdade. De você... para poder vencer uma limitação, você tem que assumir essa limitação. Então, passa também por uma divisão de corresponsabilidade. Então, eu quero te ajudar, mas eu preciso que você me ajude a te ajudar. Reconhecendo que você tem esse e esse limite, mas também tem essas e mais essas possibilidades. Nessa mescla de coisas é que a gente vai caminhar. Então, quer dizer, é preciso ter um vínculo afetivo, precisa ter confiabilidade, precisa contar nesse planejamento com as recaídas que são muitas. [...] Então, assim, é uma vivência que ela é construída junto e passo a passo. Eu falo que ela é lenta, gradual, contínua, tem retrocessos, mas, ai, quando você consegue chamar atenção desse paciente do ato, assim, tirar ele desse papel de ser cuidado, mas trazer ele para um papel onde ele também é o cuidador. Nossa, é fantástico (Profissional 7).

A gente conheceu uma fisioterapeuta que trabalhava em outra área e começou a pedir umas ajudas. Ela entrou antes de ter aberto o centro de especialidades. Então, ela ficou na área técnica e ela [es]tava ajudando um monte de gente. E onde ela colou, que a gente adorou e ela adorou, foi na saúde mental. Ela dava apoio nas residências terapêuticas, mas, assim, ela conteve crise, ela pegou paciente fugindo da residência correndo na rua, sem nunca ter estudado, pensado... depois que ela veio falar: “Ah, você vai ficar chateada...” [disse a Fisioterapeuta]. “Aconteceu alguma coisa, o que que foi?” [disse a Profissional 3]. “Não sei quem fugiu, eu fui lá, no meio da rua, aí eu dei um abraço, e fui conversando, levando ele pra casa...” [disse a Fisioterapeuta]. Eu falei: “Chateada, porque?”. Aí foi ela e o cuidador, psicólogos e outros profissionais, foram ver, teve que chamar ambulância, não sei o que, porque o cara [es]ta em crise. Então, acho que tem essa questão de não ter formação, mas não é só isso, a disposição, a possibilidade de abertura... a possibilidade de conhecer, de se abrir, e de enxergar um sujeito, e não um louco, cheio de sintomas. Isso pode ter em qualquer um, e a gente teve... e os artistas tinham... A gente teve artista e professor de educação física. Que também depois [a educadora física] falou: “gente, eu morria de medo, eu não sabia nada, tinha prepotência e eu fui me surpreendendo, me surpreendendo, e foi ótimo... Fantástico...” (Profissional 3).

No entanto, esse cuidado pode tomar rumos distintos, que, às vezes, se misturam ou não, e que podem ou não até mesmo nos confundir quanto ao que se construirá nos processos de subjetividade do usuário. Por isso, a importância de refletir sobre as práticas de cuidado compostas pelos trabalhadores de saúde mental e questionar até que ponto elas se pautam na autonomia dos sujeitos ou na tutela e na infantilização das pessoas com transtorno mental. Ou seja: o que está sendo construído? Quais são os objetivos?

As ações de tutela pelo trabalhador em saúde mental com o portador de transtorno pode se dar tanto de forma consciente como de forma inconsciente. O Profissional 1 diz que, em certos momentos, o trabalhador passa a mão da cabeça de um usuário sem se dar conta do que a sua ação pode estar (re)produzindo para o outro. E o Profissional 2 acrescenta que, por isso, é importante uma formação teórica para não dar ouvidos aos instintos maternais de proteção excessiva à pessoa com transtorno mental, que “entravam de um modo muito pessoal na coisa e isso até virava uma espécie de fetiche, de bibelô de alguém” (Profissional 2). Para os profissionais, o louco deve ser liberto, solto dessa forma de cuidado que perpassa na tutela, considerando que o aprisionamento atrapalha o sujeito no seu processo de transformação, criação subjetiva.

A gente tem, também, profissionais, que embarcam como mãe. Aí fica no lado mal da mãe também, que espera em troca muita coisa, que tutela, que é uma pedagogia por bom comportamento, e tal. Então eu temo, quando a gente tem muita gente sem o desejo de estar no [serviço], por mais que ela tenha boa vontade. Se acabou a vontade materna, que não é boa, que é tutelar, que aí não tem autonomia, aí você pode ter gente estabilizada e sem autonomia, é melhor ter alguém como [Maria6 6 Maria é um nome fictício dado a uma usuária de um serviço de saúde mental. ]. A estabilização tem crises, tem afrontações pra cá e pra lá, mas é o jeito dela viver e ela consegue viver e dar conta das coisas... eu acho que tem se produzido autonomia sim, espero que continue, e acredito até que continua assim, né (Profissional 3).

É importante refletir que o ato de gerir a vida do outro é carregado de valores morais que impedem a construção, a formação do conhecimento (Deleuze, 2002Deleuze, G. (2002). Espinosa: filosofia e prática. São Paulo, SP: Escuta.) e, a ação de tutela impossibilita o outro de construir novas formas de existência. Os valores morais são pautados num certo modo de vida, naquilo em que se julga certo ou errado, mas não, necessariamente, é acolhido por todos de tal maneira. Dessa forma, é preciso pensar num cuidado também que se remete a não se apropriar dos desejos e das vontades alheias e, simplesmente, afirmar ao outro um modo de viver duro e padronizado.

