Acessibilidade / Reportar erro

Conhecimento e Avaliação dos Trade-offs de Custos Logísticos: um Estudo com Profissionais Brasileiros1 * Artigo apresentado no XXXVII Encontro da Anpad (EnANPAD), Rio de Janeiro, Brasil, 2013 e 37th Annual Congress of the European Accounting Association, Tallinn, Estônia, 2014.

Resumos

O equilíbrio entre os custos incorridos e o serviço oferecido ao cliente depende da identificação e da exploração dos trade-offs de custos logísticos. Nesse sentido, o presente estudo teve o objetivo de identificar a extensão em que os profissionais logísticos brasileiros conhecem e avaliam os trade-offs de custos. Para tanto, um questionário, definido com base no arcabouço teórico, foi aplicado a uma amostra de 73 profissionais de companhias comerciais e industriais constantes na relação das maiores empresas da Revista Exame Melhores e Maiores. A indicação da confiabilidade do questionário foi dada pelo Alfa de Cronbach (90, 8%). Os dados coletados foram submetidos à análise quantitativa que abrangeu a estatística descritiva e a realização do teste estatístico não paramétrico de Mann-Whitney.Os resultados demonstraram que a maioria dos profissionais logísticos sabe que os trade-offs existem, mas não possui amplo entendimento do conceito, especialmente da sua relação com o custo total. O conhecimento de que a logística impacta o desempenho econômico-financeiro, por sua vez, apareceu como difundido para a maior parte da amostra, sendo mais expressivo entre os profissionais experientes.Os resultados também revelaram que a avaliação dos trade-offs é enfatizada em desenhos e redesenhos da rede e dos processos logísticos, mas ainda é limitada na formulação de projetos específicos. A não utilização de simuladores de custo e a indisponibilidade de informações adequadas de custo apareceram como fatores relacionados à restrita avaliação dos trade-offs. Esses achados são importantes para demonstrar que a Controladoria pode ajudar a Logística a reverter a situação de não avaliação dos trade-offs para buscar otimizar o resultado econômico.

Logística; Custo total; Custos logísticos; Trade-offs de custos logísticos


The balance between costs incurred and the service provided to the customer depends on the identification and exploitation of logistics cost trade-offs. In this sense, the goal of the present study was to identify the extent to which Brazilian logistics professionals understand and assess cost trade-offs. To this end, a questionnaire based on the theoretical framework was administered to a sample of 73 professionals at commercial and industrial companies that were included on the list of the largest Brazilian enterprises in the 'Melhores and Maiores' (Best and Biggest) edition of Exame Magazine. The questionnaire's reliability was ascertained using Cronbach's Alpha (90.8%), and the data thus gathered were quantitatively analyzed through descriptive statistics and the non-parametric Mann-Whitney test. The results showed that most logistics professionals know that there are trade-offs but lack a broad understanding of the concept, especially with respect to the relationship between trade-offs and total cost. Nonetheless, the knowledge that logistics have an impact on economic-financial performance appeared to be widespread for most of the sample, particularly among experienced professionals. The results also revealed that although trade-off assessments are emphasized when designing and redesigning logistics processes and networks, these assessments are still limited in regard to the formulation of specific projects. The non-use of cost simulators and lack of adequate cost information were identified as factors related to the limited assessment of trade-offs. These findings are important because they demonstrate that a company's controllership can help logistics professionals to reverse this situation of non-assessment of trade-offs and to strive for the optimization of economic results.

Logistics; Total Cost; Logistics Costs; Logistics cost trade-offs


1 INTRODUÇÃO

Um produto com boa concepção, com ótima embalagem e com ampla promoção não tem valor se não estiver disponível quando for desejado pelo cliente (LaLonde, 1993LaLonde, B. J. (1993) Integrated distribution systems: a management perspective. International Journal of Physical Distribution & Logistics Management, 23(5), 04-12.). Destaca-se, portanto, a relevância da logística, que é a principal responsável para que o produto certo esteja no lugar certo, no tempo certo, na quantidade certa, nas condições certas, a um preço certo e com as informações certas (Mentzer, Flint, & Hult, 2001Mentzer, J. T., Flint, D. J., & Hult, T. M. (2001). Logistics service quality as a segment-customized process. Journal of Marketing, 65(4), 82-104.).

A logística, após ser estritamente associada ao meio militar, começou a se estender ao meio empresarial somente na segunda metade do século passado. Sua propagação ao ambiente corporativo foi marcada pela fragmentação de diversas atividades por várias áreas organizacionais, o que conduziu à existência de objetivos colidentes e à apresentação de altos custos (Ballou, 2007Ballou, R.H. (2007). The evolution and future of logistics and supply chain management. European Business Review, 19(4), 332-348.).

A fragmentação logística também realçou que o custo total ótimo só poderia ser alcançado com a integração da área e com a avaliação dos trade-offs pelos profissionais logísticos (Lambert & Armitage, 1979Lambert, D. M., & Armitage, H. M. (1979). Distribution costs: the challenge: the key to managing the physical distribution function is total cost analysis, rather than haphazard stabs at cutting specific costs. Management Accounting (pre-1986), 60(11), 33-45.; Christopher, 1997Christopher, M. (1997). Logística e gerenciamento da cadeia de suprimentos: estratégia para a redução de custos e melhoria dos serviços. São Paulo: Pioneira.).Diante desse contexto, este estudo objetivou: (1) investigar a extensão em que os profissionais logísticos conhecem os trade-offs; e (2) identificar se os profissionais avaliam os trade-offs ao desenharem e implantarem soluções.

Destarte, chega-se às duas questões que nortearam esta pesquisa: "Em que extensão os profissionais logísticos conhecem os trade-offs de custos logísticos?" e "Os profissionais logísticos avaliam os trade-offs de custos logísticos?". As respostas a esses dois questionamentos foram obtidas com a adoção de uma abordagem empírico-analítica que envolveu a aplicação de um questionário a 73 profissionais logísticos das maiores empresas industriais e comerciais do Brasil, segundo a Revista Exame Melhores e Maiores do ano base de 2010. A análise dos dados ocorreu quantitativamente mediante estatística descritiva e testes de hipóteses.

Há estudos nacionais e internacionais (i.e., Lambert & Armitage, 1979Lambert, D. M., & Armitage, H. M. (1979). Distribution costs: the challenge: the key to managing the physical distribution function is total cost analysis, rather than haphazard stabs at cutting specific costs. Management Accounting (pre-1986), 60(11), 33-45.; Christopher, 1997Christopher, M. (1997). Logística e gerenciamento da cadeia de suprimentos: estratégia para a redução de custos e melhoria dos serviços. São Paulo: Pioneira.; Bio, Robles, & Faria, 2002Bio, S. R., Robles, L. T., & Faria, A. C. (2002). Em busca da vantagem competitiva: trade-offs de custos logísticos em cadeias de suprimentos Revista de Contabilidade CRC-SP, 6(19), 5-18.; Faria, 2003Faria, A. C. (2003). Custos logísticos:uma abordagem na adequação das informações de controladoria à gestão da logística empresarial. Tese de doutorado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, São Paulo, SP, Brasil.; Fellous, 2009Fellous, S. M. (2009). Gestão da cadeia de suprimentos no Brasil e a utilização de instrumentos da contabilidade gerencial: uma avaliação sob a perspectiva dos profissionais envolvidos. Dissertação de mestrado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, São Paulo, SP, Brasil.) que admitem a existência dos trade-offs e discutem a necessidade da sua avaliação. Contudo, esses estudos, que possuem um escopo ampliado de exploração dos custos logísticos, acabam tratando os trade-offs como tema acessório, não como foco da investigação. Dessa forma, o preenchimento de detalhes acerca dos trade-offs pode completar lacunas na literatura e oferecer contribuições tanto à teoria quanto à prática.

A principal contribuição que este artigo oferece à teoria fundamenta-se na constituição de uma forma estruturada para mensurar o conhecimento e a avaliação dos trade-offs. Essa estruturação fomenta a redução de inconsistências, melhora a comparabilidade entre estudos e favorece o estabelecimento de críticas para o tema.

Do ponto de vista prático, destaca-se a interdisciplinaridade que este artigo promove ao integrar a logística à contabilidade. Este estudo contribui com a logística ao evidenciar que a análise dos trade-offs é necessária para que seja encontrado o equilíbrio entre os recursos consumidos e os serviços oferecidos (Busher & Tyndall, 1987Busher, J. R., & Tyndall, G. R. (1987). Logistics excellence. Management Accounting, 69(2), 32-39.). Esta pesquisa também contribui com a contabilidade ao demonstrar que a avaliação dos trade-offs é elementar para que seja otimizado o custo total e, assim, seja melhorado o resultado econômico global da organização.

2 PLATAFORMA TEÓRICA E DESENVOLVIMENTO DAS HIPÓTESES

Embora evidências da logística existam, pelo menos, desde o período da construção das pirâmides, havia, até 1950, ampla associação do seu contexto à aquisição, à manutenção e ao transporte militar.

