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REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E RECONFIGURAÇÃO DA ÁREA CENTRAL DE FORTALEZA

productive restructuring and reconfiguration of the central area of Fortaleza

Resumo

O texto discute a temática metropolitana sob a ótica da reestruturação produtiva, especialmente, as transformações espaciais e a reconfiguração da área central de Fortaleza. O foco é voltado à compreensão dos processos sócio-espaciais em sua configuração com fragmentos, resíduos e novas centralidades, testemunhos do processo de produção da cidade à luz da reestruturação imobiliária como estratégia de reprodução do capital. A hegemonia do capital financeiro e das empresas construtoras nacionais ou transnacionais, reforçam mecanismos de reprodução sócioespacial alterando a estrutura urbana e a expansão da malha urbana. Constata o peso e a expressão assumidos pelos condomínios, loteamentos murados e shoppings que alteram o preço da terra urbana e modificam, sobremaneira, o uso do solo.

Palavras-chave:
Metrópole; Reestruturação produtiva; Fragmentação da cidade; Centralidade

Abstract

The text discusses the metropolitan theme from the perspective of productive restructuring, especially the spatial transformations and the reconfiguration of the central area of Fortaleza. The focus is placed upon the comprehension of the social-spatial processes in their configuration with fragments, residues and new centralities, which testify to the process of production of the city in the light of property restructuring as a strategy for the reproduction of capital. The hegemony of financial capital and of the national and transnational construction companies reinforces mechanisms of social-spatial reproduction altering the urban structure and the expansion of the urban sprawl. This text confirms the significance and importance of the condominiums, walled properties and shopping malls which alter the price of urban land and modify, above all, the use of the soil.

Key words:
Metropolis; Productive restructuring; Fragmentation of the city; Centrality

Résumé

Le texte aborde le thème métropolitain du point de vue de la restructuration productive, en particulier les transformations spatiales et la reconfiguration de la zone centrale de Fortaleza. L'accent est mis sur la compréhension des processus socio-spatiales dans leur configuration avec des fragments, des résidus et de nouvelles centralités, qui témoignent du processus de production de la ville à la lumière de la restructuration d'immobilier comme une stratégie pour la reproduction du capital. L'hégémonie du capital financier et des entreprises nationales et transnationales construction renforcent les mécanismes de reproduction sociale-spatiale, la modification de la structure urbaine et l'expansion de l'étalement urbain. Ce texte confirme la signification et l'importance des condominiums, des propriétés fortifiées et des centres commerciaux qui modifient le prix des terrains urbains et modifient, surtout, l'utilisation du sol.

Mots clés:
Métropole; Restructuration productive; Fragmentation de la ville; Centralité

INTRODUÇÃO

Fortaleza não está inserida no rol das cidades de grande porte que tiveram um passado colonial reconhecido pela valorização do acervo arquitetônico, traçado de ruas, igrejas suntuosas de forte teor artístico, quando comparada com outras cidades como Recife e Salvador e São Luiz. Ao contrário, só adquiriu feições urbanas compatíveis com estatuto de cidade do século XIX, com o advento do mercado algodoeiro quando se transformou em centro de coleta e exportação daquele produto. Com o comércio do algodão a cidade passou a se comunicar com o sertão através da Estrada de Ferro de Baturité. Seu porto, mesmo precário devido as arrebentações das vagas marinhas, passou por sensíveis melhorias. A partir de então, além de exercer as funções de sede administrativa do Ceará, a cidade se firmou como excepcional empório comercial, situação que ostenta até hoje. O algodão deixou importante legado para Fortaleza. O centro da cidade expressava a efervescência da acumulação do capital mercantil, com melhorias urbanas até então desconhecidas como o alinhamento de vias e de edificações, construção de prédios mais sofisticados em contraste com o casario pobre e simples dominante na paisagem urbana. O período áureo do algodão termina com o fim da Guerra de Secessão, nos Estados Unidos, responsável pela destruição das lavouras americanas organizadas em torno de seu cultivo, pautada em mão de obra escrava. A carência de matéria prima para os teares ingleses exigiu que o mercado estimulasse o plantio e comprasse algodão cultivado noutras áreas do mundo. Com o fim da Guerra de Secessão (1861 e 1865) se dá a desaceleração da economia local e regional. Com ela, termina também o fausto do chamado ouro branco que introduziu o Ceará na divisão internacional do trabalho. Além da crise, nos momentos de estiagem mais prolongada, quando a seca dizimava os cultivos, levas e levas de flagelados dirigiam-se à cidade em busca da ajuda oficial ou de esmolas da igreja ou da sociedade. Ao fim do período, muitos permaneciam na cidade ocupando suas bordas, nas imediações do centro. Mais tarde, a partir dos anos 30, do século XX, formaram-se as favelas. Da mesma forma, como não ocupavam terras inseridas na trama da indústria imobiliária, não incomodava aqueles que se organizavam em volta do Centro.

Muitas das cidades que vivenciaram a decadência de seus centros tradicionais empenharam-se na tarefa de requalificar e reestruturar suas áreas centrais visando aproveitar a infra-estrutura instalada e desfrutar do excepcional capital simbólico que possuem tendo em vista a obtenção de maior renda fundiária. Sobre esse tema assim se manifestou Maricato (2001)MARICATO, Ermínia. Brasil, cidades: alternativas para a crise urbana. Petrópolis: Editora Vozes, 2001; "dotados de uma infra-estrutura excepcional em relação às demais regiões da cidade, os centros metropolitanos vêm sofrendo um significativo esvaziamento ao mesmo tempo em que as periferias crescem extensivamente." (MARICATO, 2001MARICATO, Ermínia. Brasil, cidades: alternativas para a crise urbana. Petrópolis: Editora Vozes, 2001;)

A degradação de áreas centrais tem sido recorrente no Brasil e noutras cidade do exterior. A resposta a esse processo tem sido o estabelecimento de políticas de revigoramento dessas cidades. Mesentier (2006)MESENTIER, L.M de, Metrópole: patrimônio e 'revitalização urbana', In: SILVA, C..A., FREIRE, D.G., OLIVEIRA, J.F.G.de, (orgs.).Metrópole:governo, sociedade e território.: Rio de Janeiro: DP&AFaperj, 2006. "as áreas urbanas de valor patrimonial quando localizadas nos bairros centrais das cidades, estão no foco das políticas públicas de reestruturação da metrópole, porque podem tornar-se um fator de atração para os centros urbanos de atividades produtivas e, por conseqüência, as intervenções urbanas em áreas de valor patrimonial podem ser um fator de dinamização do mercado imobiliário metropolitano." (MESENTIER, 2006MESENTIER, L.M de, Metrópole: patrimônio e 'revitalização urbana', In: SILVA, C..A., FREIRE, D.G., OLIVEIRA, J.F.G.de, (orgs.).Metrópole:governo, sociedade e território.: Rio de Janeiro: DP&AFaperj, 2006.)

