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O fazer científico nos estudos literários: das práticas letradas acadêmicas às características epistemológicas1 1 Este artigo está vinculado às ações do projeto Ateliê de Textos Acadêmicos, com apoio do Programa Nacional de Pós-Doutorado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (PNPD/Capes), via processo nº 23038.007066/2011-60.

Scientific practice in literary studies: from academic literacy practices to epistemological characteristics

RESUMO

Este artigo pretende estudar a configuração de práticas letradas acadêmicas na área dos estudos literários. Para tanto, selecionamos oito artigos científicos da área, publicados em periódicos de diferentes estratos de classificação do Qualis Periódicos 2013-2016 de Linguística e Literatura, e aplicamos um questionário a sete estudantes e profissionais que atuam no campo dos estudos literários. Os dados são analisados com base nos aportes dos novos estudos de letramento, mais especificamente a abordagem dos letramentos acadêmicos, e do interacionismo sociodiscursivo. As análises apontam que as práticas letradas acadêmicas da área se caracterizam por uma postura interpretativista, interdisciplinaridade e primado do texto literário, o que demonstra o caráter situado de concepções epistemológicas e da arquitetura do gênero artigo científico.

PALAVRAS-CHAVE:
letramentos acadêmicos; estudos literários; interacionismo sociodiscursivo

ABSTRACT

This article aims to analyze the configuration of literary practices in literary studies. For such, eight academic articles from this field published in journals with different classifications according to Qualis Capes 2013-2016 in Linguistics and Literature were selected, and a questionnaire was applied to seven students and professionals who work in the field of literary studies. The data are analyzed based on contributions from the New Literacy Studies, specifically the approaches of Academic Literacy and Socio-discursive Interactionism. The results show that academic literacy practices of the field are characterized by an interpretative stance, interdisciplinarity, and the prevalence of literary texts, demonstrating their predisposed nature towards epistemological conceptions and how the academic article genre is constructed.

KEYWORDS:
Academic Literacy; Literary Studies; Socio-discursive Interactionism

1 Introdução

Os estudos sobre letramento(s) acadêmico(s) têm ganhado força nas pesquisas em linguística aplicada no Brasil, visando investigar práticas de leitura e de escrita no meio universitário tanto para descrevê-las quanto para propor alternativas didáticas que possam subsidiar o ensino e a aprendizagem naquele contexto. Esses estudos, grosso modo, têm apontado a natureza complexa, múltipla e situada dessas práticas, o que nos faz pensar, (para) além das habilidades de leitura e de escrita - as quais, decerto, são componentes importantes delas -, também nos contextos particulares que envolvem essas atividades e têm implicações determinantes para a caracterização, o ensino e a aprendizagem delas.

Nesse direcionamento, nosso trabalho focaliza práticas letradas num contexto específico: o fazer científico nos estudos literários. Podemos compreender os estudos literários, panoramicamente, como área do conhecimento que se interessa pela literatura, no sentido mais amplo, como forma de expressão artística. Essa forma de arte, entretanto, não tem uma definição objetiva. Eagleton (2003EAGLETON, T. Teoria da literatura: uma introdução. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.), depois de questionar algumas definições de literatura amplamente disseminadas (escrita de ficção, emprego peculiar da linguagem, discurso não pragmático, escrita “bela”), chega à conclusão de que a noção de literatura deriva de juízos de valor (ideologias) que são construídos social e historicamente e, por isso mesmo, variáveis. Os estudos da área enfocam as obras consideradas literárias (do cânone à chamada literatura de massa, literatura popular, passando também pela relação com outras mídias, linguagens e artes, e ainda com o ensino), abordadas a partir de variados enfoques teóricos, como fenomenologia, hermenêutica, estética da recepção, estruturalismo, pós-estruturalismo, semiótica, psicanálise e crítica sociológica, demonstrando, assim, que a área pode dialogar com outras, como filosofia, sociologia, história, psicologia e estudos culturais. Quanto à abordagem metodológica, geralmente rejeita-se, conforme Murad e Vicente (2010MURAD, S.; VICENTE, R. Ciência e literatura: irradiações e convergências. Revista de Letras, São Paulo, v. 50, n. 2, p. 389-405, jul.-dez. 2010. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2MojTkv >. Acesso em: 4 out. 2013.
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), o paradigma positivista, sob o argumento de ser reducionista no tratamento de um objeto artístico, que pede, na visão de Pinheiro (2003PINHEIRO, H. Pesquisa em literatura: atitudes e procedimentos. In: PINHEIRO, H. (Org.). Pesquisa em literatura. Campina Grande: Bagagem, 2003. p. 15-58.), uma apreensão mais sensível, que leve em conta sensibilidade e intuição. Desse modo, privilegia-se um paradigma qualitativo.

