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Os valores da corrupção: administração de bens apreendidos e confiscados

THE VALUES OF CORRUPTION: ADMINISTRATION OF SEIZED AND CONFISCATED ASSETS

Resumo

O artigo se dedica a explorar os valores patrimoniais e extrapatrimoniais envolvidos em casos de corrupção. A pesquisa se inspira em recomendações que organismos internacionais – como as Nações Unidas, a Organização dos Estados Americanos, o Banco Mundial e a Transparência Internacional – construíram para enfrentar esse problema. Penalistas e internacionalistas que participam dessas reflexões engendradas nas reuniões dos foros internacionais delimitam o marco teórico do trabalho, cuja abordagem transnacional é complementada por informações nacionais extraídas de banco de dados oficiais. O confisco de bens constitui estratégia privilegiada para reagir à corrupção, por ser medida que afeta o lucro, objetivo principal do criminoso econômico. O confisco só será possível, contudo, caso se adotem medidas cautelares para preservar o valor dos bens enquanto o respectivo processo judicial se desenvolve. A constrição temporária desses bens os leva à custódia do Estado, que assume a responsabilidade de administrá-los de maneira economicamente eficiente.

Direito internacional; corrupção; recuperação de ativos; administração de bens apreendidos e confiscados

Abstract

The article is dedicated to explore the touchable and untouchable values related to corruption. The research is inspired by reflections that international organizations – such as the United Nations, the Organization of American States, the World Bank and the Transparency International – have built to address the problem. Criminalists and internationalists who participate in these reflections engendered in international forums meetings delimit the theoretical framework of the article. The confiscation of property is a privileged strategy to respond to corruption, because it affects the profit, which is the main purpose of economic criminal activity. However, confiscation is only possible if provisional measures are previously adopted in order to preserve the value of goods while the trial reaches an end. The temporary constriction of these assets implies their custody by the State, who is responsible to manage them in a cost-effective way.

International law; corruption; asset recovering; management of seized and confiscated assets

Introdução

Processos judiciais que julgam práticas de corrupção frequentemente requerem a adoção de medidas sobre ativos que constituem produto, proveito ou mesmo instrumento do crime. Nesses casos, o Estado é chamado a lidar com o desafio de gerenciar, com efetividade, ativos apreendidos e confiscados1 1 Autores como Rogério Filippetto (2011, p. 182) diferenciam o conceito de confisco e de perdimento de ativos. O autor entende que confisco soa como exercício de ato de império de iniciativa do Estado, de conteúdo punitivo, como expropriação do patrimônio pessoal. Ao contrário, perdimento foi o termo preferido pelo texto constitucional para prescrever as sanções penais aplicáveis no Brasil (inciso XLVI do artigo 5º). A esse despeito, adotaremos a postura de Bonfim e Bonfim (2005, p. 97) no sentido de que o termo confisco pode se aplicar ao perdimento de bens e valores como efeito genérico da condenação penal. Importantes marcos normativos internacionais ratificam essa orientação. No âmbito das Nações Unidas, a Convenção contra o tráfico ilícito de entorpecentes e substâncias psicotrópicas (artigo 1º, g), a Convenção contra o crime organizado transnacional (artigo 2º, g) e a Convenção contra a corrupção (artigo 2º, g) definem confisco como a privação de algum bem, em caráter definitivo, por decisão de um tribunal ou de outra autoridade competente. A reiterada menção que as convenções internacionais fazem ao confisco como expropriação legal de bens de origem ilícita parece fundamentar nosso alinhamento à permissão de adotá-lo como termo sinônimo de perdimento de bens. no âmbito de processos dessa natureza. Este estudo explora diretrizes internacionais e iniciativas nacionais sobre administração de bens de origem ilícita que estão, provisória ou definitivamente, sob a custódia estatal. A reflexão desenvolvida sobre o tema reconhece que a economia globalizada alça o fenômeno da corrupção a um patamar transnacional e, por isso, o estudo salienta as diretrizes internacionais sobre a matéria. Com efeito, organizações internacionais constituem espaços privilegiados para o desenvolvimento de orientações que superam forças políticas e econômicas que eventualmente constrinjam iniciativas em nível nacional (MICHALOWSKI; KRAMER, 1987MICHALOWSKI, Raymond J.; KRAMER, Ronald C. The space between the laws: the problem of corporate crime in a transnational context. Social Problems, v. 34, n. 1, 1987.).

A arena internacional conta com a participação de países em diferentes estágios de desenvolvimento e com diferentes estratégias econômicas, fatores esses que influenciam as negociações entre os múltiplos atores, com vistas a um acordo final. Tais acordos constituem diretrizes que denotam o consenso político atingido pela comunidade internacional para o controle de práticas corruptas. Esse consenso é particularmente importante quando se trata da administração de ativos apreendidos em casos de corrupção, uma vez que o fluxo de capital ilícito entre países é uma característica do mundo globalizado, movido por uma economia interconectada, o que requer soluções cujos horizontes também transponham as fronteiras nacionais (AAS, 2010AAS, Katja Franko. Global criminology. In: McLaughlin, Eugene; Newburn, Tim (eds). The Sage handbook of criminological theory. Londres: Sage, 2010.).

Com efeito, o Brasil é Estado parte de convenções internacionais contra a corrupção e, como tal, compromete-se a desenvolver políticas públicas em conformidade com os termos desses tratados (ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, 2014ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO. Brazil – OCDE Anti-Bribery Convention. 2014. Disponível em: <http://www.oecd.org/daf/anti-bribery/brazil-oecdanti-briberyconvention.htm >. Acesso em: 13 fev. 2017.
http://www.oecd.org/daf/anti-bribery/bra...
; UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME, 2017UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME. Brazil. 2017. Disponível em: <https://www.unodc.org/unodc/treaties/CAC/country-profile/CountryProfile.html?code=BRA>. Acesso em: 13 fev. 2017.
https://www.unodc.org/unodc/treaties/CAC...
). A aderência do Brasil aos termos das convenções internacionais é periodicamente analisada por meio de avaliações conduzidas pela organização internacional correspondente, em colaboração com autoridades nacionais. Os relatórios publicados como resultado de tais avaliações constituem importantes fontes de informação sobre medidas adotadas em âmbito doméstico para cumprir com as obrigações internacionais e, por isso, são utilizados neste artigo como referência metodológica.

A resposta à questão inicial passa por identificar e analisar os problemas estatais para gerenciamento de ativos apreendidos ou confiscados, a fim de encontrar possíveis alternativas à disposição das autoridades de persecução. Esses desafios são comuns à comunidade de nações, de modo que os países se organizam em foros internacionais para pensar soluções criativas e inovadoras de alcançar os melhores resultados no enfrentamento à corrupção. As estratégias contemporâneas recomendam enfrentar a criminalidade econômica sob a perspectiva econômica. Em outras palavras, privar corruptos e corruptores dos recursos provenientes da corrupção. A medida, por óbvio, traz ônus ao Estado: se retira o patrimônio da esfera individual, assume para si a tarefa de administrá-lo. Por isso o estudo também se dedica a explorar os resultados alcançados com o gerenciamento desses bens, para, enfim, apresentar as possibilidades de aprimoramento do modelo estatal de gestão, com fundamento tanto em instrumentos já previstos pelo ordenamento jurídico nacional, como a alienação antecipada de bens, quanto em possíveis encaminhamentos futuros, como a criação de um escritório especializado em recuperação de ativos.

O trabalho está organizado de modo a privilegiar essa metodologia que, inicialmente, aborda danos econômicos, sociais e políticos da corrupção, valendo-se de contribuições aportadas por instituições como o Banco Mundial e o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos. Esse item introdutório do artigo chama a atenção para as demandas sociais que exigem a gestão dos recursos públicos de maneira íntegra, sob pena de ruptura da coesão social e de grave fragilização da governança. Dados de pesquisas recentes desenvolvidas pela Transparência Internacional ilustram o impacto da corrupção na opinião pública brasileira. A resposta do Estado a essas demandas também é abordada, mediante uma compilação das principais iniciativas de enfrentamento da corrupção, desenvolvidas no último decênio de forma coordenada pelos três Poderes da República.

O item seguinte é dedicado a explorar as especificidades da resposta estatal à criminalidade econômica. Como a corrupção é delito que se reveste de grande viés patrimonial, o artigo defende a razoabilidade de enfrentá-lo de modo a retirar do autor do crime o que ele auferiu com a conduta ilícita, sejam bens, direitos ou valores. Nesse sentido, a recuperação de ativos é erigida como estratégia primordial de lidar com a corrupção, com efeitos positivos tanto para dissuadir a prática do crime quanto para reparar os danos dele decorrentes. Cogitar o confisco dos bens somente ao final do processo judicial, contudo, é inútil. A essa altura, o autor do crime provavelmente terá se desfeito do bem caso ele tenha ficado sob a sua custódia. Por isso, o Estado pode se valer de medidas acautelatórias para avocar a responsabilidade de preservar o valor econômico dos bens até decisão definitiva sobre a licitude. Essa medida é recomendada por convenções internacionais e encontra amparo no ordenamento jurídico pátrio.

Por fim, o terceiro item aborda os desafios da consequência lógica da apreensão de bens pelo Estado: a responsabilidade de administrá-los. O artigo apresenta a normativa nacional e estrangeira e os dados de sistemas públicos de estatísticas oficiais sobre a gestão de bens apreendidos ou confiscados no âmbito de processos judiciais. A análise da carência de estrutura estatal para administração de bens leva em consideração dois pontos nevrálgicos do problema: a pluralidade da natureza dos bens e o longo prazo em que ficam sob a custódia estatal. A parte final do artigo identifica as iniciativas em que o Brasil se envolve, tanto em âmbito nacional quanto internacional, para superar a deficiência reconhecida em gerir bens de origem ilícita. A conjunção das variáveis exploradas ressalta a relevância da pesquisa para propor alternativas à carência de estrutura pública de gestão de bens sob o poder do Estado, de modo a priorizar sugestões e recomendações para a intervenção na realidade. Com efeito, o protagonismo do tema e as implicações para a governabilidade e para a estabilidade social denotam a importância do assunto como matéria de pesquisa (MURRAY, 2013MURRAY, Kenneth. A square go: tackling organised crime where it doesn’t want to be tackled. Journal of Money Laundering Control, v. 16, n. 2, 2013.).