Pautados nesses pressupostos, alguns projetos foram implantados com o objetivo de reabilitar essas áreas. São bem conhecidos os do Pelourinho, em Salvador, o do Recife Antigo, o de São Luiz. Essas restaurações urbanas, a exposição de camadas temporais acumuladas, preservação de 'pedaços do passado', com paredes sem reboco, partes de piso ao lado de equipamentos renovados com itens tecnológicos avançados nada mais são que encenação. Essas áreas antigas, agora revisitadas e repaginadas, se inscrevem na lógica da reprodução do capital transformando tempo e espaço pretéritos em mercadorias.

Discutindo esse processo espacial à luz do movimento do capital Lefebvre é enfático ao afirmar que "as centralidades antigas, a decomposição dos centros são por ela substituídas pelo centro de decisão" (LEFEBVRE, 1991LEFEBVRE, Henri. O Direito à Cidade. São Paulo: Editora Moraes, 1991.).

Em contrapartida, os centros de decisão referidos por Lefebvre ganharam forte expressão empresarial a partir da Segunda Guerra Mundial, quando transformaram a terra urbana em condição de acumulação. Arrais (2014-p.50) diz que "essa dinâmica demográfica metropolitana pode ser traduzida pela constante necessidade por terra para dar suporte às diversas atividades sociais e econômicas (indústrias, comércio varejista e atacadista, serviços e, especialmente, habitação) traduzidas em diferentes usos do solo e localizações. Os ambientes metropolitanos são, tradicionalmente, ambientes de pressão fundiária e imobiliária". (ARRAIS, 2014).

São setores das cidades convertidos em bairros modernos, equipados com vias largas, praças, áreas de lazer e de entretenimento, centros comerciais, empresariais e de serviços conforme o processo de reestruturação do capital. Esses bairros geralmente são parcelados em lotes maiores que dão lugar a enormes estruturas como arranha-céus com capacidade de extrair o máximo de renda diferencial sobre o lote usado. Redes modernas de tubulação, antenas com forte capacidade de rastrear satélites de comunicação, feixes de fibras óticas, cabeamento e de transporte, fazem desses centros espaços preferenciais. A incorporação de grandes equipamentos confere notoriedade aos bairros novos. Seu entorno passa a ser valorizado ampliando seus limites. As cidades com forte poder de comando no contexto do mundo globalizado têm carência de novos territórios para expansão de suas atividades, daí a verticalização acentuada ou conversão de bairros para fins de alojar comércio e serviços bem como os convertidos em bairros residenciais os mistos através do processo chamado gentrification. Em muitos casos, aproximam de seu centro tradicional, considerando a qualidade da infra-estrutura instalada e noutros em situação de desuso. No contexto da reestruturação produtiva os centros urbanos e as cidades foram valorizados e considerados um patrimônio de valor inestimável, o que justifica, conforme Jeudy (1987)JEUDY, Henri-Pierre. Une Crise de la Conservation Monumentale, In: Metamorphoses de la Ville. Paris:Economica, 1987. "A conservação sob todos seus aspectos continuaria então promovendo estratégias seguras face à ameaça de desaparecimento de signos culturais identitários." (JEUDY, 1987JEUDY, Henri-Pierre. Une Crise de la Conservation Monumentale, In: Metamorphoses de la Ville. Paris:Economica, 1987.).

O centro de Fortaleza em sua trajetória sempre foi alvo de políticas públicas e espaço de grandes investimentos privados que emprestaram aquele setor da cidade importância e reconhecimento. Nos últimos anos, um esvaziamento acentuado, tem comprometido várias das múltiplas funções por ele exercidas em especial, as da administração pública e serviços ligados ao setor judiciário. A paulatina transferência do poder com saída do palácio de despacho do Governo, de várias secretárias, da Câmara Municipal e da Assembléia Legislativa pesaram sobremaneira, na expressividade da área central como ponto vital da cidade. Num primeiro momento, denota-se que o processo de verticalização buscava o afastamento do centro ocasionando alteração no preço da terra e ampliação da malha urbana da cidade e de sua área metropolitana.

Hoje, face ao intenso processo de parcelamento e uso do solo as áreas mais afastadas do núcleo tradicional, apresentam problemas ligados à distância e às despesas com deslocamentos. Assim, a verticalização, num processo inverso, aproxima-se, aos poucos, do centro da cidade, evidenciando a busca de vantagens locacionais devido à contínua desvalorização dos imóveis localizados no entorno do centro. O contraditório do processo é que o mesmo movimento gerador da acentuada desvalorização do entorno do centro com a busca de áreas novas mais afastadas, vêm provocando uma valorização da terra urbana, principalmente com o remembramento mento de lotes.

No caso de Fortaleza esse processo se dá no entorno do perímetro da delimitação da área central, ou seja, o centro expandido. Ocorre, face à destruição de edificações de reconhecido valor histórico e arquitetônico.

A cidade mesmo não estando incluída no rol das cidades brasileiras de expressivo valor histórico de seu patrimônio material e imaterial, necessita de políticas de requalificação da área central conforme a expressão histórica e cultural de suas edificações e possibilidades de manejo dos recursos naturais remanescentes. Lidar com áreas de interesse histórico e geográfico exige cuidado no empreendimento, pois, segundo Magalhães (1997)MAGALHÀES, Aloísio, E Triunfo? Rio de Janeiro, Fundação Roberto Marinho, 1997., "No caso dos monumentos de pedra e cal não faz sentido restaurá-los para que voltem depois a ser abandonados. É preciso reinserir esse bem na vida da comunidade." (MAGALHÀES, 1997MAGALHÀES, Aloísio, E Triunfo? Rio de Janeiro, Fundação Roberto Marinho, 1997.).

