Acessibilidade / Reportar erro

CONTRIBUIÇÕES DA ANÁLISE DO DISCURSO E DA EPISTEMOLOGIA DE FLECK PARA A COMPREENSÃO DA DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA E SUA INTRODUÇÃO EM AULAS DE CIÊNCIAS

Contributions of Discourse Analysis and Fleck's epistemology to the comprehension of Popular Science and its introduction in science classrooms

Resumos

Neste artigo a divulgação científica é entendida como produção de um círculo esotérico constituído por cientistas e jornalistas. Nele busco caracterizar as condições de produção deste tipo de texto tendo para tanto apoio em categorias da Análise do Discurso e da epistemologia de Fleck. A divulgação científica é compreendida em termos de circulação intercoletiva de idéias, ou seja, pelo fluxo de informações que ocorre entre o círculo esotérico e o círculo exotérico de não especialistas. Discuto ainda as implicações das mediações realizadas durante a produção dos textos de divulgação e sua inserção na sala de aula. Finalmente, comento a possibilidade de que estas mediações venham a se constituir obstáculos na aprendizagem formal de conceitos científicos sendo ressaltadas as relações entre os contextos de produção e significação dos textos de divulgação científica no processo de leitura.

divulgação científica; análise do discurso; Fleck; ensino de ciências.


In this article, the popular science is seen as production of an "esoteric" circle constituted by scientists and journalists and comprehended in terms of intercollective communication of ideas, i. e., by the exchange of information that occurs between the "esoteric" circle and the "exoteric" circle of non specialists. I try to characterize the conditions of production of the popular scientific text using categories of Discourse Analysis and Fleck's epistemology. I also argue the implications of the mediations that occur when the popular scientific text is produced and introduced in science classroom later. Finally, I discuss the possibility that those mediations might constitute obstacles for the formal scientific concepts learning. In order to accomplish it, the relations between the context of production and meaning making of popular scientific text are considered in the reading process.

popular science; discourse analysis; Fleck; science teaching.


Texto completo disponível apenas em PDF.

Full text available only in PDF format.