Uma expansão limitada da logística para o meio empresarial apenas começou a ocorrera partir da segunda metade do século passado. Indícios logo demonstraram (entre 1960 e 1970) que os resultados dessa logística empresarial, até então fragmentada, não eram bons: existiam acentuados conflitos interdepartamentais, os custos eram altos e o nível de serviço oferecido ao cliente era baixo (Ballou, 2007Ballou, R.H. (2007). The evolution and future of logistics and supply chain management. European Business Review, 19(4), 332-348.). Esses indícios também evidenciaram que uma mudança seria necessária e propulsionaram o surgimento da logística integrada (Lambert & Armitage, 1979Lambert, D. M., & Armitage, H. M. (1979). Distribution costs: the challenge: the key to managing the physical distribution function is total cost analysis, rather than haphazard stabs at cutting specific costs. Management Accounting (pre-1986), 60(11), 33-45.).

A logística integrada visou estabelecer uma situação que não fomentasse conflitos entre as áreas e que favorecesse tanto o atendimento aos clientes quanto a geração dos lucros.Para tanto, sabendo que a satisfação dos clientes dependia do nível de serviço ofertado e que a geração de lucros dependia do custo total incorrido no oferecimento do serviço, a logística integrada buscou oferecer soluções que atendessem à equação nível de serviço ótimo e custo total mínimo (Faria & Costa, 2005Faria, A. C., & Costa, M. F. G. (2005). Gestão de custos logísticos. São Paulo: Atlas.).

O nível de serviço ao cliente representa uma medida de produtividade na criação das utilidades de tempo e de lugar (Lambert & Lewis, 1983)Lambert, D. M., & Lewis, C. M. (1983). Managing customer service to build market share and increase profit. Business Quarterly, 48(3), 50-57. e, em conjunto com o custo total, constitui um dos pilares da logística integrada. Cada nível de serviço, por originar diferentes receitas e diferentes custos, determina os lucros.

Se nenhum serviço é ofertado, incorre-se em baixos custos, mas não se criam as utilidades de tempo e de lugar e não se concretizam as vendas. À medida que se amplia o nível de serviço, aumentam-se os custos, mas se criam as utilidades de tempo e de lugar e estimulam-se as vendas. Diante dessa situação, Sabath (1978)Sabath, R. E. (1978). How much service do customers really want?, Business Horizons 21(2), 26-32. defende que o ótimo nível de serviço é aquele que retém os clientes ao menor custo total possível.

O conceito do custo total foi trazido em 1956, quando Lewis, Culliton, e Steele (1956)Lewis, H. T., Culliton, J. W., & Steele, J. D. (1956). The role of air freight in physical distribution. Boston: Division of Research, Graduate School of Business Administration, Harvard University. evidenciaram que as decisões logísticas não deveriam ser consideradas isoladamente devido aos inter-relacionamentos de custos das atividades. Os autores enfatizaram o exemplo que o transporte aéreo poderia substituir o transporte aquáticos e a maior velocidade e a maior confiabilidade dos aviões fizessem com que o incremento no custo do transporte fosse compensado pelos custos menores de manutenção de inventários, de armazenagem e de embalagem.

Posteriormente, a importância do conceito foi expandida com a sustentação de que todas as soluções logísticas deveriam objetivar a otimização do custo total, não a redução dos custos individuais (Christopher, 1994Christopher, M. (1994). Integrating logistics strategy in the corporate financial plan. In J. F. Roberson & W. C. Copacino (Eds.). The logistics handbook. New York: The Free Press.). Isso porque nenhum custo pode ser modificado sem afetar os outros custos e/ou o serviço ao cliente (Gopal & Cypress, 1993Gopal, C., & Cypress, H. (1993). Integrated distribution management: competing on customer service, time, and cost. Homewood: Irwin.).

A centralização das instalações, por exemplo, auxilia na redução dos custos de armazenagem, mas dificulta e torna morosos o planejamento, a coordenação e a execução de um alto nível de serviço. Um maior número de instalações, por sua vez, amplia a cobertura de mercado e o nível de serviço, mas, simultaneamente, aumenta alguns custos logísticos (de inventário e armazenagem, por exemplo) e reduz outros custos (transporte, por exemplo). Além disso, uma rede com várias instalações distantes dos clientes consegue oferecer o mesmo nível de serviço que uma rede com várias instalações próximas, desde que implante uma estratégia de transportes que reduza o tempo de resposta, mas, para isso, incorra em maiores custos. Esses fatos ocorrem porque na formulação das soluções há uma reação dos componentes logísticos para cada plano de ação considerado(Napolitano, 1997Napolitano, M. (1997). Distribution network modeling. Industrial Engineer, 29(6), 20-24.), conforme exemplifica a Tabela 1:

Tabela 1
Exemplos de ações e reações nas soluções logísticas

A análise das possíveis reações para cada ação proposta é necessária para que seja identificada qual solução proporciona o nível de serviço ótimo e o custo total mínimo. Ela implica na identificação das substituições de um elemento de custo por outro elemento de custo, ou seja, dos trade-offs de custos logísticos (Bio et al., 2002Bio, S. R., Robles, L. T., & Faria, A. C. (2002). Em busca da vantagem competitiva: trade-offs de custos logísticos em cadeias de suprimentos Revista de Contabilidade CRC-SP, 6(19), 5-18.).

Os trade-offs referem-se às trocas compensatórias entre o aumento em algum custo logístico e a diminuição em outro custo logístico e/ou o aumento no nível de serviço ao cliente. Por exemplo, a decisão de deixar de utilizar embalagens não à prova d'água para usar embalagens à prova d'água provoca a ampliação no custo de embalagem, mas induz à redução no custo de transporte, pois viabiliza a seleção de modais descobertos.

Embora Lewis et al.(1956)Lewis, H. T., Culliton, J. W., & Steele, J. D. (1956). The role of air freight in physical distribution. Boston: Division of Research, Graduate School of Business Administration, Harvard University.tenham proposto tacitamente a ideia dos trade-offs, Lambert e Armitage (1979)Lambert, D. M., & Armitage, H. M. (1979). Distribution costs: the challenge: the key to managing the physical distribution function is total cost analysis, rather than haphazard stabs at cutting specific costs. Management Accounting (pre-1986), 60(11), 33-45. foram aqueles que fundamentaram o conceito e que evidenciaram a necessidade da sua avaliação que, de modo geral, implica na identificação e na mensuração das possíveis reações dos componentes logísticos às ações propostas.Como o controle dos recursos consumidos em decorrência do nível de serviço oferecido ao cliente é responsabilidade dos profissionais logísticos (Busher & Tyndall, 1987)Busher, J. R., & Tyndall, G. R. (1987). Logistics excellence. Management Accounting, 69(2), 32-39., desponta a eles a necessidade de conhecer e de avaliar os trade-offs.

Considerando que a experiência influencia diretamente o conhecimento e a habilidade dos executivos (Myers, Griffith, Daugherty, & Lusch, 2004)Myers, M. B., Griffith, D. A., Daugherty, P. J., & Lusch, R. F. (2004). Maximizing the human capital equation in logistics: education, experience, and skills., Journal of Business Logistics 25(1), 211-32. e que um profissional logístico experiente é capaz de visualizar imediatamente os problemas da área e de reagir pronta e agressivamente para suas resoluções (Slone, Mentzer, & Dittmann, 2007)Slone, R. E. , Mentzer, J. T., & Dittmann, J. P. (2007). Are you the weakest link in your company's supply chain? Harvard Business Review, 85(9), 116-127., elabora-se a hipótese H1: o conhecimento dos trade-offs de custos logísticos está positivamente associado à experiência dos profissionais logísticos.

A educação formal também favorece a identificação de problemas e a eliminação de parte dos erros e dos retrabalhos porque amplia a base de sabedoria dos profissionais. Dessa forma, com base na defesa de Myers, Griffith, Daugherty, e Lusch (2004)Myers, M. B., Griffith, D. A., Daugherty, P. J., & Lusch, R. F. (2004). Maximizing the human capital equation in logistics: education, experience, and skills., Journal of Business Logistics 25(1), 211-32. de que o aprendizado formal é uma das principais bases de astúcia do profissional logístico, propõe-se a hipóteseH2:o conhecimento dos trade-offs de custos logísticos está positivamente associado à educação formal dos profissionais logísticos.

Segundo van Hoek, Chatham, e Wilding (2002)Van Hoek, R. I., Chatham, C., & Wilding, R. (2002). Managers in supply chain management, the critical dimension. Supply Chain Management, 7(3), 119-125. e Hult, Ketchen Jr., Cavusgil, e Calantone (2006)Hult, G. T. M., Ketchen Jr., D. J., Cavusgil, S. T., & Calantone, R. J. (2006). Knowledge as a strategic resource in supply chains. Journal of Operations Management, 24(5), 458-475., a sabedoria apenas é relevante se for convertida em verdadeiro entendimento e aplicada na resolução de problemas e na tomada de decisões. Diante dessa constatação, ressalta-se que possuir o conhecimento per si dos trade-offs não é suficiente: é preciso empregá-lo na análise das inúmeras possibilidades de formulação das soluções.

