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Sobre mapas e topógrafos: uma tréplica a Barbosa (2004) e Mattos (2004)

Sobre mapas y topógrafos: una tréplica a Barbosa (2004) y Mattos (2004)

On maps and topographers: redirect to (2004) and Mattos (2004)

RAE DEBATE

Sobre mapas e topógrafos: uma tréplica a Barbosa (2004) e Mattos (2004)

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Sobre mapas y topógrafos: una tréplica a Barbosa (2004) y Mattos (2004)

Miguel P. Caldas; Tatiana Tinoco

SOBRE MAPAS E TOPÓGRAFOS: UMA TRÉPLICA A BARBOSA (2004) E MATTOS (2004)

De forma geral, para o bem e para o mal, nosso trabalho tende a provocar fortes reações.

Quando fazíamos a pesquisa que originou tanto o artigo aqui discutido, quanto um anterior já publicado na RAE (Tonelli et al., 2003), de uma coisa todos os envolvidos tínhamos certeza: não seria assim que conseguiríamos novos amigos. O propósito era simples, a despeito da tarefa ser colossal, e a intenção básica - para muitos - ser desaforada: usando uma metodologia relativamente nova e ainda inexplorada no Brasil, contribuir para o movimento de estudos sobre a nova produção científica com um aprofundado levantamento bibliométrico de toda a produção de uma das nossas áreas de conhecimento. Sentíamos que o tipo de "mapa" que esse tipo de levantamento traz mostraria aspectos do relevo do campo que outros estudos topográficos ainda não tinham revelado. Julgávamos que os novos dados obtidos gerariam um mapa mais rico do terreno, e que isso seria, em si, algo positivo e contributivo.

Mas, enquanto mais os dados apareciam, mais preocupados ficávamos com a quantidade de calos em que o levantamento pisaria, e daí nas consequências, digamos, interpessoais, que nosso estudo poderia nos trazer. Ora, nada mais natural: como qualquer mapeamento que utilize ferramentas e levantamentos topográficos antes não adotados, o novo mapa gerado irá, parafraseando Nicholo Machiavelli, acabar despertando a ira de todos os que acreditam que perdem com a nova situação, e angariando muito pouco reforço entre aqueles que com ela têm algo a ganhar. É verdade, o artigo em questão é bem menos revolucionário do que a nova ordem das coisas à qual Machiavelli se referia. E, além disso, não apenas de gente potencialmente prejudicada poderiam vir críticas mordazes ao trabalho. A réplica de Pedro Lincoln é um bom exemplo de crítica isenta, e mesmo assim, vigorosa.

Mas, mesmo assim, o que vale é que a analogia com Machiavelli pode servir: mexer nessa casa de marimbondo não nos traria muitos amigos, e deixaria o espaço aberto para ressentimentos, mal-entendidos e muito nariz torto.

De fato, as reações não tem sido nem poucas, nem sutis. Em geral, as respostas que observamos da nossa pesquisa tendem a ser de múltiplas naturezas, mas duas tendem a ser mais freqüentes: ora se concentram na metodologia, ora no objeto de análise, o campo de estudos organizacionais em si e, mais especificamente, de Recursos Humanos. A réplica do Pedro Lincoln tende a focalizar-se no primeiro tipo, enquanto a do Allan Barbosa foca-se no segundo. Será nessa ordem que as discutiremos.

Pedro Lincoln e as preocupações epistemológicas e metodológicas do estudo

Quando pela primeira vez lemos a réplica de Pedro Lincoln, confessamos que pensávamos ter sido a ele dada, pela RAE, uma versão incompleta ou muito distorcida do original. Afinal, o Professor Pedro Lincoln não é alguém de poucas credenciais ou falta de história no campo, e além disso é um bom amigo e respeitável colega no campo, alguém que admiramos acima de tudo. No entanto, talvez por falta de habilidade explicativa ou de clareza de nossa parte no artigo original, ou mesmo pela aparente falta de familiaridade do Pedro com a metodologia em questão, diversos dos seus pontos de crítica - além dos diversos nos quais está coberto de razão - são, em nosso ver, inadequados para o propósito do texto, ou são desinformados do método, ou ainda têm suas respostas quer seja no próprio texto, quer seja na literatura exaustivamente coberta no campo que a embasa.

