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GERMINAÇÃO E REINDUÇÃO DA TOLERÂNCIA À DESSECAÇÃO EM SEMENTES DE Senna multijuga (RICH.) IRWIN ET BARN

GERMINATION AND RE-INDUCTION OF DISSECATION TOLERANCE IN SEEDS OF Senna multijuga (RICH.) IRWIN ET BARN

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi analisar diferentes métodos de superação de dormência, condições ótimas de germinação, tais como luz, temperatura, e possível reindução da tolerância à dessecação em sementes de Senna multijuga. Foram testados dois métodos de superação de dormência: imersão em água com temperatura inicial de 100ºC (água quente) e imersão em água com temperatura constante a 100ºC por 20 segundos (água fervente), ambos os tratamentos seguidos de repouso fora do aquecimento por 24 horas. Para o teste de germinação, foram avaliados os regimes térmicos 25ºC, 30ºC (constantes) e 20-30°C (alternados), na presença e ausência de luz. Para o teste de reindução da tolerância à dessecação, foram selecionadas sementes germinadas com 1, 2, 3 e 4 mm de comprimento radicular e submetidas aos tratamentos de dessecação: sem incubação; com incubação em solução de polietilenoglicol (PEG6000) nas concentrações de -1,4; -1,7 e -2,0MPa; com incubação em solução de PEG -1,4MPa + ABA nas concentrações de 1, 10 e 100 μM. O delineamento inteiramente casualizado (DIC) foi utilizado em todos os experimentos com 4 repetições de 25 sementes. A superação de dormência utilizando água quente proporcionou germinabilidade superior a 65%. As sementes de Senna multijuga, apesar de não serem fotoblásticas positivas obrigatórias, apresentaram maior porcentagem de germinação sob condições de luz. Foi possível observar a retomada do crescimento após a secagem em sementes germinadas com radículas de até 3 mm de comprimento.

Palavras-chave:
luz; dormência tegumentar; canafístula.

ABSTRACT

The aims of this study were to verify the effects of different tests in the overcoming dormancy, excellent germination terms, as light and temperature, and the possibility of re-induction of desiccation tolerance in Senna multijuga seeds. We evaluated two tests for overcoming dormancy: immersion in water with an initial temperature of 100ºC (hot water) and immersion in water at a constant temperature at 100ºC for 20 seconds (boiling water), both treatments followed by rest out of the heating for 24 hours. For the germination test, we evaluated 25ºC, 30ºC (constant) and 20-30ºC (alternate), in the presence and absence of light. For the re-induction of desiccation tolerance, we selected seeds germinated with 1, 2, 3 and 4mm of radicle length. We submitted the germinated seeds to the follow treatments: no incubation, incubation in polyethylene glycol (PEG6000) at the -1,4, -1,7 and -2,0MPa; incubation in PEG -1,4MPa + ABA at the concentrations of 1, 10 and 100μM. The tests followed a completely randomized design (DIC) using 4 repetitions of 25 seeds. The overcoming dormancy using hot water provided the best germination (65%). The Senna multijuga seeds are not photoblastic required, but in light conditions the germination was higher. We observed the resumption of the radicle growth in germinated seeds of up to 3mm length.

Keywords:
light; tegumentar dormancy; canafístula.

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, estudos direcionados para a preservação das florestas, bem como a restauração de áreas degradadas e recomposição de matas ciliares, têm contribuído para amenizar os profundos impactos de origem antrópica. A revegetação dessas áreas, além de colaborar na restauração do equilíbrio de vários ecossistemas e na diminuição do impacto ambiental negativo, também pode se apresentar como forma alternativa de renda para a população do campo.