A complexidade que permeia a formulação das soluções logísticas pede ferramentas que favoreçam o processamento dos dados (LeKashman & Stolle, 1965LeKashman, R., & Stolle, J. F. (1965). The total cost approach to distribution. Business Horizons, 8(1), 33-46.). Nesse sentido, considerando que o uso de sistemas de informação e de tecnologia computadorizada provê o potencial de identificar rápida e precisamente oportunidades de otimização de custos (Gustin, Daugherty, & Stank, 1995Gustin, C. A., Daugherty, P.J., & Stank, T. P. (1995). The effects of information availability on logistics integration. Journal of Business Logistics, 16 (1), 1-21.), constrói-se a hipóteseH3: a avaliação dos trade-offs de custos logísticos está positivamente associada à utilização de simuladores de custo.

A disponibilidade de informações adequadas de custo também desponta como requisito à avaliação dos trade-offs. Isso ocorre porque o cálculo dos trade-offs e a análise do custo total dependem de segregação e evidenciação detalhadas dos custos logísticos (Bio et al., 2002Bio, S. R., Robles, L. T., & Faria, A. C. (2002). Em busca da vantagem competitiva: trade-offs de custos logísticos em cadeias de suprimentos Revista de Contabilidade CRC-SP, 6(19), 5-18.; Fornaciari, Pereira, & Zanquetto Filho, 2003Fornaciari, G., Pereira, M. M. A. M., & Zanquetto Filho, H. (2003). A necessidade de segregação e evidenciação dos custos logísticos nos relatórios contábeis. Anais do Congreso Internacional de Costos, Punta del Este, Uruguai, 8.; Waller & Fawcett, 2012Waller, M .A., & Fawcett, S. E. (2012). The total cost concept of logistics: one of many fundamental logistics concepts begging for answers., Journal of Business Logistics 33(1), 1-3.). Sob esse prisma, formula-se a hipóteseH4:a avaliação dos trade-offs de custos logísticos está positivamente associada à adequabilidade das informações contábeis.

Em suma, esta seção apresentou a fundamentação teórica que defende que a otimização do custo total logístico depende da análise dos trade-offs e que esta, por sua vez, depende do conhecimento aplicado dos profissionais logísticos. Na próxima seção, expõe-se o caminho percorrido para converter a teoria apresentada em proposições observáveis, que permitam identificar a extensão do conhecimento e da avaliação dos trade-offs e operacionalizem o teste das quatro hipóteses propostas.

3 DESENHO DA PESQUISA E ASPECTOS METODOLÓGICOS

Esta pesquisa caracteriza-se tanto como descritiva quanto como exploratória. Descritiva porque buscou identificar e expor as extensões do conhecimento e da avaliação dos trade-offs; exploratória porque procurou descobrir fatores associados a essas extensões. A abordagem adotada foi a empírico-analítica de caráter quantitativo na qual 73 empresas comerciais e industriais brasileiras foram investigadas mediante um levantamento que envolveu a aplicação de um questionário.

O desenho da pesquisa é apresentado nesta seção, que evidencia os seguintes elementos: constructos e definições operacionais das variáveis;instrumento de pesquisa;população e amostra; e estruturação da análise dos resultados.

3.1 Constructos e Definições Operacionais das Variáveis.

Constructos são criados para que a realidade possa ser examinada mediante proposições particulares, observáveis e mensuráveis embasadas em um marco teórico(Martins & Theóphilo, 2009Martins, G., & Theóphilo, C. R. (2009). Metodologia da investigação científica para ciências sociais aplicadas. (2 ed.). São Paulo: Atlas.). Nesta pesquisa, constructos foram elaborados para investigar as extensões de conhecimento e de avaliação dos trade-offs e para, adicionalmente, identificar possíveis fatores a elas associadas.

3.1.1 Conhecimento dos trade-offs de custos logísticos.

As variáveis relacionadas ao constructo do conhecimento dos trade-offs de custos logísticos foram estabelecidas com base na constatação de Myers et al. (2004)Myers, M. B., Griffith, D. A., Daugherty, P. J., & Lusch, R. F. (2004). Maximizing the human capital equation in logistics: education, experience, and skills., Journal of Business Logistics 25(1), 211-32. ,que o conhecimento racional estimula a visualização holística dos problemas e melhora o processo decisório.Com base no estudo de Lambert e Armitage (1979)Lambert, D. M., & Armitage, H. M. (1979). Distribution costs: the challenge: the key to managing the physical distribution function is total cost analysis, rather than haphazard stabs at cutting specific costs. Management Accounting (pre-1986), 60(11), 33-45., constata-se que o conhecimento racional dos trade-offs refere-se à ciência da:

  • (1) Existência dos trade-offs - Conhecimento de que os custos logísticos têm comportamentos desiguais e que o aumento no custo de uma atividade logística pode ser compensado pelo aumento nas receitas (decorrente da ampliação do nível de serviço) ou pela redução no custo de outra atividade logística, e vice-versa; e

  • (2) Relação dos trade-offs com o custo total-Conhecimento de que, para atingir o custo total ótimo, não se deve recorrer a técnicas normais de corte, já que a eliminação individual de um custo pode conduzir ao surgimento ou ao aumento de outros custos (2a). Em suma, é o conhecimento de que a formação do custo total é determinada pelos trade-offs (2b).

Posteriormente, autores (i.e., Christopher & Ryals, 1999Christopher, M., & Ryals, L. (1999). Supply chain strategy: its impact on shareholder value. The International Journal of Logistics Management, 10(1), 1-10.; Presutti & Mawhinney, 2007)Presutti, W. D., & Mawhinney, J. R. (2007). The supply chain-finance link. Supply Chain Management Review, 11(6), 32-38. acrescentaram que não basta ter ciência dos impactos da logística no custo total e advertiram sobre a necessidade de se ter conhecimento dos:

  • (3) Impactos econômico-financeiros - Conhecimento de que as formulações das soluções logísticas e, consequentemente, os trade-offs interferem em inúmeras dimensões econômico-financeiras. É evidente, por exemplo, o impacto das deliberações logísticas nos custos, nas receitas e na eficiência da utilização do capital fixo e do capital de giro.

O acesso às três variáveis ocorreu com quatro questões obrigatórias. Essas questões adotaram a escala Likert, que é uma escala na qual o respondente mostra o quanto concorda ou discorda da afirmação apresentada (Martins & Theóphilo, 2009Martins, G., & Theóphilo, C. R. (2009). Metodologia da investigação científica para ciências sociais aplicadas. (2 ed.). São Paulo: Atlas.). A concordância ou a discordância às afirmações poderia estar em um dentre cinco pontos da escala, cujos extremos eram relacionados ao baixo e ao alto nível de conhecimento.

A escolha pela escala Likert de cinco pontos visou oferecer aos respondentes a possibilidade de seleção de uma posição intermediária (relativa a um nível de conhecimento moderado, ou seja, nem fraco nem forte).Cumpre ressaltar que Weijters, Cabooter, e Schillewaert (2010)Weijters, B., Cabooter, E., & Schillewaert, N. (2010). The effect of rating scale format on response styles: the number of response categories and response category labels. International Journal of Research in Marketing, 27(3), 236-247. não recomendam o uso de escalas sem um ponto intermediário, pois consideram que estas deixam respondentes com posturas neutras em uma situação desconfortável por se sentirem obrigados a escolherem uma posição polar que não representa sua verdadeira percepção.