Nosso objetivo neste trabalho é analisar a configuração de práticas letradas que caracterizam essa área. Interessa-nos, especificamente, entender quais são os valores e normas que subjazem a concepções epistemológicas, percepções dos sujeitos e parâmetros de produção de textos acadêmicos, notadamente artigos científicos. Ao compreender como membros de uma disciplina usam a linguagem de certa maneira, para interagirem nas redes acadêmicas e profissionais das quais fazem parte, estamos construindo interpretações também sobre as concepções epistemológicas da área, ou seja, os modos como representam e fazem ciência. Esse nosso empreendimento, assim, pode ser útil a escritores experientes e, principalmente, a escritores novatos e professores, no sentido de entenderem, apreenderem e, porventura, questionarem escolhas que caracterizam as formas de fazer ciência na referida disciplina.

Teoricamente, respaldamo-nos na abordagem dos letramentos acadêmicos, derivada dos novos estudos de letramento ou estudos de letramento, quanto à caracterização das práticas de letramento; e no interacionismo sociodiscursivo, quanto às operações de linguagem que são mobilizadas nos textos. Como material de análise, definimos artigos publicados em periódicos científicos e respostas a um questionário aplicado a estudantes e profissionais da área dos estudos literários.

O artigo está organizado da seguinte forma: primeiramente, exporemos conceitos dos estudos sobre letramento e do interacionismo sociodiscursivo, os quais fundamentam teoricamente nossas reflexões; em seguida, descreveremos os procedimentos de geração e de análise dos dados (artigos científicos e questionários); posteriormente, apresentaremos a análise desses dados, relacionando-os; por fim, teceremos nossas considerações finais.

2 A abordagem dos letramentos acadêmicos

A abordagem dos letramentos acadêmicos, que fundamenta nosso trabalho, nasceu no seio dos novos estudos de letramento ou estudos de letramento, a partir da obra pioneira de Street (1984STREET, B. V. Literacy in theory and practice. Cambridge: Cambridge University Press, 1984.), cujas concepções repercutiram em outros estudos, como os do próprio Street (1993STREET, B. V. Introduction: the new literacy studies. In: STREET, B. V. (Ed.). Cross-cultural approaches to literacy. Cambridge: Cambridge University Press, 1993. p. 1-21. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2MsgHV0 >. Acesso em: 10 jun. 2017.
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, 2014STREET, B. V. Letramentos sociais: abordagens críticas do letramento no desenvolvimento, na etnografia e na educação. São Paulo: Parábola, 2014.), de Barton e Hamilton (1998BARTON, D.; HAMILTON, M. Local literacies: reading and writing in one community. London; New York: Routledge, 1998., 2000) e Gee (2008GEE, J. P. Social linguistics and literacies: ideology in discourses. 3. ed. Abingdon; New York: Routledge, 2008.), e, no Brasil, de Soares (2006SOARES, M. Alfabetização e letramento. 4. ed. São Paulo: Contexto, 2006., 2009SOARES, M. Letramento: um tema em três gêneros. 3. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.), Kleiman (1995KLEIMAN, A. B. (Org.). Os significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a prática social da escrita. Campinas: Mercado de Letras, 1995.) e Kleiman e Assis (2016), para citar apenas algumas referências.

Street (1984STREET, B. V. Literacy in theory and practice. Cambridge: Cambridge University Press, 1984.) opõe-se à visão da escrita como sistema de comunicação autônomo, independente do contexto. Nessa visão, o letramento é entendido como conjunto de técnicas e habilidades cognitivas que os indivíduos adquiririam, permitindo-lhes interagir nos mais variados contextos, quaisquer que sejam as condições sociais, históricas e culturais de um grupo. Por essa razão, essa concepção é denominada por ele de modelo autônomo, pois a escrita, como habilidade genérica e universal, não se relaciona com os diferentes usos que os indivíduos podem fazer dela.

Em oposição, o autor propõe um modelo, que ele denomina de ideológico, para compreender a escrita e seus usos como prática social. A premissa básica desse modelo, a qual tomamos para nós, é de que “o que práticas e conceitos particulares de leitura e escrita são para uma dada sociedade depende do contexto; que eles já estão incorporados em uma ideologia e não podem ser isolados ou tratados como ‘neutros’ ou meramente ‘técnicos’”2 2 No original: “what the particular practices and concepts of reading and writing are for a given society depends upon the context; that they are already embedded in an ideology and cannot be isolated or treated as ‘neutral’ or merely ‘technical’” (STREET, 1984, p. 1). (STREET, 1984STREET, B. V. Literacy in theory and practice. Cambridge: Cambridge University Press, 1984., p. 1, tradução nossa). Nesse caso, o letramento não estaria localizado na mente das pessoas como habilidade cognitiva, nem nos textos como técnica, mas na interação entre as pessoas como uso, como prática social.