1 Corrupção: dados econômicos, sociais e políticos

As últimas décadas foram marcadas por crescentes reações contra a corrupção (NAYLOR, 2003NAYLOR, Robin Thomas. Towards a general theory of profit-driven crimes. The British Journal of Criminology, v. 43, n. 1. Oxford: Oxford University Press, 2003.). O tema é frequente nas manchetes e se constitui, progressivamente, como elemento balizador da satisfação pública com o governo (BERGERON, 2013BERGERON, James. Transnational organised crime and international security. The RUSI Journal, v. 158, n. 2, 2013.). Algumas dessas reações assumem forma de manifestação pública para comunicar que a corrupção é prática que não se coaduna com o imperativo da eficiência dos serviços próprios da administração do Estado e do comportamento ético dos poderes estatais constituídos.

No Brasil, as manifestações de junho de 2013 tiveram como um de seus principais motes a indignação com o mau uso dos recursos públicos. Pesquisa desenvolvida pela Transparência Internacional2 2 A Transparência Internacional é uma organização não governamental que visa a enfrentar a corrupção em âmbito global por meio de ações que congregam governos, empresas e sociedade civil. A organização está representada em mais de 100 países e é referência mundialmente reconhecida pela publicação anual do relatório do índice de percepção da corrupção, cujos resultados são reportados ao Grupo de Trabalho Anticorrupção do G20. revelou que o índice de percepção da corrupção entre brasileiros coloca o País na 79ª posição entre os 176 países pesquisados. A 1ª posição é ocupada pela Dinamarca, reconhecida como o país menos corrupto (TRANSPARÊNCIA INTERNACIONAL, 2017TRANSPARÊNCIA INTERNACIONAL. Corruption Perceptions Index 2016. 2017. Disponível em: <https://www.transparency.org/news/feature/corruption_perceptions_index_2016>. Acesso em: 12 jun. 2017.
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). Em 2013, a organização não governamental divulgou dados agregados que informam que 35% dos brasileiros sentem que o nível de corrupção no País é estável. Apenas 23% dos entrevistados reconhecem como efetivas as ações do governo contra a corrupção, o que a torna um sério problema no setor público nacional para 70% deles. Os partidos políticos foram identificados como as instituições mais corruptas, imediatamente seguidas pelo Congresso Nacional e pela Polícia (TRANSPARÊNCIA INTERNACIONAL, 2013TRANSPARÊNCIA INTERNACIONAL. Global Corruption Barometer: Brazil. 2013. Disponível em: <https://www.transparency.org/gcb2013/country/?country=brazil>. Acesso em: 9 jan. 2016.
https://www.transparency.org/gcb2013/cou...
).

O Banco Mundial também pesquisa o controle da corrupção pelos países. O conceito é entendido como a percepção da medida com que o poder público é exercido para ganhos privados, independentemente da extensão da corrupção, e constitui uma das variáveis para aferir os indicadores de governança de um país. O índice de controle da corrupção varia entre 0 e 100. Em que pese a melhor performance brasileira em 2011, quando o índice de controle de corrupção atingiu a marca de 63, dados de 2015 apontam o pior desempenho do País, com índice de 41,35 (BANCO MUNDIAL, 2016BANCO MUNDIAL. Worldwide governance indicators: country data report for Brazil. Disponível em: <http://info.worldbank.org/governance/wgi/index.aspx#countryReports>. Acesso em: 9 jan. 2016.
http://info.worldbank.org/governance/wgi...
).

O movimento anticorrupção não se restringe, contudo, às fronteiras nacionais. Manifestações em diversos outros países pedem o enfrentamento de ações ímprobas. A própria Organização das Nações Unidas (ONU) fez uma leitura das revoluções da Primavera Árabe como “uma veemente rejeição da corrupção e um grito por integridade” (UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME, 2011aUNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME. Primavera árabe mostra a rejeição da população contra a corrupção e pedido por integridade, 2011a. Disponível em: <http://www.unodc.org/lpo-brazil/pt/frontpage/2011/10/25-primavera-arabe-mostra-a-rejeicao-da-populacao-contra-a-corrupcao-e-pedido-por-integridade-disse-diretor-executivo-do-unodc-na-abertura-da-conferencia-global-contra-a-corrupcao.html>. Acesso em: 3 jan. 2015.
http://www.unodc.org/lpo-brazil/pt/front...
). Alguns anos depois, o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, pelo acrônimo em inglês) revelou atividades econômicas ilícitas que envolviam a subsidiária do Banco HSBC na Suíça (CONSÓRCIO INTERNACIONAL DE JORNALISTAS INVESTIGATIVOS, 2017aCONSÓRCIO INTERNACIONAL DE JORNALISTAS INVESTIGATIVOS. HSBC pays Swiss authorities record-breaking fine. Disponível em: <https://www.icij.org/blog/2015/06/hsbc-pays-swiss-authorities-record-breaking-fine>. Acesso em: 13 fev. 2017a.
https://www.icij.org/blog/2015/06/hsbc-p...
). O país inspirou o nome da investigação colaborativa, batizada como Swiss Leaks (CONSÓRCIO INTERNACIONAL DE JORNALISTAS INVESTIGATIVOS, 2017bCONSÓRCIO INTERNACIONAL DE JORNALISTAS INVESTIGATIVOS. Swiss leaks: murky cash sheltered by bank secrecy. Disponível em: <https://www.icij.org/project/swiss-leaks/about-project-swiss-leaks >. Acesso em: 13 fev. 2017b.
https://www.icij.org/project/swiss-leaks...
), que expôs práticas de suborno e outros ilícitos cometidos por empresários e personalidades de mais de 200 países. Também foram reveladas transações financeiras suspeitas praticadas por autoridades políticas de países como Argélia, Djibouti, Filipinas, Geórgia, Grã-Bretanha, Índia, Liechtenstein, Líbano, México, Paraguai, Quênia, República Democrática do Congo, Romênia, Ruanda, Rússia, Senegal, Tunísia, Ucrânia e Zimbábue.

No ano seguinte, o ICIJ revelou a existência de transações ilícitas de capital financeiro por meio de milhares de empresas de fachada. A investigação ficou conhecida como o maior vazamento da história sobre informações privadas dessa natureza (CONSÓRCIO INTERNACIONAL DE JORNALISTAS INVESTIGATIVOS, 2017cCONSÓRCIO INTERNACIONAL DE JORNALISTAS INVESTIGATIVOS. Panama papers. About this project. Disponível em: <https://panamapapers.icij.org/about.html >. Acesso em: 13 fev. 2017c.
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): Panama Papers, escândalo cujo nome foi dado em referência ao país que sedia o escritório jurídico (Mossack Fonseca) responsável pela criação de estruturas corporativas, frequentemente em paraísos fiscais, com o objetivo de proteger a identidade de pessoas que lucram com ativos ilícitos. O escândalo teve alcance global e expôs pessoas de mais de 200 países, muitas das quais envolvidas em casos de corrupção e em práticas correlatas. A repercussão impactou a opinião pública sobre o governo de alguns países, o que denota a relação que se tem visto estabelecer entre escândalos de corrupção, estabilidade política e governabilidade (GREEN, 2005GREEN, Penny. Disaster by design: Corruption, construction and catastrophe. The British Journal of Criminology, v. 45, n. 4. Oxford: University Press, 2005.; UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME, 2011aCONSÓRCIO INTERNACIONAL DE JORNALISTAS INVESTIGATIVOS. HSBC pays Swiss authorities record-breaking fine. Disponível em: <https://www.icij.org/blog/2015/06/hsbc-pays-swiss-authorities-record-breaking-fine>. Acesso em: 13 fev. 2017a.
https://www.icij.org/blog/2015/06/hsbc-p...
).

Rejeitar a corrupção é compreensível. A gestão criminosa de recursos públicos prejudica sobremaneira o desenvolvimento dos países. O desvio de dinheiro impede o desenvolvimento de obras públicas e a manutenção de serviços essenciais, o que afeta a circulação de recursos e a geração de empregos e riquezas. Investidores não se interessam em alocar recursos a áreas onde prevalecem atividades de corrupção e de descontrole administrativo. Por isso, o subdesenvolvimento econômico e social é condição que não pode ser superada sem o enfrentamento do abuso de poderes confiados ao Estado e ilegalmente utilizados para obter ganhos privados.

Uma atuação governamental comprometida com o desenvolvimento, com a legalidade e com a probidade pressupõe, portanto, a construção de uma pauta permanente de enfrentamento à corrupção. Isso porque a malversação de recursos públicos dificulta a prestação de serviços em prol da cidadania, o que, em última análise, gera um quadro de desesperança na sociedade, que pode pôr em risco a legitimidade de gestão do poder público.

A reivindicação por uma governança pública transparente ocupa, de fato, as agendas nacional e internacional. Em âmbito nacional, o título XI do Código Penal cuida dos crimes contra a administração pública, atribuindo penas a diversas condutas ímprobas. As fórmulas tradicionalmente concebidas pelo direito penal, todavia, frequentemente não são capazes de oferecer respostas adequadas à criminalidade econômica, como a corrupção. Estratégias preventivas assumem cada vez mais importância sobre medidas tardiamente punitivas. Nesse contexto se fortalece a integração das esferas civil, administrativa e penal – sem, contudo, confundirem-se – para que cada seara disponibilize os instrumentos de que dispõe para enfrentar a corrupção.

Sanções civis e penais são aplicadas, quando cabíveis, por determinação judicial. A competência judiciária exclusiva para estabelecer tais sanções não significa, contudo, a coincidência de procedimentos. A jurisdição penal dos tribunais conta com ferramentas próprias, diferentes daquelas de que se vale a jurisdição civil. Em que pese ambas as jurisdições compartilharem a possibilidade de aplicar sanções pecuniárias e de determinar o confisco e a devolução de ativos, penas privativas de liberdade, por exemplo, só se aplicam em julgamentos criminais. Nada obstante, o Poder Judiciário não está isolado no esforço de enfrentar a corrupção. Sanções administrativas podem ser infligidas pela Administração Pública e envolvem a cominação de multa e de outras coações pecuniárias, a decretação do confisco e a restituição de ativos, além da aplicação de advertências e de suspensão de licenças e permissões de funcionamento.