O problema é privá-los, a priori, de bens materiais e simbólicos, humanos incorporadamente humanos, sejam eles quais forem. Já foram destituídos, pelo modelo hospitalocêntrico, de tantas coisas, principalmente da experimentação cotidiana da potência singular de cada ser vivo, no caso de uma vida ‘humana’ própria. Agora tentam juntar os cacos para criarem para si uma nova vida, calcada nessa experiência singular que potencializa o agir. O problema é não permitir que façam uso das regras facultativas, que não possam selecionar o que desejam e o que não desejam mais, que não possam experimentar, que não possam afirmar hábitos próprios e mudar de hábitos, sejam eles quais forem. Muitas vezes, moraliza-se tudo, pedagogiza-se tudo em nome dos supostos ‘bons hábitos’, desvalorizando a própria vida (Lavrador, 2006Lavrador, M. C. C. (2006). Loucura e vida na contemporaneidade (Tese de doutorado). Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, ES., p.178).

Na saúde mental, há muitas pessoas com um longo histórico de internação e que foram privadas de fatores mínimos, como a higiene pessoal. O ato de comer com as mãos, na correria e num instinto de proteger a sua comida, fazer necessidades fisiológicas no chão, por exemplo, foram e continuam sendo realidades em muitos manicômios. Com o passar do tempo, esse paciente vai perdendo esses costumes de cuidado com o seu próprio corpo, com a sua vaidade e com o espaço que habita.

Ao sair desses espaços manicomiais, a pessoa com transtorno mental se deparará com um mundo em que a sociedade rejeita certos tipos de comportamento, como fazer as suas necessidades fisiológicas no chão, andar sem vestimenta. E daí, ele precisará reaprender alguns comportamentos e regras para manter um bom convívio com a sociedade, com a comunidade em que ele vive.

O Profissional 9 fala sobre esse trabalho de (re)educação e de “pedagogia para o bom comportamento”. Ela faz uma comparação do seu trabalho como uma educação infantil e diz o seguinte:

O negócio é ensinar. Igual criança. Uma criança, você vai ensinando e, aos poucos, eles vão pegando. E assim é eles. Então, eu não acho que é tanta dificuldade não. Arrumar a cama mal-arrumada. Vai lá e arruma mal-arrumada. Eu não gosto de arrumar por eles. [...] Depois que eles viram as costas, eu vou e dou mais uma ajeitada. Mas não para eles verem. Porque eles fazerem, e eu vou lá e faço novamente, ele vai falar: “Então, eu não vou fazer de novo”. Porque a gente tem que entender que eles não são tão assim... Eles têm um pouquinho de noção (Profissional 9).

Durante a conversa, esse profissional relembra vários casos do seu trabalho experienciados diariamente. Das situações mais simples às mais complexas, ela tenta disparar neles, ao seu estilo, um cuidado tanto pessoal quanto nos espaços de vivência. Um profissional simples e sem formação na área de saúde mental vive na pele o que é cuidar de um familiar com transtorno mental. Ele encontra na sua própria história modos de lidar com as pessoas com transtorno mental e atribui à preguiça o fato deles não quererem realizar uma orientação dada por ela.

Tem uns que faz. Você fala: “faz tal coisa. Comeu, lava o seu prato. Vai lá e lava”. Agora, tem aqueles que não fazem por nada. O [João]7 7 João é um nome fictício dado a um usuário do serviço em saúde mental. , acho que tem 30 anos, 39 anos, ele não lava o copo que ele bebe água, mas ele é preguiça. Não é problema não, é preguiça. Porque ele gosta da melhor fruta. Ele gosta da melhor roupa. Viu, ele gosta das coisas boas. Então, por ele não lavar o prato e não lavar o copo, não é pelo problema, é preguiça. Eu falo com ele que ele é cheio de preguicite. Os outros fazem. O seu [Marcos]8 8 Marcos é um nome fictício dado a um usuário do serviço em saúde mental. não deixa de lavar um prato. Mas ai você: “Não, não... Passa a bucha” [fala a Profissional 9]. AÍ você fica ensinando ele. Mesmo que não faça cem por cento. Lavou o prato, deixou o prato limpo. É isso aÍ, parabéns, tá bom. Quando ele vira as costas, eu vou lá e lavo novamente. O seu [Ricardo]9 9 Marcos é um nome fictício dado a um usuário do serviço em saúde mental. , ele já acaba de comer, vai lá, lava o prato dele, colher e copo, [...] não passa uma bucha ou um sabão, mas já foi lá e lavou. Aí, vou lá e lavo de novo. Agora, eu falo com o seu [Ricardo]:“Quando ele for lavar o prato, você passa o sabão e bucha. Você pega e passa. Tá bom?”. “Tá bom” [fala Ricardo]. O [José]10 10 José é um nome fictício dado a um usuário do serviço em saúde mental. também. Tomou o café, lava o seu copo. Comeu, lava o seu prato. Agora, tem dia que nem nada e nem santo que faça fazer. Mas não é complicado, não é impossível, você ensinar (Profissional 9).

A questão que precisa ser olhada com cautela não é somente o ato do ensino em si, mas como se dá esse processo, o que é ensinado para os usuários e para qual finalidade, para que este ensino não impeça os processos inventivos do outro e nem que seja um modo de tutela.