Nessa perspectiva, a escrita está indissoluvelmente associada a relações de poder, valores e regras sociais de determinado grupo, em determinado contexto. Desse modo, os significados do letramento dependem dos participantes e das instituições em que as atividades de leitura e de escrita acontecem. Depreendemos que o letramento é situado em diferentes contextos sociais, com significados e propósitos específicos conforme tais contextos.

As atividades de leitura e de escrita, assim, conformam-se a certos padrões, valores e normas das instituições sociais e dos participantes, ou seja, conformam-se a certas práticas. De acordo com Barton e Hamilton (2000BARTON, D.; HAMILTON, M. Literacy practices. In: BARTON, D.; HAMILTON, M.; IVANIČ, R. (Ed.). Situated literacies: reading and writing in context. London; New York: Routledge, 2000. p. 7-14.), as práticas de letramento variam mediante contextos, esferas de atividade (Cf. BAKHTIN, 2016BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. São Paulo: Editora 34, 2016.) e sistemas, de modo que, como as pessoas interagem em situações comunicativas variadas e com diferentes propósitos, existem distintas formas de usos da escrita (letramentos) associados a elas. Cada um desses domínios, portanto, possui atividades particulares que obedecem a certas regularidades e configurações, que definem formas particulares de uso da escrita. Assim, falamos de letramentos múltiplos porque as práticas, as convenções, os valores, as instituições, os papéis sociais dos participantes e os textos funcionam de modo específico em cada esfera.

Em nosso caso, focalizamos as práticas letradas no contexto acadêmico. Lea e Street (1998LEA, M. R.; STREET, B. V. Student writing in higher education: an academic literacies approach. Studies in Higher Education, New York, v. 23, n. 2, p. 157-172, Jun. 1998. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2Patpqf >. Acesso em: 14 ago. 2018.
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, 2000LEA, M. R. Academic literacies: a pedagogy for course design. Studies in Higher Education, New York, v. 29, n. 6, p. 739-756, Dec. 2004. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2P6mmyB >. Acesso em: 11 maio 2017.
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, 2014LEA, M. R.; STREET, B. V. (Ed.). Student writing in higher education: new contexts. Milton Keynes; Philadelphia: Open University Press; Society for Research into Higher Education, 2000.) e Lea (2004LEA, M. R.; STREET, B. V. O modelo de “letramentos acadêmicos”: teoria e aplicações. Revista Filologia e Linguística Portuguesa, São Paulo, v. 16, n. 2, p. 477-493, jul.-dez. 2014. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2B5EhTb >. Acesso em: 15 maio 2017.
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, 2005) dedicaram-se a estudar o letramento acadêmico, inaugurando uma abordagem teórico-metodológica e campo de investigação da escrita acadêmica denominada de letramentos acadêmicos. Em trabalho seminal dessa abordagem, Lea e Street (1998, p. 157, tradução nossa) assim nos apresentam a definição de letramento acadêmico:

Aprender no ensino superior envolve a adaptação a novas formas de conhecimento: novas formas de compreensão, interpretação e organização do conhecimento. Práticas de letramento acadêmico - leitura e escrita dentro de disciplinas - constituem processos centrais através dos quais os alunos aprendem novos assuntos e desenvolvem seus conhecimentos sobre novas áreas de estudo. Uma abordagem prática para o letramento leva em conta o componente cultural e contextual das práticas de escrita e leitura, e isso, por sua vez, tem implicações importantes para a compreensão da aprendizagem dos alunos.3 3 No original: “Learning in higher education involves adapting to new ways of knowing: new ways of understanding, interpreting and organizing knowledge. Academic literacy practices - reading and writing within disciplines - constitute central processes through which students learn new subjects and develop their knowledge about new areas of study. A practices approach to literacy takes account of the cultural and contextual component of writing and reading practices, and this in turn has important implications for an understanding of student learning” (LEA; STREET, 1998, p. 157).

A definição anterior nos evidencia a compreensão dos usos da leitura e da escrita na esfera acadêmica como situada em dois sentidos: 1) por localizar-se num domínio particular de uso da linguagem - a academia -, com seus conteúdos, suas maneiras de organizar e divulgar o conhecimento, seus gêneros, enfim, suas regras de funcionamento; e 2) por considerar que esses conhecimentos são ainda mais específicos de cada disciplina4 4 Hyland (2010) afirma que cada disciplina pode ser vista como uma cultura, com seus valores, normas, conteúdos, comportamentos e relações de poder, daí a denominação de cultura disciplinar. Dentro de cada cultura, que não se caracteriza como completamente homogênea, os indivíduos se engajam em interações por meio das quais se podem depreender as concepções e as práticas que constroem a especificidade daquela cultura. , que possui suas próprias formas de fazer ciência, de modo que seja preferível o uso do termo no plural devido às singularidades existentes. Além disso, a especificidade dos letramentos acadêmicos não está apenas nos conteúdos que definem uma área do conhecimento, como a dos estudos literários, mas também em aspectos culturais, que configuram modos de agir, identidades e relações de poder (KLEIMAN; ASSIS, 2016KLEIMAN, A. B.; ASSIS, J. A. (Org.). Significados e ressignificações do letramento: desdobramentos de uma perspectiva sociocultural sobre a escrita. Campinas: Mercado de Letras, 2016.).