É com essa perspectiva que importantes ferramentas civis e administrativas se somaram ao arcabouço jurídico estabelecido para controlar a corrupção. A Constituição Federal (BRASIL, 1988BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso: 14 nov. 2014.
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) já previa que atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível (art. 37, § 4º). Em 1992, a Lei n. 8.429, Lei de Improbidade Administrativa (BRASIL, 1992BRASIL. Lei n. 8.429, de 2 de junho de 1992. Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências. Diário Oficial, Brasília, DF, 3 jun. 1992.), veio dispor sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito. Dentre as espécies de atos de improbidade que ela abrange, estão os que geram enriquecimento ilícito (art. 9), os que importam prejuízo ao erário (art. 10) e os que atentam contra os princípios da administração pública (art. 11). Para todos os casos, o texto da lei ratificou as sanções constitucionalmente previstas e foi além: sujeitou o responsável pela improbidade ao pagamento de multa civil e à proibição de contratar com o Poder Público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios. Caso a improbidade constitua enriquecimento ilícito ou prejuízo ao erário, poderá ser decretada, ainda, a perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio do infrator (art. 12).

Iniciativas mais recentes também merecem destaque. Vale ressaltar a Lei Complementar n. 135/2010 (BRASIL, 2010BRASIL. Lei Complementar n. 135, de 4 de junho de 2010. Altera a Lei Complementar nº 64, de 18 de maio de 1990, que estabelece, de acordo com o § 9º do art. 14 da Constituição Federal, casos de inelegibilidade, prazos de cessação e determina outras providências, para incluir hipóteses de inelegibilidade que visam a proteger a probidade administrativa e a moralidade no exercício do mandato. Diário Oficial, Brasília, DF, 7 jun. 2010.), Lei da Ficha Limpa, que visa proteger a probidade administrativa por meio de hipóteses de inelegibilidade a cargos políticos de candidatos condenados por órgãos colegiados e a Lei n. 12.527/2011 (BRASIL, 2011aBRASIL. Lei n. 12.527, de 18 de novembro de 2011. Regula o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal; altera a Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990; revoga a Lei nº 11.111, de 5 de maio de 2005, e dispositivos da Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991; e dá outras providências. Diário Oficial, Brasília, DF, 18 nov. 2011a.), Lei de Acesso à Informação, que fomenta o desenvolvimento da cultura de transparência na administração pública. Essas leis aprimoraram o arcabouço normativo brasileiro contra a corrupção, que, até 2013, privilegiou a responsabilização de pessoas físicas por atos ímprobos. Com a promulgação da Lei n. 12.846/2013 (BRASIL, 2013cBRASIL. Lei n. 12.846, de 1º de agosto de 2013. Dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências. Diário Oficial, Brasília, DF, 2 ago. 2013c.), o País passou a dispor de ferramentas que permitem a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. Em âmbito administrativo, a pessoa jurídica infratora pode sofrer o constrangimento de ver extraordinariamente publicada a decisão que a condenou. Também poderá pesar contra ela sanção de multa, cujo valor será equivalente ou superior à vantagem auferida e pode atingir o montante de 20% do faturamento bruto do último exercício anterior ao da instauração do processo administrativo, excluídos os tributos (art. 6). Às sanções administrativas, somam-se medidas judiciais que podem decretar: o perdimento de ativos que representem vantagem ou proveito obtidos da infração; a suspensão ou interdição parcial das atividades da pessoa jurídica; a proibição temporária de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder público; e, em último caso, a própria dissolução compulsória da pessoa jurídica (art. 19).

As iniciativas nacionais se inspiraram, em grande medida, em documentos produzidos pela comunidade internacional para estabelecer ações preventivas e repressivas com o fim de conter o suborno de funcionários públicos, a corrupção na política fiscal e no setor privado. Dentre os instrumentos de referência, vale destacar a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (UNCAC),3 3 O Decreto n. 5.687, de 31 de janeiro de 2006, promulgou a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 31 de outubro de 2003 e assinada pelo Brasil em 9 de dezembro de 2003. a Convenção Interamericana contra a Corrupção4 4 O Decreto n. 4.410, de 7 de outubro de 2002, promulgou a Convenção Interamericana contra a Corrupção, de 29 de março de 1996, com reserva para o art. XI, parágrafo 1º, inciso “c”. e a Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, no âmbito da Organização para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento (OCDE).5 5 O Decreto n. 3.678, de 30 de novembro de 2000, promulgou a Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, concluída em Paris, em 17 de dezembro de 1997.

A criação de um quadro normativo capaz de estabelecer constrangimentos de natureza jurídica contra práticas ímprobas é de importância fulcral, mas não é suficiente. A aplicação de tais normas requer iniciativas criativas, sofisticadas e abrangentes, coordenadas entre os vários atores que se envolvem no enfrentamento da corrupção. É com essa perspectiva que, em 2003, foi instituída a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCCLA). A ENCCLA consiste na articulação de diversos órgãos governamentais e da sociedade civil que se reúnem com o objetivo de identificar e propor ajustes aos pontos falhos do sistema anticorrupção. A propósito da ENCCLA, vale ressaltar que a estratégia foi reconhecida pelas Nações Unidas como boa prática brasileira, exitosa em instrumentalizar políticas de enfrentamento à corrupção, o que contribui para uma boa avaliação sobre a forma como o País implementa o artigo 36 da UNCAC (UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME, 2011bUNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME. Country Review Report of Brazil. 2011b. Disponível em: <http://www.unodc.org/documents/treaties/UNCAC/CountryVisitFinalReports/2017_01_19_Brazil_Final_Country_Report.pdf >. Acesso em: 12 jun. 2017
http://www.unodc.org/documents/treaties/...
, p. 11). A boa avaliação sobre a ENCCLA também foi destacada pelo Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI), grupo intergovernamental que desenvolve os padrões internacionais de enfrentamento à lavagem de dinheiro (GAFI, 2010GAFI. Mutual evaluation report. Federative Republic of Brazil, 2010. Disponível em: <http://www.fatf-gafi.org/media/fatf/documents/reports/mer/MER%20Brazil%20full.pdf>. Acesso em: 10 fev. 2017.
http://www.fatf-gafi.org/media/fatf/docu...
).

Atualmente, mais de 60 órgãos e entidades fazem parte da ENCCLA, que conta com representantes do Poder Executivo, Legislativo e Judiciário, além de representantes do Ministério Público e da sociedade civil. A abrangência da ENCCLA é atenta ao pacto federativo ao envolver não só instituições federais, mas também estaduais. A iniciativa garante a coordenação de agentes governamentais e não governamentais que enfrentam a corrupção. Além das reuniões habituais para consecução das metas previamente estabelecidas segundo corresponsabilidades dos órgãos que compõem a Estratégia, há também reuniões bimestrais do Gabinete de Gestão Integrada (GGI), que consiste em grupo de 25 órgãos participantes da ENCCLA e que tem como atribuição acompanhar a execução das ações em vigência, bem como planejar e propor as futuras ações e recomendações a serem discutidas nas reuniões plenárias. Por ocasião da plenária, realizada anualmente, todos os órgãos representados se reúnem para discutir o trabalho realizado ao longo do ano que passou e deliberar as ações a serem realizadas no ano seguinte. As primeiras ações contra a corrupção estabelecidas pela ENCCLA datam de 2004 e estiveram presentes em todos os anos subsequentes (ver Apêndice A Apêndice A Ações estabelecidas pela ENCCLA contra a Corrupção Fonte: Ministério da Justiça (2017). no final do artigo).

O conjunto dessas metas e recomendações reúne os principais esforços do Estado brasileiro em enfrentar a degeneração social e econômica que constitui consequência própria do desvio de recursos públicos. Os prejuízos financeiro e econômico resultam dos inevitáveis impactos que a corrupção gera no investimento público e privado. Disso decorrem perdas na prestação dos serviços públicos, com danos sociais agravados porque vulnerabiliza sobretudo os estratos da população mais dependentes dos préstimos do Estado.

Os efeitos da corrupção são abrangentes e se expandem da seara socioeconômica para atingir também o âmbito político. A descrença nas instituições públicas e a desconfiança geral da população nos representantes eleitos certamente ameaçam a consolidação da democracia. Isso porque um dos fundamentos democráticos é a confiança depositada pela sociedade na boa administração dos recursos entregues ao Estado.

Dessarte, as iniciativas que se opõem à corrupção têm o condão de contribuir para mitigar efeitos deletérios sob a perspectiva econômica, social e política. Ao tempo em que permitem o favorável desenvolvimento do sistema econômico, fomentam a alocação eficiente de recursos públicos para os fins originários e, com isso, reparam fissuras da coesão social e recuperam a confiança pública desgastada e a institucionalidade da governança fragilizada.

Fica claro, portanto, que o enfrentamento da corrupção é consciente dos valores afetados por esse crime: tanto os valores que fundamentam o desenvolvimento social e a crença nas instituições quanto os valores absolutos dos bens indevidamente apropriados das arcas públicas.

2 Pagando na mesma moeda: os custos da corrupção

O exercício da jurisdição estatal para coibir atos ilícitos pode implicar a apreensão temporária ou o perdimento definitivo de ativos relacionados à conduta ilegal. Essas sanções guardam especial correspondência com a corrupção, cuja perspectiva de lucro é preponderante e, por isso, comumente implica em ativos de grande valor financeiro. Estimativas indicam que cerca de US$ 1,8 trilhão são anualmente desviados por práticas de corrupção, evasão fiscal e crime organizado (TRANSPARÊNCIA INTERNACIONAL, 2010TRANSPARÊNCIA INTERNACIONAL. Relatório anual 2010. 2010. Disponível em: <http://files.transparency.org/content/download/76/303/file/2010_AnnualReport_EN.pdf>. Acesso em: 7 jan. 2015.
http://files.transparency.org/content/do...
). Recursos desviados de países em desenvolvimento, como o Brasil, atingem cifras entre US$ 20 e US$ 40 bilhões por ano (BANCO MUNDIAL E ESCRITÓRIO DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE DROGAS E CRIME, 2007BANCO MUNDIAL E ESCRITÓRIO DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE DROGAS E CRIME. Stolen asset recovery initiative: challenges, opportunities and an action plan. Washington, DC, 2007., p. 9). O total de recursos repatriados entre 1996 e 2011 atinge US$ 5 bilhões (STEPHENSON et al., 2011STEPHENSON, Kevin M. et al. Barriers to asset recovery: an analysis of the key barriers and recommendations for action. Washington, DC: The World Bank, 2011., p. 11).