No entanto, o ato de ensinar, o encontro com o outro deve respeitar a livre produção subjetiva da realidade social, com o rompimento ou não do lugar de origem em que o outro está inserido, através dos tensionamentos contínuos e sucessivos dos processos de mudança. E esses processos se dão pelos movimentos de desterritorialização, reterritorialização e territorialização dos espaços existenciais. Para Franco e Merhy (2013Franco, T. B., & Merhy, E. E. (2013). O reconhecimento de uma produção subjetiva do cuidado. In T. B. Franco & E. E. Merhy (Ed.), Trabalho, produção do cuidado e subjetividade em saúde (Vol. 1, pp. 151-171). São Paulo, SP: Hucitec., p. 161),

Esse processo é intenso, dinâmico e tensionado por sucessivos e contínuos processos de mudança. A produção subjetiva da realidade social se dá através de movimentos de desterritorialização e territorialização dos próprios sujeitos que produzem o cotidiano, o funcionamento social. E nesse processo, os sujeitos operam em intensidades diferentes para cada movimento, podendo desterritorializar, o que significa romper com o lugar de origem e podem portanto adotar novos territórios existenciais, ética e politicamente identificados com a produção de uma nova realidade social; por outro lado, podem não reterritorializar, retornando ao lugar de origem e assim não produzir mudanças sociais, eternizando um status conservador de funcionamento social. A desterritorialização pode se dar por “coeficientes” diferentes, respeitando uma certa gradação de sentidos para as rupturas a serem realizadas.

É importante salientar que nesses processos de (des)territorialização, num trabalho com saúde mental, devem haver espaços de liberdade que permitam essas movimentações. Franco (2013a)Franco, T. B. (2013a). O trabalhador de saúde como potência: ensaio sobre a gestão do trabalho. In T. B. Franco, & E. E. Merhy (Ed.), Trabalho, produção do cuidado e subjetividade em saúde (Vol. 1, pp. 243-251). São Paulo, SP: Hucitec. faz um questionamento, que talvez seja pertinente, sobre a liberdade do trabalhador nos processos de trabalho, que se encontra com as estruturas prescritivas do modo de organização dos trabalhos, pois “a gestão tem as suas normas, portarias, regras, protocolos, que definem o comportamento a ser adotado pelos trabalhadores, formas de padronizar seu trabalho, isto não lhe tira a liberdade?” (Franco, 2013aFranco, T. B. (2013a). O trabalhador de saúde como potência: ensaio sobre a gestão do trabalho. In T. B. Franco, & E. E. Merhy (Ed.), Trabalho, produção do cuidado e subjetividade em saúde (Vol. 1, pp. 243-251). São Paulo, SP: Hucitec., p. 244-245). Para ele, a liberdade do trabalhador é fundamental para a produção de cuidado no seu trabalho e no encontro dele com o usuário. Esta liberdade “lhe dá a condição de produzir o cuidado da forma como lhe convém, ou seja, no momento do seu encontro com o usuário ele decide sobre o processo de trabalho, agenciado pelos afetos do próprio encontro” (Franco, 2013aFranco, T. B. (2013a). O trabalhador de saúde como potência: ensaio sobre a gestão do trabalho. In T. B. Franco, & E. E. Merhy (Ed.), Trabalho, produção do cuidado e subjetividade em saúde (Vol. 1, pp. 243-251). São Paulo, SP: Hucitec., p. 244).

Nos serviços de saúde mental, o trabalho tem perpassado tanto pelas práticas duras dos protocolos, como pela liberdade do cuidado. Assim, se o trabalhador for livre como proposto por Franco (2013aFranco, T. B. (2013a). O trabalhador de saúde como potência: ensaio sobre a gestão do trabalho. In T. B. Franco, & E. E. Merhy (Ed.), Trabalho, produção do cuidado e subjetividade em saúde (Vol. 1, pp. 243-251). São Paulo, SP: Hucitec.), como não ser capturado por essas formas duras e permitir um encontro afetuoso com o usuário? É importante se atentar que

Estas regras, normas e protocolos são instrumentos usados para padronizar, mas que ao mesmo tempo capturam o trabalho vivo, ou seja, retiram a liberdade do trabalhador e aprisionam seus atos assistenciais e de cuidado em um padrão previamente concebido (Franco, 2013aFranco, T. B. (2013a). O trabalhador de saúde como potência: ensaio sobre a gestão do trabalho. In T. B. Franco, & E. E. Merhy (Ed.), Trabalho, produção do cuidado e subjetividade em saúde (Vol. 1, pp. 243-251). São Paulo, SP: Hucitec., p. 245).

Então, a partir do contato que o trabalhador constrói com o seu trabalho e com o outro, ele poderá transformar as prescrições para modos flexíveis de um trabalho potente, vivo e não capturado, que se dará numa postura ética-estética-política. E se atentar para que os modos de organização enrijecidos não influenciem a relação trabalhador-usuário de forma que impeça o fluxo das afetações.

Em certos momentos, esse trabalho enrijecido que se dá no cuidado com o outro na saúde mental pode acontecer por duas questões que precisam ser pensadas: o acesso universal dos serviços em saúde mental e o cuidado que está sendo construído com a precarização dos serviços.