A Tabela 2 evidencia as quatro questões, detalha os extremos da escala Likerte sumariza as principais obras que subsidiaram a definição das variáveis:

Tabela 2
Variáveis do conhecimento dos trade-offs de custos logísticos

3.1.2 Avaliação dos trade-offs de custos logísticos.

As variáveis relacionadas à avaliação dos trade-offs de custos logísticos foram definidas com base na percepção de que a análise dos trade-offs realizada de fato nas empresas pode ser incompleta e abranger apenas o exame de algumas fases, abaixo relacionadas:

  • (1) Avaliação do trade-off nível de serviço versus custo total - Comparação entre os resultados almejados da logística (nível de serviço) e os custos a eles associados (Christopher, 1987)Christopher, M. (1987). Assessing the costs of logistics service. Cranfield School of Management Working Paper, SWP 61/87., tanto em soluções de projetos específicos (1a) quanto em soluções de desenhos da rede e dos processos logísticos (Gopal & Cypress, 1993)Gopal, C., & Cypress, H. (1993). Integrated distribution management: competing on customer service, time, and cost. Homewood: Irwin. (1b);

  • (2) Avaliação dos trade-offs de custos relevantes - Identificação e mensuração das potenciais trocas compensatórias entre reduções (aumentos) de custos e ampliações (diminuições) de outros custos e/ou redução (aumento) do nível de serviço oferecido ao cliente (Lambert & Armitage, 1979Lambert, D. M., & Armitage, H. M. (1979). Distribution costs: the challenge: the key to managing the physical distribution function is total cost analysis, rather than haphazard stabs at cutting specific costs. Management Accounting (pre-1986), 60(11), 33-45.).Esta variável restringe-se à avaliação dos trade-offs relevantes, pois a existência das inúmeras inter-relações entre os custos inviabiliza a análise pormenorizada de todas as trocas compensatórias (LeKashman & Stolle, 1965LeKashman, R., & Stolle, J. F. (1965). The total cost approach to distribution. Business Horizons, 8(1), 33-46.), mas não suprime a necessidade de avaliar as mais materiais, como aquelas relacionadas por Faria, Bio, e Robles (2004)Faria, A. C., Bio, S. R., & Robles, L. T. (2004). Custos logísticos: discussão sob uma ótica diferenciada. Anais do Congresso Brasileiro de Custos, Porto Seguro, BA, Brasil, 11.;

  • (3) Avaliação dos impactos econômico-financeiros dos trade-offs - Simulação e análise do desempenho econômico-financeiro decorrente das diferentes alternativas de formulação às soluções logísticas, já que estas, depois de implantadas, engendram impactos econômico-financeiros duradouros (LeKashman & Stolle, 1965LeKashman, R., & Stolle, J. F. (1965). The total cost approach to distribution. Business Horizons, 8(1), 33-46.; Mak & Shen, 2010Mak, H. Y., & Shen, Z. J. M. (2010). Integrated supply chain design models. Wiley Encyclopedia of Operations Research and Management Science, DOI 10.1002/9780470400531.eorms0414, 01-15.
    https://doi.org/10.1002/9780470400531.eo...
    ). A simulação e a análise se aplicam tanto ao trade-off entre o nível de serviço e o custo total (3a) quanto aos demais trade-offs relevantes (3b);

  • (4) Avaliação sistemática do custo total da rede e dos processos logísticos - Reavaliação contínua da rede e dos processos logístico sem intervalos de tempo regulares para assegurar a permanência de patamares competitivos do nível de serviço e dos custos (Chow, 2008Chow, G. (2008). Getting back to basics. Canadian Transportation Logistics, 111(10), 40.). A avaliação sistemática é necessária, pois a rede e os processos logísticos devem se adequar às constantes mudanças a que organização e seu ambiente externo estão expostos (LeKashman & Stolle, 1965LeKashman, R., & Stolle, J. F. (1965). The total cost approach to distribution. Business Horizons, 8(1), 33-46.); e

  • (5) Deliberação da solução que otimiza o custo total - Após realização das avaliações anteriormente mencionadas, escolha da formulação que melhor atende à equação nível de serviço ótimo/custo total mínimo (5a) e que favorece a atuação da rede e dos processos logísticos com o custo total otimizado (5b) (LeKashman & Stolle, 1965LeKashman, R., & Stolle, J. F. (1965). The total cost approach to distribution. Business Horizons, 8(1), 33-46.; Faria, 2003Faria, A. C. (2003). Custos logísticos:uma abordagem na adequação das informações de controladoria à gestão da logística empresarial. Tese de doutorado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, São Paulo, SP, Brasil.; Faria & Costa, 2005Faria, A. C., & Costa, M. F. G. (2005). Gestão de custos logísticos. São Paulo: Atlas.).

Essas variáveis foram acessadas mediante oito questões obrigatórias que também adotaram a escala Likert de cinco pontos. A Tabela 3 demonstra essas questões, apresenta os extremos da escala usada e revela as principais fontes consultadas para determinação das variáveis:

Tabela 3
Variáveis da avaliação dos trade-offs de custos logísticos

3.1.3 Experiência e educação formal do profissional logístico.

As variáveis relacionadas à experiência e à educação formal foram definidas com base na arguição de Slone, Mentzer, e Dittmann (2007)Slone, R. E. , Mentzer, J. T., & Dittmann, J. P. (2007). Are you the weakest link in your company's supply chain? Harvard Business Review, 85(9), 116-127. de que o conhecimento funcional dos executivos logísticos é aprimorado com experiência e com cursos. Nesta pesquisa, similarmente ao estudo de Myers et al. (2004)Myers, M. B., Griffith, D. A., Daugherty, P. J., & Lusch, R. F. (2004). Maximizing the human capital equation in logistics: education, experience, and skills., Journal of Business Logistics 25(1), 211-32., a experiência foi mensurada com uma questão obrigatória sobre o tempo de serviço em logística, enquanto o grau de educação formal foi medido com uma questão obrigatória sobre o maior nível de ensino contraído pelo profissional. A Tabela 4 traz as questões, as escalas usadas e as referências adotadas para a definição das variáveis:

Tabela 4
Variáveis da experiência e da educação formal do profissional logístico

3.1.4 Utilização de simuladores de custo e adequação das informações contábeis.

A variável relacionada à utilização de simuladores de custo foi estabelecida com base na argumentação de Russell e Cooper (1992)Russell, R. M., & Cooper, M. C. (1992). Cost savings for inbound freight: the effects of quantity discounts and transport rate breaks on inbound freight consolidation strategies., International Journal of Physical Distribution & Logistics Management 22(9), 20-44., segundo a qual a avaliação de várias decisões econômicas interdependentes está além da capacidade humana do tomador de decisão. Os simuladores propiciam a antecipação e a mensuração dos possíveis efeitos das várias alternativas e favorecem o entendimento da realidade de forma mais completa que o simples embasamento no próprio conhecimento. Neste estudo, a variável foi acessada por meio de uma questão obrigatória cuja resposta deveria se enquadrar na escala binária sim ou não.

A variável relacionada à adequação das informações contábeis foi elaborada com base na visão de que dados apropriados devem ser disponibilizados para evidenciar de que modo a redução em algum custo pode causar aumento em outros custos (Tyndall & Busher, 1985)Tyndall, G. R., & Busher, J. R. (1985). Improving the management of distribution with cost and financial information., Journal of Business Logistics 6(2), 1-18.e, assim, viabilizarem a análise dos trade-offs (Lambert & Quinn, 1981Lambert, D. M., & Quinn, R. (1981). Increase profitability by managing the distribution function. Ivey Business Journal, 46(1), 56-64.; Faria, 2003Faria, A. C. (2003). Custos logísticos:uma abordagem na adequação das informações de controladoria à gestão da logística empresarial. Tese de doutorado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, São Paulo, SP, Brasil.). O acesso à variável fez uso de duas questões não obrigatórias sobre o quanto os profissionais logísticos acreditam que as informações recebidas da Controladoria ajudam a apurar os trade-offs e a definir a formulação das soluções.A não obrigatoriedade dessas questões deve-se à sua aplicabilidade somente às empresas que recebem alguma informação contábil.

A Tabela 5 traz as questões, os extremos da escala usada e as principais obras consultadas na constituição das variáveis relativas à utilização de simuladores e à adequação das informações contábeis:

Tabela 5
Variáveis da utilização de simuladores de custo e da adequação das informações contábeis

3.2 Instrumento de Pesquisa.

As questões, até então relatadas, foram agregadas em um questionário.Para preservar a validade desse questionário, um profissional, um consultor e um docente da área logística avaliaram seu conteúdo e sua estrutura, sem a presença dos pesquisadores, antes da sua efetiva aplicação. Após essa avaliação e a realização de modificações pertinentes, houve outra aplicação prévia do questionário, novamente sem a presença dos pesquisadores, a um gestor logístico com perfil semelhante ao dos potenciais respondentes. Não foi detectada necessidade de alteração no questionário, o que permitiu sua efetiva aplicação eletrônica em fevereiro e março de 2012.

O alfa de Cronbach foi calculado antes da utilização dos dados coletados para identificar se o instrumento de pesquisa (questionário) apresentava respostas confiáveis. O valor superior a 70% no referido alfa indica confiabilidade (Martins & Theóphilo, 2009Martins, G., & Theóphilo, C. R. (2009). Metodologia da investigação científica para ciências sociais aplicadas. (2 ed.). São Paulo: Atlas.).

Neste estudo, o alfa de Cronbach calculado para a amostra final, tanto para o questionário como um todo, que abrange as doze questões de escala Likert obrigatórias, quanto para os constructos individualmente, resultou em valores superiores a 70%. O alfa de Cronbach apresentou o valor de 90, 8% para o questionário, 81, 0% para o constructo do conhecimento dos trade-offs, 88, 5% para o constructo da avaliação dos trade-offs e 87, 4% para o constructo da adequação das informações contábeis.

3.3 População e Amostra.

A população da presente pesquisa englobou empresas que possuíam dois atributos específicos: (1)estavam entre as maiores empresas brasileiras segundo a Revista Exame Melhores e Maiores do ano base de 2010; e (2) atuavam na atividade industrial e/ou comercial. O total de companhias que tinham esses atributos e que compuseram a população deste estudo é 659.