A corrupção comumente se estrutura sobre complexos fluxos financeiros, que tanto mantêm o funcionamento dinâmico da atividade ilícita, quanto geram os dividendos almejados dessa atividade. Bens e valores constituem, simultaneamente, o objetivo último do crime e a força motriz de sua própria subsistência. A compreensão do caráter empresarial dessa criminalidade sugere a estratégia de que o Estado pode se valer para enfrentá-la. É dizer que as práticas ilícitas de vocação econômica, voltadas ao expressivo incremento patrimonial dos criminosos, denotam que a resposta estatal não terá êxito em controlá-las caso não envolva, necessariamente, a preocupação com esse patrimônio (KILCHLING, 2001KILCHLING, Michael. Tracing, seizing and confiscating proceeds from corruption (and other illegal conduct) within or outside the criminal justice system. European Journal of Crime. Criminal Law and Criminal Justice. v. 9, n. 4, 2001., p. 264).

A reação estatal à corrupção se expande, portanto, para além da dogmática tradicional. À resposta tradicional de imposição da pena corporal, com os efeitos decorrentes dessa condenação, somam-se implicações sobre o patrimônio. O enfrentamento da criminalidade econômica reclama adaptação própria para oferecer respostas adequadas a novos desafios. É o que advoga Rogério Filippeto:

Assim, nada mais natural do que se investir nas medidas alternativas à imposição da pena privativa de liberdade, notadamente na utilização da pena de multa e da pena de perdimento de bens e valores [...]. Percebe-se, também, o acerto de paralelamente investir-se em providências relacionadas com a responsabilidade civil do agente, como a obrigação de reparar o dano causado pelo crime e o perdimento de bens. [...]

Ao impedir a fruição desses proveitos [do crime], afirma-se o adágio popular de que o crime não compensa. A implementação da recuperação de ativos passa a ser objetivo mais importante que a própria imposição de pena, em virtude da ofensa à ordem socioeconômica ou à administração da justiça. Trata-se de uma postura funcional, almejando reduzir a produção criminal. A estratégia não deixa de ser resultado de um enfoque econômico do Direito, pois parte-se do raciocínio básico de que o incremento no custo da prática da ação ilícita é um importante fator na dissuasão do agente. A análise do custo benefício é que determina o comportamento criminoso do homem econômico (FILIPPETO, 2011FILIPPETO, Rogério. Lavagem de dinheiro: crime econômico da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011., p. 207-208).

Se o crime se torna um negócio que gera grandes volumes de riqueza, a política criminal que reage a esse quadro será efetiva na medida em que priva os criminosos dos proveitos ilicitamente auferidos. A resposta penal por excelência, tradicionalmente voltada à persecução da pessoa, exige uma reformulação para contemplar ações que busquem valores. Dessarte, o confisco de ativos é importante eixo da nova estratégia estatal para arrostar a corrupção.

Além de assumir efeito dissuasório da prática do crime, a constrição de bens pode assegurar a reparação de danos causados pelo delito. A propósito, as medidas para indisponibilizar o patrimônio ilícito foram historicamente concebidas como instrumento para garantir que vítimas pudessem requerer, futuramente, a compensação pelos prejuízos que o delito lhes tiver causado (DE CARLI, 2012DE CARLI, Carla Veríssimo. Lavagem de dinheiro: ideologia da criminalização e análise do discurso. 2. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2012., p. 217). Em crimes de corrupção, contudo, nem sempre é possível nomear vítimas individualmente, mas a índole reparatória a que se destinam as medidas patrimoniais permanece para assegurar a compensação da sociedade pelos danos econômicos e sociais.

Felizmente, avanços podem ser observados nessa mudança de paradigma. São cada vez mais comuns os procedimentos de persecução criminal que priorizam a recuperação de ativos, reconhecida como a mais perspicaz ferramenta para confrontar o proveito do crime (CRIBB, 2003CRIBB, Nicholas. Tracing and confiscating the proceeds of crime. Journal of Financial Crime, v. 11, n. 2, 2003., p. 180).

A abordagem da efetividade da atuação estatal em recuperar bens apreendidos ou confiscados é complexa e, por isso, exige uma análise que congregue os modelos estrangeiros já desenvolvidos, a doutrina acadêmica construída sobre o assunto, a legislação nacional sobre o tema e as boas práticas já assimiladas. O intuito de disfarçar a origem ilícita dos valores desviados por práticas de corrupção comumente implica que sejam destinados a outros países. O envolvimento de jurisdição estrangeira dificulta a investigação nacional para estabelecer a relação entre o ato ilegal e o ativo com vistas a, posteriormente, recuperá-lo. Essa prática confere aos atos de corrupção uma natureza frequentemente transnacional, o que exige, por paralelismo, uma resposta transnacional ao problema. É por essa razão que os foros internacionais são espaços privilegiados em que os países se dedicam a desenvolver estudos, debates e recomendações sobre a recuperação de bens apreendidos ou confiscados.

Com efeito, a sociedade internacional se une pelo que compartilha de valores básicos. Tais valores são comumente refletidos – expressa ou implicitamente – em instrumentos internacionais consagrados, como as convenções. Nesse sentido, chama a atenção a UNCAC, pela ampla abrangência, de vocação global, o que lhe confere especial relevância. Também conhecida como Convenção de Mérida, contempla a abordagem do fenômeno da corrupção para além do campo penal. É o que comunica o artigo 43, que chama os Estados Parte a considerar a possibilidade de prestar cooperação mútua nas investigações e procedimentos correspondentes a questões civis e administrativas relacionadas à corrupção.

A Convenção considera o expressivo viés monetário do crime, de modo que, para enfrentá-lo, compartilha a estratégia de privilegiar a descapitalização de criminosos, o que necessariamente implica a constrição de bens (ANSELMO, 2012ANSELMO, Marcio Adriano. Lavagem de dinheiro e cooperação jurídica. São Paulo: Saraiva, 2012., p. 83). É ilustrativa a abrangência expressa do confisco dentro do âmbito de aplicação (art. 3) da Convenção e a dedicação do artigo 31 às orientações quanto ao embargo preventivo, à apreensão e ao confisco. A constrição de bens também é abordada em todo o capítulo V, reservado à recuperação de ativos. O artigo 53 desse capítulo trata de medidas para a recuperação direta de bens e, para tanto, prevê que um Estado possa atuar como litigante nos tribunais de outro Estado Parte, seja como querelante – quando entabula uma ação civil com o objetivo de determinar a titularidade ou propriedade de bens adquiridos mediante a prática de corrupção – seja como vítima – quando ajuíza ação para requerer indenização ou ressarcimento de danos e prejuízos decorrentes da corrupção. Além disso, estabelece que os Estados adotarão as medidas necessárias a fim de permitir que as decisões pelo confisco reconheçam o legítimo direito de propriedade de outro Estado Parte sobre os bens adquiridos mediante a prática de corrupção.

A importância que a Convenção de Mérida atribui aos custos patrimoniais do crime fica patente quando o artigo 57 sugere a restituição integral dos ativos desviados ao Estado prejudicado pelo delito (MACHADO, 2013MACHADO, Maria Rocha. Lavagem de dinheiro e recuperação de ativos: Brasil, Nigéria, Reino Unido e Suíça. São Paulo: Quartier Latin, 2013., p. 102). Na verdade, a sensibilidade de que se reveste o crime de corrupção é tamanha que a convenção inova em relação a todas as demais convenções das Nações Unidas para prever, ainda no artigo 57, a possibilidade de que tais ativos sejam restituídos sem que haja a necessidade de trânsito em julgado da sentença condenatória.

A OCDE concluiu a Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais. Esse instrumento normativo também preceitua que os Estados capturem os bens de origem ilícita ao estabelecer que o suborno e o produto da corrupção de um funcionário público estrangeiro, ou o valor dos bens correspondentes a tal produto, estão sujeitos a retenção e confisco (art. 3, item 3). A Convenção tampouco se restringe aos limites do direito penal, e chama os Estados a considerar a imposição de sanções civis ou administrativas adicionais à pessoa sobre a qual recaiam sanções por corrupção de funcionário público estrangeiro (art. 3, item 4).

A Convenção Interamericana contra a Corrupção também compartilha a perspectiva de descapitalizar criminosos por meio da apreensão de bens de origem ilícita. É nesse sentido que determina que os Estados prestem a mais ampla assistência possível para identificar, localizar, bloquear, apreender e confiscar bens obtidos ou provenientes da prática dos delitos tipificados de acordo com a Convenção, ou os bens usados para essa prática, ou o respectivo produto (art. 15).

Como Estado Parte de todos esses instrumentos internacionais, o Brasil reconhece a efetividade da estratégia de recuperar ativos ilicitamente auferidos. Esse reconhecimento é expresso nos acordos bilaterais de cooperação jurídica internacional em matéria penal que o País negocia com outros Estados. Atualmente, estão em vigor acordos dessa natureza com Canadá,6 6 Promulgado pelo Decreto n. 6.747, de 22 de janeiro de 2009 (BRASIL, 2009a). China,7 7 Promulgado pelo Decreto n. 6.282, de 3 de dezembro de 2007 (BRASIL, 2007). Colômbia,8 8 Promulgado pelo Decreto n. 3.895, de 23 de agosto de 2001 (BRASIL, 2001b). Coreia do Sul,9 9 Promulgado pelo Decreto n. 5.721, de 13 de março de 2006 (BRASIL, 2006a). Cuba,10 10 Promulgado pelo Decreto n. 6.462, de 21 de maio de 2008 (BRASIL, 2008a). Espanha,11 11 Promulgado pelo Decreto n. 6.681, de 8 de dezembro de 2008 (BRASIL, 2008b). Estados Unidos,12 12 Promulgado pelo Decreto n. 3.810, de 2 de maio de 2001 (BRASIL, 2001a). França,13 13 Promulgado pelo Decreto n. 3.324, de 30 de dezembro de 1999 (BRASIL, 1999). Honduras,14 14 Promulgado pelo Decreto n. 8.046, de 11 de julho de 2013 (BRASIL, 2013a). Itália,15 15 Promulgado pelo Decreto n. 862, de 9 de julho de 1993 (BRASIL, 1993). México,16 16 Promulgado pelo Decreto n. 7.595, de 1º de novembro de 2011 (BRASIL, 2011c). Nigéria,17 17 Promulgado pelo Decreto n. 7.582, de 13 de outubro de 2011 (BRASIL, 2011b). Panamá,18 18 Promulgado pelo Decreto n. 7.596, de 1º de novembro de 2011 (BRASIL, 2011d). Peru,19 19 Promulgado pelo Decreto n. 3.988, de 29 de outubro de 2001 (BRASIL, 2001c). Portugal,20 20 Promulgado pelo Decreto n. 1.320, de 30 de novembro de 1994 (BRASIL, 1994). Reino Unido,21 21 Promulgado pelo Decreto n. 8.047, de 11 de julho de 2013 (BRASIL, 2013b). Suíça,22 22 Promulgado pelo Decreto n. 6.974, de 7 de outubro de 2009 (BRASIL, 2009c). Suriname23 23 Promulgado pelo Decreto n. 6.832, de 29 de abril de 2009 (BRASIL, 2009b). e Ucrânia.24 24 Promulgado pelo Decreto n. 5.984, de 12 de dezembro de 2006 (BRASIL, 2006b).

