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Papel do farmacêutico no seguimento farmacoterapêutico para o controle da dor de origem oncológica

Resumos

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: A dor é um sintoma frequente nas neoplasias malignas, porém na maioria das vezes o farmacêutico da farmácia hospitalar diante da enorme tarefa burocrática que o afastam do paciente, não tem contribuído significativamente na assistência ao paciente com dor oncológica. O objetivo deste estudo foi propor a inserção o profissional farmacêutico no controle da dor de origem oncológica visando o uso racional e o monitoramento das reações adversas a medicamentos. CONTEÚDO: Para o controle efetivo do quadro álgico, implementação de medidas analgésicas e avaliação da eficácia terapêutica da dor faz-se essencial o uso correto da "Guia para Tratamento da Dor no Câncer" da Organização Mundial de Saúde (OMS), o qual proporciona diretrizes para o controle da dor na maioria dos pacientes com câncer avançado, e ainda, é fundamental o relato da experiência dolorosa do paciente aos profissionais da saúde. CONCLUSÃO: As escalas de mensuração da dor aliadas ao protocolo preconizado pela OMS tem-se mostrado um instrumento essencial para o uso racional de medicamentos. O profissional farmacêutico, além de cumprir com sua atividade corrente, está capacitado para interagir nas equipes multidisciplinares, auxiliando no tratamento álgico de pacientes oncológicos, avaliando o comprimento desse protocolo estabelecido pela OMS no controle da dor.

Algia em oncologia; Cuidados paliativos; Escada analgésica; Mensuração da Dor; Profissional farmacêutico


BACKGROUND AND OBJECTIVES: Pain is a frequent cancer symptom, however most of the times pharmacists of the hospital pharmacy, due to the huge bureaucratic tasks that depart them from patients, have not significantly contributed in assisting cancer pain patients. This study aimed at proposing the insertion of pharmacists in the cancer pain control team aiming at the rational use of drugs at and monitoring patients' adverse reactions. CONTENTS: For effective pain control, implementation of analgesic measures and assessment of therapeutic efficacy, it is critical to adequately use the "Guide to Cancer Pain Management" of the World Health Organization (WHO), which establishes guidelines for controlling pain of most advanced cancer patients; it is also fundamental to report patients' painful experience to health professionals. CONCLUSION: Pain measurement scales added to WHO's recommended protocol have been shown to be a critical tool for the rational use of drugs. Pharmacists, in addition to performing their daily activities, are qualified to interact in multidisciplinary teams helping controlling cancer patients' pain, by evaluating the compliance with this WHO protocol to control pain.

Analgesic ladder; Cancer pain; Palliative care; Pain measurement; Pharmacist


ARTIGO DE REVISÃO

Papel do farmacêutico no seguimento farmacoterapêutico para o controle da dor de origem oncológica* * Recebido do Curso de Farmácia da Universidade de Caxias do Sul (UCS). Caxias do Sul, RS, Brasil.

Mari Lisa RabeloI; Márcio Luis Lima BorellaII

IAcadêmica do Curso de Farmácia da Universidade de Caxias do Sul (UCS). Caxias do Sul, RS, Brasil

IIDocente do Curso de Farmácia da Universidade de Caxias do Sul (UCS). Caxias do Sul, RS, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Mari Lisa Rabelo Rua Francisco Getúlio Vargas, 1130 95070-560 Caxias do Sul, RS E-mail: marilisa.rabelo@gmail.com

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: A dor é um sintoma frequente nas neoplasias malignas, porém na maioria das vezes o farmacêutico da farmácia hospitalar diante da enorme tarefa burocrática que o afastam do paciente, não tem contribuído significativamente na assistência ao paciente com dor oncológica. O objetivo deste estudo foi propor a inserção o profissional farmacêutico no controle da dor de origem oncológica visando o uso racional e o monitoramento das reações adversas a medicamentos.

CONTEÚDO: Para o controle efetivo do quadro álgico, implementação de medidas analgésicas e avaliação da eficácia terapêutica da dor faz-se essencial o uso correto da "Guia para Tratamento da Dor no Câncer" da Organização Mundial de Saúde (OMS), o qual proporciona diretrizes para o controle da dor na maioria dos pacientes com câncer avançado, e ainda, é fundamental o relato da experiência dolorosa do paciente aos profissionais da saúde.