Neste contexto temos Senna multijuga (cássia-verrugosa, pau-cigarra e canafístula), uma espécie de ocorrência em quase todo o Brasil, principalmente na mata pluvial da encosta atlântica (CARVALHO, 1994CARVALHO, P. E. R. Espécies florestais brasileiras: recomendações silviculturais, potencialidades e uso da madeira. Brasília: Embrapa/CNPF, 1994. 640 p.), cuja propagação é caracterizada como sendo desuniforme em função de dormência nas sementes, retardando, assim, sua germinação. De acordo com Lemos Filho et al. (1997LEMOS FILHO, J. P. et al. Germinação de aquênios de Senna macranthera, Senna multijuga e Stryphnodendron polyphyllum. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília v. 32, p. 357-361, 1997.), a germinabilidade dessa espécie não ultrapassa 12% pelo fato de suas sementes apresentarem dormência tegumentar. Portanto, torna-se necessário o emprego de tratamentos pré-germinativos que venham promover a reidratação das sementes e o consequente início da germinação.

De modo geral, a dormência de sementes constitui um mecanismo de sobrevivência das espécies, assegurando sua viabilidade até que as condições sejam favoráveis para o estabelecimento e crescimento da plântula (HILTON, 1985HILTON, J. R. How light affects weed seed germination. Derby, v. 28, n. 3, p. 95-97, 1985.; KHAN, 1996KHAN, A. A. Control and manipulation of seed dormancy. In: LANG, G. A. (Ed.). Plant dormancy: physiology, biochemistry and molecular biology. Wallingford: CAB International, 1996. p. 29-45.). Um tipo de dormência encontrado é a imposta pelo tegumento, a qual é eficiente para retardar a germinação, permitindo, consequentemente, ampla distribuição das plântulas ao longo do tempo (KHAN, 1996KHAN, A. A. Control and manipulation of seed dormancy. In: LANG, G. A. (Ed.). Plant dormancy: physiology, biochemistry and molecular biology. Wallingford: CAB International, 1996. p. 29-45.). Apesar de ser ecologicamente importante, a dormência tegumentar, juntamente com a crescente degradação ambiental, pode influenciar na recuperação natural de áreas que tenham sofrido algum tipo de interferência em sua composição.

Tratando-se ainda da propagação sexuada de espécies florestais, seu comportamento varia em relação à luz, assim como à temperatura, podendo a germinação ser influenciada positiva ou negativamente, ou ainda, apresentarem respostas indiferentes.

A ativação ou inibição da germinação pela luz ocorre devido à ação do fitocromo. Todas as sementes têm fitocromos e a sensibilidade à luz deve-se à forma do fitocromo existente na semente seca (TAKAKI, 2001TAKAKI, M. New proposal of classification of seeds based on forms of phytochrome instead of photoblastism. Brazilian Journal of Plant Physiology, Brasília, v. 13, p. 103-107, 2001. ). O fitocromo B é a forma preexistente nas sementes fotoblásticas positivas (CASAL; SÁNCHEZ, 1998CASAL, J. J.; SÁNCHEZ, R. Phytochromes and seed ghermination. Seed Science Research , New Delhi, v. 8, p. 317-329, 1998. ). A sua atividade está relacionada à dependência de luz para a germinação, ao passo que a atividade do fitocromo A nas sementes, possibilita a germinação tanto na presença como na ausência de luz (SOCOLOWSKI; TAKAKI, 2004SOCOLOWSKI, F.; TAKAKI, M. Germination of Jacaranda mimosifolia (D.Don - Bignoniaceae) seeds: effects of light, temperature and water stress. Brazilian Archives of Biology and Technology, Curitiba, v. 47, p. 785-792, 2004. ).