O cumprimento dessas obrigações internacionais exige fundamento normativo interno que as torne juridicamente possíveis. No que tange à legislação brasileira, o Código Penal estabelece os efeitos da condenação nos seguintes termos (BRASIL, 1940BRASIL. Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial, Rio de Janeiro, DF, 31 dez. 1940.):

Art. 91 - São efeitos da condenação:

I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime;

II - a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé:

a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito;

b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso.

§ 1º Poderá ser decretada a perda de bens ou valores equivalentes ao produto ou proveito do crime quando estes não forem encontrados ou quando se localizarem no exterior.

O Código de Processo Penal (CPP) (BRASIL, 1941BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Diário Oficial, Rio de Janeiro, DF, 13 out. 1941 (retificado em 24 out. 1941).) também denota a importância do custo patrimonial de crimes contra a administração pública, como é o caso da corrupção, ao determinar que “o condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais” (art. 33, § 4º).

Na seara administrativa e civil, a Lei n. 12.846/2013 (BRASIL, 2013cBRASIL. Lei n. 12.846, de 1º de agosto de 2013. Dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências. Diário Oficial, Brasília, DF, 2 ago. 2013c.) prevê a possibilidade de ajuizar ação contra pessoas jurídicas infratoras com vistas ao “perdimento de bens, direitos ou valores que representem vantagem ou proveito direta ou indiretamente obtidos da infração” (art. 19, inc. I). Ainda neste campo, a Lei n. 8.429/1992 (BRASIL, 1992BRASIL. Lei n. 8.429, de 2 de junho de 1992. Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências. Diário Oficial, Brasília, DF, 3 jun. 1992.) também dispõe sobre as sanções patrimoniais aplicáveis a quem comete atos de improbidade:

Art. 6° No caso de enriquecimento ilícito, perderá o agente público ou terceiro beneficiário os bens ou valores acrescidos ao seu patrimônio.

Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá à autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado.

A exequibilidade dos efeitos patrimoniais das sentenças condenatórias requer poder de cautela do Estado. Nesse sentido, o capítulo VI do Código de Processo Penal dispõe sobre medidas que visam a assegurar a integridade dos bens por ocasião do momento de confiscá-los. A ausência dessas medidas cautelares permitiria que réus em processo de corrupção se desfizessem dos bens no decorrer do procedimento investigativo ou judicial, o que inviabilizaria a recuperação dos ativos. Para evitar o perecimento de bens, o Estado pode se valer de institutos jurídicos como o sequestro, a hipoteca legal, o arresto e a busca e apreensão.

O sequestro é medida aplicável a bens – móveis ou imóveis – auferidos com os proventos da infração. Logo, sequestra-se o produto indireto do delito ou, por analogia, o produto direto, caso constitua bem imóvel e, portanto, insuscetível de apreensão (LEITE, 2011LEITE, Larissa. Medidas patrimoniais de urgência no processo penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2011., p. 294). Trata-se de providência preparatória ou incidental à ação penal, de modo que pode ser decretada antes mesmo de oferecida a denúncia ou, posteriormente, em qualquer fase do processo. O sequestro incide sobre bens em relação aos quais não há uma decisão definitiva do Poder Judiciário sobre a licitude da origem. Bastam indícios veementes da proveniência ilícita para que o juiz o ordene, seja por iniciativa própria, seja mediante pedido das autoridades persecutórias (arts. 126 e 127 do Código de Processo Penal – CPP). Dada essa natureza precária, o sequestro pode ser levantado caso a ação penal não seja intentada no prazo de 60 dias ou caso terceiro beneficiado pela transferência dos bens preste a devida caução (art. 131 do CPP). A hipoteca legal e o arresto constituem providências reguladas no mesmo capítulo que o CPP dedica ao sequestro (Capítulo VI do Título VI). As medidas compartilham o objetivo de garantir as obrigações patrimoniais decorrentes do crime, primordialmente a reparação do dano.

Nos termos do art. 134 do CPP, o ofendido tem legitimidade para requerer a inscrição da hipoteca legal, que constitui o direito real cujo fito é justamente assegurar a reparação do dano que o crime causou e o pagamento das despesas processuais. Em vista disso, o valor da responsabilidade civil constitui o limite para designação do imóvel a ser hipotecado (art. 135), que, vale ressaltar, independe da vinculação com o crime que se investiga (LEITE, 2011LEITE, Larissa. Medidas patrimoniais de urgência no processo penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2011., p. 383). Para a concessão da medida processual, é preciso convicção sobre a materialidade e razoável segurança sobre a autoria da infração. Pode ser precedida pelo arresto, cuja concessão se submete aos mesmos requisitos.

Além do arresto prévio à hipoteca legal, o sistema jurídico reconhece o arresto como instrumento processual autônomo. Tem por função assegurar a solvabilidade do devedor para indenizar a vítima, pagar as despesas processuais e as penas pecuniárias, de modo que são esses os elementos que balizam o montante a ser arrestado. Assim como o sequestro, pode recair sobre bens móveis e imóveis (DE CARLI, 2012DE CARLI, Carla Veríssimo. Lavagem de dinheiro: ideologia da criminalização e análise do discurso. 2. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2012., p. 217). Ao contrário do sequestro, contudo, o arresto se aplica a bens independentemente da ilicitude de sua origem. Aproxima-se, nesse caso, da hipoteca. Afasta-se dela, porém, quando incide sobre bens móveis (art. 137), caso o valor dos bens imóveis seja insuficiente. Nessa hipótese, não é preventivo da hipoteca, mas complementar a ela, quando se revela inapta a garantir o valor previsto da responsabilidade patrimonial (LEITE, 2011LEITE, Larissa. Medidas patrimoniais de urgência no processo penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2011., p. 416).

É sujeito à busca e apreensão o objeto direto do crime. Não obstante abordadas no capítulo que o Código de Processo Penal reserva às provas, a busca e a apreensão possuem natureza jurídica variada e também podem ser interpretadas como medidas acautelatórias incidentes sobre bens móveis, com fins de proteção patrimonial (LEITE, 2011LEITE, Larissa. Medidas patrimoniais de urgência no processo penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2011., p. 249). Nesse caso, possuem objeto autônomo, distinto do fim probatório, porquanto servem a reparar o dano e a privar o usufruto do autor do crime (LEITE, 2011LEITE, Larissa. Medidas patrimoniais de urgência no processo penal. Rio de Janeiro: Renovar, 2011., p. 267).

A aplicação dessas ações assecuratórias exige o cumprimento de requisitos próprios. O fumus boni juris exige indícios suficientes para que o direito seja considerado plausível, ou seja, reclama a razoabilidade e a probabilidade de que o processo principal decida definitivamente pela perda dos bens. Quando advier tal decisão, é preciso que ela não seja tardia a ponto de não ter aplicabilidade em virtude do perecimento do bem. Por isso, o periculum in mora também constitui requisito de verificação obrigatória e denota que a medida acautelatória deve se aplicar quando se destine a evitar prejuízo que adviria da demora na conclusão da ação principal (MIRABETE, 2005MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. São Paulo: Atlas, 2005., p. 253). Esse prejuízo frequentemente se traduz na desvalorização do valor real dos ativos ou mesmo no perecimento ou ocultação desses bens, caso eles permaneçam sob o domínio dos réus. Além disso, é preciso vislumbrar nexo causal entre o bem e a autoria do ilícito, a fim de reconhecer a responsabilidade patrimonial individualizada.

3 Administração de ativos apreendidos e confiscados

A mudança paradigmática que reconhece a relação simbiótica entre a corrupção e o proveito econômico constitui o primeiro passo no sentido de se apropriar das oportunidades que o ordenamento jurídico disponibiliza para descapitalizar a atividade criminosa (BLANCO CORDERO, 2009BLANCO CORDERO, Isidoro. El delito de blanqueo de capitales. Madrid: Aranzadi, 2009., p. 277). Esse primeiro movimento, apesar de constituir motivo de otimismo pela sua efetividade, faz-nos deparar com um novo desafio: como bem gerenciar os ativos apreendidos ou confiscados?

A sentença judicial que priva os apenados dos ganhos ilícitos é a mesma que transfere esses proveitos à responsabilidade do Estado. Essa privação se justifica pela expectativa de preservação dos bens, direitos e valores, de modo que é desarrazoado que tais ativos se desvalorizem quando passem à responsabilidade do Estado. Logo, o apoderamento do Estado sobre os ativos implica, necessariamente, o múnus de aproveitá-los economicamente. A intervenção do Estado sobre a propriedade é determinação grave, sobretudo diante do caráter provisório da medida cautelar. Impõe-se, portanto, uma intervenção útil.

Por óbvio, à medida que o novo paradigma aumenta o número de ordens de natureza acautelatória, cresce também o número de ativos que requerem o gerenciamento estatal. A falta de estrutura para o manejo apropriado desses bens e valores é um problema desafiador (BLANCO CORDERO, 2011BLANCO CORDERO, Isidoro. Sistemas de administración de bienes de América Latina y Guía para la administración de bienes incautados y decomisados del crimen organizado. Washington: OEA Documentos Oficiales, 2011., p. 95). Os motivos desse desafio são variados.

A princípio, há de se considerar a diversidade de ativos apreendidos: empresas dos mais diversos ramos, fazendas, animais, aeronaves, embarcações, carros, joias, equipamentos eletrônicos, além de ativos financeiros (ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS, 2011ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Sistemas de administración de bienes de América Latina y Guía para la administración de bienes incautados y decomisados del crimen organizado. Washington, DC: OEA, 2011., p. 57-58). O sequestro de cotas de um cemitério ilustra, de forma emblemática, o quão diversos podem ser os ativos apreendidos. Tratou-se de constrição judicial sobre cemitério em Governador Valadares/MG que era utilizado para prática de lavagem de dinheiro, crime que costuma suceder a corrupção. Uma vez que a empresa passou à responsabilidade do Estado, também passou a ser de responsabilidade estatal a autorização para o funcionamento do cemitério, com a continuidade das atividades de sepultamento (BRAGA, 2010BRAGA, Mariana. O desafio de administrar os bens apreendidos dos criminosos. Revista Via Legal, v. 3, n. 9, p. 21, 2010.). Indubitavelmente, os procedimentos relativos à administração de bens tão diversos exigem do Estado expertise suficiente para geri-los de forma não só a preservar o valor desses ativos, mas de modo a explorar o seu potencial produtivo.