No caso de Fortaleza, as intervenções realizadas são pontuais, incapazes de ocasionar resultados semelhantes ao ocorrido noutras cidades nordestinas. A emergência de novos bairros de expressiva centralidade na vida de relações da cidade acirra uma competição desigual com o centro tradicional. A qualidade da infra-estrutura urbana desses bairros confirma as novas centralidades. É grande o volume de capital investido. Em contrapartida, as intervenções realizadas no centro tradicional, mesmo considerando sua alta densidade histórica e pluralidade cultural, não consegue vencer o processo de fragmentação e a emergência de diferentes territórios em seu interior.

A CIDADE ULTRAPASSA O CENTRO

O centro reunia todas as funções necessárias para atender as demandas da capital cearense. Era pólo administrativo, comercial e de serviços. Possuía sede do governo de todos os poderes e de empresas ligadas aos setores comercial e financeiro.

A cidade crescia conforme os ditames da economia cearense baseada na produção e comércio internacional do algodão. Amalha urbana espraiava-se, em todas as direções. Aexpansão, entretanto, não foi suficiente para que o centro ultrapassasse os limites traçados no século XIX. Transpor o Pajeú, riacho localizado a leste da área central, foi um grande feito. O riacho praticamente desapareceu da paisagem urbana. Na porção Leste, a Avenida Dom Manuel definiu novos fluxos norte/sul e facilitou a expansão para a Aldeota, bairro de prestígio que capturou parte substancial das atividades da área central. Esses limites foram fundamentais na delimitação e reforço das funções centrais da cidade.

No pós Segunda Guerra a cidade cresce num ritmo mais acelerado e a partir da década de cinqüenta do século XX muda, sensivelmente sua configuração. O centro, entretanto, permanecia exercendo suas funções e mantendo sua centralidade sobre a cidade. À medida que crescia a malha urbana e se adensava aumentava o poder de direcionamento exercido pelos segmentos sociais de maior poder aquisitivo na instalação dos meios de consumo coletivo.

A busca do lugar faz da cidade um espaço de conquistas. A população carente, concentrada na porção periférica e em permanente estado de demanda, contrasta com os bairros que se equipam e aperfeiçoam seus serviços urbanos. Nos anos trinta a cidade vivencia o surgimento das primeiras favelas, instaladas em áreas mais distantes dos bairros mais ocupados e equipados. Uma das características do processo de favelização em Fortaleza era a ocupação dos leitos das vias. Os lotes e quadras permaneciam intocados, entretanto, seus proprietários para alcançá-los, tinham que trafegar pelas vielas resultantes da ocupação do leito da via. As favelas não incomodavam, até certo ponto, essa nova classe média que se transferia para a parte leste da cidade, especialmente para a Aldeota. Trata-se de uma classe média pequena, ainda em fase de formação, entretanto, com forte poder de acumulação através do mercado de terras. Para Alva (1997)ALVA, Eduardo Neira, In: Metrópoles Insustentáveis. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1997. "As metrópoles são, de todo modo, centros de processos de crescimento econômico, nos quais a acumulação de economias externas fomenta investimentos públicos e privados e onde o monopólio da terra contribui destacadamente para a formação de capital privado através do mercado imobiliário".

O contínuo processo de expansão da malha urbana com o parcelamento paulatino das terras do entorno, a transposição dos fatores que impediam a extensão da malha como a construção de pontes, canalização de riachos e aterramentos expressava o crescimento da cidade. A capital cearense mostrava pujança demográfica e sérios problemas sociais com o aumento da pobreza urbana. As políticas públicas implementadas são incapazes de atender a demanda reprimida de um expressivo contingente populacional. Ao mesmo tempo, no momento que se consolida uma política de transferência maciça da população para a porção periférica da cidade, observa-se uma descentralização do sistema de transporte que fragmentou o núcleo e provocou parcial perda da polaridade exercida pela área central. Davis (2001)DAVIS, Mike. Ecologia do Medo. Rio de Janeiro/São Paulo: Editora Record, 2001., analisando a situação da realidade urbana da costa oeste americana diz que "as perdas dos velhos subúrbios são geralmente o ganho de alguém. Assim como os loteamentos após a Segunda Guerra Mundial roubaram empregos e receitas dos centros das cidades, agora seus bolsos estão sendo pilhados por novos centros urbanos mais afastados nos braços em espiral da galáxia metropolitana."

Essa alteração estrutural no interior da cidade vem impulsionando uma intensa reorganização espacial. São grandes intervenções comandadas pelo setor privado que impõe obras a serem executadas pelo governo do Estado e pela Prefeitura, ocasionando a formação de novas demandas habitacionais e de transporte. No centro tradicional, face às transformações ocorridas em sua estrutura e dinâmica é expressivo o número de estabelecimentos comerciais e de serviços que cerraram suas portas e abandonaram suas atividades. Mudaram de ramo, voltou-se para outro público.

Teixeira em estudo sobre Vitória recorre à Jaramillo, que afirma existir ligação entre a produção da construção e a terra urbanizada, apropriada por meio do produto edificado quando é consumido, mesmo que este não tenha produzido a terra urbanizada. A partir desta constatação questiona como então estudar o processo produtivo da construção e a urbanização e pergunta que referências tomar. (CAMPOS JÚNIOR, 2011).

NOVAS CENTRALIDADES

A recuperação de núcleos históricos tem sido uma tentativa de inserção com maior vigor, desses centros na tessitura da cidade. É novamente Magalhães (1997)MAGALHÀES, Aloísio, E Triunfo? Rio de Janeiro, Fundação Roberto Marinho, 1997., quem melhor interpreta essa política. Para ele "A SEPLAN na posição de tentativa de compreensão do fenômeno de evolução brasileira mais ampla, já tinha identificado e já estava agindo com o programa de recuperação das cidades históricas, na direção de recuperação vocacionada dos conjuntos dos bens culturais do Nordeste, em primeiro lugar." (MAGALHÀES, 1997MAGALHÀES, Aloísio, E Triunfo? Rio de Janeiro, Fundação Roberto Marinho, 1997.).