Essa forma de compreender a escrita acadêmica suplanta outras duas identificadas por Lea e Street (1998LEA, M. R.; STREET, B. V. Student writing in higher education: an academic literacies approach. Studies in Higher Education, New York, v. 23, n. 2, p. 157-172, Jun. 1998. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2Patpqf >. Acesso em: 14 ago. 2018.
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): a abordagem das habilidades de estudo e da socialização acadêmica. A primeira concebe a escrita acadêmica como um conjunto de habilidades técnicas de natureza especialmente gramatical, que, uma vez ensinadas e aprendidas, podem ser empregadas na leitura e na escrita de qualquer texto acadêmico, de qualquer área do conhecimento, desconsiderando completamente as especificidades das disciplinas. A segunda amplia o foco da abordagem para as convenções de áreas do conhecimento, compreendendo a escrita de modo situado, ou seja, o objetivo principal é a aculturação dos indivíduos para adquirirem os modos de falar, pensar e agir numa determinada disciplina, o que se traduz na apreensão de modelos de gêneros textuais.

A abordagem dos letramentos acadêmicos, embora não desconsidere essas dimensões da escrita, entende que essas questões estão imersas em relações de poder, identidades e aspectos institucionais. Por um lado, os textos materializam as práticas letradas e, por isso, são os instrumentos para se inferirem e interpretarem as configurações das práticas de letramento histórica e culturalmente construídas nas interações, que determinam as normas institucionais, os participantes e seus papéis e, por conseguinte, a forma e a função que assumem os textos nessas práticas. Por outro, os estudos (LEA, 2005LEA, M. R. “Communities of practice” in higher education. In: BARTON, D.; TUSTING, K. (Ed.). Beyond communities of practice: language, power and social context. Cambridge: Cambridge University Press, 2005. p. 180-197. Doi: https://doi.org/10.1017/CBO9780511610554.010
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; LEA; STREET, 1998, 2000) advogam a necessidade de integrar as características de cada disciplina específica, associadas às concepções de alunos e professores, à interação entre eles e a normas institucionais, para caracterizar as práticas letradas de determinada área, pois são esses aspectos contextuais que moldam os textos.

Como vemos, ganham destaque, nessa abordagem, questões epistemológicas e de identidade, julgadas como decisivas na apropriação e no funcionamento das práticas letradas acadêmicas. Defende-se, assim, uma simbiose entre textos e práticas sociais, que, em nosso estudo, dá-se na integração entre a perspectiva dos letramentos acadêmicos com a análise dos gêneros textuais, aqui representada pela abordagem do interacionismo sociodiscursivo, cujos dispositivos principais de análise de texto serão expostos na próxima seção.

3 Categorias de análise dos artigos: aportes do interacionismo sociodiscursivo

Textos da esfera acadêmica, a exemplo do artigo científico, têm sido objeto de estudo de autores de diferentes correntes teóricas sobre gêneros, no intuito de descrevê-los (BAZERMAN, 1988BAZERMAN, C. Shaping written knowledge: the genre and activity of the experimental article in science. Madison: University of Wisconsin Press, 1988.; BHATIA, 2001BHATIA, V. K. Análise de gêneros hoje. Revista de Letras, Fortaleza, n. 23, v. 1-2, p. 102-115, jan.-dez. 2001. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2vJl2to >. Acesso em: 12 fev. 2013
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; SWALES, 1990SWALES, J. M. Genre analysis: English in academic and research settings. Cambridge: Cambridge University Press, 1990.), didatizá-los (MACHADO; LOUSADA; ABREU-TARDELLI, 2004MACHADO, A. R.; LOUSADA, E.; ABREU-TARDELLI, L. S. Resumo. São Paulo: Parábola, 2004b.a, 2004bMACHADO, A. R.; LOUSADA, E.; ABREU-TARDELLI, L. S. Resenha. São Paulo: Parábola, 2004a., 2005MACHADO, A. R.; LOUSADA, E.; ABREU-TARDELLI, L. S. Planejar gêneros acadêmicos. São Paulo: Parábola, 2005.; MOTTA-ROTH; HENDGES, 2010MOTTA-ROTH, D.; HENDGES, G. R. Produção textual na universidade. São Paulo: Parábola, 2010.; SWALES; FEAK, 1994SWALES, J. M.; FEAK, C. B. Academic writing for graduate students: essential tasks and skills. Ann Arbor: The University of Michigan Press, 1994.) e/ou relacioná-los a práticas de letramento acadêmico (FIAD, 2016FIAD, R. S. (Org.). Letramentos acadêmicos: contextos, práticas e percepções. São Carlos: Pedro & João Editores, 2016.; IVANIČ, 1998IVANIČ, R. Writing and identity: the discoursal construction of identity in academic writing. Amsterdam; Philadelphia: John Benjamins B. V., 1998. Doi: https://doi.org/10.1075/swll.5
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; RINK; BOCH; ASSIS, 2015RINK, F.; BOCH, F.; ASSIS, J. A. (Org.). Letramento e formação universitária: formar para a escrita e pela escrita. Campinas: Mercado de Letras, 2015.).5 5 Um panorama mais amplo e mais completo dos estudos sobre gêneros e práticas letradas da esfera acadêmica é oferecido por Motta-Roth (2008) e Bawarshi e Reiff (2013). Em nosso trabalho, adotamos a perspectiva do interacionismo sociodiscursivo, que assume como uma de suas atribuições, conforme Bronckart (1999BRONCKART, J.-P. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: Educ, 1999., 2006), apresentar uma proposta de classificação dos textos com base nas operações em que se baseia seu funcionamento. Essa proposta coaduna-se com o objetivo de nosso trabalho de analisar o funcionamento de artigos científicos em práticas letradas acadêmicas no campo dos estudos literários.