Estas duas questões não estão dissociadas uma da outra e, por isso, se entrelaçam na relação serviço-trabalhador-usuário dos processos de cuidado. O acesso universal à saúde é um princípio fundamental do Sistema Único de Saúde (SUS). No entanto, hoje, é uma realidade brasileira ainda o não acesso imediato do usuário, quando ele necessita. Há longas filas de espera durante a procura de vaga nos serviços de saúde, o que não é diferente na saúde mental, ferindo com a lógica principal desse sistema público e constitucional. Franco e Merhy (2013Franco, T. B., & Merhy, E. E. (2013). O reconhecimento de uma produção subjetiva do cuidado. In T. B. Franco & E. E. Merhy (Ed.), Trabalho, produção do cuidado e subjetividade em saúde (Vol. 1, pp. 151-171). São Paulo, SP: Hucitec., p. 165) relatam que

[...] os serviços ainda convivem com grandes esperas, filas e na maioria dos serviços dispositivos racionadores como a triagem, senhas para procedimentos, etc... Observa-se ainda processos de trabalho partilhados, embora haja um discurso do trabalho em equipe; saberes técnicos pretensamente onipotentes, mas pouco eficazes na satisfação das necessidades dos usuários; relações hierárquicas na equipe de saúde; enfim, as contradições revelam fortes estranhamentos nas redes de atenção à saúde.

Ao fazer esse recorte dentro da saúde mental, esses fortes estranhamentos também se dão nessa rede de atenção. E, com isso, refletimos sobre qual é o cuidado que está sendo construído com essa precarização dos serviços. Há momentos em que o trabalho se pauta somente no medicamento, pois não há vagas para o usuário participar de outras possibilidades, sejam elas terapêuticas ou não. Depois, ao entrar num outro espaço, há o trabalho de desconstrução com o usuário a respeito de sua dependência com a medicação: dizer que não será somente esse método que irá disparar nele outros modos existenciais e afirmar que outras alternativas podem ter efeitos mais significativos para ele. Tudo isso após um longo tempo de espera por, primeiro, uma consulta médica, e, posteriormente, por outros dispositivos de cuidado no serviço de saúde mental. Assim, essa forma de organização traz muitas inquietações aos trabalhadores e a nós sobre as (re)produções no processo terapêutico e de cuidado com o outro. Como permitir uma postura ética-política no acolhimento ao usuário? Como serão as afetações entre trabalhador-usuário e como isso afetará as produções de cuidado? Como não sustentar o processo criativo de um trabalho vivo e a liberdade de agir? Como explica o Profissional 6 sobre o seu trabalho:

Acho que o programa tem que ser... Na verdade, o objetivo do programa é ser porta aberta. Se a porta está aberta, ele tem que atender. E ele não pode escolher o que ele atende. Ele tem que atender tudo. Na verdade, ele te que ser... o atendimento tem que ser oportuno, tem que ser na hora que a pessoa precisa. Como que uma pessoa vai chegar... se ela está procurando um serviço de saúde, é porque ela realmente está precisando. Como que os usuários vão estar daqui a dois meses? Que cuidado é esse? O atendimento, ele deveria ser: “tudo bem, eu não tenho tempo para te atender, eu não posso te atender agora, fazer aquele atendimento, aquela anamnese, mas vem cá vamos conversar um pouquinho. Deixa eu tentar entender o que está acontecendo, que de repente, eu não tenho condições de fazer a sua anamnese agora, mas, sei lá, eu vou conhecer um pouquinho da sua história e saber o que você está demandando, eu consigo te agendar para amanhã” [fala da Profissional 6]. Não vai ser hoje, mas vai ser amanhã, não vai ser daqui a dois meses. Isso a gente não consegue fazer. Não. [...] Mas a gente não consegue dar conta de todos. Principalmente, os casos que estão nos grupos. Tem muito paciente que deveria estar no grupo e não está. E aí, querendo ou não, o paciente que está no grupo, ele fica mais próximo da equipe. Você conhece aquele paciente, você sabe toda a história de vida dele. Você acaba conhecendo melhor. O paciente chega e você que vê ele está meio tristinho, você já pergunta o que é, já conversa, já tem mesmo uma intimidade com aquele paciente. Só que assim, os pacientes que estão mais próximos da equipe são poucos. E, aí, a gente prega tanto aquela coisa que não é só o remédio, não é só a consulta médica. Mas, tá, eu não tenho vaga no grupo, eu não tenho para onde encaminhar, eu vou fazer o quê? Você vai encaminhar para o médico. Já que ela está reclamando que ela não consegue dormir, que não sei o que, mas eu sei que ela não consegue dormir, porque ela está com problemas... hum, sei lá, no trabalho, com o marido, com o filho. Mas eu não tenho como colocá-la no grupo. Eu não tenho como colocá-la no atendimento individual. E, ai, ela vai continuar sem dormir? Não. Então, vou encaminhá-la para o médico, porque para o médico tem vaga e por incrível que pareça. Entendeu?! E, aí, assim, a gente vai pregando uma coisa e vai fazendo outra. E, depois, quando surge a vaga no grupo, eu vou chegar com cara para essa paciente: olha só, hoje você não precisa mais desse remédio. A partir de hoje, vamos para a terapia de grupo? Entendeu?! É mais ou menos... como pelo menos assim, não posso falar pela equipe, mas como eu estou me sentindo hoje dentro do programa (Profissional 6).