Considerando a infra-estrutura instalada no bairro, o centro fica em desvantagem quanto à expansão urbana e os meios de consumo coletivo. Afora os meios de circulação, há de se levar em conta a concentração espacial dos meios de consumo coletivo, responsáveis pela emergência de bairros marcados pela forte concentração espacial dos meios de produção e reprodução.

O pressuposto do preço de comercialização da terra urbana leva em conta a instalação da infra-estrutura, equipamentos e serviços. Os mesmos variam conforme a capacidade de compra das classes sociais para as quais se destinam. Conforme Harvey (2004- pp.86/87)HARVEY, David. O Novo Imperialismo. São Paulo: Loyola, 2004.

Mudar relações espaciais de fato funciona como condição necessária que molda as reorganizações políticas que nos cercam. Eis como veremos em breve, um aspecto crucial em que se intersecionam as lógicas territorial e capitalista. As condições particulares das indústrias de transporte e comunicações ilustram um problema mais geral. O movimento fluido sobre o espaço só pode ser estabelecido mediante a instalação de certas infra-estruturas físicas no espaço.

Prossegue Harvey (2004- p.87)HARVEY, David. O Novo Imperialismo. São Paulo: Loyola, 2004.

A paisagem geográfica da atividade capitalista está eivada de contradições e tensões e que ela é perpetuamente instável diante de todos os tipos de pressões técnicas e econômicas que sobre ela incidem. As tensões entre competição e monopólio, concentração e dispersão, centralização e descentralização, fixidez e movimento, dinamismo e inércia, entre diferentes escalas de atividade - todas essas tensões advêm dos processos moleculares de acumulação interminável do capital no espaço e no tempo."

Na análise da relação produção/consumo, o centro de Fortaleza fica em desvantagem em relação às novas áreas da cidade. É inegável que no contexto da reestruturação produtiva Fortaleza vivenciou a emergência de novas centralidades. Esse processo tem sido verificado em centros tradicionais que passaram por um processo de esvaziamento face à ação do capital imobiliário com forte poder de gerar, em várias escalas, diferenças sócio-espaciais e suas conseqüências na organização espacial vinculadas à globalização em franco andamento. No caso de Fortaleza, a cidade cresceu muito, dando origem a bairros mais equipados com infra-estrutura de consumo coletivo e mais baratos e eficientes quanto aos custos de instalação e manutenção dessa infra-estrutura ocupando hoje a posição de quinta cidade brasileira. Com população superior a dois milhões e meio de habitantes, a capital cearense apresentou, a partir dos anos sessenta, um acentuado crescimento demográfico, em período marcado pela forte repressão política que se inicia em 1964 e se estende até o início dos anos 80. Somam-se a isso fatores estruturais e conjunturais, explicativos da expansão recente da cidade, o aumento do número de favelas, a construção de enormes conjuntos habitacionais o que ocasiona a formação de extensas áreas periféricas. Esta franja pobre que contorna a cidade concentra milhares de migrantes oriundos de áreas sertanejas, num crescente fluxo, decorrente do êxodo rural engrossado pelas fileiras de flagelados nos períodos de estiagem. Considerando o conjunto metropolitano, o total da população aproxima-se dos três milhões e meio de habitantes. Quanto a sua oficialização, a Região Metropolitana de Fortaleza, foi do tipo compulsório, ou seja, instituída e definida por força legal (Lei Complementar n° 14/73). No que tange à realidade sócio-espacial, significa dizer que sua institucionalização deu-se antes que o processo de metropolização se manifestasse. No seu início, quando de sua instalação, a RMF, era constituída pelos municípios de Fortaleza, Caucaia, Maranguape, Pacatuba e Aquiráz. Em conformidade com a legislação em vigor, um novo município para integrar a região metropolitana teria que ser resultado de desmembramento ocorrido devido à emancipação de distritos dos municípios matriciais. Foi o que aconteceu com os distritos de Eusébio, Guaiúba, Itaitinga e Maracanaú que após o processo emancipatório passaram a integrar o espaço metropolitano. A Constituição de 1988 transferiu para os governos estaduais o poder de agregar mais municípios ou criar novas regiões metropolitanas. No caso de Fortaleza, por força de leis posteriores a 1988, foram agregados os municípios Horizonte, Pacajús, Chorozinho, São Gonçalo do Amarante, Cascavel e Pindoretama.

Fortaleza inicia um processo de crescimento a partir dos anos cinqüenta, quando adquire ares de cidade mais organizada. A política habitacional implantada pelo BNH - Banco Nacional da Habitação, criado em 1964, nos primórdio da ditadura militar, resultou no esgarçamento do tecido urbano da cidade. O Conjunto Prefeito José Walter localizado no extremo sul do território do município, data de 1971. Sua construção comprova esse processo espacial de expansão da malha urbana e extensão da rede de infra-estrutura, equipamentos e serviços essenciais. Os demais conjuntos construídos a partir desta política aguçavam a especulação imobiliária. Os vazios urbanos se beneficiavam com a expansão da infra-estrutura. Ainda nos anos setenta a cidade se expande em direção à franja periférica. O Distrito Industrial de Fortaleza, instalado em Maracanaú, na época, distrito do município de Maranguape. A partir dos anos oitenta, a cidade inicia o processo de preenchimento de seus vazios urbanos. Os movimentos sociais se pronunciam registrando suas reivindicações, gerando instabilidade ao governo militar. Simultaneamente, a cidade conhece um processo de verticalização, mesmo que localizado. Tal processo indica quão poucos os bairros dotados de infra-estrutura, capazes de dar suporte a uma população mais numerosa. É o momento da expansão da Aldeota e da ocupação da zona leste da cidade. Uma classe média emergente composta, majoritariamente, de funcionários públicos e técnicos mais especializados, procura lugares mais equipados para morar.