Os textos, nessa perspectiva, são considerados como condutas verbais e formas de ação, o que nos remete ao conceito central de agir linguageiro, tanto no âmbito das atividades sociais de linguagem, como organizações funcionais criadas historicamente por uma coletividade para garantir a interação e a cooperação entre as pessoas nas formações sociais, quanto no âmbito de ações individuais de linguagem, como parte da atividade de linguagem que é atribuída a um agente singular - por exemplo, a produção ou a compreensão de um texto oral ou escrito.

Os textos são, então, formas de agir linguisticamente, e neles se manifestam as relações entre as produções de linguagem e seu contexto acional e social, ou seja, os textos são o produto de ações linguageiras situadas. Desse modo, são as unidades comunicativas de nível superior situadas, acabadas e autossuficientes do ponto de vista das ações de linguagem, das quais são os produtos empíricos observáveis (BRONCKART, 1999BRONCKART, J.-P. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: Educ, 1999., 2006). Sob esse ponto de vista, os textos nos permitem interpretar/compreender o agir humano, que, em nosso caso, volta-se para práticas letradas do contexto acadêmico.

Ao engajar-se numa ação de linguagem - com vistas à produção de um texto, por exemplo -, um agente deve mobilizar um conjunto de conhecimentos, tratados como capacidades de linguagem (Cf. DOLZ; SCHNEUWLY, 2004DOLZ, J.; SCHNEUWLY, B. Gêneros e progressão em expressão oral e escrita: elementos para uma reflexão sobre uma experiência suíça (francófona). In: SCHNEUWLY, B.; DOLZ, J. (Org.). Gêneros orais e escritos na escola. Campinas: Mercado de Letras, 2004. p. 41-70.), as quais são adquiridas e empregadas pelo agente como produto de uma aprendizagem que é social e acontece em situações particulares de uso da linguagem. Essas capacidades mobilizam operações que culminam no texto empírico, e são definidas por Bronckart (1999BRONCKART, J.-P. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: Educ, 1999.) como mecanismos gerais comuns a toda produção de linguagem e relacionados às propriedades de uma língua natural no âmbito de uma formação social.

As primeiras operações de linguagem a serem mobilizadas dizem respeito, segundo Bronckart (1999BRONCKART, J.-P. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: Educ, 1999., 2006), à situação de ação de linguagem, que compreende representações do agente sobre o contexto físico e sociossubjetivo de produção e o conteúdo temático. O contexto físico engloba as representações sobre emissor, receptor, lugar e momento físicos de produção; já o contexto sociossubjetivo, sobre posição social do autor e do destinatário, lugar social e objetivo da interação. O conteúdo temático, por sua vez, refere-se aos temas, às informações que são apresentadas no texto.

Essas representações servem como base de orientação para outras decisões, como a escolha e adaptação do gênero de texto mais adequado às propriedades da situação. Essa adaptação, defende Bronckart (2006BRONCKART, J-P. Atividade de linguagem, discurso e desenvolvimento humano. Campinas: Mercado de Letras, 2006.), dá-se em função dos objetivos visados, dos valores, do lugar social de produção, dos papéis que assumem os participantes no processo de interação e do maior ou menor conhecimento de um gênero em função das circunstâncias do desenvolvimento pessoal de cada indivíduo quanto a suas experiências de vida e representações do mundo. Desse modo, a uma mesma ação de linguagem podem corresponder textos empíricos com características diferentes.