Ademais, a regra geral de longa duração dos procedimentos judiciais que julgam a corrupção e que decidirão, definitivamente, sobre a licitude desses bens implica, como consequência lógica, que eles ficarão longos anos sob a responsabilidade estatal. A guarda desses bens gera um ônus excessivo e duradouro ao Estado, o que reforça o imperativo de manutenção do valor producente desses ativos em longo prazo. Do ponto de vista utilitário e econômico, soa desarrazoado manter objetos apreendidos em depósitos por muito tempo. As despesas são inúmeras e somam desde os custos financeiros de aluguel do depósito até a própria manutenção dos bens, sempre sujeitos à desvalorização quando não utilizados.

Ninguém ganha quando os bens sujeitos a medidas de constrição não cumprem sua função econômica. O prejuízo é ainda maior quando tais bens se deterioram. Em caso de condenação do réu e perda definitiva do bem, o Estado terá fracassado em reparar o dano provocado pela corrupção. Em caso de absolvição, o proprietário receberá o bem depreciado, e é provável que o Estado tenha de responder à sua intervenção ineficiente com o pagamento de indenização correspondente.

O diagnóstico da carência de estrutura estatal para o gerenciamento de ativos confiscados tem despertado iniciativas para superação desse quadro. A ENCCLA congrega as mais importantes ações nesse tema. O Apêndice B Apêndice B Ações estabelecidas pela ENCCLA para administração de ativos confiscados Fonte: Ministério da Justiça (2017). (no final do artigo) compila o progresso dos esforços em melhor administrar os bens apreendidos pelo Estado.

Um dos produtos do acúmulo desses esforços da ENCCLA se destaca no enfrentamento da corrupção: trata-se do Laboratório de Tecnologia contra a Corrupção e a Lavagem de Dinheiro (UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME, 2011bUNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME. Country Review Report of Brazil. 2011b. Disponível em: <http://www.unodc.org/documents/treaties/UNCAC/CountryVisitFinalReports/2017_01_19_Brazil_Final_Country_Report.pdf >. Acesso em: 12 jun. 2017
http://www.unodc.org/documents/treaties/...
, p. 156). Os laboratórios realizam um trabalho de análise de informação relevante de natureza cadastral, bancária, fiscal, contábil, bursátil, patrimonial e telefônica e de outras formas de comunicação telemática, que serve de apoio às autoridades de persecução penal, o que promove uma investigação multidisciplinar. Para tanto, utiliza-se de uma gama diversa de fontes de informação – abertas e fechadas – a que têm acesso, o que permite realizar o cruzamento de informações que podem contribuir para detectar incompatibilidades no incremento patrimonial dos sujeitos investigados.

Com efeito, os laboratórios lançam mão de alta tecnologia – hardware e software – para a recopilação, centralização e análise da informação, o que gera a possibilidade de desenvolver uma ampla rede de laboratórios de tecnologia contra a corrupção em âmbito nacional e internacional. Trata-se de iniciativa muito bem avaliada nos foros internacionais, que já despertou interesse de vários países (GAFI, 2010GAFI. Mutual evaluation report. Federative Republic of Brazil, 2010. Disponível em: <http://www.fatf-gafi.org/media/fatf/documents/reports/mer/MER%20Brazil%20full.pdf>. Acesso em: 10 fev. 2017.
http://www.fatf-gafi.org/media/fatf/docu...
; ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS, 2013ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. XXXVII Meeting of the Group of Experts for the Control of Money Laundering. Final Report. 2013. Disponível em: <http://www.cicad.oas.org/apps/Document.aspx?Id=2427 >. Acesso em: 13 fev. 2017.
http://www.cicad.oas.org/apps/Document.a...
, p. 4; UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME, 2011bUNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME. Country Review Report of Brazil. 2011b. Disponível em: <http://www.unodc.org/documents/treaties/UNCAC/CountryVisitFinalReports/2017_01_19_Brazil_Final_Country_Report.pdf >. Acesso em: 12 jun. 2017
http://www.unodc.org/documents/treaties/...
, p. 156). Exemplo disso é que Brasil e Bolívia assinaram acordo para implementação de Laboratório de Tecnologia no Combate à Lavagem de Dinheiro naquele país.25 25 Documento em posse do autor.

Em suma, os laboratórios são ferramentas que permitem encontrar os ativos de origem ilícita, por meio da investigação patrimonial. Com efeito, as autoridades de persecução penal devem promover investigações patrimoniais, paralelas à investigação principal, a fim de identificar os ativos vinculados às práticas de corrupção. Uma atividade de persecução que não tenha esse foco patrimonial não contará com a especialização suficiente para encontrar o nexo causal entre o crime e os ativos que dele resultam.

Além de promover políticas para a localização de ativos eventualmente vinculados a casos de corrupção, a ENCCLA fomentou o mapeamento do quadro de bens apreendidos e, atualmente, em poder do Estado: o Sistema Nacional de Bens Apreendidos (SNBA). Trata-se de base de dados de abrangência nacional que compila as informações sobre os bens apreendidos em procedimentos criminais. A alimentação do SNBA é de responsabilidade do juiz vinculado ao respectivo processo em que o perdimento do bem foi decretado. A reunião desses dados permite gerar estatísticas aptas a subsidiar políticas para gerenciamento desses bens. Com efeito, a manutenção de estatísticas sobre a apreensão de ativos é medida recomendada ao Brasil pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, como forma de enfrentar a corrupção (ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, 2014ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO. Brazil – OCDE Anti-Bribery Convention. 2014. Disponível em: <http://www.oecd.org/daf/anti-bribery/brazil-oecdanti-briberyconvention.htm >. Acesso em: 13 fev. 2017.
http://www.oecd.org/daf/anti-bribery/bra...
). O SNBA registra quase 17 bilhões de bens sob a custódia do Estado, que atingem o valor de aproximadamente R$ 2 bilhões (BRASIL, 2015BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. 2015. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/SNBA/relatorio_bens.php >. Acesso em: 7 jan. 2015.
http://www.cnj.jus.br/SNBA/relatorio_ben...
).

No âmbito da avaliação sobre como o Brasil implementa a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, o SNBA foi identificado como ferramenta de êxito para consolidar informações sobre ativos apreendidos e, com isso, controlá-los e monitorá-los (UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME, 2011bUNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME. Country Review Report of Brazil. 2011b. Disponível em: <http://www.unodc.org/documents/treaties/UNCAC/CountryVisitFinalReports/2017_01_19_Brazil_Final_Country_Report.pdf >. Acesso em: 12 jun. 2017
http://www.unodc.org/documents/treaties/...
, p. 79). O sistema atende a disposições do parágrafo 3 do artigo 36 da Convenção de Mérida, mas não é suficiente. Por isso, como encaminhamento da avaliação, as Nações Unidas recomendaram ao Brasil que desenvolva um escritório de recuperação de ativos ou outra agência capaz de gerenciar os ativos propriamente, a fim de que não se deteriorem e mantenham sua função econômica (UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME, 2011bUNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME. Country Review Report of Brazil. 2011b. Disponível em: <http://www.unodc.org/documents/treaties/UNCAC/CountryVisitFinalReports/2017_01_19_Brazil_Final_Country_Report.pdf >. Acesso em: 12 jun. 2017
http://www.unodc.org/documents/treaties/...
, p. 79). De fato, as informações disponibilizadas pelo SNBA são o passo inicial para fomentar a administração de bens, de modo a superar o mero depósito e avançar para explorar o potencial econômico deles.

Em que pese a possibilidade de o Estado nomear pessoa física ou jurídica para atuar como administrador, a pluralidade de bens apreendidos e sequestrados é tão complexa que nem sempre será viável tal administração. É por essa razão que o CPP, além de abordar o regime para o depósito e a administração dos bens, trata da possibilidade de “alienação antecipada para preservação do valor dos bens sempre que estiverem sujeitos a qualquer grau de deterioração ou depreciação, ou quando houver dificuldade para sua manutenção” (art. 144-A, caput).

Diz-se alienação porque se trata da venda de bens que, em virtude da origem ilícita e por força de medidas acautelatórias, estão em poder do Estado. Vende-se o bem quando a medida parece ser a mais adequada para lhe preservar o valor econômico até que sobrevenha sentença definitiva. Diz-se antecipada justamente porque constitui exceção à regra de que a venda dos bens só é realizada após o trânsito em julgado da sentença condenatória.

O mérito da alienação antecipada está em evitar que bens apreendidos e sequestrados fiquem abandonados em depósitos e sofram, quando menos, da depreciação pela passagem do tempo. Ao contrário, se vendidos os bens, o valor correspondente à identidade econômica é depositado em conta bancária necessariamente atrelada a alguma forma de atualização monetária. Se, afinal, sobrevier sentença condenatória, o Estado poderá se valer desse montante para restabelecer o status quo prévio à prática de corrupção. Se o réu for absolvido, ele receberá o correspondente ao valor econômico dos bens, com a devida atualização. Vê-se, portanto, que a lei oferece algumas ferramentas para que o Estado extraia proveito econômico dos bens à sua disposição. A decisão sobre qual é a medida mais efetiva, contudo, não é fácil. A conjuntura atual está a exigir uma profissionalização dessa atividade de administração.

Os desafios que enfrentamos para gerenciamento de bens apreendidos não são exclusivos do Brasil. A corrupção, como fenômeno que afeta toda a comunidade internacional, tem convidado os países a pensar soluções conjuntas para lidar com os aspectos patrimoniais do crime. É nessa perspectiva que a Organização dos Estados Americanos desenvolveu o Projeto de Bens Confiscados na América Latina (Projeto BIDAL, segundo o acrônimo em espanhol). Em 2014, o Brasil passou a ser beneficiado pelo Projeto.26 26 Documento em posse do autor.

O Projeto BIDAL constitui um programa de assistência técnica que sugere mecanismos de aprimoramento do sistema de identificação, localização e administração de ativos de origem ilícita sob o poder do Estado. O Projeto tem por escopo estabelecer normas de governança e transparência na gestão dos bens, para que sejam administrados de modo a alcançar efetividade produtiva, com diretrizes sobre pontos críticos para o sucesso, tanto do ponto de vista organizacional quanto do fundamento normativo-legal que sustentará uma administração responsável desses ativos.