Aausência de políticas públicas reguladoras do uso do solo e do ordenamento do espaço urbano explica em parte o fato dos planos urbanos elaborados não terem sido implantados integralmente. A cidade até então era monocêntrica, o que garantia hegemonia e dinâmica da área central. Nos anos oitenta, o advento dos shoppings center completa o que fora iniciado nos anos setenta quando a cidade deu lugar a enormes supermercados, construídos em diferentes bairros. Nos anos noventa, com a instalação dos terminais de transporte urbano, a cidade se fragmenta mais, formando distintos territórios. Aliada à pressão do capital privado, o Estado fomenta a descentralização e a fragmentação. Cabe como exemplo a construção do Centro Administrativo do Estado, no sítio Cambeba. Trata-se de uma área integrante da grande Messejana, localizada na sua porção nordeste. Com características rurais, o sítio Cambeba era desconectado do mundo de relações da cidade. Quando da construção do Centro Administrativo, o custo especulativo da terra urbana apresentou aumento considerável.

As políticas de transferência maciça da população para as áreas periféricas do espaço metropolitano, instigam várias indagações sobre o destino de expressivas parcelas a serem atingidas por grandes obras projetadas pelo Estado e pela Prefeitura. São obras de forte impacto na configuração e composição urbana com expressivo peso na localização de grandes estruturas comerciais e de serviços no processo de remanejamento da população e no plano da mobilidade e ecessibilidade urbana. Para SILVA(2005, p. 111)SILVA, J. B. da. A região metropolitana de Fortaleza. In: SILVA, José Borzacchiello da; CAVALCANTE TC; DANTAS, EWC. (Org). Ceará: um novo olhar geográfico. Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2005. "o processo de fragmentação metropolitana, associado a uma descentralização e desconcentração da indústria, resultou na escolha de cidades menores, para receber novos investimentos".

Dentre as várias intervenções destacam-se: Trem Metropolitano de Fortaleza, (Metrofor), instalação dos BRTs, (Bus Rapid Transfort), VLT (Veículo Leve sobre Trilho), reforma do Estádio Presidente Vargas, Estádio do Castelão (tendo em vista a Copa de 2014), abertura de túneis, alargamento de vias, construção de novos centros comerciais, expansão do Porto do Pecém, do Aeroporto Internacional Pinto Martins e do Distrito Industrial de Maracanaú. No contexto da discussão de política de recuperação da área central, uma obra do porte do Metrofor deveria ser a grande possibilidade de se promover uma reestruturação daquela porção da cidade. O sistema metroviário não pode e não deve ser implantado como mera modernização de um sistema de transporte voltado às facilidades de mobilidade e acessibilidade mais rápida e segura dos passageiros. Ao contrário, esse modal, quando implantado deve conter propostas capazes de requalificar espaços, ampliando as possibilidades de resgate das áreas servidas e mais ainda, quando tratar-se de centro da cidade. O centro de Fortaleza, apesar dos problemas impostos pela substituição de uso do solo, tem sido contemplado com grandes obras, o que tem resultado na ampliação de sua coroa imediata. Intervenções como a construção de mercados centrais e centros culturais deveriam ser capazes de provocar a requalificar as áreas onde são implantados. No caso do centro de Fortaleza, as intervenções foram realizadas, entretanto, não ocorreu o impacto esperado. Um dos equipamentos mais importantes foi o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, localizado na extremidade nordeste, estendendo-se até às proximidades do antigo Porto do Poço da Draga, área contígua ao centro e vizinha da Praia de Iracema. Foi a obra que provocou maior impacto nessa área ocupada anteriormente por vários armazéns já desativados. Sua construção ocasionou expressiva valorização de seu entorno e visível alteração na fisionomia urbana da cidade e conseqüente pressão para a transferência da população trabalhadora remanescente das antigas atividades portuárias. Quanto ao centro da cidade, no que refere ao seu núcleo, não se observou mudança significativa. O Novo Mercado São Sebastião, na porção Sudoeste do centro, próximo ao início da Avenida Bezerra de Menezes, Novo Mercado Central, construído próximo a Fortaleza Nossa Senhora de Assunção, na porção oriental do centro. Nos dois casos, a localização na periferia imediata do centro impediu que esse impacto ocorresse. Os dois equipamentos são importantes para a cidade, entretanto, não foram capazes de alterar os fluxos e as atividades da área central.

A falta de articulação entre esses novos equipamentos impede que eles funcionem plenamente na sua condição de centros nodais aptos a atender novas demandas da população. A dinâmica aparente das intervenções físicas mais recentes no entorno do núcleo tradicional não devolve a pujança de outrora. O centro não é mais o local privilegiado dos acontecimentos mais significativos, de atividades que fizeram dele no passado, o bairro mais importante da capital.

Essa constatação tem provocado diferentes tentativas de reintegração do centro de Fortaleza à malha urbana de prestígio da cidade. Tratando-se de uma das áreas mais antigas de Fortaleza, uma das medidas liga-se as políticas recentes de recuperação de centros históricos patrocinadas pelo IPHAN e órgãos estaduais ligados ao patrimônio cultural e à memória urbana. A busca da valorização patrimonial com o tombamento de edifícios, escavações, recuperação de fachadas, resgate de tempos pretéritos com retirada de revestimentos que comprovam sucessivas camadas de tempo, seria, em parte, capaz de devolver parte do prestígio do centro da cidade. Foram vários os levantamentos das diversas intervenções realizadas em edifícios isolados, praças e logradouros, associados à política de construção ou aproveitamento de edifícios identificados como de grande valor histórico para alojar centros culturais, centrais de artesanato ou similares. Dessa forma, Fortaleza ingressaria na prática de restaurar o acervo arquitetônico e urbanístico com feições do passado, visando a reinserção de porções da cidade com suas temporalidades diferenciadas na dinâmica espacial cotidiana, como marca da política de reabilitação urbana, como já ocorreu noutras cidades brasileiras. Em Fortaleza os edifícios restaurados que mais chamam a atenção são a Antiga Cadeia Pública, hoje ocupada por lojas de artesanato; a Igreja do Rosário, a mais antiga da capital e a Fortaleza Nossa Senhora da Assunção.