Tomadas essas decisões, o agente passa a mobilizar conhecimentos que convergem na estruturação do texto empírico, que, na visão de Bronckart (1999BRONCKART, J.-P. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: Educ, 1999., 2006), é uma arquitetura composta de três camadas superpostas: a infraestrutura textual, os mecanismos de textualização e os mecanismos enunciativos.

A infraestrutura, nível mais profundo da arquitetura, engloba:

  • Tipos de discurso: correspondem a formas linguísticas que traduzem nos textos a criação de mundos discursivos (associados à atividade de linguagem). Esses mundos se constroem com base em duas operações: 1) as coordenadas do conteúdo temático podem manter com as coordenadas do mundo ordinário (físico ou sociossubjetivo), no qual ocorre a ação de linguagem, uma relação de conjunção (quando os fatos são acessíveis, apresentados e avaliados relativamente aos critérios do mundo dos protagonistas da ação) ou de disjunção (quando os fatos são apresentados como passados, futuros, plausíveis ou imaginários, situados em outro lugar em relação aos protagonistas da ação), definindo, respectivamente o mundo do expor e o do narrar; 2) as instâncias de agentividade mobilizadas no texto (como personagens, grupos, instituições) e sua inscrição espaço-temporal podem manter com os parâmetros físicos da ação de linguagem relação de implicação (explicitada, com referência a elementos das condições de produção, como dêiticos) ou de autonomia (não explicitada, sem necessidade de referência a esses elementos). O cruzamento dessas operações dá origem a quatro mundos discursivos, que são semiotizados e identificáveis em formas linguísticas, configurando quatro tipos de discurso: 1) interativo (mundo do expor implicado); 2) teórico (mundo do expor autônomo); 3) relato interativo (mundo do narrar implicado); e 4) narração (mundo do narrar autônomo). Esses tipos podem também articular-se, por meio de fusão (integração que dá origem a um tipo misto) ou de encaixamento (justapostos, com fronteiras delimitadas). Aos tipos de discurso está integrada a coesão verbal (CAVALCANTE, 2015CAVALCANTE, R. P. Universidade de Genebra: Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação. Revista Prolíngua, João Pessoa, v. 10, n. 3, p. 105-117, nov. 2015. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2vJmhZA >.Acesso em: 16 maio 2016.
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    ), que é responsável por organizar temporal e hierarquicamente estados, acontecimentos e ações e é semiotizada por verbos e advérbios.

  • Sequências textuais e outras formas de planificação: são as formas de organização linear das macroestruturas semânticas disponíveis na memória do agente produtor. Essas formas combinam-se de diversas maneiras nos textos, do que decorre a heterogeneidade composicional da maioria deles. São seis as sequências: 1) narrativa (visa criar tensão, narrando acontecimentos organizados por um processo de intriga); 2) descritiva (tenciona fazer ver um objeto de discurso por meio da apresentação de suas propriedades); 3) argumentativa (tem o objetivo de convencer por meio da apresentação de um raciocínio argumentativo sustentado por tese e argumentos); 4) explicativa (pretende resolver um problema, apresentando constatações e esclarecimentos acerca de um fenômeno); 5) dialogal (intenta regular a interação, estruturando as conversações em turnos de fala); e 6) injuntiva (objetiva fazer agir, por meio de instruções). São duas as outras formas de planificação: 1) scripts (disposição de acontecimentos ou ações de uma história em ordem cronológica, sem processo de tensão); e 2) esquematização (disposição de informações sem problematização ou contestação).

  • Plano geral: refere-se à organização do conteúdo temático quanto ao modo de dispô-lo e estruturá-lo. Pode assumir formas variadas, em função do gênero, da extensão, do conteúdo temático, das condições de produção. Para efeito de análise, sua descrição pode dar-se na forma de um resumo desse conteúdo temático.

Os mecanismos de textualização têm a função de marcar a organização e a progressão do conteúdo temático. São responsáveis pela coerência temática, na dimensão da linearidade do texto, e designam suas relações lógicas e hierárquicas: articulações da progressão temática, por meio de mecanismos de conexão; e introdução e retomada de referentes, por meio da coesão nominal.

Os mecanismos enunciativos definem o tipo de interação entre o agente-produtor e o(s) destinatário(s) e são responsáveis pela coerência pragmática do texto. Por um lado, designam o posicionamento enunciativo, que situa as instâncias enunciativas (vozes) responsáveis pelo que é dito no texto: autor, expositor ou narrador (conforme o mundo discursivo), personagens, vozes sociais. Por outro, designam as avaliações e os comentários sobre elementos do conteúdo temático, marcadas pelas modalizações.