Com relação à temperatura, a germinação das sementes de uma espécie ocorre de acordo com determinados limites, que uma vez superados, todo o processo de crescimento inicial da planta é interrompido. Entre esses limites, existe a temperatura considerada ótima, na qual favorece o máximo de germinação em menor intervalo de tempo. Além disso, algumas espécies, principalmente aquelas não domesticadas, apresentam melhor comportamento germinativo quando submetidas à alternância de temperatura (ALBUQUERQUE et al., 1998ALBUQUERQUE, M. C. F. et al. Influência da temperatura e do substrato na germinação de sementes de saguaraji (Colubrina glandulosa Perk. - Rhamnaceae). Revista Brasileira de Sementes, Brasília, v. 20, n. 2, p. 346-349, 1998.; MARCOS FILHO, 2005MARCOS FILHO, J. Fisiologia de sementes de plantas cultivadas. Piracicaba: Fealq, 2005. 495 p.; SALOMÃO et al., 1995SALOMÃO, A. N.; EIRA, M. T. S.; CUNHA, R. The effect of temperature on seed germination of four Dalbergia nigra Fr. Allem - Leguminosae. Revista Árvore, Viçosa, MG, v. 9, n. 4, p. 588-594, 1995.). Essa alternância de temperatura corresponde às oscilações encontradas em condições ambientais. Por outro lado, existem espécies em que a germinação é favorecida quando submetidas à temperatura constante (LIMA et al., 1997LIMA, C. M. R.; BORGHETTI, F.; SOUSA, M. V. Temperature and germination of the Leguminosae Enterolobium contortisiliquum. Revista Brasileira de Fisiologia Vegetal , Campinas, v. 9, n. 2, p. 97-102, 1997.).

Outro aspecto que influencia a germinação de espécies nativas é a tolerância à dessecação (TD), termo geralmente referido como a capacidade de um organismo sobreviver a um extremo de desidratação, em que o conteúdo de água do protoplasma seja igual ou inferior a 0.1g por grama de massa seca (g g-1), nesta ocasião, o potencial hídrico será de aproximadamente -100Mpa (BERJAK; PAMMENTER, 2000BERJAK, P.; PAMMENTER, N. W. What ultrastructure has told us about recalcitrant seeds. Revista Brasileira de Fisiologia Vegetal, Campinas, v. 12, p. 22-55, 2000. ; 2008BERJAK, P.; PAMMENTER, N. W. From Avicennia to Zizania: Seed Recalcitrance in Perspective. Annals of Botany, Oxford, v. 101, p. 213-228, 2008.; BERJAK ET AL., 2007BERJAK, P.; FARRANT, J. M.; PAMMENTER, N. W. Seed desiccation tolerance mechanisms. In: JENKS, M. (Ed.). Plant desiccation tolerance. Ames, IO: Blackwell Publishing, 2007. ).

Alguns autores definem TD como uma estratégia adaptativa que objetiva a sobrevivência das sementes ao armazenamento, sobretudo em condições ambientais severas, uma vez que os tecidos dessecados são mais bioestáveis (PRITCHARD et al., 2004PRITCHARD, H. W. et al. Ecological correlates of seed desiccation tolerance in tropical african dryland trees. American Journal of Botany, Columbus, v. 91, n. 6, p. 863-870, jun. 2004.; GARNCZARSKA et al., 2009GARNCZARSKA, M.; BEDNARSKI, W.; JANCELEWICZ, M. Ability of lupine seeds to germinate and to tolerate desiccation as related to changes in free radical level and antioxidants in freshly harvested seeds. Plant Physiology and Biochemistry, New Delhi, v. 47, n. 1, p. 56-62, jan. 2009.). Sementes com capacidade de manter a TD mesmo após a germinação podem caracterizar alta possibilidade de sobrevivência mesmo em ambientes com maiores amplitudes hídricas.

Diante do exposto, objetivou-se, com a realização deste trabalho, avaliar o efeito de tratamentos pré-germinativos como forma de superar a dormência de sementes de Senna multijuga, bem como diferentes regimes térmicos e condições de luminosidade para germinação. Especificamente, buscou-se, também, avaliar o comportamento desta espécie em relação à reindução da tolerância à dessecação de sementes germinadas.

MATERIAL E MÉTODOS

Coleta do material

As sementes de Senna multijuga foram coletadas na região de Lavras - MG, Brasil, no campus da Universidade Federal de Lavras (UFLA) no início do período de dispersão (abril a maio de 2010). Após o beneficiamento, realizado manualmente, determinou-se o teor de água, conforme Brasil (2009)BRASIL. Ministério da agricultura. Regras para análise de sementes. Brasília: Ministério da Agricultura, 2009. 398 p. . Posteriormente, as sementes foram acondicionadas em sacos plásticos e armazenadas em câmara com temperatura controlada a 10°C e umidade relativa de 60% até o momento da realização dos experimentos.