  • AIRES, Joanez. et al. Divulgação científica na sala de aula: um estudo sobre a contribuição da revista Ciência Hoje das Crianças. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS, 4., 2003, Bauru, SP. Atas... Porto Alegre: ABRAPEC, 2003. 1 CD.
  • ALMEIDA, Maria José P. M. O texto escrito na educação em física: enfoque na divulgação científica. In: ALMEIDA, Maria José P. M.e SILVA, Henrique César (Orgs.) Linguagens, leituras e ensino da ciência. Campinas, SP: Mercado de Letras: Associação de Leitura do Brasil, 1998. 208 p.
  • ALVETTI, Marco Antônio S. Ensino de física moderna e contemporânea e a revista Ciência Hoje. 1999. 169f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Centro de Ciências da Educação, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.
  • ALVETTI, Marco Antônio S. e CUTOLO, Luiz Roberto A. Uma visão epistemológica da circulação de idéias presentes na comunicação científica. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE ENSINO DE FÍSICA, 16., 2005, Rio de Janeiro. Programa e Resumos... Rio de Janeiro: SBF: CEFET/RJ: UERJ, 2005.
  • BACHELARD, Gaston. A formação do espírito científico. Rio de Janeiro: Contraponto, 1996. 316 p.
  • BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes (Coleção Ensino Superior), 1992. 510 p.
  • BUENO, Wilson da C. Jornalismo científico: conceitos e funções. Ciência e Cultura, Campinas, 37 (9), p. 1420-1427, 1985.
  • CARDOSO, Sílvia Helena B. Discurso e ensino. Belo Horizonte: Autêntica, 1999. 168 p.
  • CHAVEZ, Taniamara V. e MACHADO, Rodrigo Batista. Uma proposta para o ensino de física com textos de divulgação científica. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE ENSINO DE FÍSICA, 16., 2005, Rio de Janeiro. Programa e Resumos... Rio de Janeiro: SBF: CEFET/RJ: UERJ, 2005.
  • CHELINI, Maria-Júlia Estefânia e MARANDINO, Martha. Recursos lingüísticos e extra- lingüísticos em textos de divulgação: um estudo piloto sobre o tema moluscos. In: ENCONTRO PERSPECTIVAS DO ENSINO DE BIOLOGIA, 9., 2004, São Paulo. Caderno de Programa e Resumos... Campinas, SP: Graf. FE, 2004.
  • CRUZ, Frederico F. de S.; FERRARI, Nadir e RIBEIRO, Maria Cecília M. O uso da divulgação científica como instrumento didático num tema interdisciplinar. In: ENCONTRO DE PESQUISA EM ENSINO DE FÍSICA, 7., 2000, Florianópolis. Resumos... São Paulo: SBF, 2000. 1 CD.
  • CUTOLO, Luiz Roberto A. e DELIZOICOV, Demétrio. O currículo do curso de graduação em medicina da UFSC: análise a partir das categorias fleckianas. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS, 2., 1999, Valinhos. Atas... Porto Alegre: ABRAPEC, 1999. 1 CD.
  • DA ROS, Marco Aurélio e. DELIZOICOV, Demétrio Estilos de pensamento em saúde pública. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS, 2., 1999, Valinhos. Atas... Porto Alegre: ABRAPEC, 1999. 1 CD.
  • DELIZOICOV, Demétrio. Pesquisa em ensino de ciências como ciências humanas aplicadas. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, Florianópolis, v. 21, n. 2, ago. 2004.
  • DELIZOICOV, Nadir C. O movimento do sangue no corpo humano: história e ensino. 2002. 253 f. Tese (Doutorado em Educação) - Centro de Ciências da Educação, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.
  • FLECK, Ludwik. La génesis y el desarollo de un hecho científico. Madrid: Alianza Editorial, 1986. 200 p.
  • GOMES, Isaltina M. A. M. Dos laboratórios aos jornais: um estudo sobre jornalismo científico. 1995. 232 f. Dissertação (Mestrado em Lingüística) - Centro de Artes e Comunicação, Universidade Federal de Pernambuco, Recife.
  • GOUVÊA de Sousa, Guaracira. A Divulgação Científica para Crianças: o caso da Ciência Hoje das Crianças. 2000. Tese (Doutorado em...) - Departamento de Bioquímica Médica, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.
  • LEITE, Raquel C. M.; FERRARI, Nadire. DELIZOICOV, Demétrio A história das leis de Mendel na perspectiva fleckiana. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, Porto Alegre, 1(2), p.97-108, 2001.
  • LOPES, Alice R. C. Livros didáticos: obstáculos verbais e substancialistas ao aprendizado da ciência química. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v.74, n.177, p.309-334, 1993.
  • MAINGUENEAU, Dominique. Novas tendências em análise do discurso. Campinas: Pontes: Ed. da UNICAMP, 1989. 198 p.
  • MARTINS, Isabel; NASCIMENTO, Tatiana G. e ABREU, Teo B. Clonagem na sala de aula: um exemplo do uso didático de um texto de divulgação científica. Investigações em Ensino de Ciências, Porto Alegre, vol.9, n.1, mar. 2004. Disponível em <http://www.if.ufrgs.br/public/ensino/>
    » http://www.if.ufrgs.br/public/ensino/
  • MASSARANI, Luiza e MOREIRA, Ildeu C. A retórica e a ciência: dos artigos originais à divulgação científica. Ciência & Ambiente, Santa Maria, 23, p. 31-47, 2001.
  • NASCIMENTO, Tatiana G. Adaptações de um texto de divulgação científica sobre clonagem para um livro didático de ciências. In: ENCONTRO PERSPECTIVAS DO ENSINO DE BIOLOGIA, 9., 2004, São Paulo. Caderno de Programa e Resumos... Campinas, SP: Graf. FE, 2004.
  • NASCIMENTO, Tatiana G. e. MARTINS, Isabel Análise do movimento de re-elaboração discursiva em dois textos de divulgação científica. 2003. In: Simpósio Nacional de Ensino de Física, 15., 2003, Curitiba. Disponível em <http://www.sbf1.sbfisica.org.br/eventos/snef/xv/>
    » http://www.sbf1.sbfisica.org.br/eventos/snef/xv/
  • ORLANDI, Eni P. As histórias das leituras. Leitura: teoria & prática. Porto Alegre: Mercado Aberto, Ano 3, p. 7-9, jul. 1984.
  • ORLANDI, Eni P. Discurso e leitura. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1993. 168 p.
  • ORLANDI, Eni P. A linguagem e seu funcionamento: as formas do discurso. 4. ed. São Paulo: Pontes, 1996a. 280 p.
  • ORLANDI, Eni P. Interpretação: autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólico. 2. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1996b. 150 p.