A restrição às maiores empresas foi fundamentada pela constatação de Napolitano (1997)Napolitano, M. (1997). Distribution network modeling. Industrial Engineer, 29(6), 20-24. de que organizações pequenas não tendem a apresentar uma situação em que robustas soluções logísticas originem economias significativas.

A delimitação às empresas comerciais e industriais decorreu da exclusão do setor de serviços pelo fato de este possuir alguns ramos que não lidam com a transferência de bens físicos. Os ramos de educação e de práticas religiosas, por exemplo, não implicam na transferência de bens do fornecedor para o cliente, mas, sim, na transmissão de ensinamentos intelectuais e de doutrinas espirituais (Ellram, Tate, & Billington, 2004Ellram, L. M., Tate, W. L., & Billington, C. (2004). Understanding and managing the services supply chain. The Journal of Supply Chain Management, 40 (4), 17-32.).

A ausência da transferência de bens restringe a variedade de atividades logísticas executadas (a manutenção de inventários e a armazenagem, por exemplo, não são estritamente necessárias) e limita a quantidade de trade-offs enfrentados pelas empresas.Como o escopo limitado de trade-offs está presente em certos ramos de serviço e constitui uma característica operacional distinta da desejada nesta pesquisa, houve a exclusão de todo o setor de serviços.

Para localizar o contato das empresas componentes da população deste estudo, houve consulta à base de ex-alunos do MBA de Supply Chain Management & Logística Integrada da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (FIPECAFI) e ao banco de dados da revista Exame. Na base de ex-alunos foi possível obter o endereço eletrônico de profissionais logísticos de 205 distintas empresas.Com ligações ao telefone cadastrado no banco de dados da revista Exame, por sua vez, foi possível obter o contato eletrônico/telefônico de profissionais logísticos de mais 38 empresas. Dessa forma, o objetivo da pesquisa foi explicado e o questionário foi encaminhado para 243 distintas empresas. Foram recebidas73 respostas válidas, que constituem a amostra da pesquisa e indicam uma taxa de retorno de 30%.

Como um dos pilares da validade da pesquisa é a parcela da população efetivamente acessada, houve análise do viés da não resposta (Armstrong & Overton, 1977Armstrong, J. S., & Overton, T.S. (1977). Estimating nonresponse bias in mail surveys. Journal of Marketing Research, 14(3), 396-402.). Os 36 participantes que demandaram reiterações de chamada à pesquisa foram equiparados aos não respondentes e suas respostas foram comparadas àquelas dos37 participantes que logo atenderam à pesquisa. Com o teste de Mann-Whitney foi detectada ausência de diferenças estatísticas significativas entre os grupos, o que indicou a inexistência do viés da não resposta e a validade no que tange à população contatada.

3.4 Tratamento e Análise dos Dados.

A análise quantitativa dos dados propôs a adoção de duas perspectivas: estatística descritiva e testes de hipóteses.

A estatística descritiva buscou evidenciar a distribuição das respostas no que se refere à extensão do conhecimento e da avaliação dos trade-offs. Para possibilitar a identificação de concentrações, as respostas foram agregadas em dois grupos. O primeiro grupo foi composto pelas respostas cujos pontos assinalados na escala Likert eram fracos ou médios, ou seja, 1, 2 ou 3. Já o segundo grupo foi constituído pelas respostas que tiveram pontos fortes marcados na escala Likert, ou seja, os pontos 4 ou 5.

Para o conhecimento dos trade-offs, os escores fracos e o escore médio (1, 2 e 3) indicam que a sabedoria questionada não é disseminada ou é parcialmente disseminada, enquanto os escores fortes (4 e 5) indicam que a sabedoria é amplamente difundida. Já para a avaliação dos trade-offs, os escores fracos e o escore médio (1, 2 e 3) referem-se à ausência ou à parcialidade da análise, enquanto os escores fortes (4 e 5) referem-se a análises amplamente realizadas.

Os testes de hipóteses, por sua vez, visaram identificar os fatores associados ao conhecimento e à avaliação dos trade-offs. Sua operacionalização implicou na formação de dois grupos, cada um com características do fator analisado em extremos opostos, conforme mostra a Tabela 6, que também evidencia, nos parênteses, a quantidade de profissionais de cada grupo:

Tabela 6
Grupos formados para os testes de hipóteses

A normalidade das variáveis foi testada com os testes de Kolmogorov-Smirnov e de Shapiro-Wilk. A um nível de significância de 0, 10, nenhuma das variáveis obteve distribuição normal para os dois grupos, o que indicou a necessidade de se recorrer a testes estatísticos não paramétricos. Como os grupos formados para cada hipótese eram independentes e as variáveis tinham nível de mensuração ordinal, o teste não paramétrico selecionado foi o de Mann-Whitney (Fávero, Belfiore, Chan, & Silva, 2009Fávero, L. P., Belfiore, P. P., Chan B. L., & Silva, F. L. (2009). Análise de dados: modelagem multivariada para tomada de decisões. Rio de Janeiro: Elsevier.).

4 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

Este estudo, antes de apresentar os resultados específicos, descreve os dados referentes ao perfil dos respondentes para mostrar que a maior parte dos profissionais consultados tende a estar familiarizada com a logística. Isso porque a maioria da amostra possui pós-graduação e mais de 10 anos de experiência na área, conforme revela a Tabela 7:

Tabela 7
Caracterização dos respondentes

4.1 Conhecimento e Avaliação dos Trade-offs.

Passando à apresentação dos resultados específicos, traz-se primeiramente a Tabela 8, que revela a concentração dos escores assinalados às respostas das questões sobre o conhecimento dos trade-offs:

Tabela 8
Níveis dos escores assinalados às questões do conhecimento dos trade-offs de custos logísticos

Inicialmente, nota-se que o conhecimento mais difundido é o de que a logística impacta a dimensão econômico-financeira, pois 77% dos profissionais afirmaram que têm essa ciência em níveis fortes.Este achado era esperado porque, cada vez mais, se propaga a ideia de que o efetivo gerenciamento logístico ajuda a alavancar o desempenho econômico-financeiro (Presutti & Mawhinney, 2007Presutti, W. D., & Mawhinney, J. R. (2007). The supply chain-finance link. Supply Chain Management Review, 11(6), 32-38.).

Em seguida, observa-seque a maior parte dos profissionais logísticos (59%) assinalou escores fortes para afirmar que sabe que o aumento no custo de uma atividade logística pode ser compensado pela redução no custo de outra atividade logística ou pelo aumento nas receitas (e vice-versa). Como a existência das trocas compensatórias é demarcada pelas substituições entre os elementos de custos (Bio, Robles, & Faria, 2003Bio, S. R., Robles, L. T., & Faria, A. C. (2003). O papel da Controladoria no apoio às decisões logísticas: um estudo de caso. Anais do Congresso Brasileiro de Custos, Guarapari, ES, Brasil, 10.), o resultado encontrado sugere que os profissionais sabem que os trade-offs existem.

Finalmente, constata-se que o entendimento da relação dos trade-offs com o custo total é o que está menos difundido entre os profissionais. A concentração das respostas às questões nos níveis fracos e médio (52% e 59%) revela que os profissionais, apesar de cientes da possível compensação entre os custos, ainda resistem a acreditar que os cortes individuais não são a melhor opção para a otimização do custo total (Lambert & Armitage, 1979Lambert, D. M., & Armitage, H. M. (1979). Distribution costs: the challenge: the key to managing the physical distribution function is total cost analysis, rather than haphazard stabs at cutting specific costs. Management Accounting (pre-1986), 60(11), 33-45.).

Em suma, os resultados indicam que o conhecimento dos trade-offs é restrito, pois evidenciam que os profissionais logísticos sabem que as trocas compensatórias existem, mas não têm um entendimento claro do seu conceito e do seu funcionamento. De certa forma, esse achado corrobora a constatação de LeKashman e Stolle (1965)LeKashman, R., & Stolle, J. F. (1965). The total cost approach to distribution. Business Horizons, 8(1), 33-46. de que o impacto real da logística é muito maior do que a maior parte dos gestores imagina.

Migrando o foco do estudo do conhecimento para a avaliação dos trade-offs, apresenta-se a Tabela 9 que revela a concentração dos escores assinalados às respostas das suas questões:

Tabela 9
Níveis dos escores assinalados às questões da avaliação dos trade-offs de custos logísticos

Inicialmente, constata-se que a avaliação dos trade-offs é enfatizada em soluções referentes à rede e aos processos logísticos: as questões relacionadas a esse tipo de solução foram as que obtiveram a maior proporção (60%) de respostas concentrada sem escores fortes.Dois fatores podem estar relacionados a essa ênfase: (1) a grande disponibilidade de softwares comerciais desenvolvidos para desenho de redes (Napolitano, 2011)Napolitano, M. (2011). 6 tips for optimizing the distribution network. Logistics Management, 50 (7), 54-56, 58.; e (2) o relevante custo da rede edos macroprocessos logísticos (Faria, 2003Faria, A. C. (2003). Custos logísticos:uma abordagem na adequação das informações de controladoria à gestão da logística empresarial. Tese de doutorado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, São Paulo, SP, Brasil.).