Superação de dormência e testes de germinação

Inicialmente as sementes foram submetidas a dois diferentes métodos de superação de dormência: imersão em água quente - com temperatura inicial de 100ºC, seguido de repouso fora do aquecimento por 24 horas, como sugerido por Davide et al. (1995DAVIDE, A. C.; FARIA, J. M. R.; BOTELHO, S. A. Propagação de espécies florestais. Belo Horizonte: CEMIG/UFLA/FAEPE, 1995. 45 p.); e imersão em água fervente - com temperatura constante de 100ºC por 20 segundos, seguido de repouso fora do aquecimento por 24 horas, conforme Baskin e Baskin (1998BASKIN C. C.; BASKIN J. M. Seeds: ecology, biogeography and evolution of dormancy and germination. San Diego: Academic Press, 1998. 627 p. ).

Realizados os tratamentos para superação de dormência, as sementes foram desinfestadas em solução de hipoclorito de sódio a 2% por 2 minutos, lavadas com água destilada e colocadas para germinar sobre duas folhas de papel Germitest(r) dispostas em placas de Petri e umedecidas com 4 ml de água destilada. O experimento foi conduzido em câmaras de germinação modelo BOD 347 Eletrolab com controle fototermoperiódico e fotoperíodo de 12 horas, em diferentes regimes térmicos 25ºC; 30ºC (constantes) e 20-30°C (alternados), na presença e ausência de luz. Para os tratamentos conduzidos na ausência de luz, as placas de Petri foram envolvidas em sacos de polietileno preto, sendo as avaliações de germinação realizadas em câmara sob luz verde.

Reindução de tolerância à dessecação

Definido o método mais eficiente de superação da dormência e as condições ideais de germinação, foram selecionadas, com o auxílio de um paquímetro, sementes germinadas com 1, 2, 3 e 4 mm de comprimento radicular. Posteriormente, as sementes germinadas foram submetidas aos seguintes tratamentos de dessecação: sem incubação (secagem direta em sílica gel com ambiente controlado a 20ºC e 20% de umidade relativa); com incubação em solução de polietilenoglicol (PEG6000) nas concentrações de -1,4; -1,7 e -2,0MPa; com incubação em solução de PEG -1,4MPa + ABA nas concentrações de 1, 10 e 100 μM, conforme metodologia descrita por Buitink et al. (2003BUITINK, J. et al. The re-establishment of desiccation tolerance in germinated radicles of Medicago truncatula Gaertn. seeds. Seed Science Research, Cambridge, v. 13, p. 273-286, 2003.). O teor de água foi monitorado durante o experimento por intermédio de subsequentes pesagens, segundo Brasil (2009)BRASIL. Ministério da agricultura. Regras para análise de sementes. Brasília: Ministério da Agricultura, 2009. 398 p. . Após a incubação por 72 horas nas soluções propostas, as sementes foram lavadas em água destilada e prosseguiu-se com a secagem em sílica gel sob as mesmas condições do tratamento sem incubação. Após a desidratação, as sementes foram pré-umedecidas por 24 horas em ambiente com umidade relativa de 100% e temperatura de 20ºC. Posteriormente, as sementes pré-umidificadas foram colocadas em condições ideais de germinação. As sementes germinadas que reassumiram o processo germinativo e retomaram o crescimento da raiz primária foram consideradas tolerantes à dessecação, seguindo metodologia descrita por Buitink et al. (2003)BUITINK, J. et al. The re-establishment of desiccation tolerance in germinated radicles of Medicago truncatula Gaertn. seeds. Seed Science Research, Cambridge, v. 13, p. 273-286, 2003..