Das formas mais duras às mais flexíveis do trabalho, o cuidado vai se constituindo nos encontros da relação trabalhador-usuário e verifica-se que esse tensionamento – normativo e liberdade – provoca rupturas e criações importantes no trabalho vivo. Pois, para Franco (2013aFranco, T. B. (2013a). O trabalhador de saúde como potência: ensaio sobre a gestão do trabalho. In T. B. Franco, & E. E. Merhy (Ed.), Trabalho, produção do cuidado e subjetividade em saúde (Vol. 1, pp. 243-251). São Paulo, SP: Hucitec., p. 245),

Convive-se o tempo todo com esta tensão o que resulta em processos de trabalho às vezes mais criativos, livres, que operam por fluxos entre os próprios trabalhadores e usuários, e com formas mais rígidas de controle dos mesmos. Os fazeres, as práticas de cuidado, vão se assumindo assim configurações diferentes em espaços e tempos distintos.

Uma outra questão que perpassa e afeta o processo de cuidado pelo trabalhador de saúde mental e que, muitas vezes, é trazido por eles é o fator de risco em lidar com a loucura. Mas que risco é esse? Como lidar com isso?

Talvez a pessoa com transtorno mental seja perigosa, pois o seu processo delirante se expande de tal forma que não se encaixa num molde rígido de vida. E isso faz com que alguns tenham medo. Sair das estruturas fechadas em que vivemos e ouvir o delírio do outro não é fácil. Manejar com essas produções delirantes não é simples. E se dificulta mais ainda quando lidamos com a precarização dos serviços.

Apesar dos relatos de agressão aos trabalhadores de saúde mental pelos usuários, e não minimizando essas ações, a violência ao profissional é uma situação que é vivenciada em vários ambientes de trabalho, não somente na saúde mental. No entanto, ela é diferenciada em serviços de saúde mental, pois falamos de pessoas que carregam em si o estigma de serem perigosas. Há na nossa cultura uma ideologia bastante presente de que as pessoas com transtorno mental são perigosas e, por isso, necessitam de isolamento. Além disso, nós não temos controle sobre o desenvolvimento da “crise em si” do outro. Ou seja, não podemos mensurar como será a reação da pessoa em seu momento de crise, mas podemos trabalhar de forma que não haja culpabilização dos atos do usuário durante esse processo, até mesmo porque nem todo processo de crise apresenta atitudes violentas.

O manejo da crise pelos trabalhadores de saúde mental deve levar em consideração as individualidades e o processo subjetivo do outro. Segundo Ferigato, Campos e Ballarin (2007Ferigato, S. H., Campos, R. T. O., & Ballarin, M. L. G. S. (2007). O atendimento à crise em saúde mental: ampliando conceitos. Revista de Psicologia da UNESP, 6(1), 31-44., p. 38),

valorizar o sujeito em crise implica levar em consideração sua condição de ser humano, e não apenas de doente e também não apenas como sujeito em crise; significa respeitar seu tempo, sua individualidade e singularidade, que nem sempre vão de encontro com a expectativa da equipe.

Sem uma fórmula de como lidar com a crise, os trabalhadores (re)inventam a cada momento o seu trabalho devido à multiplicidade do ser humano. A relação afetuosa entre trabalhador-usuário é muito importante durante esse momento para a construção de outras possibilidades nas intervenções. Faz parte desse contato o ato de respeitar esse momento de crise da pessoa com transtorno mental e saber ouvir os delírios que estão sendo produzidos intensamente. Durante esse encontro, em muitas vezes, o trabalhador amplia a sua sensibilidade para compreender e analisar esse cenário que ali se constrói, e toma decisões importantes para sua ação. Porém, deve ficar claro que lidar com a crise não é fácil e exige do profissional uma postura ética e de cuidado. O cuidado precisa ser singular, como diz o Profissional 5.

Cuidar. Então, aqui... não é aqui. Se você fala assim, o que é cuidado no setor da saúde, as pessoas vão pensar que é tratar. Tipo você tem técnicas e tem algumas coisas que podem te ajudar, então, o cuidar é você ir tratando, aplicando linhas técnicas que podem te... é mais fácil para pensar. Mas eu acho que vai muito além disso. Como se cuidado exige olhar para o outro de verdade. Tanto que para cuidar tem que ter um encontro. Tem que acontecer esse encontro de alguém que precise de cuidado, seja lá qual for, e uma outra pessoa que está disposta, aberta a cuidar. E aí, vê essas, não sei, vê muito essas necessidades desse outro, que é esse outro. Eu penso que o cuidado, ele não é meramente técnico e não é um protocolo. Eu penso mesmo que o cuidado é muito singular, se não vira uma rotina. Então, eu penso que é diferente. Na rotina, numa instituição de saúde, que não necessariamente significa um cuidado em saúde. Então, é mesmo olhar essa pessoa que precisa de ajuda de uma forma muito única e se abrir e estar disposto a ajudar, seja com normas técnicas, seja com a sua boa vontade, seja com a sua escuta, seja com a sua companhia, seja com o seu silêncio. Acho que tudo isso é uma forma de cuidado (Profissional 5).