CONCLUSÃO: As escalas de mensuração da dor aliadas ao protocolo preconizado pela OMS tem-se mostrado um instrumento essencial para o uso racional de medicamentos. O profissional farmacêutico, além de cumprir com sua atividade corrente, está capacitado para interagir nas equipes multidisciplinares, auxiliando no tratamento álgico de pacientes oncológicos, avaliando o comprimento desse protocolo estabelecido pela OMS no controle da dor.

Descritores: Algia em oncologia, Cuidados paliativos, Escada analgésica, Mensuração da Dor, Profissional farmacêutico.

INTRODUÇÃO

Atualmente a dor é uma das maiores causas de incapacidade e sofrimento para pacientes com câncer em progressão, cerca de 80% destes pacientes experimentarão algum tipo de dor1. Um aspecto importante a ser considerado é que dor crônica acomete cerca de 50% dos pacientes com câncer em todos os estágios da doença e em 70% nas neoplasias avançadas2. Em aproximadamente 20% de pacientes com câncer a dor pode ser resultante do tratamento cirúrgico, quimioterápico e radioterápico3, no entanto, também pode ser causada diretamente pelo tumor, ou por motivos não relacionados à doença oncológica como as alterações metabólicas, infecciosas, carenciais e degenerativas1.

Ajudar indivíduos com doenças avançadas e potencialmente fatais, as chamadas doenças terminais, e seus familiares em um dos momentos mais cruciais de suas vidas é uma atividade ou um modelo de atenção à saúde que vem sendo denominado como "cuidados paliativos"4. A assistência paliativa é voltada ao controle de sintomas, sem função curativa, com vistas a preservar a qualidade de vida (QV) até o final. Os cuidados visam à promoção de conforto e são basicamente voltados para higiene, alimentação, curativos e cuidados com ostomias, e atenção sobre analgesia, observando-se, portanto, as necessidades de diminuição de sofrimento e aumento de conforto5.

O controle efetivo da dor oncológica em cuidados paliativos exige uma equipe multidisciplinar, a qual deve seguir o protocolo proposto pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e utilizar fármacos por via oral de acordo com a Escada Analgésica; esta pode proporcionar alivio da dor em 70% a 90% dos pacientes, reservando a utilização de tratamentos intervencionistas para situações especiais6. No entanto, na grande maioria das vezes o profissional farmacêutico da farmácia hospitalar tem uma enorme gama de tarefas burocráticas que o afastam do paciente.

Com a falta de uma rotina de mensuração da dor ou da participação integral da equipe de saúde não se pode obter conforto satisfatório, melhorando a QV destes pacientes.

Neste contexto, o presente estudo teve como objetivo propor a inserção do profissional farmacêutico nos cuidados paliativos do paciente oncológico, através da análise de prescrições de pacientes com dor, visando o uso racional e o monitoramento de reações adversas a medicamentos (RAM).

CONTEÚDO

Diariamente todos pacientes oncológicos devem ser avaliados quanto à presença e intensidade da dor, atualmente, devido à proximidade da equipe de enfermagem com o paciente, os enfermeiros são mais bem indicados7. No entanto, instrumentos de avaliação e mensuração raramente são usados para monitorar tal experiência8.

Nesse contexto, na tentativa de documentar de forma objetiva e obter sucesso no alivio da dor, foram desenvolvidos instrumentos que permitem a escolha da terapêutica mais adequada para cada paciente. Em 1986, a OMS reuniu especialistas que elaboraram o "Guia para Tratamento da Dor no Câncer". Este protocolo tem por base a preconização do uso preferencial da via oral, a administração dos fármacos em horários pré-estabelecidos e não mais "se necessário" e, escalonamento progressivo de analgésicos, conhecido como "Escada Analgésica da OMS" (Figura 1)6,9.


Recentemente, foi proposto o acréscimo de um degrau à escada analgésica, onde seriam colocados os procedimentos invasivos, como os bloqueios anestésicos e os procedimentos cirúrgicos10. Este protocolo para o tratamento da dor no câncer é baseado em três passos principais, estes compreendem uma sequência crescente, no que diz respeito à potência, de analgésicos não opioides e progredindo para os opioides, quando a dor for moderada ou intensa. Propõe-se o uso de analgésicos anti-inflamatórios não esteroides (AINES), de opioides fracos e opioides fortes, nesta sequência2,6,11. A estes analgésicos podem ser associados a fármacos adjuvantes como os antidepressivos e anticonvulsivantes, entre outros. A mudança de um passo para outro geralmente é devida à analgesia inadequada - ocasionada pelo aumento da dor - devida à progressão da doença6. O ácido acetilsalicílico, a codeína e a morfina são os analgésicos-padrões desta proposta2. O tratamento será considerado adequado quando existir congruência entre o nível de dor relatado pelo paciente e a potência do analgésico prescrito6,9.