Em seguida, nota-se que as respostas às questões referentes às soluções específicas apresentaram marcações que se equilibraram entre escores fortes e escores fracos ou médios. Observa-seque, enquanto praticamente metade dos profissionais entende que identifica e analisa amplamente os trade-offs relevantes (55%), o trade-off nível de serviço versus custo total(52%) e os impactos econômico-financeiros(51 e 53%), a outra metade conclui que identifica e analisa pouco ou parcialmente esses aspectos.

Finalmente, destaca-se que a solução selecionada pelos profissionais logísticos não é necessariamente aquela que otimiza o custo total (55% dos respondentes tiveram suas respostas concentradas em níveis fracos ou médios). Consequentemente, não é surpreendente a constatação de que mais de metade das empresas (53%) entende atuar distante do custo total ótimo.

Destarte, os resultados indicam que o nível de avaliação dos trade-offs pelos profissionais logísticos brasileiros ainda está em um patamar inferior ao desejável. Fellous (2009)Fellous, S. M. (2009). Gestão da cadeia de suprimentos no Brasil e a utilização de instrumentos da contabilidade gerencial: uma avaliação sob a perspectiva dos profissionais envolvidos. Dissertação de mestrado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, São Paulo, SP, Brasil., que chegou a achado similar ao explorar especificamente a análise do custo total, argumentou que a real situação pode ser ainda pior comum nível de efetiva avaliação mais baixo do que os respondentes percebem.

Para identificar fatores relacionados às extensões do conhecimento e da avaliação dos trade-offs, até então reportadas, passa-se agora aos testes de hipóteses.

4.2 Fatores Relacionados ao Conhecimento e à Avaliação dos Trade-offs.

As hipóteses 1 e 2 propõem que a extensão de conhecimento dos trade-offs pode ser influenciada pelo nível de experiência e pelo nível de educação formal dos profissionais logísticos.Para identificar se essas hipóteses eram ou não aceitas, foi realizado o teste estatístico não paramétrico de Mann-Whitney. A Tabela 10 reporta os resultados obtidos nesse teste:

Tabela 10
Testes das hipóteses 1 e 2

Considerando um nível de significância de 0, 10, o teste de Mann-Whitney explicita que há uma diferença estatística significativa na H1: a extensão do conhecimento dos impactos econômico-financeiros difere entre profissionais experientes e não experientes. A Tabela 11 detalha os escores assinalados pelos grupos na questão dessa variável:

Tabela 11
Frequências dos escores assinalados pelos profissionais experientes e não experientes

Observa-se que os profissionais logísticos experientes têm mais conhecimento dos impactos econômico-financeiros do que os profissionais não experientes. Esses resultados, articulados à arguição de Christopher (1997)Christopher, M. (1997). Logística e gerenciamento da cadeia de suprimentos: estratégia para a redução de custos e melhoria dos serviços. São Paulo: Pioneira. de que o profissional logístico deve ser bem informado financeiramente para controlar seus recursos e seus custos, permitem inferir que a experiência na área, além de ajudar a construir uma base de conhecimentos operacionais, estimula o interesse pelo entendimento dos impactos econômico-financeiros.

Para a H2, a um nível de significância de 0, 10, o teste de Mann-Whitney não rejeitou a hipótese nula de nenhuma variável. Esse resultado indica a não existência de diferença no conhecimento dos trade-offs de custos logísticos entre profissionais com maior e com menor grau de escolaridade. Vale destacar que o estudo de Myers et al.(2004)Myers, M. B., Griffith, D. A., Daugherty, P. J., & Lusch, R. F. (2004). Maximizing the human capital equation in logistics: education, experience, and skills., Journal of Business Logistics 25(1), 211-32. também explorou o impacto da escolaridade (assim como da experiência) no desempenho logístico e, similarmente a este artigo, não identificou diferença entre os distintos níveis da variável.

Testes adicionais foram realizados para verificar se, ao invés do grau de formação sugerido por Myers et al. (2004)Myers, M. B., Griffith, D. A., Daugherty, P. J., & Lusch, R. F. (2004). Maximizing the human capital equation in logistics: education, experience, and skills., Journal of Business Logistics 25(1), 211-32., a área de estudo dos profissionais poderia impactar a extensão de conhecimento dos trade-offs. As respostas dos profissionais formados em logística foram comparadas com as respostas dos profissionais não formados em logística; e as respostas dos profissionais com formação na área de negócios (administração, ciências contábeis e economia) foram comparadas com as respostas dos profissionais com formação em áreas técnicas (engenharia e logística, principalmente). Nenhuma dessas comparações resultou em diferença estatística significativa na realização do teste de Mann-Whitney.

Assim, a H1e a H2demonstram que o conhecimento dos trade-offs é parcialmente relacionado à experiência e não relacionado à educação formal. Esses resultados, apesar de não revelarem conclusivamente o que interfere na extensão do conhecimento dos trade-offs, permitem que futuros estudos já partam desta constatação e possam buscar levantar evidências de outros fatores.

No que se refere à avaliação dos trade-offs, a hipótese 3 propõe que a extensão das análises pode depender da utilização de simuladores de custo, já que o processamento de vasta gama de dados requer suporte computacional (LeKashman & Stolle, 1965LeKashman, R., & Stolle, J. F. (1965). The total cost approach to distribution. Business Horizons, 8(1), 33-46.). Essa hipótese foi reforçada pelas constatações simultâneas de não uso de simuladores por 42% das empresas da amostra e de limitada avaliação dos trade-offs.A Tabela 12 reporta os resultados obtidos pelo teste estatístico de Mann-Whitney:

Tabela 12
Testes da hipótese 3

Considerando um nível de significância de 0, 10, o teste de Mann-Whitney evidencia que todas as variáveis apresentaram diferenças estatísticas significativas entre os grupos. Essas diferenças confirmam que a utilização de simuladores de custo, tanto em projetos específicos (i.e., roteirização) quanto em desenhos da rede, impacta a extensão da avaliação dos trade-offs de custos logísticos.

Ademais, ratifica-se a conclusão de Fellous (2009)Fellous, S. M. (2009). Gestão da cadeia de suprimentos no Brasil e a utilização de instrumentos da contabilidade gerencial: uma avaliação sob a perspectiva dos profissionais envolvidos. Dissertação de mestrado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, São Paulo, SP, Brasil. de que a extensão de avaliação dos trade-offs é maior em empresas que usam simuladores. Isso porque, enquanto o grupo de empresas que usam simuladores concentrou todas suas respostas em níveis fortes, o grupo de empresas que não usam simuladores concentrou todas as suas respostas em níveis fracos ou médios.

A hipótese 4, por sua vez, propõe que a extensão de avaliação dos trade-offs pode depender da disponibilidade de informações adequadas de custo. Essa hipótese foi reforçada com a constatação de que a maior parte da amostra da pesquisa, além de avaliar limitadamente os trade-offs, não recebe informações contábeis julgadas adequadas, conforme evidencia a Figura 1:

Figura 1
Recebimento das informações contábeis

A satisfação de somente 30% das empresas desta pesquisa demonstra a permanência de um problema há tempos advertido por pesquisadores logísticos e contábeis. Da logística, por exemplo, Pohlen e LaLonde já preconizavam em 1994 que os controllers não desenvolviam informações para a análise dos custos logísticos, apesar da sua magnitude e da sua importância.Da área contábil, Faria já advertia em 2003 que os custos das atividades logísticas não eram apresentados claramente e costumavam estar embutidos em diversas rubricas das demonstrações contábeis, principalmente de estoques, de custo dos produtos vendidos, de despesas operacionais e de deduções de receitas.

Com essas considerações colocadas, parte-se propriamente para o teste de Mann-Whitney para investigar estatisticamente se a falta de adequadas informações contábeis relaciona-se significativamente à restrita avaliação dos trade-offs. A Tabela 13 reporta os resultados:

Tabela 13
Testes da hipótese 4

Considerando um nível de significância de 0, 10, o teste de Mann-Whitney mostra que todas as variáveis, com exceção das 3b e 5 (a e b), possuem diferenças estatísticas significativas entre os grupos. Essas diferenças confirmam que a disponibilidade de informações contábeis adequadas impacta a extensão da avaliação dos trade-offs de custos logísticos.