De certa forma, a Reforma Psiquiátrica propôs os dispositivos em saúde mental para lidar com a desconstrução da figura da pessoa com transtorno mental como um agente criminoso. Assim como noutros ambientes de trabalho, a agressão é um ato possível, independentemente de ser um espaço de saúde mental. Essa é uma preocupação que precisa ser colocada sempre em análise nos espaços de discussão e de formação, para que a criminalização da pessoa com transtorno mental não retorne a ser o foco da saúde mental, mas sim o acolhimento, o cuidado, a atenção e afetividade que se estabelecem com o outro.

Ao mesmo tempo, todas as angústias e os medos dos trabalhadores precisam ser ouvidos e acolhidos de modo que não haja pessoalizações e/ou culpabilizações desses tensionamentos presentes nos trabalhos e sentidas por eles. Também não é fácil para o trabalhador lidar com a loucura, que por séculos foi considerada algo perigoso. Hoje, mais intensamente a partir de 1970, se discute uma possibilidade de cuidado em liberdade. Esse processo de desconstrução da figura da pessoa com transtorno mental perigoso é gradual e romper com os ideais imaginários não é fácil. Talvez uma forma de acolher essa angústia do trabalhador seja por meio da formação, mas que não seja ela o único espaço para isso. A educação é importante, pois contribui para transformações dos processos de subjetivação e para a autoanálise dos trabalhadores. Para Franco (2013bFranco, T. B. (2013a). O trabalhador de saúde como potência: ensaio sobre a gestão do trabalho. In T. B. Franco, & E. E. Merhy (Ed.), Trabalho, produção do cuidado e subjetividade em saúde (Vol. 1, pp. 243-251). São Paulo, SP: Hucitec., p. 187),

Ao mencionarmos que é possível a educação operar no mundo das relações de ensino/aprendizagem como dispositivo, sugerimos que a ação pedagógica dispare processos de subjetivação, associados aos de cognição. A aposta que se faz é a de que os processos educacionais possam contribuir na produção de sujeitos, entendidos como coletivos com capacidade de intervir na realidade com o objetivo de transformá-la.

Além dos tensionamentos vivenciados junto à pessoa com o sofrimento mental, há, em algumas situações, também os tensionamentos na equipe de trabalho, principalmente quando há uma grande exposição do trabalhador num caso. A equipe precisa ser um suporte para os trabalhadores nas intervenções, pois tratar com a loucura, por ser um movimento intenso de rupturas com a realidade, pode provocar tensões entre trabalhador-usuários e entre trabalhador-trabalhador.

essa equipe que faz a saúde mental sem ter formação teórica pode adoecer com essa exposição. Eu acho que precisa de uma formação teórica, e na minha época a primeira coisa que se falava era: “vai fazer análise!”. Antes de você atender um paciente você vai fazer análise. Isso nos anos 70, hoje em dia, não está muito em moda o assunto, mas eu acho que, você precisa ter um suporte e um cuidado de si pra você cuidar do outro desse modo arriscado que pelo menos o psicótico exige (Profissional 2).

Entendendo a necessidade de acolher o trabalhador e dar voz às angústias produzidas no trabalho cotidiano, o Profissional 7 se sensibilizou para realizar uma intervenção com as enfermeiras, porque a enfermagem lida diretamente com a medicação, as injeções e a dor, sem contar com as correrias dos outros trabalhos, como plantões em hospitais, provocando um estresse muito grande no enfermeiro.

Com certeza, esse é um momento que foi criado para que elas possam se cuidar e está sendo muito gratificante. [As enfermeiras] estão superentusiasmada com isso, porque, assim, é um outro público-alvo, mas que também traz questões e, assim, a dor vai endurecendo o profissional de saúde. E ai então, já tenho trabalhado com elas a linguagem do desenho, da pintura, da expressão corporal. E também, estão, assim, radiantes porque estão descobrindo em si também outras possibilidades. Não só para fazer o objeto, mas a possibilidade de poder falar de si, escutar e ser escutada. Isso é bastante interessante, porque provoquei sem querer uma comoção geral entre elas. E aí uma delas falou assim: “Nossa, quanto tempo que eu não sei o que é chorar, como que chorar faz bem”. Então, as pessoas vão ficando embrutecida. [...] Lógico que tem outras possibilidades, outros recursos que são igualmente maravilhosos, mas eu estou falando daquilo que eu tenho domínio. E, assim, eu fico muito encantada. Cada vez para mim, é um trabalho novo, é uma nova possibilidade que se configura ali. E, assim, quando você toca a alma de uma pessoa, isso vai gerar um multiplicador. Então, não é só cuidar de quem cuida, mas é cuidar de quem cuida para essa pessoa continue cuidando melhor do outro. E se ele vai ser sensibilizado para isso, lógico que isso vai se desdobrar de uma maneira melhor (Profissional 7).

No trabalho cotidiano nos serviços de saúde mental podemos perceber ramificações do cuidado. O cuidado se amplia, se espalha, se movimenta. Ele não é unilateral, em que somente a pessoa com transtorno mental tem acesso. A construção do cuidado se constrói na relação de afeto dos encontros e é recíproco. Imaginemos uma rede de cuidado, em que cada nó representa um agente de cuidado. O agente de cuidado é composto por trabalhador, usuário, gestor, familiar, serviço, equipe e, assim, outras sucessivas multiplicações de outros agentes. O fluxo de cuidado transita por todos os nós em vários sentidos, pois não há uma direção única de produção de cuidado.