Alguns dos enganos e mal-entendidos nos quais a réplica do Pedro se baseia, quando lidos por um leitor menos atento - e nesse sentido não familiarizado com a longa e respeitável tradição desse pesquisador na busca da evolução epistemológica do campo - podem ser mal compreendidos como graves acusações, e até inadequadamente aceitos como justos. Tal leitor desavisado poderia entender que Pedro nos estaria acusando, por exemplo, de (i) usar um tipo de positivismo ao qual contrapõe outro, que chama de mais convencional; (ii) credenciar o método por figuras de linguagem; (iii) arbitrariamente definir categorias e variáveis de análise; (iv) indutivamente extrair somente de números levantados generalizações para o campo sem antes partir de fundamentação teórica e renunciando ao método hipotético-dedutivo, que considera superior e convencional; (v) levantar números curiosos e sobre eles advogar uma contribuição ao campo; e (vi) amparados no que chama de "fetiche dos números", e advogando apenas estar levantando estatísticas, produzir conclusões e significações quantitativas e limitadas. Sabemos que não é a acusação simples e leviana que intenciona o Pedro, nem é sobre nosso trabalho em particular que ele critica. Boa parte de suas ponderações são genéricas, e dirigidas na verdade a meta-estudos quantitativos e análises do tipo survey que o campo tem produzido nos últimos anos. Acontece que foi apenas associado a nosso texto que Pedro teve direito à voz sobre o assunto, e a exerceu sem ter, na verdade, maior compreensão tanto sobre o método (ao qual se refere com uma familiaridade improvável, posto que ele é inédito por estas paragens e mesmo na área de Administração fora do Brasil), quanto sobre aquilo que de fato nós fizemos. Para evitar a extensão do mal-entendido naquele leitor desavisado, e por que não, para melhorar mensagens ineficazes que tenhamos emitido, é que nos detemos abaixo nos principais eixos de crítica de Pedro.

Muitas dessas críticas se fundamentam no que percebemos ser uma quase dogmática posição do Pedro contrária ao método escolhido e o que ele entende serem as premissas epistemológicas nos quais se basearia. Para discutir tudo isso, só nos resta convidarmos o Pedro a reler o texto procurando conter seu pré-conceito ao método, pois até nele encontrará várias das respostas pedidas.

Essencialmente, pedimos tanto ao Pedro, quanto ao leitor em geral, que lembre o seguinte em nosso trabalho:

(a) a pesquisa que origina este trabalho não existe no vácuo. Como bem lembra a réplica do Allan, a pesquisa está inserida em uma onda de outros trabalhos que antes fizeram as mesmas indagações. Estão lá definidas as categorias e as variáveis. Se os revisar, Pedro irá encontrá-las. Não achamos - nem nossos múltiplos revisores teriam aprovado - se revisássemos cada um desses trabalhos anteriores individualmente, dos estudos de Clóvis Machado-da-Silva e da Sylvia Vergara, até os mais de 15 trabalhos nessa vertente nos últimos 6 anos de Enanpad, em todas as áreas. Simplesmente não faria sentido. Nem haveria espaço editorial justificável. Além disso, aquelas poucas variáveis que não derivaram de estudos brasileiros anteriores, são trazidas pelo próprio método, como a análise de autocitação, que é clássica nas suas aplicações em análises de campos científicos. Juntando um grupo ao outro, as categorias e variáveis que usamos não podiam ser mais óbvias e estabelecidas. O engano, acreditamos, se deva ao engano de Pedro de tomar esta análise bibliométrica, que diga-se claramente, nunca foi feita em nosso campo no Brasil, com meta-estudos sobre a produção brasileira de forma geral, na qual este estudo sim está associado. Um engano compreensível Pedro, mas que pode produzir injustiças de julgamento, como veremos adiante.

(b) A pesquisa proposta é um levantamento citacional quantitativo que complementa análise qualitativa anterior. Como exposto no texto, antes de embarcar em qualquer análise de "números curiosos", ou de triturar dados em intrincados softwares estatísticos (o que, aliás, nós nunca fizemos, ao contrário do que indica Pedro), nós empreendemos uma exaustiva leitura qualitativa de todos os textos, compartilhando a base qualitativa gerada sobre o mesmo grupo de artigos com o estudo anterior, complementando-o. Podemos compreender que Pedro - e tantos outros - tenham tamanha antipatia ao uso de métodos quantitativos que se enganem ao deixar de perceber que no próprio texto se dá o crédito a análise qualitativa prévia. Mas não podemos simplesmente fingir que ela não existiu, ou deixar que a crítica de Pedro a uma (inexistente) análise meramente quantitativa seja entendida como verdadeira por um leitor desavisado. Ora, Pedro, se ler todos os textos, classificá-los e analisá-los do ponto de vista temático, metodológico e epistemológico, sempre usando metodologia já legitimada antes no campo (como fizemos com a mesma base em artigo anterior), e depois usar análise citacional para estudar os padrões de todas as citações feitas, como fizemos neste último trabalho, não nos dá alguma legitimidade para estabelecer relações, então simplemente o campo não se sujeita à análise objetiva, e de alguma forma se coloca acima de mortais investigadores. Não há nada de fantástico, curioso, ou arbitrário em levantar e comprovar que a maior parte da produção no período cita sempre os mesmos, uns aos outros, quando não a si próprios. E ao colocarmos os dados da forma mais bruta e exuastiva em tantas tabelas, o que esperamos é que o campo julgue por si mesmo se o mapa é ou não útil, e se o campo deve ou não refletir sobre si próprio. Não achamos justo que vocë simplesmente desqualifique a análise por uma antipatia pré-concebida ao método.