E O CENTRO PERDE PRESTÍGIO

Os poderes manifestos no centro de Fortaleza emanam de forças e correntes políticas contidas no cotidiano da cidade. De sede do poder convencional expresso nos diversos tipos de gestão do estado o centro ganhou novos proprietários. A população mais pobre e amplos setores da periferia descobriram e incorporaram em seu cotidiano a variedade de espaços públicos de animação e entretenimento disponíveis no centro da cidade. Apropriando-se de uma área bem estruturada, esses grupos constituíram novos territórios descolando-os de antigas relações funcionais tornando-os autônomos e diferenciados. Mantendo a forma urbana, alguns equipamentos e um mobiliário urbano como herança de seu período áureo, esses novos territórios expressam por seu uso e conteúdo, um amálgama de tempos múltiplos. No centro, são nítidas as diferenças entre os freqüentadores e os respectivos usos atribuídos às diversas áreas territorializadas. Alguns espaços conjugados constituem eixos estruturantes do setor central da cidade. É o que acontece com as praças do Ferreira e José de Alencar, interligadas no sentido leste-oeste e vice-versa pela Rua Guilherme Rocha. Os fluxos e refluxos gerados por esses dois logradouros garantem uma dinâmica especial à área central. Esta via de ligação, antiga Rua do Ouvidor, conecta esses dois espaços numa equilibrada combinação. Basta observar que cada uma dessas praças tem nas suas imediações espaços similares inseridos noutra dinâmica, como a Praça dos Leões na porção leste e a da Lagoinha, na porção oeste. Uma política de reorientação e alocação de equipamentos e serviços pretende modificar substancialmente o uso desses logradouros e integrá-los à rede de circulação da área central. De modo análogo, grupos de pressão, motivados pela perspectiva do potencial patrimonial do centro, buscam identificar outros corredores, estruturá-los com novos equipamentos e serviços, considerando seus arredores. Essa reorientação não se restringe às meras propostas de reforma ou embelezamento desses logradouros. Algo mais consistente tem sido pensado na perspectiva de reintegração do centro à cidade.

Para Roncayolo (1987)RONCAYOLO, Marcel. Metamorphoses de la Ville - Avant Propos. Paris: Economica, 1987.,

A cidade, a ação sobre a cidade e na cidade não podem pertencer exclusivamente ao mundo da materialidade, dos arranjos físicos: ela é assunto de imagens, de representações, quando se pensa na projeção intelectual que conduz os construtores de utopias, ao planejamento ou às representações que permitem aos habitantes da cidade se apropriarem dos espaços urbanos e às vezes modelar o seu sentido.

Essa possibilidade de modelagem em Fortaleza não tem sido levada em consideração na perspectiva do planejamento. É visível nas intervenções realizadas a ausência de uma visão arrojada sobre as múltiplas possibilidades de uso que o centro sugere. Delas, reabilitar a função residencial, aumentando sua densidade demográfica através de um projeto que ocasionaria uma mudança no tipo de uso do solo, favorecendo a animação social e, simultaneamente, uma política de recuperação e restauro de edifícios públicos e privados e, ao mesmo tempo, garantir e adequar a utilização da magnífica infra-estrutura e qualidade dos equipamentos ali instalados. Integrar o centro nos circuitos culturais divulgando o potencial de suas praças, de suas edificações e de seu rico mobiliário urbano é uma possibilidade de resgatar um modo de vida característico.

Em passado recente, o centro continha territórios tão diversos conforme o crescimento e a composição da população da cidade. As diferenças se comprimiam e encontravam mecanismos de sobrevivência. Os poderes expressos pelo Palácio da Luz, a Assembléia Provincial, o Palácio do Bispo ali estavam presentes. Bazares, clubes, alfaiatarias, Escola Normal conviviam com feiras populares. A rigidez das normas impostas pelo Código de Postura exigia atitudes e gestos coerentes com o nível de urbanidade que a cidade vivenciava.

Qualquer pesquisa sobre lugares da memória e expressão urbana em Fortaleza apontará o centro como local de concentração de um universo de símbolos e significados identitários do Ceará. Ali estão localizados o Teatro José de Alencar, Museu do Ceará, Palácio da Luz, Igreja do Rosário, Fortaleza N. Sra. Da Assunção, Estação João Felipe, Parque da Criança, Praça do Ferreira, Praça José de Alencar, a centenária Faculdade de Direito. Acrescente-se um razoável número de ruelas estreitas com povo comprimido, os calçadões, praças. Entretanto, apesar da constatação desta significação, as políticas propostas até agora para o centro não provocaram o impacto esperado. Por outro lado, a apropriação do centro por uma população de menor poder aquisitivo, acusa uma resignificação de praças, monumentos, edificações e outros logradouros.

Malgrado sua expressão enquanto espaço da memória urbana da cidade, nos últimos trinta anos um acentuado processo de verticalização vem alterando sobremaneira o perfil da cidade e sua paisagem urbana. As inovações tecnológicas incorporadas aos modelos construtivos reconfiguraram, bruscamente, a cidade. Essa expansão ocupou áreas novas, sendo muitas consideradas como de preservação como campo de dunas, manguezais, lagoas e leitos de rios. Desse processo surgiram inúmeros bairros novos. Alguns, antigos, foram repaginados por novos usos e ocupação. Nessa expansão desenfreada a cidade transfigurou-se, perdeu muito de sua identidade. A mácula mais forte em sua imagem reside no desprezo e abandono parcial de seu centro. O conglomerado central, disforme e fragmentado, expressão de múltiplos tempos e espaços diferenciados não acompanhou a veloz dinâmica urbana da cidade. Relegado e pouco ajustado às imposições do rearranjo sócio-espacial, esta porção de Fortaleza converteu-se, por esta razão entre outras, em excelente resíduo arquitetônico e paisagístico do que fora a cidade de outrora, lugar privilegiado da memória coletiva do cearense. O centro permanece como um verdadeiro relicário de formas pretéritas, impregnado de lembranças e marcas de sucessivos modos de vida conhecidos pela capital com uso diferenciado pela população, que dele apropriou-se.