É um cuidado que tem que ser muito amplo, porque se fica um cuidado só de um neste serviço aqui, não comporta. Aí a pessoa não é cuidada. Então o cuidado é só meu, a intervenção é só minha. Você só é “cuidado” entre aspas no momento que eu sou, então o espaço é o dá para esse cuidar. Então, nesse serviço, o cuidar [da equipe que] ainda faz é multi. Multi não, sei lá, acho que é transdisciplinar. E todo mundo muito, aí seria tão lindo, todo mundo com a mesma visão de cuidado, com a mesma abertura para o cuidado, seria tudo perfeito. Mas é por aí. Para mim, o cuidado é isso. Voz, abertura, singularidade (Profissional 5).

Então, assim como há uma preocupação de se fortalecer essa rede de cuidado com o usuário, ela também deve ser fortalecida para o cuidador, a fim de que ele possa continuar esse movimento de produção de cuidado. E isso ativa na rede de cuidado outros atores para contribuir nessa relação, ou seja, convoca outros sujeitos para dar suporte nesse cuidado, para que ele não seja individual e sim uma construção coletiva. Os profissionais trazem a ideia de suporte, para um suportar o outro, não só nas discussões nos espaços coletivos do serviço, mas também um suporte que fala de acolhimento do trabalhador.

E essa ideia de acolher o outro trabalhador não necessariamente é para corroborar com as práticas de cuidado que ele apresenta com o usuário, mas para se tentar produzir nele outros modos de fazer o trabalho. Isso nos faz pensar que a relação de cuidado entre a equipe também se passa por certa confiabilidade e aposta nos trabalhos do outro.

Além dessas questões trazidas até o momento, o cuidado ao cuidador também se passa na relação gestão e trabalhador. A precarização do trabalho e a desvalorização profissional também podem causar o adoecimento do trabalhador e da equipe. Segundo Franco (2013aFranco, T. B. (2013a). O trabalhador de saúde como potência: ensaio sobre a gestão do trabalho. In T. B. Franco, & E. E. Merhy (Ed.), Trabalho, produção do cuidado e subjetividade em saúde (Vol. 1, pp. 243-251). São Paulo, SP: Hucitec.), para haver a produção de cuidado, os trabalhadores precisam ter bons encontros nas relações de trabalho e, às vezes, a própria gestão provoca encontros tristes que despotencializam essa possibilidade. Para ele,

Ao conduzir um tipo de gestão que não produza as condições ideais de trabalho, segurança, conforto, perspectiva de futuro, opera na sua relação com os trabalhadores produzindo tristeza, e esta tem sido a marca da gestão do trabalho na saúde, quando não prioriza o que são questões fundamentais para o cuidado do cuidador, produção de bons encontros. Estes poderiam estar vinculados com a ideia concreta de carreira profissional, remuneração suficiente para o bem-estar, Educação Permanente que possibilite análise e autoanálise do trabalho e da vida no SUS, trabalho multiprofissional e em redes, formas de participação colegiada, liberdade na condução do seu processo de trabalho e no cuidado em saúde, linhas ativas de liberdade e utopia ativa (Franco, 2013Franco, T. B., & Merhy, E. E. (2013). O reconhecimento de uma produção subjetiva do cuidado. In T. B. Franco & E. E. Merhy (Ed.), Trabalho, produção do cuidado e subjetividade em saúde (Vol. 1, pp. 151-171). São Paulo, SP: Hucitec., p. 249).

Sendo assim, a equipe pode ser um agente de cuidado do cuidador em saúde mental. Enfrentamentos coletivos são importantes nos espaços de trabalho para produzir outros modos de lidar com o usuário e com o próprio trabalhador, que, muitas vezes, se sente adoecido pelos processos de trabalho. Além disso, as ações coletivas da equipe também podem promover rupturas de uma organização de adoecimento da gestão, podendo produzir bons encontros nas relações de trabalho entre trabalhador-usuário e trabalhador-trabalhador.

Considerações finais

O processo de desinstitucionalização ainda enfrenta grandes embates para afirmar o cuidado em liberdade como uma forma de tratamento e de respeito à dignidade e aos direitos sociais e humanos dos usuários na saúde mental. Podemos citar como desafios as práticas em liberdade dos profissionais da saúde mental, que exigem certo exercício ético-político, um comprometimento com a política social de saúde, a afirmação dos direitos dos usuários que são negligenciados e condições de trabalho que perpassam o cotidiano dos trabalhadores.

Apesar de a Reforma Psiquiátrica propor o cuidado em liberdade, a produção de autonomia e processos criativos, a política pública construída nessas afirmações corre o risco de se tornar institucionalizada devido às práticas de tutela. O cuidado perpassa num limiar bastante tênue entre a liberdade e a tutela, e isso pode provocar tensionamentos no trabalho sobre o que é cuidar e como produzir o cuidado.

O trabalho criativo é muito importante para os processos de trabalho potentes cotidianos, principalmente nos momentos de crises da pessoa com transtorno mental. Este cuidado em liberdade se constrói nas relações afetivas trabalhadores-usuários. Para isso, é preciso (re)pensar sempre nas posturas e nas apostas profissionais com o comprometimento ético-político.

Uma questão que precisa ser tratada são as condições de trabalho que afetam essa produção de cuidado e a relação trabalhador-usuário, tendo em vista que o trabalhador, muitas vezes, não consegue lidar com o sucateamento do trabalho e demonstra certa despotencialização aos processos criativos.