(c) Em nenhum momento fazemos apologia - nem credenciamos por qualquer maneira - o método bibliométrico como suficiente para analisar o campo. Concordamos com a maior parte das questões e limitações da análise citacional que o Pedro anuncia. Ora, o nosso próprio texto já as resume, e dá ao leitor o roteiro de crítica do método, além daquilo que ao Pedro parece incomodar. Mas o problema está em querer dizer que pelas limitações do método se possa desqualificar por completo o mapeamento, ou suas conclusões e sugestões (S1 a S7), que o Pedro prefere por ignorar no atacado. Em diversos pontos criticamos o método, e diversas vezes deixamos claro que seu uso deve ser "complementar" a outras ferramentas de análise. E, em vez de deixar isso a outrem e colocar-nos em posição de mera crítica, fizemos essa análise qualitativa anterior. E ela aponta a mesma direção. O nosso campo tem as limitações e desafios apontados, Pedro: gostemos, ou não. E mesmo que não sejamos ardorosos fãs quer seja da análise quantitativa quanto da bibliometria, temos de admitir que a crudez destes dados simplesmente revela "alguma" coisa. Se você, tal como nós, não conseguirmos admitir diversidade teórica, epistemológica e metodológica na análise do nosso campo e de seus (des)caminhos, o tipo de análise que nos restaria fazer seria, essa sim, de questionável capacidade contributiva. Além disso, a despeito das bem salientadas limitações do método, não seriam algumas das perguntas sobre nossa produção importantes o suficiente para o utilizarmos com todas as precauções e cuidados que nele estabelecemos? Não seria importante entendermos se, como trabalhos anteriores qualitativamente sugeriam, nosso programas de pós-graduação e seus grupos de pesquisa podem ter-se fechado em torno de si mesmos e duas próprias referências, em um contexto no qual tantos de nossos líderes clamam por maior ligação e criação interinstitucional de redes de pesquisa? Não seria útil ao campo compreender, em um contexto que vêr a multiplicação de periódicos acadêmicos e a discussão acalorada de critérios de qualidade, se de fato alguns veículos são preferidos por alguns desses programas, enquanto são ignorados por outros, e se tais padrões se mantêm consistentes ao longo do tempo dentro de cada instituição? Não seria conveniente saber quais são os veículos de divulgação de pesquisa com maior impacto no campo, e até que ponto a vinculação desses veículos a uma instituição são ou não determinantes nesse impacto e em sua consulta pela área? Ou ainda, não seria prudente verificarmos se, como prevê a recente literatura sobre pop management no Brasil, parte da nossa produção baseia-se em referências gerencialistas ou sem base acadêmica, ou ainda em leitura de segunda mão, via apuds, gerando conhecimento duvidoso e questionável? E não seriam todas essas indicações úteis a um campo que procura relevância e um lugar ao sol no contexto acadêmico internacional ? Pois sem uma análise bibliométrica aprofundada, Pedro, essas perguntas simplesmente não são passíveis de resposta.