Delineamento experimental e análise estatística

O delineamento inteiramente casualizado (DIC) foi utilizado em todos os experimentos. Para cada fator foram utilizadas 4 repetições de 25 sementes. Para os testes de germinação foi utilizado um fatorial 2 x 2 x 3, representando dois tratamentos para superação de dormência, duas condições luminosas e três temperaturas. Para os testes de reindução de tolerância à dessecação foi utilizado um fatorial 4 x 4, representando quatro tratamentos pré-secagem e quatro comprimentos radiculares. Para os testes de reindução com ABA também foi utilizado um fatorial 4 x 4, representando quatro tratamentos de secagem e quatro comprimentos radiculares. Os dados obtidos foram submetidos à análise de variância utilizando-se o Sistema de Análise de Variância para Dados Balanceados (SISVAR(r)) (FERREIRA, 2010). Os resultados de germinação de todos os testes, bem como os resultados de reindução de tolerância à dessecação, foram comparados utilizando-se o teste de Skott Knott a 5% de significância.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados dos testes de germinação estão apresentados na Tabela 1. Não houve interação entre os fatores superação de dormência, luz e temperatura. Foi observado apenas o efeito isolado para cada um desses fatores. Sementes de Senna multijuga, quando submetidas à imersão em água quente - com temperatura inicial de 100ºC, seguido de repouso fora do aquecimento por 24 horas, apresentaram maior porcentagem de germinação (Tabela 1).

TABELA 1:
Superação de dormência, temperatura e condição de radiação luminosa na porcentagem de germinação de sementes de Senna multijuga.
TABLE 1:
Overcoming dormancy, temperature and condition of light radiation at the germination percentage of Senna multijuga seeds.

A dormência observada em sementes dessa espécie pode ser atribuída ao efeito da impermeabilidade dos tegumentos. Nesse caso, a água quente, como método de superação de dormência, é apropriada assim como já foi demonstrado para outras espécies (PASSOS et al., 1988PASSOS, M. A. A.; LIMA, T. V.; ALBUQUERQUE, J. L. Quebra de dormência de sementes de leucena. Revista Brasileira de Sementes , Brasília, v. 10, n. 2, p. 97-102, 1988.; RIBAS et al., 1996RIBAS, L. L. F.; FOSSATI, L. C.; NOGUEIRA, A. C. Superação da dormência de sementes de Mimosa bimucronata (DC.) O.Kuntze (maricá). Revista Brasileira de Sementes , Brasília, v. 18, n. 1, p. 98-101, 1996. ).

Ainda na Tabela 1, observa-se que as temperaturas 30ºC (constante) e 20-30ºC (alternadas), resultaram no maior porcentual de germinação, indicando, dessa maneira, serem temperaturas ótimas para a germinação de sementes de Senna multijuga. Por outro lado, para Oliveira, et al. (2003OLIVEIRA, L. M.; FERREIRA, R. A.; CARVALHO, M. L. M. Germinação de sementes de Senna multijuga (Rich.) Irwin et Barn., sob diferentes condições de radiação luminosa e temperaturas. Revista Ciência Agronômica, Ceará, v. 34, n. 2, p. 213-218, 2003.), a alternância de temperatura (20-30ºC) parece ter maior importância na germinação de sementes dessa mesma espécie, do que a temperatura constante (25ºC). A utilização de temperaturas alternadas em estudos relacionados à germinação de sementes florestais parece mais indicada, uma vez que estas oscilações refletem o que ocorre em condições ambientais.

Com relação à condição de radiação luminosa, os resultados obtidos no presente estudo demonstraram que a ausência e a presença de luz contínua exerceram influência no processo germinativo de sementes de Senna multijuga, sendo que o maior porcentual germinativo foi observado na condição luminosa (Tabela 1).

Na Tabela 2 estão apresentados os resultados referentes à porcentagem de sobrevivência da raiz primária de sementes germinadas e posteriormente, secadas diretamente em sílica ou secadas em sílica após incubação em PEG. As sementes germinadas, com até 3 mm de comprimento e que foram secadas diretamente em sílica ou incubadas em PEG, apresentaram retomada do crescimento da radícula. Contudo, essa recuperação ocorreu em baixas porcentagens e, apenas as sementes com radícula de 1 mm de comprimento apresentaram sobrevivência superior a 60%. Sementes germinadas com 1 e 2 mm dentro do melhor tratamento (-1,4MPa) não diferiram estatisticamente entre si. O tratamento com -2,0MPa foi o único que diferiu para sementes com 1 e 2 mm de comprimento radicular, sendo a retomada do crescimento superior em sementes com 1 mm de comprimento.