A grande contribuição do Projeto BIDAL reside em aproveitar a experiência de vários outros países para identificar as melhores práticas de que já se lançou mão para administrar bens de origem ilícita com ferramentas de vanguarda. O conhecimento acumulado ao longo dos anos de aplicação do Projeto incentiva o aprimoramento dos procedimentos nacionais para apreensão, confisco, administração e disposição de ativos provenientes de crimes de corrupção. O Projeto tem escopo abrangente, que inclui a investigação patrimonial, a administração de ativos apreendidos, o destino desses ativos após o confisco e o elemento da cooperação internacional. Para tanto, preliminarmente, foi elaborado diagnóstico situacional que identificou aspectos positivos e negativos do sistema brasileiro de investigação e administração de bens apreendidos e a forma de disposição dos ativos sob o poder do Estado (ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS, 2015ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Projeto BIDAL Brasil. Documento de resultados do diagnóstico situacional relacionado à̀ investigação patrimonial, administraçã̃o e destino de bens apreendidos e confiscados. 2015. Disponível em: < http://www.justica.gov.br/sua-protecao/lavagem-de-dinheiro/projeto-bidal-brasil-1/arquivos-bidal/diagnostico-situacional-portugues.pdf>. Acesso em: 13 fev. 2017.
http://www.justica.gov.br/sua-protecao/l...
). Com isso, foi preparado documento de trabalho apresentado à ENCCLA, com propostas de aprimoramento do inventário e registro de bens apreendidos e confiscados, de supervisão e controle desses bens, de administração de provas, de suspensão ou exoneração das cargas tributárias relacionadas aos bens apreendidos, de venda antecipada, de administração de produtos financeiros, de administração de empresas apreendidas, de cooperação internacional e de destinação de bens confiscados (ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS, 2016ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Projeto BIDAL Brasil. Documento de Trabalho do Grupo de Trabalho Interinstitucional. 2016. Disponível em: < http://www.justica.gov.br/sua-protecao/lavagem-de-dinheiro/projeto-bidal-brasil-1/arquivos-bidal/bidal-proposta-gti-final-1.pdf>. Acesso em: 13 fev. 2017.
http://www.justica.gov.br/sua-protecao/l...
).

Segundo o relatório apresentado à ENCCLA, uma vez declarado o confisco definitivo, os bens devem ser, a princípio, leiloados ou eventualmente doados a instituições que os tenham usado em sua fase de apreensão, mediante prévia consideração das necessidades institucionais e do plano de uso efetivamente apresentado. Quanto aos bens que forem efetivamente leiloados, o produto financeiro, os valores em dinheiro e o produto do leilão devem ser utilizados para cobrir os gastos despendidos com a manutenção e preservação desses bens. O valor remanescente deve ser destinado a vítimas, caso a autoridade judicial competente as tenha identificado na sentença, bem como o montante ou os ativos suscetíveis de restituição. Os valores remanescentes podem ser destinados a instituições públicas envolvidas no enfrentamento da corrupção, como o Ministério da Justiça, o Ministério Público, o Poder Judiciário e a Advocacia-Geral da União. Finalmente, devem ser destruídos os bens cujo estado tornem impossível ou excessivamente onerosa a respectiva reparação ou reforma (ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS, 2016ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Projeto BIDAL Brasil. Documento de Trabalho do Grupo de Trabalho Interinstitucional. 2016. Disponível em: < http://www.justica.gov.br/sua-protecao/lavagem-de-dinheiro/projeto-bidal-brasil-1/arquivos-bidal/bidal-proposta-gti-final-1.pdf>. Acesso em: 13 fev. 2017.
http://www.justica.gov.br/sua-protecao/l...
). Com isso, pretendemos acessar respostas visionárias do futuro, que criem condições para o desenvolvimento de ações que sejam capazes de enfrentar novas modalidades criminosas com novos instrumentos de política criminal.

Conclusão

A corrupção é crime com capacidade de movimentar grandes volumes de riqueza. Esse fenômeno guarda um caráter quase empresarial, no sentido de que tem por escopo principal o lucro. A vocação própria da criminalidade econômica desafia, portanto, a aposta que o sistema de justiça historicamente faz para enfrentar o crime: a privação de liberdade. Ora, se o crime é cometido para alcançar ativos de grande valor econômico, a resposta estatal será razoável à medida que considerar iniciativas dirigidas a recuperá-los de mãos criminosas em prol dos legítimos destinatários; frequentemente, a própria sociedade. O confisco de bens, direitos e valores é, portanto, medida consoante a estratégia de priorizar a recuperação de ativos auferidos mediante práticas corruptas.

São recentes os avanços que permitiram entender o confisco como iniciativa fundamental para enfrentar a corrupção. Isso porque o procedimento penal se apresenta tradicionalmente voltado à persecução contra a pessoa, sem a devida atenção ao patrimônio envolvido no crime. Foram subutilizados mesmo os parcos instrumentos que o ordenamento jurídico disponibilizou às autoridades de persecução para identificar e localizar ativos. Não obstante esse quadro, pouco a pouco uma mudança paradigmática desloca prioridades da estratégia estatal e o confisco assume tal importância a ponto de ser considerado ferramenta indispensável ao efetivo enfrentamento da corrupção.

Os avanços significaram novos desafios. O aumento de ordens de confisco – ou de medidas acautelatórias para garantia do confisco futuro – obviamente aumentou o número de ativos sob a responsabilidade do Estado. Quando o confisco é definitivo, decidido por sentença transitada em julgado que transfere a propriedade do bem ao Estado, esse bem será disposto em conformidade com a legislação que regulamenta o patrimônio estatal. Situação mais desafiadora é aquela em que os bens estão sob a custódia provisória do Estado. É o caso de quando medidas cautelares são aplicadas e o Estado avoca a função de administrar bens e de garantir que o valor econômico correspondente seja preservado, com o fim de assegurar a utilidade de eventual ordem futura de confisco.

As medidas cautelares podem ser aplicadas a uma vasta pluralidade de bens, o que implica a exigência de alto grau de especialidade para reconhecer o meio mais proveitoso de administrá-las. A natureza do bem ditará a estratégia de gerenciamento, que usualmente precisa ser concebida para longo prazo. Os casos de corrupção costumam ser complexos, com envolvimento de muitos autores e com uma materialidade cuja comprovação requer custosos procedimentos para instrução probatória. Esses elementos contribuem para processos penais cujo desenvolvimento se expande no tempo, o que implica que os bens relacionados a esses processos ficarão longos anos sob a custódia do Estado. Esse quadro gera problemas diretos à boa administração e preservação dos bens apreendidos.

Lidar com esses problemas exige estratégias que conjugam esforços nacionais e internacionais. Em âmbito nacional, a ENCCLA tem pautado a política que congrega as principais instituições da República em prol da boa gestão dos bens em poder do Estado: tanto os bens públicos propriamente ditos – afinal, enfrentar a corrupção é, em suma, proteger o patrimônio público – quanto os bens que provisoriamente estão a cargo do Estado, como medida para enfrentar práticas ímprobas. Indubitavelmente, os principais avanços normativos e operacionais para o aprimoramento da administração de bens apreendidos foram pensados no âmbito da ENCCLA.

A corrupção não é, contudo, exclusividade brasileira. Ao contrário, provoca toda a comunidade internacional, que se vê prejudicada pelos altos custos do desvio de recursos públicos. Os principais foros internacionais erigiram o enfrentamento da corrupção como uma de suas principais pautas. Os países têm lançado mão das ferramentas próprias do direito internacional – convenções, acordos bilaterais, programas de assistência técnica, documentos de referência, manuais de boas práticas – com o escopo de buscar diretrizes inovadoras para lidar com uma criminalidade que transpõe fronteiras. Se a corrupção, como crime econômico, afeta o sistema financeiro internacional, a arena transnacional onde se opera a comunicação entre países reage em busca de estratégias coordenadas para enfrentá-la.

Recuperar ativos desviados por práticas de corrupção é desafio que deve ser encarado de forma inovadora, aberta ao desenvolvimento de propostas que surgem dentro e fora das nossas fronteiras. Exige o desenvolvimento de ações futuristas, que sejam capazes de enxergar à frente para projetar soluções capazes de oferecer respostas efetivas em longo prazo. É lidar com a criminalidade econômica com visões e instrumentos adequados de política criminal. É, em suma, resgatar o que o crime desviou.