(d) O estudo não usa - nem poderia usar - nem metologia indutiva nem hipotético-dedutiva. Nem usa softwares com significações embutidas. Pedro argumenta que nosso estudo deveria ter sido feito com base hipotético-dedutiva, baseando-se em hipóteses prévias derivadas de análise teórica. E depois, nos nega o direito de defesa de que o que estaríamos fazendo era simples mapeamento, indicando que a interpretação e significação é terceirizada a softwares que a imbutem e banalizam. Lamentamos, Pedro, mas não entedemos sua lógica. O estudo não é amostral, nem procura positivisticamente objetivar um campo através de análises de partes dele. Ele é um (i) levantamento quantitativo; (ii) que complementa análise qualitativa anterior; (iii) que faz um "censo" de "todo" o comportamento citacional do campo no período; e (iv) que faz tudo isso baseado em um protocolo que por mais desconhecido e antipático que lhe seja, mostra facetas do nosso campo que outros não mostraram ainda. Ele é simplesmente isso: um censo de tudo o que fizemos nesse período, e que serve de "indicador de comportamento", como salientado no texto. Nesse sentido, por exemplo é indiscutível que o percentual de citações via apuds, por exemplo, seja de um determinado montante, independente daquela citação ser positiva ou negativa, e que este constitui um indicador importante da qualidade da referência no campo. Não sabemos porque um autor usa um apud em vez do trabalho original, nem nos atrevemos a induzir nada de tal comportamento. Apenas julgamos que o número é elevado, e sugerimos que o campo estabeleça limites para tal prática, pois em "lugar algum do mundo" revisores de tais trabalhos lhe teriam maior respeito. E se queremos que nossa produção seja lida em mais algum lugar, talvez devéssemos nos importar mais em entender tão simples indicadores de qualidade. Simplesmente não entendemos como uma análise indutiva tenha sido feita, trata-se de censo integral! Tampouco fica claro como um estudo hipotético-dedutivo fosse razoável - o que seria isso, afinal? O rascunho do topógrafo antes de fazer suas medições, com base no que a teoria anterior sobre o terreno lhe indicasse? Lamento, mas não só isso não faria qualquer sentido, como nos parece, sim, descabido desqualificar um estudo por inteiro, e recusar-se a discutir qualquer sugestão que dele se derive, porque ele não segue um único caminho de geração de conhecimento no qual se decida acreditar. Levantamos todos os fatos que a metodologia nos permite levantar sobre o comportamento citacional do campo no período, e os expusemos, nus e crus. Todo o levantamento é passível de replicação e confirmação. Qualquer um que faça o mesmo estudo, usando o ferramental da metodologia adotada, encontraria as mesmas virtudes e falhas no relevo do campo. "Qualquer topógrafo, diante dos mesmos dados, desenharia o mesmo mapa". E, por fim, não conseguimos entender a que Pedro se refere com "softwares" a quem delegaríamos as subjetivações e análises. O software usado é conhecido e aberto a todos, Pedro: uma planilha eletrônica, depois importada para um banco de dados simples, desses vendidos em qualquer papelaria hoje em dia. Existem, sim, softwares especializados em realizar alguns tipos de análise bibliométrica, no entanto a nossa preocupação em compreender a metodologia e empregá-la em um ambiente novo, e portanto com suas particularidades, foi maior do que a eventual facilidade proporcionada por esses softwares. Não há uma única variável aqui que foi retirada de um algoritmo tomado por empréstimo. Simples e "suada" contagem, Pedro. Já dissemos de onde vieram as variáveis. As significações, com todas suas limitações, são inteiramente nossas. O que daí fizemos, a partir dos dados levantados e de seu cruzamento, foi problematizar o que vimos, e propor sugestões ao campo.

Essencialmente, achamos que não conseguimos nos fazer entender pelo Pedro Lincoln em relação à nossa intenção e à execução de nosso trabalho. Somente a constatação de tal potencial mal-entendido em outros leitores além dele, e a oportunidade que sua réplica nos proporciona de melhor passar nossa mensagem, justifica nosso agradecimento ao Pedro. Quando se soma a esse mal-entendido a evidente antipatia e desconhecimento do Pedro em relação ao método escolhido, revela-se que o que pode ter acontecido é que esse pesquisador tenha-se enganado e pré-julgado o que fizemos, e pode ter deixado de perceber importantes detalhes em "o que" e em "como" fizemos o levantamento. Por fim, aparentemente a partir de seu próprio viés, ele se recusa a considerar quer sejam as conclusões, quer seja qualquer das sugestões que fazemos ao campo. Em vez de ignorá-las como um todo, pela aversão estrutural que confessa ter ao método e o que ele entende serem seus pressupostos, talvez o leitor, diferente do Pedro naquele momento - com as limitações de tempo e espaço para tal que lhe eram impostas - queira debatê-las. Seria a coisa democrática a fazer.

Pedro Lincoln termina sua réplica convidando nossa tréplica, e indagando se quiçá algumas de suas observações possam ter sido injustas ou descabidas. Sinceramente, Pedro, achamos que talvez sim, um pouco. Que ao campo caiba julgar.

Mas a verdade é que este tipo de debate acadêmico por "réplicas" e "tréplicas", apesar de saudável e usual fora do Brasil, pode provocar fortes reações e contra-reações pelos mal-entendidos que podem gerar.