  • ORLANDI, Eni P. Análise de discurso: princípio e procedimentos. Campinas: Pontes, 1999. 100 p.
  • PINTO, Milton José. Comunicação e discurso: introdução à análise de discursos. São Paulo: Hacker Editores, 1999. 128 p.
  • ROCHA, Marcelo B. O potencial didático dos textos de divulgação científica segundo professores de ciências. 2003. Dissertação (Mestrado em Tecnologia Educacional) - Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.
  • SALÉM, Sônia e KAWAMURA, Maria Regina. O texto de divulgação e o texto didático: conhecimentos diferentes? In: ENCONTRO DE PESQUISADORES EM ENSINO DE FÍSICA, 5., 1996. Belo Horizonte. Atas... São Paulo: SBF, 1996.
  • SCHEID, Neusa Maria J.; DELIZOICOV, Demétrioe. FERRARI, Nadir A proposição do modelo de DNA: um exemplo de como a história da ciência pode contribuir para o ensino de genética. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS, 4., 2003, Bauru, SP. Atas... Porto Alegre: ABRAPEC, 2003. 1 CD.
  • SILVA, Leandro L. As analogias na divulgação científica: o caso da Ciência Hoje das crianças. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS, 4., 2003, Bauru, SP. Atas... Porto Alegre: ABRAPEC, 2003. 1 CD.
  • STUDIES IN HISTORY AND PHILOSOPHY OF BIOLOGICAL AND BIOMEDICAL SCIENCES, vol. 35. Cambridge, UK: Elsevier, 2004.
  • TERRAZAN, Eduardo Adolfo. O potencial didático dos textos de divulgação científica: um exemplo em física. In: ALMEIDA, Maria José P. M.e SILVA, Henrique César (Orgs.). Linguagens, leituras e ensino da ciência Campinas, SP: Mercado de Letras: Associação de Leitura do Brasil, 1998. 208 p.
  • TERRAZAN, Eduardo Adolfo e GABANA, Marciela. Um estudo sobre o uso de atividades didáticas com texto de divulgação científica em aulas de física. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS, 4., 2003, Bauru, SP. Atas... Porto Alegre: ABRAPEC, 2003. 1 CD.
  • ZAMBONI, Lílian Maria S. Cientistas, jornalistas e a divulgação científica: subjetividade e heterogeneidade no discurso da divulgação científica. Campinas, SP: Autores Associados, 2001. 167 p.
  • *
    Bolsista CAPES.
  • 1
    Este autor promove ainda a distinção entre disseminação e divulgação científica. Ambas constituem-se modalidades do que ele chama difusão científica a qual consiste em "todo e qualquer processo ou recurso utilizado para veiculação de informações científicas e tecnológicas" (BUENO, 1985, p.1421). Ao contrário da divulgação, a disseminação diz respeito à difusão de conhecimentos que os cientistas fazem entre os pares.
  • 2
    A circulação intercoletiva de idéias pode ocorrer nos dois sentidos, porém, neste artigo destaco apenas o movimento existente desde o grupo de produtores da DC para o público não especialista.
  • 3
    No caso do coletivo de pensamento exclusivo dos cientistas, a circulação intracoletiva fica caracterizada pela disseminação dos conhecimentos científicos intrapares (BUENO, 1985).
  • 4
    O texto, para a AD, consiste na forma empírica do uso da linguagem (PINTO, 1999), na unidade de análise do discurso (ORLANDI, 1993).
  • 5
    Segundo o referencial da AD, as condições de produção envolvem o contexto histórico-social de formulação do texto, os interlocutores (autor e leitor), os lugares onde eles se situam, as imagens que eles fazem de si e dos outros e o objeto da fala (ORLANDI, 1999).
  • 6
    Bachelard (1996) constrói sua teoria do conhecimento científico com base no conceito de obstáculos epistemológicos os quais, segundo ele, são causas de estagnação, regressão e inércia que impedem a formação do espírito científico. Além de explorar a noção de obstáculo epistemológico no desenvolvimento histórico do pensamento científico, Bachelard reflete sobre a prática pedagógica. É em termos de obstáculos pedagógicos que ele comenta as dificuldades que os professores têm em compreender como se dá a aprendizagem de conceitos científicos, isto é, pela impossibilidade de se reconhecer os conhecimentos empíricos já constituídos de seus alunos.
  • 7
    Bachelard (1996) classifica os obstáculos epistemológicos em diferentes tipos, entre eles, o obstáculo verbal que é definido como "a falsa explicação obtida com a ajuda de uma palavra explicativa, nessa estranha inversão que pretende desenvolver o pensamento ao analisar um conceito, em vez de inserir um conceito particular numa síntese racional" (p.27). Ao comentar esse obstáculo, o epistemólogo destaca o perigo do uso de metáforas para a formação do espírito científico, uma vez que nem sempre elas apresentam imagens passageiras; estas "levam a um pensamento autônomo; tendem a completar-se, a concluir-se no reino da imagem" (idem, p.101).
  • 8
    De acordo com Orlandi (1984), "há leituras previstas para um texto" (p.7). Esta previsibilidade tem como elementos determinantes os sentidos históricos (relacionados aos funcionamentos do texto num tempo histórico) e a intertextualidade (conjunto de relações entre os textos que mostram como o texto deve ser lido).
  • 9
    Segundo Orlandi (1984), há especialistas que legitimam o processo histórico da leitura e que podem ser considerados críticos nos diversos domínios científicos. Assim, "ao mesmo tempo em que avaliam a importância de um texto, os críticos fixam-lhe um sentido que é considerado o desejado (o prestigiado) para a leitura" (p.8). É nesse circuito da leitura de prestígio em que atua o professor de ciências.
  • 10
    Vale ressaltar que esta apropriação do discurso da DC por meio de textos de revistas, jornais etc. Pelo professor não necessariamente se dá na escola, podendo ocorrer em diversos espaços fora dela.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2005
Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais Av. Antonio Carlos, 6627, CEP 31270-901 Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, Tel.: (55 31) 3409-5338, Fax: (55 31) 3409-5337 - Belo Horizonte - MG - Brazil
E-mail: ensaio@fae.ufmg.br