TABELA 2:
Porcentagem de sobrevivência da raiz primária de sementes germinadas de Senna multijuga com após secagem em sílica e PEG.
TABLE 2:
Percentage of survival of the primary root of germinated seeds of Senna multijuga after drying in silica and PEG.

Durante o processo de germinação, as sementes iniciam a reativação do metabolismo celular, e ao mesmo tempo ocorre o processo de perda da tolerância à dessecação (KERMODE; FINCH-SAVAGE, 2002KERMODE, A. R.; FINCH-SAVAGE, B. E. Desiccation Sensitivity in Orthodox and Recalcitrant Seeds in Relation to Development. In: BLACK, M.; PRITCHARD, H. W. (Org.). Desiccation and survival in plants: drying without dying. Londres: CABI Publishing, 2002. p. 149-184.). De modo geral, considera-se que as sementes perdem essa capacidade a partir da protrusão radicular, tal como observado em Sesbania virgata (MASETTO et al., 2008MASETTO, T. E. et al. Desiccation tolerance and DNA integrity in Eugenia pleurantha O. Berg. (Myrtaceae) seeds. Revista Brasileira de Sementes , Viçosa, v. 30, n. 1, p. 51 -56, 2008.), Solanum lycopersicum e Abelmoschus esculentus (LIN et al., 1998LIN, T. P. et al. Disappearance of desiccation tolerance of imbibed crop seeds is not associated with the decline of oligosaccharides. Journal of Experimental Botany , Lancaster, v. 49, n. 324, p. 1203-1212, 1998.).

Pereira (2011PEREIRA, W. V. S. Tolerância à dessecação em sementes de Copaifera langsdorffii e Tapirira obtusa. 2011. 68 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Florestal) - Universidade Federal de Lavras, Lavras, 2011.) estudando a perda da tolerância à dessecação em Copaifera langsdorffii, verificou que sementes iniciam o processo de perda de tolerância à dessecação na fase I da germinação. O autor relata que logo após a rápida embebição, sementes que passam pelo processo de secagem e reidratação apresentam sobrevivência inferior a 30%. Esses resultados mostram que a capacidade de tolerar a secagem nesta espécie é perdida muito antes da protrusão radicular, fato esse incomum, considerando o comportamento observado nos estudos relacionados a este tema.

Em relação aos métodos de secagem empregados, a incubação em solução de PEG a -1,4MPa foi a que apresentou os melhores resultados quanto à reindução da tolerância à dessecação. Já a solução de PEG a -2,0MPa foi a que proporcionou os piores resultados quanto à sobrevivência das sementes germinadas após a desidratação (Tabela 2).

Quanto mais negativo for o potencial osmótico da solução, mais rápida será a perda de água da semente germinada para a solução. Se a secagem ocorrer de forma lenta e nas condições ideais, aumentam as possibilidades de ocorrer a retomada do crescimento radicular após a secagem. A secagem lenta também propicia maior homogeneidade na perda de água, proporcionando um tempo adequado e necessário para que as sementes germinadas possam fazer síntese de novo de moléculas e substâncias que atuam na proteção dos tecidos durante a secagem (KERMODE; FINCH-SAVAGE, 2002KERMODE, A. R.; FINCH-SAVAGE, B. E. Desiccation Sensitivity in Orthodox and Recalcitrant Seeds in Relation to Development. In: BLACK, M.; PRITCHARD, H. W. (Org.). Desiccation and survival in plants: drying without dying. Londres: CABI Publishing, 2002. p. 149-184.; VIEIRA et al., 2010VIEIRA, C. V. et al. Stress-associated factors increase after desiccation of germinated seeds of Tabebuia impetiginosa Mart. Plant Growth Regulation, Dordrecht, n. 62, p. 257-263, 2010.).