O centro não só espelhava a cidade em sua magnitude, ele era a cidade, depositário único de perfis e imagens que construíram e reforçaram a idéia de cearensidade. Seu suposto abandono é, contraditoriamente, garantia de sua preservação. A cidade apaga sua memória com seu centro praticamente intacto, exceto o que foi demolido para dar lugar a estacionamentos. Esta situação de mudança de usuários e de uso é a possibilidade de, no resgate do centro, a cidade em sua totalidade, reencontrar-se com seu passado, com sua História, com o seu sentido. Hoje, o dinamismo do centro está ajustado às condições sócio-econômicas de sua clientela. A pujança do informal tem rebatimento direto com as dificuldades encontradas ali pelo setor formal da economia. Basta ver o número de lojas e escritórios fechados naquela área e o surgimento de centros comerciais com boxes minúsculos, Novo Beco da Poeira, Mercado do Esqueleto, Feira da Sé, feirinhas. A redução funcional do centro no que tange às funções políticas, financeiras e de entretenimento, tem registro na situação falimentar dos cinemas, bancos e vários serviços públicos que migraram para outros bairros da cidade. O luxuoso e vetusto cinema São Luiz, último remanescente do áureo período do cinema na área central, ressente-se hoje, da fuga de seu público para as salas dos modernos centros comerciais.

Malgrado o peso do centro como lugar pleno de formas vivas de um Ceará antigo, sua recuperação caminha a passos lentos. Mesmo em se tratando de território objeto de inúmeras intervenções, os ruídos gerados por sucessivas discussões não foram capazes de alcançar resultados mais alvissareiros. Denota-se um fosso entre o teor dos discursos e resultados que evidenciem sua eficácia e eficiência. Na verdade, grande parte das políticas tem servido para aguçar o esvaziamento de funções e depreciação econômica de equipamentos e de parte substancial do mobiliário urbano da área central. Para Villaça (2001)VILLAÇA, Flávio. Espaço Intra-Urbano no Brasil. São Paulo: Studio Nobel: FAPESP: Loncoln Institute, 2001. "Os centros de nossas metrópoles são áreas complexas constituídas por várias subáreas, caracterizadas por certa concentração de atividades do setor terciário...os centros principais de nossas metrópoles atingiram sua máxima extensão física por volta da década de 1950".

O centro de Fortaleza pulsa independente da precariedade visual expressa pelo desmanche de equipamentos e infra-estrutura que em passado recente eram fundamentais para a cidade. Com um movimento extraordinário, ele revela sua capacidade de excepcional praça comercial, gerador e prestador de serviços, de lazer e animação. Os fluxos de pessoas e veículos evidenciam a vitalidade, a permanência e o potencial daquela área da cidade, esvaziada cotidianamente de suas atividades de status e prestígio, típicos de seu período áureo, iniciado na segunda metade do século passado. Os primeiros vestígios de mudança começaram nos anos sessenta. Apesar da sucessiva substituição de atividades e de classes sociais, o centro resiste como espaço simbólico. Mesmo reconhecendo esta capacidade de resistir, são evidentes as marcas deixadas pelas recentes mudanças funcionais e a morosidade das políticas voltadas à sua reestruturação e requalificação urbanas.

A Estação Central do Metrofor é a grande intervenção que ocorre atualmente neste setor da cidade. A Praça do Ferreira continua com ares de vitrine de um projeto mais ambicioso de requalificação do centro. Entretanto, ela isolada num conjunto extremamente diferenciado, não foi suficiente para instaurar um processo de reconversão de uso da área central. Nichos bem definidos, com suas territorialidades próprias, permanecem compondo e decompondo o centro. Os dois casos a seguir ilustram bem esta situação. O do setor sudeste do quadrilátero central constituído pela antiga Escola Normal, compreendendo o trecho contido entre a Avenida D. Manuel, Rua Conde D'Eu., no sentido Leste/Oeste e as Ruas Costa Barros e Pinto Madeira, no sentido norte/sul. Essa área possui enorme potencial instalado seja devido ao volume edificado ou pela qualidade do construído ou a expressão do peso institucional ali contido. Esse trecho tem significativa expressão no setor educacional, com instituições públicas e privadas de ensino de diferentes níveis - o centenário Colégio Imaculada Conceição, Colégio Estadual Justiniano de Serpa, Centro de Estudos Sociais Aplicados da UECE - Universidade Estadual do Ceará, CDL - Centro dos Diretores Lojistas e Prefeitura Municipal de Fortaleza, entre outros. Este trecho sem sombra de dúvida constitui um apêndice do centro, apresentando sérios problemas de conexão com a malha viária dominante. O baixo curso do riacho Pajeú e o Setor Cerealista da cidade, nas imediações da Catedral metropolitana e o Mercado São José ainda na área central, contribuem para isolar aquela área de expressão institucional tão diversa, contribuindo para sua fragmentação. No extremo norte da cidade, em plena área litorânea, novos investimentos insistem em integrar esses setores isolados no contexto das atividades de animação e de entretenimento, o Mercado Central a reforma do Teatro São José, o Centro Cultural Dragão do Mar e a remodelação da Avenida Monsenhor Tabosa, apostaram nisso. Os dois exemplos vinculam-se à expansão do centro em direção à Aldeota e Praia de Iracema, bairros mais equipados e de maior prestígio da cidade. O mesmo não ocorre com os dois setores da porção oeste, a partir da Praça da Lagoinha e todo o conjunto da Jacarecanga Trata-se de áreas que gozaram de muito prestígio no passado, estando hoje, totalmente descaracterizadas. A proximidade do centro tem provocado um processo de verticalização nesta área. No outro lado, no sudoeste, do centro, o Novo Mercado de São Sebastião, ainda não conseguiu uma função integradora daquele setor com a malha e o movimento da área central propriamente dita.