Segundo a OMS, esta metodologia foi testada em diversos centros em diferentes países comprovando sua eficácia6. No entanto alguns autores preferem manter cautela com a escada analgésica proposta pela OMS, estes assumem que não deve ser empregada a todos os tipos de dores, por isso, salientam a importância de identificar o tipo de dor que o paciente apresenta12. Devido a estas e outras numerosas críticas, em seu 20º aniversário, em 2006, a escada analgésica foi debatida por especialistas e após, foi publicado um estudo com provas que apóiam cada passo descrito neste protocolo13.

Assim sendo, propõe-se o uso da escada analgésica da OMS, através de uma equipe multidisciplinar avaliando as necessidades individuais de cada paciente. E, para isso é recomendado que o profissional farmacêutico gerenciasse melhor seu tempo, diminuindo as tarefas administrativas e aumentando as atividades clínicas como na avaliação da prescrição analgésica, se esta é coerente com os protocolos e diretrizes estabelecidas pela OMS. Fazer com que esses fármacos sejam usados de forma segura é um dos papéis fundamentais do profissional farmacêutico, ainda mais que seu envolvimento com o paciente resulta na prevenção e na detecção precoce de RAM assim, a atuação do farmacêutico não deve se limitar as atividades burocráticas. No entanto, este profissional também deve assegurar que a prescrição seja o mais segura possível, com base no conhecimento de fatores relevantes sobre fármacos e pacientes.

A proposta de inserção do profissional farmacêutico também atribui a este a comparação do padrão proposto pela OMS com a prescrição álgica e os resultados obtidos na mensuração. O farmacêutico classificará esta prescrição como compatíveis, compatíveis com restrições ou incompatíveis. Compatível refere-se aos esquemas terapêuticos contemplados na proposta analgésica da OMS, compatível com restrições refere-se a esquemas terapêuticos que apresentavam desvio da proposta da escada analgésica e, por não compatível, esquemas terapêuticos divergentes da proposta da OMS. Se necessário, o médico prescritor deverá ser alertado sobre a incompatibilidade visualizada na prescrição realizada ao paciente oncológico com algia.

Aproximando o profissional farmacêutico ao paciente, muda-se a postura comumente empregada nestes ambientes, passa-se a enxergar o paciente como foco de seu trabalho. Neste sentido, com os recursos já disponíveis, trabalhando em parceria com os pacientes, os médicos, farmacêuticos e equipe de enfermagem podem desempenhar um papel importantíssimo na QV dos pacientes, revisando os esquemas analgésicos prescritos e gerenciando a intervenção e interpretando as recomendações de promoção da saúde.

CONCLUSÃO

A experiência dolorosa é um fenômeno individual e, para caracterizá-la, deve-se adotar um padrão de avaliação diária da dor do paciente oncológico. Em todos os casos, o tratamento deve ser individualizado, de acordo com as necessidades do paciente e dirigido, se possível, à causa desencadeante de dor.

As escalas de mensuração da dor aliadas ao protocolo preconizado pela OMS tem-se mostrado um instrumento essencial para o uso racional de medicamentos. Desta maneira pode-se definir a terapêutica medicamentosa mais adequada ao paciente, garantindo que seja avaliado aquilo que o paciente vivencia, e não o que o profissional julga que seja sentido. No entanto, com o passar do tempo assume-se a necessidade de ser restaurada, modelada ou modificada.

O papel do profissional farmacêutico, por meio de suas habilidades e conhecimentos, torna-se uma ferramenta importante ao analisar a coerência entre estes dados coletados pela equipe de enfermagem e a prescrição realizada pelo profissional médico. Avalia-se assim o uso adequado dos protocolos estabelecidos pela OMS, garantindo melhor qualidade ao paciente no final de sua vida.

Apresentado em 22 de agosto de 2011.

Aceito para publicação em 05 de fevereiro de 2013.

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  • Endereço para correspondência
    Mari Lisa Rabelo
    Rua Francisco Getúlio Vargas, 1130
    95070-560 Caxias do Sul, RS
    E-mail:
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    Recebido do Curso de Farmácia da Universidade de Caxias do Sul (UCS). Caxias do Sul, RS, Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Abr 2013
    • Data do Fascículo
      Mar 2013

    Histórico

    • Recebido
      22 Ago 2011
    • Aceito
      05 Fev 2013
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