Portanto, para agir linguisticamente, o agente produtor de um texto deve mobilizar conhecimentos sobre o contexto de produção, o conteúdo temático, o gênero de texto e os recursos de uma língua natural na composição arquitetural, processo que tem como resultado o texto empírico. Essas categorias, particularmente elementos da infraestrutura (tipos de discurso, formas de planificação e plano geral) e dos mecanismos enunciativos (posicionamento enunciativo), ajudar-nos-ão a explicar o funcionamento de artigos científicos no campo dos estudos literários como forma de os agentes aturarem sobre o mundo.

4 O processo de geração dos dados e os procedimentos de análise

Para compreendermos o funcionamento de práticas letradas acadêmicas no campo dos estudos literários, valemo-nos de dois conjuntos de dados.

Um deles é formado por artigos publicados em revistas científicas dessa área. Coletamos aleatoriamente oito artigos de quatro revistas representantes de diferentes estratos de classificação do Qualis Periódicos 2013-2016 em Linguística e Literatura, assim distribuídos:

  • A1, Fontes (2017FONTES, I. S. C. Autoficção, memória e trauma histórico em “Uma fome”, de Leandro Sarmatz. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, Brasília, n. 52, p. 50-65, dez. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2MMeC3b >. Acesso em: 24 out. 2017.
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    ) e Martins e Bulhões (2017MARTINS, G. V.; BULHÕES, R. M. Literatura e espetáculo religioso em um conto de Marcelino Freire. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, Brasília, n. 52, p. 66-79, dez. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2OxuGq3 >. Acesso em: 24 out. 2017.
    http://bit.ly/2OxuGq3...
    );

  • A2, Brunhara (2016BRUNHARA, R. Visualizando a guerra no mundo antigo: o caso de Homero e da Lírica Grega. Nau Literária: Crítica e Teoria da Literatura em Língua Portuguesa, Porto Alegre, v. 12, n. 2, p. 7-18, jul.-dez. 2016. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2MQzyWE >. Acesso em: 24 out. 2017.
    http://bit.ly/2MQzyWE...
    ) e Lucena (2016LUCENA, K. C. Roa Bastos, compilador da história paraguaia. Nau Literária: Crítica e Teoria da Literatura em Língua Portuguesa, Porto Alegre, v. 12, n. 2, p. 19-26, jul.-dez. 2016. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2vHQzvS >. Acesso em: 24 out. 2017.
    http://bit.ly/2vHQzvS...
    );

  • B1, Cunha (2017CUNHA, R. O verdugo e a revolta como princípio ético. O Eixo e a Roda: Revista de Literatura Brasileira, Belo Horizonte, v. 26, n. 2, p. 301-316, ago. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2nFcf7C >. Acesso em: 24 out. 2017.
    http://bit.ly/2nFcf7C...
    ) e Paranhos (2017PARANHOS, K. R. História & teatro, teatro & história: uma relação tão delicada. O Eixo e a Roda: Revista de Literatura Brasileira, Belo Horizonte, v. 26, n. 2, p. 187-205, ago. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2KTlTfH >. Acesso em: 24 out. 2017.
    http://bit.ly/2KTlTfH...
    ); e

  • B2, Furlan (2017FURLAN, S. De Desdêmona a Capitu: Machado de Assis lê Shakespeare. Anuário de Literatura, Florianópolis, v. 22, n. 1, p. 16-30, ago. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2MMbuo5 >. Acesso em: 24 out. 2017.
    http://bit.ly/2MMbuo5...
    ) e Soto (2017SOTO, L. G. Dom Quixote, uma aventura crítica (e apologética). Anuário de Literatura, Florianópolis, v. 22, n. 1, p. 55-71, ago. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2KTs8QH >. Acesso em: 24 out. 2017.
    http://bit.ly/2KTs8QH...
    ).

Além dos artigos, foram observadas também as normas contidas na seção “Diretrizes para autores”. Nela, os periódicos enfatizam o ineditismo e a relação da contribuição com o escopo temático da publicação, além de normatizarem aspectos como titulação dos autores e formatação (número de páginas, padrão de citações e referências). Duas revistas (A1 e A2) expõem diretrizes de avaliação e outras duas (B1 e B2), algumas breves orientações sobre o plano geral do artigo ou do resumo.

Quanto ao seu contexto de produção, os artigos são escritos por pós-graduandos em nível de mestrado e doutorado, além de mestres e doutores de diferentes instituições de ensino e pesquisa do Brasil. São endereçados a outros pesquisadores também da área, que podem acessar os trabalhos via site da revista, no qual há acesso livre, além de portais de indexadores nacionais e até internacionais, a fim de estabelecer uma interlocução entre pesquisadores e a divulgação de conhecimentos produzidos na área. Os temas são bastante diversos, como o são a própria definição do objeto de estudo da área e as relações que ela mantém com outras áreas do conhecimento: produções antigas, como a Ilíada, e contemporâneas, como contos de Leandro Sarmatz e Marcelino Freire; obras do cânone literário mais tradicional, como Dom Casmurro e Dom Quixote, e obras teatrais, como O verdugo; análises alicerçadas em conceitos da crítica literária e também da psicanálise, da filosofia e da sociologia, tendo em vista interpretar, por exemplo, representações da guerra, relação entre arte e história, autoficção e identidade.