Destaque-se a implantação, em 1974, do primeiro centro comercial da cidade, nos moldes dos modernos shoppings. Hoje, afastados da área central, localizados em importantes eixos de circulação e exercendo enorme centralidade, são mais de doze e vários estão em construção. Os shoppings center estabelecem acirrada competição entre espaços públicos e privados na cidade. Discutindo e criticando as práticas de revalorização dos espaços públicos, Hastaoglou (1991)HASTAOGLOU, Vithleem, Recomposition de la vie e de l'espace urbains, In: Les Raisons de L'Urbain-Colloque International, Rennes, LARES-Université Rennes-France. assim se coloca

Data do início dos anos 70, a emergência de propostas teóricas, de projetos e realizações visando restaurar as 'qualidades perdidas' do espaço urbano para recuperar o que se chama de cultura urbana. Inicialmente difusas e opostas, unidas por vez devido à reação comum face aos estragos causados pela prática do urbanismo modernista, elas atingem pouco a pouco o estatuto semi oficial e ganham coesão referindo-se a dois aspectos principais da questão: reformar o espaço físico da cidade, melhoria da qualidade de vida e organizar novas formas de vida coletiva...a rejeição de normas organizacionais e morfológicas do urbanismo funcionalista assim como seus efeitos sobre a segregação de funções e a fragmentação dos espaços e do tempo que estão na base do declínio da noção de espaço público e que serviram de causas à alienação urbana acarretando a perda da identidade da cidade.

Para os jovens de classe média a preferência recai sobre os centros planejados de compras com suas amplas áreas de circulação, praças de alimentação e lazer. Para o jovem da periferia o centro tradicional é o espaço preferencial da festa e do encontro. Os jovens de classe média não se reconhecem facilmente no centro tradicional. De um modo geral, os habitantes da cidade comungam com idéia de revalorização da área central, expressando de forma nítida a vontade de que o bairro seja devolvido aos cidadãos. É evidente o peso polarizador da área central sobre toda a cidade, fazendo-a responsável pela mais significativa parcela de negócios realizados na capital. Os centros tradicionais das cidades brasileiras mudaram muito nos últimos anos e Fortaleza não ficou imune a esse processo. É nítida a acirrada competição intra-urbana que se estabelece entre os centros tradicionais e alguns bairros, alguns, equipados com enormes pólos de compras deixam esses centros em desvantagem.

No caso específico de Fortaleza, não se pode dizer que o centro deixou de exercer suas funções, apesar das perdas sofridas. Reconhece-se que parte delas, as mais qualificadas daquela área da cidade, estava ligada a concentração de atividades voltadas a um público de maior poder aquisitivo. Dos equipamentos e serviços de prestígio que permanecem no Centro destacam-se o religioso com a Catedral metropolitana, o militar com a sede da 10ª Região Militar, instalada em expressivo sítio histórico ocupado pelo Forte de Nossa Senhora da Assunção.

CENTRO: MUTAÇÕES E RESISTÊNCIAS

O centro de uma cidade adquire vestígio de uma área destacada nas atividades urbanas quando ele é capaz de gerar relações cotidianas inerentes a um determinado modo de vida, diferenciando-o dos demais setores da cidade.

Atendendo a múltiplos desejos, o centro favorece esse entrecruzamento de interesses. Nas praças do Ferreira e José de Alencar, desenham-se campos específicos de práticas sociais inseridas no cotidiano da cidade. A Praça José de Alencar é o próprio parlamento da cidade, seu púlpito primeiro e mais significativo.

A afluência de moradores de todos os recantos garante público para todas as pregações, independente de cor ou credo. A periferia e a cidade encontram-se no centro. A cidade e seu entorno experimentam uma aparente conexão que se manifesta em logradouros que contém alta densidade histórica e pluralidade cultural. O centro de Fortaleza, repartido, fragmentado, com diversos territórios em seu interior é, cada vez mais, espaço privilegiado de encontro, de trocas e de múltiplas solidariedades. Ele encerra em si, na íntima relação que mantém com a periferia, a possibilidade de recriar, com excessiva redução do glamour de outrora, um universo de atividades nele desenvolvidas. A modernidade moldou e deixou sua marca naquela porção da cidade estando presente nas linhas de alguns edifícios, no traçado de praças, em instalações comerciais e serviços.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Numa cidade que se firma como portão de entrada para o turismo nacional e internacional o pobre é um hóspede incômodo. Em nome da Copa de 2014, as obras avançam sem considerar a promoção social. O caso mais evidente é o do projeto de implantação do VLT - Veículo Leve sobre Trilhos. Quando implantado, deverá ligar os bairros do Mucuripe à Parangaba facilitando o acesso sem a necessidade de ida ao centro da cidade ou aos terminas de transporte. Os moradores das comunidades assentadas há muitos anos estão sendo ameaçados de remoção, sem que lhes sejam dadas informações claras e precisas. O desespero e as diferentes reações em forma de organização, alianças com setores sociais mais avançados, provocam intensa mobilização, a medida que se anuncia o início das obras. Não se leva em conta apenas o contingente atingido, posto que a implantação dessas obras, de peso estruturante para o uso e ocupação do solo, deve ocasionar um acelerado processo de reestruturação e requalificação urbanas na cidade. A implantação de um sistema metroviário em fase avançada de construção significará intensa alteração na fisionomia da área central da cidade. Discute-se se ele será capaz de requalificar o centro da cidade, área carente de investimentos integrados, atual reduto preferencial dos pobres que se dirigem para Fortaleza, fazendo do centro, cada vez mais, centro da periferia.

A cidade nova que desponta, surge sem marcas referenciais. As manifestações de certo compromisso com o novo, exclui o centro. Os Projetos de reestruturação e de requalificação são necessários. Conforme Maricato (2001)MARICATO, Ermínia. Brasil, cidades: alternativas para a crise urbana. Petrópolis: Editora Vozes, 2001;, "A requalificação ou recuperação de áreas deterioradas implica em considerar o patrimônio público ou privado, já construído, como poupança, num processo de complementação com obras urbanas." Ao proporem limpeza, segurança, restauração de edificações e de logradouros que formam parte significativa do perfil e da imagem construída da cidade mostram uma nova forma de ver e ler a cidade e demarcam especialmente, uma nova postura em relação aquele espaço.

O metrô, quando em pleno funcionamento, certamente, acentuará a rádioconcentricidade histórica da cidade e significará um grande reforço na centralidade exercida por ele, em Fortaleza. Entretanto, será nas imediações da área central que o sistema metroviário requalificará uma vasta porção de bairros, parcialmente degradados, até agora excluídos de certa forma do vertiginoso crescimento que tem marcado Fortaleza nos últimos trinta anos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2015

Histórico

  • Recebido
    Nov 2015
  • Aceito
    Dez 2015
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