Além disso, ratifica-se a tese que a extensão de avaliação dos trade-offs é maior em empresas que recebem informações de custo adequadas. Isso porque, enquanto o grupo de empresas que recebem informações apropriadas concentrou em níveis fortes todas as suas respostas, o grupo de empresas que não recebem informações adequadas assinalou níveis fracos, médios e fortes. Esse resultado era esperado, pois se sabe que a ausência de precisas informações contábeis restringe a estimativa dos impactos dos diferentes níveis de serviço oferecidos, impede a conscientização da relevância do custo total e dificulta a integração logística (Perreault Jr. & Russ, 1976Perreault Jr., W. D., & Russ, F. A. (1976). Quantifying marketing trade-offs in physical distribution policy decisions. Decision Sciences, 7(2), 186-201.; Christopher, 1997Christopher, M. (1997). Logística e gerenciamento da cadeia de suprimentos: estratégia para a redução de custos e melhoria dos serviços. São Paulo: Pioneira.; Faria, 2003Faria, A. C. (2003). Custos logísticos:uma abordagem na adequação das informações de controladoria à gestão da logística empresarial. Tese de doutorado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, São Paulo, SP, Brasil.).

Em suma, os testes de hipóteses revelam que tanto a utilização de simuladores quanto a disponibilização de informações adequadas de custo interferem na extensão de avaliação dos trade-offs.

5 CONCLUSÕES

Os objetivos desta pesquisa foram atendidos na medida em que, para a amostra considerada, seus resultados permitiram:aferir a extensão em que os profissionais logísticos conhecem os trade-offs; identificar se os trade-offs são avaliados no desenho e na implantação das soluções;e levantar fatores associados ao conhecimento e à avaliação dos trade-offs.

No que se refere à extensão de conhecimento dos trade-offs, destaca-se a revelação de que a maioria dos profissionais logísticos tem ciência da existência das trocas compensatórias e sabe que o aumento em um custo pode ser compensado pelo aumento nas receitas ou pela redução em outros custos. Contudo, falta a essa mesma maioria um entendimento completo do funcionamento dos trade-offs, especialmente da sua intrínseca relação com o custo total. Isso faz com que, infortunadamente, a pressão por cortes individuais de custos não seja percebida como o equívoco que é.

Ressalta-se também a ampla difusão do conhecimento de que a logística impacta o desempenho econômico-financeiro. Esse conhecimento é importante para que os profissionais logísticos busquem um gerenciamento que atenda a lucratividade e não somente parâmetros operacionais (Presutti & Mawhinney, 2007Presutti, W. D., & Mawhinney, J. R. (2007). The supply chain-finance link. Supply Chain Management Review, 11(6), 32-38.).

Sublinha-se ainda a identificação de que os profissionais com mais experiência apresentam uma extensão maior do conhecimento dos impactos econômico-financeiros do que os profissionais com menos experiência. Esse achado sugere que o tempo de atuação na logística, além de ampliar a sabedoria funcional, colabora com a construção de sabedoria econômico-financeira.Vale ressaltar que Christopher (1997)Christopher, M. (1997). Logística e gerenciamento da cadeia de suprimentos: estratégia para a redução de custos e melhoria dos serviços. São Paulo: Pioneira. destaca a necessidade de o profissional logístico ter, cada vez mais, conhecimentos financeiros para saber, sobretudo, controlar os custos que suas operações provocam.

Com relação à avaliação dos trade-offs, salienta-se a ênfase colocada no desenho da rede e dos processos logísticos. O alto custo envolvido (Faria, 2003Faria, A. C. (2003). Custos logísticos:uma abordagem na adequação das informações de controladoria à gestão da logística empresarial. Tese de doutorado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, São Paulo, SP, Brasil.) e a vasta disponibilidade de softwares comerciais para esses tipos de soluções (Napolitano, 2011Napolitano, M. (2011). 6 tips for optimizing the distribution network. Logistics Management, 50 (7), 54-56, 58.) podem ser os motivos para a priorização.

Ressalta-se que as soluções de projetos específicos, que não desenhos de rede ou de processos, apresentam patamares de avaliação limitados. Praticamente metade das empresas avalia pouco ou moderadamente os trade-offs, o que dificulta o sucesso da sua integração logística.Vale destacar que estudos anteriores mostram que a mensuração do custo total da empresa e que a avaliação dos custos envolvidos ao longo de toda cadeia de suprimentos também são restritas (i.e., Faria, 2003Faria, A. C. (2003). Custos logísticos:uma abordagem na adequação das informações de controladoria à gestão da logística empresarial. Tese de doutorado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, São Paulo, SP, Brasil.; Fellous, 2009Fellous, S. M. (2009). Gestão da cadeia de suprimentos no Brasil e a utilização de instrumentos da contabilidade gerencial: uma avaliação sob a perspectiva dos profissionais envolvidos. Dissertação de mestrado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, São Paulo, SP, Brasil.).

Sublinha-se a ratificação de que a não utilização de simuladores de custo e anão disponibilização de informações de custo adequadas (segundo julgamento dos profissionais logísticos) são fatores relacionados à limitada avaliação dos trade-offs. A associação com os simuladores deve-se à dificuldade, se não impossibilidade, de processamento dos dados das inúmeras inter-relações sem suporte computacional (LeKashman & Stolle, 1965LeKashman, R., & Stolle, J. F. (1965). The total cost approach to distribution. Business Horizons, 8(1), 33-46.). A relação com a adequação das informações dos custos, por sua vez, deriva do fato de que a ausência de precisas informações restringe as análises à dimensão operacional e faz com que nenhuma atividade logística seja executada eficientemente (Faria, 2003Faria, A. C. (2003). Custos logísticos:uma abordagem na adequação das informações de controladoria à gestão da logística empresarial. Tese de doutorado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, São Paulo, SP, Brasil.).

Assim, a lacuna preenchida por este trabalho está no aprofundamento oferecido ao tema dos trade-offs de custos logísticos. Destaca-se, primeiramente, a identificação empírica de que as extensões do conhecimento e da avaliação dos trade-offs ainda não são elevadas. Ademais, ressalta-se a confirmação de que a utilização de simuladores e a disponibilidade de adequadas informações de custo, além de serem importantes à gestão do custo logístico (LeKashman & Stolle, 1965LeKashman, R., & Stolle, J. F. (1965). The total cost approach to distribution. Business Horizons, 8(1), 33-46.; Faria, 2003Faria, A. C. (2003). Custos logísticos:uma abordagem na adequação das informações de controladoria à gestão da logística empresarial. Tese de doutorado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, São Paulo, SP, Brasil.), são fundamentais para a avaliação dos trade-offs.

A principal contribuição da pesquisa para o campo de conhecimento contábil foi demonstrar que a maior parte das empresas ainda não atua com o custo total otimizado e que a falta da avaliação dos trade-offs é uma das causas capitais dessa situação. A utilidade desse conhecimento é evidenciar à Controladoria, cuja missão é assegurar a otimização do resultado econômico global da organização, a importância da análise dos trade-offs e da disponibilização de informações de custos que a viabilize.

Tendo em vista a recomendação a futuros estudos, sem a pretensão de exaurir as possibilidades, propõe-se a consideração de algumas explicações adicionais para os achados:

  • -A restrição aos setores comercial e industrial na amostra desta pesquisa buscou abranger empresas que lidam com a transferência de bens físicos e que, consequentemente, atuam com um escopo similar e ampliado de processos e de atividades logísticas.Apesar do propósito delimitador, a eliminação do setor de serviços culminou na exclusão de ramos que possuem relevantes preocupações logísticas, como, por exemplo, o de transportes e o de energia. Destarte, ressalta-se que a dilatação ao setor de serviços pode expandir o contexto analisado e contribuir com o estudo do tema, mas exigirá uma nova pesquisa de campo;

  • -A falta de compreensão do que significa o termo troca compensatória pode ser a causa para o não entendimento aprofundado da relação dos trade-offs com o custo total. Por mais que os profissionais logísticos conheçam os trade-offs, pode-lhes carecer a ciência de que o termo troca compensatória exprima seu significado. Futuros estudos podem, baseados nos constructos elaborados neste artigo, propor novas questões que acessem as variáveis sem mencionarem especificamente os termos troca compensatória e/ou trade-off;

  • -Os resultados à avaliação dos trade-offs exprimem o julgamento dos respondentes do quanto consideram que as várias etapas de análise propostas nesta pesquisa são aplicadas nas suas empresas. Portanto, as extensões apresentadas revelam a percepção do respondente e os maiores graus não implicam necessariamente em uma maior sofisticação de análise e, tampouco, num emprego de aplicativos e de modelagem. Da mesma forma, a consideração da relevância do trade-off envolve a subjetividade dos respondentes no entendimento da sua materialidade. Assim, propõe-se que as próximas pesquisas, baseadas nos constructos elaborados neste artigo, sugiram novas questões ou empreguem distintos métodos para acessar as variáveis de forma alternativa;

  • -A escala Likert de cinco pontos adotada no questionário permitiu que uma posição neutra fosse selecionada pelos respondentes, mas, para demonstrar se as extensões de conhecimento e de avaliação dos trade-offs eram ou não fortes, careceu da agregação dos pontos fracos ao ponto moderado na apresentação dos resultados. Novos estudos podem empregar métodos diferentes para acessarem de forma alternativa a magnitude das variáveis;

  • -Os simuladores de custo disponíveis nas empresas podem ser utilizados para algumas soluções, mas não para todas. Essa ocorrência limita a presente pesquisa, considerando a resposta dicotômica "sim" ou "não", e implica na sugestão de que futuros estudos desenvolvam questões que permitam identificar a intensidade da utilização dos simuladores;

  • -A elaboração de informações adequadas de custo favorece a otimização do custo total logístico, mas demanda esforço e custos adicionais. Considerando que este artigo apenas explorou o lado do benefício das informações, propõe-se que novas pesquisas promovam a análise da sua relação de custo/benefício.