Ora, como se diz popularmente, quem está na chuva está pra se molhar: além disso, a crítica é sempre saudável na medida em que estimula o debate. No entanto, alguns dos enganos e mal-entendidos nos quais Pedro se baseia podem, na letra impressa, adquirir status de verdades incontestes, e nesse sentido não podem ficar aqui sem uma correção. É nesse espírito que acima discutimos esses enganos, e procuramos oferecer ao leitor, para sua reflexão e derradeiro veredito, nossas ponderações.

Que entenda o leitor, no entanto, que tais ponderações refletem nada mais do que a tentativa dos autores aproveitarem críticas - mesmo aquelas que consideram injustas - para estender sua mensagem e estimular o debate sobre suas sugestões, que são na verdade nosso maior objetivo. Nenhum desrespeito ou desavença é intencionada, e desconfiamos que o Pedro e nós daremos boas risadas sobre essas e outras quando em breve nos re-encontrarmos. Afinal, apesar de todas as reações e independentemente do julgamento sobre a "utilidade" ou não da pesquisa em questão, acreditamos que o debate proporcionado por ela e a apresentação de um novo tipo de metodologia na academia brasileira em Administração são por si só resultados significativos. Em nossa opinião, esse tipo de diálogo entre pesquisadores do campo, por mais acalorado que seja, reflete mais do que as relações entre colegas, mas sim o mútuo engajamento em ajudar a academia brasileira a tornar-se mais madura, e nesse sentido deve ser encorajado.

Allan e as preocupações estruturais e conjunturais do objeto de estudo

Como dito anteriormente, a réplica do Allan Barbosa foca-se no objeto de análise em si, e não em considerações epistemológicas e metodológicas do estudo, como fez Pedro Lincoln.

Allan, em nosso entender, acertadamente procura oferecer ao leitor um valioso complemento ao levantamento cru que o estudo oferece. Ele salienta como o objeto do estudo - a produção científica em Recursos Humanos na década de 1990 - não se situa no vácuo, e que diversos fatores estruturais e conjunturais podem ajudar a explicar os elementos que produziram tais resultados.

Nesse sentido, achamos tal corte em perspectiva não apenas valioso, como complementar e salutar ao leitor e analista que procure entender, no presente ou em retrospectiva, "porque" tal produção no campo apresentou-se em levantamento da forma descrita no artigo. De fato, a pergunta de "por que" tais contornos se apresentam não foi feita antes, por nós não foi discutida e, assim, o texto do Allan pode de fato ser rico complemento e pano de fundo ao leitor interessado.

O que Allan também sugere é que as sugestões (S1 a S7) podem não ser suficientes para superar os desafios e limitações do campo encontradas em nosso estudo. De fato, embora não aponte complementos diretamente (nem lhe caberia ou seria possível em tão curta réplica) ao quadro de sugestões ao campo, Allan oferece elementos que, quando somados aos dados mais operacionais do estudo, apenas enriquecem o debate que em suma propomos.

Nesse sentido, o Allan acerta em fazer tais complementos, e beneficiam-se o leitor e o campo, que podem empreender análise mais abrangente e menos seccional de uma área que só pode crescer qualitativamente pelo debate e pelo diálogo autocrítico.

Só nos caberia talvez lembrar, menos ao Allan e mais ao leitor de outras áreas, que muito pouco do que foi discutido nesse trabalho parece ser exclusivo à área de RH. Trabalhos complementares a este, não apenas os nossos, mas de outros autores que sabemos estarem empreendendo tais levantamentos em outras áreas, estão apontando para muitas das características de relevo que nosso mapa ofereceu.

Podemos, como sempre, optar por ceder à tentação de focalizar cada um dos incômodos que nos trazem os topógrafos, ou ainda as possíveis imperfeições do mapa; ou podemos, por outro lado, nos lançar à reflexão e ao debate sobre como podemos nos superar, enquanto área de conhecimento, e enquanto pesquisadores individuais. Nossa esperança é que, seja de uma forma ou de outra, pela provocação, rejeição ou incentivo, nosso mapa mostre mais veredas e caminhos de evolução ao campo, do que antes percebíamos lá existirem.

Artigo convidado. Aprovado em 02.06.2004.

Miguel P. Caldas

Associate Professor of International Business na Loyola University New Orleans. Interesses de pesquisa em teoria das organizações, cultura organizacional e mudança e design organizacional.

E-mail: mpcaldas@loyno.edu

Endereço: 6363 St. Charles Avenue, Box 15. New Orleans, LA 70118.

Tatiana Tinoco

Mestranda em Administração de Empresas pela FGV-EAESP. Interesses de pesquisa em recursos humanos, teoria das organizações e ensino e pesquisa em Administração.

E-mail: tatianat@gvmail.br

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Mar 2007
  • Data do Fascículo
    Dez 2004
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