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    » https://www.transparency.org/news/feature/corruption_perceptions_index_2016
  • UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME. Primavera árabe mostra a rejeição da população contra a corrupção e pedido por integridade, 2011a. Disponível em: <http://www.unodc.org/lpo-brazil/pt/frontpage/2011/10/25-primavera-arabe-mostra-a-rejeicao-da-populacao-contra-a-corrupcao-e-pedido-por-integridade-disse-diretor-executivo-do-unodc-na-abertura-da-conferencia-global-contra-a-corrupcao.html>. Acesso em: 3 jan. 2015.
    » http://www.unodc.org/lpo-brazil/pt/frontpage/2011/10/25-primavera-arabe-mostra-a-rejeicao-da-populacao-contra-a-corrupcao-e-pedido-por-integridade-disse-diretor-executivo-do-unodc-na-abertura-da-conferencia-global-contra-a-corrupcao.html
  • UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME. Country Review Report of Brazil 2011b. Disponível em: <http://www.unodc.org/documents/treaties/UNCAC/CountryVisitFinalReports/2017_01_19_Brazil_Final_Country_Report.pdf >. Acesso em: 12 jun. 2017
    » http://www.unodc.org/documents/treaties/UNCAC/CountryVisitFinalReports/2017_01_19_Brazil_Final_Country_Report.pdf
  • UNITED NATIONS OFFICE ON DRUGS AND CRIME. Brazil 2017. Disponível em: <https://www.unodc.org/unodc/treaties/CAC/country-profile/CountryProfile.html?code=BRA>. Acesso em: 13 fev. 2017.
    » https://www.unodc.org/unodc/treaties/CAC/country-profile/CountryProfile.html?code=BRA
  • 1
    Autores como Rogério Filippetto (2011, p. 182) diferenciam o conceito de confisco e de perdimento de ativos. O autor entende que confisco soa como exercício de ato de império de iniciativa do Estado, de conteúdo punitivo, como expropriação do patrimônio pessoal. Ao contrário, perdimento foi o termo preferido pelo texto constitucional para prescrever as sanções penais aplicáveis no Brasil (inciso XLVI do artigo 5º). A esse despeito, adotaremos a postura de Bonfim e Bonfim (2005BONFIM, Marcia Mougenout; BONFIM, Edilson Mougenout. Lavagem de dinheiro. São Paulo: Malheiros, 2005., p. 97) no sentido de que o termo confisco pode se aplicar ao perdimento de bens e valores como efeito genérico da condenação penal. Importantes marcos normativos internacionais ratificam essa orientação. No âmbito das Nações Unidas, a Convenção contra o tráfico ilícito de entorpecentes e substâncias psicotrópicas (artigo 1º, g), a Convenção contra o crime organizado transnacional (artigo 2º, g) e a Convenção contra a corrupção (artigo 2º, g) definem confisco como a privação de algum bem, em caráter definitivo, por decisão de um tribunal ou de outra autoridade competente. A reiterada menção que as convenções internacionais fazem ao confisco como expropriação legal de bens de origem ilícita parece fundamentar nosso alinhamento à permissão de adotá-lo como termo sinônimo de perdimento de bens.
  • 2
    A Transparência Internacional é uma organização não governamental que visa a enfrentar a corrupção em âmbito global por meio de ações que congregam governos, empresas e sociedade civil. A organização está representada em mais de 100 países e é referência mundialmente reconhecida pela publicação anual do relatório do índice de percepção da corrupção, cujos resultados são reportados ao Grupo de Trabalho Anticorrupção do G20.
  • 3
    O Decreto n. 5.687, de 31 de janeiro de 2006, promulgou a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 31 de outubro de 2003 e assinada pelo Brasil em 9 de dezembro de 2003.
  • 4
    O Decreto n. 4.410, de 7 de outubro de 2002, promulgou a Convenção Interamericana contra a Corrupção, de 29 de março de 1996, com reserva para o art. XI, parágrafo 1º, inciso “c”.
  • 5
    O Decreto n. 3.678, de 30 de novembro de 2000, promulgou a Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, concluída em Paris, em 17 de dezembro de 1997.
  • 6
    Promulgado pelo Decreto n. 6.747, de 22 de janeiro de 2009 (BRASIL, 2009aBRASIL. Decreto n. 6.747, de 22 de janeiro de 2009. Promulga o Tratado de Assistência Mútua em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo do Canadá, celebrado em Brasília, em 27 de janeiro de 1995. Diário Oficial, Brasília, DF, 23 jan. 2009a.).
  • 7
    Promulgado pelo Decreto n. 6.282, de 3 de dezembro de 2007 (BRASIL, 2007BRASIL. Decreto n. 6.282, de 3 de dezembro de 2007. Promulga o Tratado entre a República Federativa do Brasil e a República Popular da China sobre Assistência Jurídica Mútua em Matéria Penal, celebrado em Pequim, em 24 de maio de 2004. Diário Oficial, Brasília, DF, 4 dez. 2007.).
  • 8
    Promulgado pelo Decreto n. 3.895, de 23 de agosto de 2001 (BRASIL, 2001bBRASIL. Decreto n. 3.895, de 23 de agosto de 2001. Promulga o Acordo de Cooperação Judiciária e Assistência Mútua em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República da Colômbia, celebrado em Cartagena de Índias, em 7 de novembro de 1997. Diário Oficial, Brasília, DF, 24 set. 2001b.).
  • 9
    Promulgado pelo Decreto n. 5.721, de 13 de março de 2006 (BRASIL, 2006aBRASIL. Decreto n. 5.721, de 13 de março de 2006. Promulga o Acordo entre a República Federativa do Brasil e a República da Coréia sobre Assistência Judiciária Mútua em Matéria Penal, celebrado em Brasília, em 13 de dezembro de 2002. Diário Oficial, Brasília, DF, 14 mar. 2006a.).
  • 10
    Promulgado pelo Decreto n. 6.462, de 21 de maio de 2008 (BRASIL, 2008aBRASIL. Decreto n. 6.462, de 21 de maio de 2008. Promulga o Acordo de Cooperação Judicial em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República de Cuba, celebrado em Havana, em 24 de setembro de 2002. Diário Oficial, Brasília, DF, 23 mai. 2008a.).
  • 11
    Promulgado pelo Decreto n. 6.681, de 8 de dezembro de 2008 (BRASIL, 2008bBRASIL. Decreto n. 6.681, de 8 de dezembro de 2008. Promulga o Acordo de Cooperação e Auxílio Jurídico Mútuo em Matéria Penal entre a República Federativa do Brasil e o Reino da Espanha, celebrado em Brasília, em 22 de maio de 2006. Diário Oficial, Brasília, DF, 9 dez. 2008b.).
  • 12
    Promulgado pelo Decreto n. 3.810, de 2 de maio de 2001 (BRASIL, 2001aBRASIL. Decreto n. 3.810, de 2 de maio de 2001. Promulga o Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América, celebrado em Brasília, em 14 de outubro de 1997, corrigido em sua versão em português, por troca de Notas, em 15 de fevereiro de 2001. Diário Oficial, Brasília, DF, 3 mai. 2001a.).
  • 13
    Promulgado pelo Decreto n. 3.324, de 30 de dezembro de 1999 (BRASIL, 1999BRASIL. Decreto n. 3.324, de 30 de dezembro de 1999. Promulga o Acordo de Cooperação Judiciária em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Francesa, celebrado em Paris, em 28 de maio de 1996. Diário Oficial, Brasília, DF, 31 dez. 1999.).
  • 14
    Promulgado pelo Decreto n. 8.046, de 11 de julho de 2013 (BRASIL, 2013aBRASIL. Decreto n. 8.046, de 11 de julho de 2013. Promulga o Tratado entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República de Honduras sobre Auxílio Jurídico Mútuo em Matéria Penal, firmado em Tegucigalpa, em 7 de agosto de 2007. Diário Oficial, Brasília, DF, 12 jul. 2013a.).
  • 15
    Promulgado pelo Decreto n. 862, de 9 de julho de 1993 (BRASIL, 1993BRASIL. Decreto n. 862, de 9 de julho de 1993. Promulga o Tratado sobre Cooperação Judiciária em Matéria Penal, entre a República Federativa do Brasil e a República Italiana, de l7 de outubro de 1989. Diário Oficial, Brasília, DF, 12 jul. 1993.).
  • 16
    Promulgado pelo Decreto n. 7.595, de 1º de novembro de 2011 (BRASIL, 2011cBRASIL. Decreto n. 7.595, de 1º de novembro de 2011. Promulga o Tratado de Cooperação Jurídica Internacional em Matéria Penal entre a República Federativa do Brasil e os Estados Unidos Mexicanos, firmado na Cidade do México, em 6 de agosto de 2007. Diário Oficial, Brasília, DF, 3 nov. 2011c.).
  • 17
    Promulgado pelo Decreto n. 7.582, de 13 de outubro de 2011 (BRASIL, 2011bBRASIL. Decreto n. 7.582, de 13 de outubro de 2011. Promulga o Tratado de Assistência Jurídica Mútua em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Federal da Nigéria, firmado em Brasília, em 6 de setembro de 2005. Diário Oficial, Brasília, DF, 13 out. 2011b.).
  • 18
    Promulgado pelo Decreto n. 7.596, de 1º de novembro de 2011 (BRASIL, 2011dBRASIL. Decreto n. 7.596, de 1º de novembro de 2011. Promulga o Tratado entre a República Federativa do Brasil e a República do Panamá sobre Auxílio Jurídico Mútuo em Matéria Penal, assinado na Cidade do Panamá, em 10 de agosto de 2007. Diário Oficial, Brasília, DF, 3 nov. 2011d.).
  • 19
    Promulgado pelo Decreto n. 3.988, de 29 de outubro de 2001 (BRASIL, 2001cBRASIL. Decreto n. 3.988, de 29 de outubro de 2001. Promulga o Acordo de Assistência Jurídica em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República do Peru, celebrado em Lima, em 21 de julho de 1999. Diário Oficial, Brasília, DF, 30 out. 2001c.).
  • 20
    Promulgado pelo Decreto n. 1.320, de 30 de novembro de 1994 (BRASIL, 1994BRASIL. Decreto n. 1.320, de 30 de novembro de 1994. Promulga o Tratado de Auxílio Mútuo em Matéria Penal, entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República Portuguesa, de 07 de maio de 1991. Diário Oficial, Brasília, DF, 1º dez. 1994.).
  • 21
    Promulgado pelo Decreto n. 8.047, de 11 de julho de 2013 (BRASIL, 2013bBRASIL. Decreto n. 8.047, de 11 de julho de 2013. Promulga o Tratado de Assistência Jurídica Mútua em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, firmado em Londres, em 7 de abril de 2005. Diário Oficial, Brasília, DF, 12 jul. 2013b.).
  • 22
    Promulgado pelo Decreto n. 6.974, de 7 de outubro de 2009 (BRASIL, 2009cBRASIL. Decreto n. 6.974, de 7 de outubro de 2009. Promulga o Tratado de Cooperação Jurídica em Matéria Penal entre a República Federativa do Brasil e a Confederação Suíça, celebrado em Berna, em 12 de maio de 2004. Diário Oficial, Brasília, DF, 8 out. 2009c.).
  • 23
    Promulgado pelo Decreto n. 6.832, de 29 de abril de 2009 (BRASIL, 2009bBRASIL. Decreto n. 6.832, de 29 de abril de 2009. Promulga o Tratado entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República do Suriname sobre Assistência Jurídica Mútua em Matéria Penal, celebrado em Paramaribo, em 16 de fevereiro de 2005. Diário Oficial, Brasília, DF, 30 abr. 2009b.).
  • 24
    Promulgado pelo Decreto n. 5.984, de 12 de dezembro de 2006 (BRASIL, 2006bBRASIL. Decreto n. 5.984, de 12 de dezembro de 2006. Promulga o Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal entre a República Federativa do Brasil e a Ucrânia, celebrado em Kiev, em 16 de janeiro de 2002. Diário Oficial, Brasília, DF, 13 dez. 2006b.).
  • 25
    Documento em posse do autor.
  • 26
    Documento em posse do autor.

Apêndice A Ações estabelecidas pela ENCCLA contra a Corrupção

  • Fonte: Ministério da Justiça (2017).
  • Apêndice B Ações estabelecidas pela ENCCLA para administração de ativos confiscados

  • Fonte: Ministério da Justiça (2017).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      Ago 2017

    Histórico

    • Recebido
      18 Mar 2017
    • Aceito
      05 Maio 2017
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