Faria et al. (2005FARIA, J. M. R. et al. Changes in DNA and microtubules during loss and re-establishment of desiccation tolerance in germinating Medicago truncatula seeds. Journal of Experimental Botany, Oxford, v. 56, n. 418, p. 2119-2130, 2005. ) relatam em seus estudos com Medicago trunculata que respostas a diferentes comprimentos de radícula variam de espécie para espécie, podendo também ser em função dos procedimentos experimentais adotados, especificamente da taxa de secagem e do potencial osmótico da solução utilizada.

A Tabela 3 mostra a influência de diferentes concentrações de ABA juntamente com PEG - 1,4MPa durante a reindução de tolerância à dessecação. Para as três concentrações de ABA testadas, observou-se um decréscimo significativo na porcentagem de sobrevivência da raiz primária após a secagem. Por outro lado, em Tabebuia impetiginosa,Vieira et al. (2010VIEIRA, C. V. et al. Stress-associated factors increase after desiccation of germinated seeds of Tabebuia impetiginosa Mart. Plant Growth Regulation, Dordrecht, n. 62, p. 257-263, 2010.) observaram um acréscimo na porcentagem de radículas que retomaram o crescimento após a dessecação precedidas de incubação em PEG -1,7MPa combinado com ABA nas mesmas concentrações testadas neste trabalho.

TABELA 3:
Porcentagem de sobrevivência da raiz primária de sementes germinadas de Senna multijuga após secagem em PEG + ABA.
TABLE 3:
Percentage of survival of the primary root of germinated seeds of Senna multijuga after drying in PEG + ABA.

Além disso, não foi verificada a retomada do crescimento da raiz primária para as sementes com 3 mm de comprimento e secas após a incubação em PEG -1,4MPa combinado com ABA 1 e 10μM (Tabela 3).

A síntese de ABA está ligada à maturação da semente, bem como ao estímulo da síntese de carboidratos, expressão de genes e outros mecanismos relacionados à aquisição da tolerância à dessecação (BARBEDO; MARCOS FILHO, 1998BARBEDO, C. J.; MARCOS FILHO, J. Tolerância à dessecação em sementes. Acta Botanica Brasilica, São Paulo, v. 12, n. 2, p. 145-164, 1998.; BARTELS, 2005BARTELS, D. Desication tolerance studied in resurrection plant Caterostigma plantagineum. Integrative & Comparative Biology, Oxford, v. 45, p. 696-701, 2005.; BERJAK, 2006BERJAK, P. Unifying perspectives of some mechanisms basic to desiccation tolerance across life forms. Seed Scicence Research, Cambridge, v. 16, p. 1-5, 2006.; BUITINK et al., 2003BUITINK, J. et al. The re-establishment of desiccation tolerance in germinated radicles of Medicago truncatula Gaertn. seeds. Seed Science Research, Cambridge, v. 13, p. 273-286, 2003.). Porém, no presente estudo, para as concentrações testadas deste fito-hormônio, não foi possível observar melhorias no restabelecimento da tolerância à dessecação em sementes germinadas de Senna multijuga.

Dessa forma, análises bioquímicas e moleculares são necessárias para melhor compreensão do comportamento desta espécie em relação à reindução da tolerância à dessecação de sementes germinadas com até 3 mm de comprimento.

CONCLUSÕES

Sementes de Senna multijuga apresentam melhor desempenho germinativo após imersão em água com temperatura inicial de 100ºC seguido de repouso fora do aquecimento por 24 horas e na presença de luz contínua.

A retomada do crescimento da raiz primária ocorre em sementes germinadas de Senna multijuga com até 3 mm de comprimento secas diretamente em sílica ou incubadas em PEG -1,4MPa. Contudo, essa recuperação acontece em baixas porcentagens e apenas as sementes com radícula de 1 mm de comprimento apresentam sobrevivência superior a 60%.

Nas concentrações testadas de ABA não se observam melhorias no processo de reindução de tolerância à dessecação, sendo sua presença prejudicial à retomada do crescimento da raiz primária de Senna multijuga.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    25 Jul 2013
  • Aceito
    03 Dez 2014
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