  • *
    Artigo apresentado no XXXVII Encontro da Anpad (EnANPAD), Rio de Janeiro, Brasil, 2013 e 37th Annual Congress of the European Accounting Association, Tallinn, Estônia, 2014.

Referências

  • Armstrong, J. S., & Overton, T.S. (1977). Estimating nonresponse bias in mail surveys. Journal of Marketing Research, 14(3), 396-402.
  • Ballou, R.H. (2007). The evolution and future of logistics and supply chain management. European Business Review, 19(4), 332-348.
  • Bio, S. R., Robles, L. T., & Faria, A. C. (2002). Em busca da vantagem competitiva: trade-offs de custos logísticos em cadeias de suprimentos Revista de Contabilidade CRC-SP, 6(19), 5-18.
  • Bio, S. R., Robles, L. T., & Faria, A. C. (2003). O papel da Controladoria no apoio às decisões logísticas: um estudo de caso. Anais do Congresso Brasileiro de Custos, Guarapari, ES, Brasil, 10.
  • Busher, J. R., & Tyndall, G. R. (1987). Logistics excellence. Management Accounting, 69(2), 32-39.
  • Chow, G. (2008). Getting back to basics. Canadian Transportation Logistics, 111(10), 40.
  • Christopher, M. (1987). Assessing the costs of logistics service. Cranfield School of Management Working Paper, SWP 61/87.
  • Christopher, M. (1994). Integrating logistics strategy in the corporate financial plan. In J. F. Roberson & W. C. Copacino (Eds.). The logistics handbook New York: The Free Press.
  • Christopher, M. (1997). Logística e gerenciamento da cadeia de suprimentos: estratégia para a redução de custos e melhoria dos serviços São Paulo: Pioneira.
  • Christopher, M., & Ryals, L. (1999). Supply chain strategy: its impact on shareholder value. The International Journal of Logistics Management, 10(1), 1-10.
  • Ellram, L. M., Tate, W. L., & Billington, C. (2004). Understanding and managing the services supply chain. The Journal of Supply Chain Management, 40 (4), 17-32.
  • Faria, A. C. (2003). Custos logísticos:uma abordagem na adequação das informações de controladoria à gestão da logística empresarial Tese de doutorado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, São Paulo, SP, Brasil.
  • Faria, A. C., Bio, S. R., & Robles, L. T. (2004). Custos logísticos: discussão sob uma ótica diferenciada. Anais do Congresso Brasileiro de Custos, Porto Seguro, BA, Brasil, 11.
  • Faria, A. C., & Costa, M. F. G. (2005). Gestão de custos logísticos São Paulo: Atlas.
  • Fávero, L. P., Belfiore, P. P., Chan B. L., & Silva, F. L. (2009). Análise de dados: modelagem multivariada para tomada de decisões Rio de Janeiro: Elsevier.
  • Fellous, S. M. (2009). Gestão da cadeia de suprimentos no Brasil e a utilização de instrumentos da contabilidade gerencial: uma avaliação sob a perspectiva dos profissionais envolvidos Dissertação de mestrado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, São Paulo, SP, Brasil.
  • Fornaciari, G., Pereira, M. M. A. M., & Zanquetto Filho, H. (2003). A necessidade de segregação e evidenciação dos custos logísticos nos relatórios contábeis. Anais do Congreso Internacional de Costos, Punta del Este, Uruguai, 8.
  • Gopal, C., & Cypress, H. (1993). Integrated distribution management: competing on customer service, time, and cost Homewood: Irwin.
  • Gustin, C. A., Daugherty, P.J., & Stank, T. P. (1995). The effects of information availability on logistics integration. Journal of Business Logistics, 16 (1), 1-21.
  • Hult, G. T. M., Ketchen Jr., D. J., Cavusgil, S. T., & Calantone, R. J. (2006). Knowledge as a strategic resource in supply chains. Journal of Operations Management, 24(5), 458-475.
  • LaLonde, B. J. (1993) Integrated distribution systems: a management perspective. International Journal of Physical Distribution & Logistics Management, 23(5), 04-12.
  • Lambert, D. M., & Armitage, H. M. (1979). Distribution costs: the challenge: the key to managing the physical distribution function is total cost analysis, rather than haphazard stabs at cutting specific costs. Management Accounting (pre-1986), 60(11), 33-45.
  • Lambert, D. M., & Lewis, C. M. (1983). Managing customer service to build market share and increase profit. Business Quarterly, 48(3), 50-57.
  • Lambert, D. M., & Quinn, R. (1981). Increase profitability by managing the distribution function. Ivey Business Journal, 46(1), 56-64.
  • LeKashman, R., & Stolle, J. F. (1965). The total cost approach to distribution. Business Horizons, 8(1), 33-46.
  • Lewis, H. T., Culliton, J. W., & Steele, J. D. (1956). The role of air freight in physical distribution Boston: Division of Research, Graduate School of Business Administration, Harvard University.
  • Mak, H. Y., & Shen, Z. J. M. (2010). Integrated supply chain design models. Wiley Encyclopedia of Operations Research and Management Science, DOI 10.1002/9780470400531.eorms0414, 01-15.
    » https://doi.org/10.1002/9780470400531.eorms0414
  • Martins, G., & Theóphilo, C. R. (2009). Metodologia da investigação científica para ciências sociais aplicadas (2 ed.). São Paulo: Atlas.
  • Mentzer, J. T., Flint, D. J., & Hult, T. M. (2001). Logistics service quality as a segment-customized process. Journal of Marketing, 65(4), 82-104.
  • Myers, M. B., Griffith, D. A., Daugherty, P. J., & Lusch, R. F. (2004). Maximizing the human capital equation in logistics: education, experience, and skills., Journal of Business Logistics 25(1), 211-32.
  • Napolitano, M. (1997). Distribution network modeling. Industrial Engineer, 29(6), 20-24.
  • Napolitano, M. (2011). 6 tips for optimizing the distribution network. Logistics Management, 50 (7), 54-56, 58.
  • Perreault Jr., W. D., & Russ, F. A. (1976). Quantifying marketing trade-offs in physical distribution policy decisions. Decision Sciences, 7(2), 186-201.
  • Pohlen, T. L., & LaLonde, B. J. (1994). Implementing activity based costing (ABC) in logistics., Journal of Business Logistics 15(2), 1-23.
  • Presutti, W. D., & Mawhinney, J. R. (2007). The supply chain-finance link. Supply Chain Management Review, 11(6), 32-38.
  • Russell, R. M., & Cooper, M. C. (1992). Cost savings for inbound freight: the effects of quantity discounts and transport rate breaks on inbound freight consolidation strategies., International Journal of Physical Distribution & Logistics Management 22(9), 20-44.
  • Sabath, R. E. (1978). How much service do customers really want?, Business Horizons 21(2), 26-32.
  • Slone, R. E. , Mentzer, J. T., & Dittmann, J. P. (2007). Are you the weakest link in your company's supply chain? Harvard Business Review, 85(9), 116-127.
  • Tyndall, G. R., & Busher, J. R. (1985). Improving the management of distribution with cost and financial information., Journal of Business Logistics 6(2), 1-18.
  • Van Hoek, R. I., Chatham, C., & Wilding, R. (2002). Managers in supply chain management, the critical dimension. Supply Chain Management, 7(3), 119-125.
  • Waller, M .A., & Fawcett, S. E. (2012). The total cost concept of logistics: one of many fundamental logistics concepts begging for answers., Journal of Business Logistics 33(1), 1-3.
  • Weijters, B., Cabooter, E., & Schillewaert, N. (2010). The effect of rating scale format on response styles: the number of response categories and response category labels. International Journal of Research in Marketing, 27(3), 236-247.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2014

Histórico

  • Revisado
    26 Set 2013
  • Recebido
    18 Set 2013
  • Aceito
    23 Maio 2014
Universidade de São Paulo, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Departamento de Contabilidade e Atuária Av. Prof. Luciano Gualberto, 908 - prédio 3 - sala 118, 05508 - 010 São Paulo - SP - Brasil, Tel.: (55 11) 2648-6320, Tel.: (55 11) 2648-6321, Fax: (55 11) 3813-0120 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: recont@usp.br