Mesmo com pedras no caminho, muitos profissionais encontram possibilidades para fazer a diferença nessas situações difíceis. Encontram nos passeios, nos artesanatos, nos grupos nas ocupações dos territórios, formas de produzir cuidado libertário e, diante disso, muitas vezes, o trabalhador consegue fazer outro movimento: aquele que promove vida, que potencializa. Mas isso não é fácil e não há um modelo de ações e de práticas.

No entanto, é importante salientar a necessidade de também produzir cuidado para quem cuida, poder ouvir as angústias, os receios e as tensões destes trabalhadores, acolhê-los nas redes de afetos e de serviços e produzir subjetividades afirmativas.

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  • 1
    Esquirol (1772–1840) foi um psiquiatra reformador de asilos e hospícios na França. Fundou o primeiro curso para o tratamento das doenças mentais e lutou pela aprovação da primeira Lei de Alienados na França. Seu trabalho influenciou para a criação do Hospício Nacional Dom Pedro II no Brasil, que foi a primeira instituição a lidar com os doentes mentais. Acreditava que o hospital psiquiátrico poderia curar essas enfermidades mentais (Centro Cultural Ministério da Saúde, 2016Centro Cultural Ministério da Saúde.(2016). Memória da loucura: influências: Esquirol (1772-1840). Rio de Janeiro: o Autor. Recuperado de http://www.ccs.saude.gov.br/memoria%20da%20loucura/mostra/esquirol.html
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    ).
  • 2
    Segundo Amarante (2008Amarante, P. (2008). O homem e a serpente: outras histórias para a loucura e a psiquiatria. Rio de Janeiro, RJ: Editora Fiocruz., p. 13), a Reforma Psiquiátrica Brasileira iniciou no final dos anos 1970, com a formação do Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM), que protagonizou discussão sobre o processo de desinstitucionalização e ansiava por uma transformação da assistência psiquiátrica.
  • 3
    Os movimentos de territorialização, desterritorialização e reterritorialização são movimentos que ocorrem na existência. De acordo com Guattari e Rolnik (1986)Guattari, F., & Rolnik, S. (1986). Micropolítica: cartografia do desejo. Rio de Janeiro, RJ: Vozes., “a noção de território é entendida aqui num sentido muito amplo, que ultrapassa o uso que dela fazem a etologia e a etnologia. Os seres existentes se organizam segundo territórios que os delimitam e os articulam aos outros existentes e aos fluxos cósmicos. O território pode ser relativo tanto a um espaço vivido, quanto a um sistema percebido no seio do qual um sujeito se sente ‘em casa’. O território é sinônimo de apropriação, de subjetivação fechada sobre si mesma. Ele é o conjunto dos projetos e das representações nos quais vai desembocar, pragmaticamente, toda uma série de comportamentos, de investimentos, nos tempos e nos espaços sociais, culturais, estéticos, cognitivos. O território pode se desterritorializar, isto é, abrir-se, engajar-se em linhas de fuga e ate sair de seu curso e se destruir. A espécie humana está mergulhada num imenso movimento de desterritorialização, no sentido de que seus territórios ‘originais’ se desfazem ininterruptamente com a divisão social do trabalho, com a ação dos deuses universais que ultrapassam os quadros da tribo e da etnia, com os sistemas maquínicos que a levam a atravessar, cada vez mais rapidamente, as estratificações materiais e mentais. A reterritorialização consistirá numa tentativa de recomposição de um território engajado num processo desterritorializante” (Guattari, & Rolnik, 1986Guattari, F., & Rolnik, S. (1986). Micropolítica: cartografia do desejo. Rio de Janeiro, RJ: Vozes., p. 323).
  • 4
    O Núcleo Estadual da Luta Antimanicomial é uma organização que não consta um respaldo jurídico. Não há uma lei que o institui como um Núcleo, direcionando funções e regras. Não existe uma hierarquia organizacional. No entanto, isso não impede que o Núcleo se posicione aos assuntos referentes à saúde mental e que seja respeitada como tal. Os encontros são mensais, não há um local fixo. Ele é aberto e é formado por trabalhadores, usuários, familiares, gestores, estudantes e outros que têm o desejo de lutar pela liberdade, autonomia e afirmação dos direitos das pessoas com transtorno mental.
  • 5
    O Movimento Cidadão em Defesa dos Direitos Humanos e das Políticas Sociais foi um movimento de resistência criado por trabalhadores, estudantes, usuários, docentes e militantes dos direitos humanos e das políticas sociais, em 2013 no Espírito Santo, que visava promover discussões e enfrentamentos às políticas e práticas higienistas implementadas pelas gestões municipais e estadual deste estado.
  • 6
    Maria é um nome fictício dado a uma usuária de um serviço de saúde mental.
  • 7
    João é um nome fictício dado a um usuário do serviço em saúde mental.
  • 8
    Marcos é um nome fictício dado a um usuário do serviço em saúde mental.
  • 9
    Marcos é um nome fictício dado a um usuário do serviço em saúde mental.
  • 10
    José é um nome fictício dado a um usuário do serviço em saúde mental.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2017

Histórico

  • Recebido
    06 Fev 2015
  • Revisado
    16 Fev 2017
  • Aceito
    14 Mar 2017
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