Outro conjunto de dados é formado por respostas a um questionário aplicado a sete estudantes/pesquisadores da área, que possuem o mesmo perfil daqueles que são autores dos artigos: quatro mestres e três doutores formados por diferentes instituições de ensino e pesquisa, como Universidade de São Paulo, Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Universidade Federal da Paraíba, Universidade Federal de Minas Gerais e Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Quanto à atuação profissional deles, quatro são professores da educação básica e três são professores da educação superior - dois destes com atuação também em curso de mestrado e/ou doutorado na área de literatura. Mediante consentimento livre e esclarecido, foi solicitado aos voluntários que respondessem a questões sobre o fazer científico nos estudos literários, as quais versavam sobre aspectos epistemológicos e sobre a constituição de textos acadêmicos, especialmente artigos científicos.

Os artigos e as respostas ao questionário serão analisados comparativamente, mediante uma abordagem prioritariamente qualitativa, a fim de interpretarmos os sentidos e as representações que emergem de ambos. Por um lado, poderemos perceber os produtos de ações de linguagem empreendidas por especialistas da área e referendadas por seus pares como representação legítima do fazer científico naquele campo, já que, atualmente, o artigo científico em publicação periódica é considerado o meio de produção e de divulgação de conhecimento mais valorizado na academia, como defendem Motta-Roth e Hendges (2010MOTTA-ROTH, D. Análise crítica de gêneros: contribuições para o ensino e a pesquisa de linguagem. Delta, São Paulo, v. 24, n. 2, p. 341-383, 2008. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2waq0Pc >. Acesso em: 18 abr. 2018.
http://bit.ly/2waq0Pc...
). Por outro, poderemos visualizar as percepções que os próprios participantes têm da área, de si e dos demais membros e que, de algum modo, balizam suas ações linguageiras e/ou a avaliação das ações de outrem e ajudam a construir as normas socialmente validadas nessa área. Quanto aos procedimentos de análise, apresentaremos trechos dos artigos e respostas dos questionários, associando-os a categorias do ISD, para explicar algumas especificidades das práticas letradas acadêmicas que estamos investigando; em seguida, exporemos algumas características epistemológicas da área que emergem desses dois conjuntos de dados.

5 Práticas letradas acadêmicas nos estudos literários

5.1 A infraestrutura textual

Comecemos pelos tipos de discurso, que constituem, como afirma Bronckart (1999BRONCKART, J.-P. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: Educ, 1999.), o nível de articulação entre os mundos discursivos criados pela atividade de linguagem e as formas disponíveis numa língua natural. Nos artigos que compõem nosso corpus, percebemos que, predominantemente, trata-se da construção do mundo discursivo do expor autônomo. Pertence à ordem do expor porque as coordenadas que organizam o conteúdo temático são conjuntas ao mundo ordinário, ou seja, o conteúdo temático dos artigos é avaliado e interpretado mediante os critérios do mundo representado, o que se mostra condizente com a função do conhecimento científico: elaborar descrições, explicações e interpretações com pretensões de verdade acerca de fenômenos os mais diversos do mundo ordinário ou, mais especificamente no nosso caso, dos objetos artísticos. É autônomo porque as instâncias de agentividade dos textos e seu espaço-tempo não estão integrados aos parâmetros objetivos da ação de linguagem, ou seja, a interpretação do texto independe do conhecimento acerca dos parâmetros que configuram as circunstâncias particulares do ato de produção. Linguisticamente, esse mundo discursivo materializa-se no discurso teórico, que exemplificamos a seguir.

FIGURA 1
Fontes (2017FONTES, I. S. C. Autoficção, memória e trauma histórico em “Uma fome”, de Leandro Sarmatz. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, Brasília, n. 52, p. 50-65, dez. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2MMeC3b >. Acesso em: 24 out. 2017.
http://bit.ly/2MMeC3b...
, p. 52)

O trecho possui características linguísticas bastante prototípicas do discurso teórico: uso da voz ativa, do presente do indicativo com valor genérico e de organizadores lógico-argumentativos (“tanto… quanto”, “mas”, “na medida em que”, “além de”) e ainda da menção ao intertexto científico, na forma de citações diretas e indiretas. Além destas, podemos destacar: o uso da primeira pessoa do plural (“buscamos”), que, segundo Bronckart (1999BRONCKART, J.-P. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: Educ, 1999., p. 172), pode remeter “aos polos da interação verbal em geral […], mas não aos protagonistas da interação em curso”, o que é reforçado pelo fato de o artigo em questão não ter autoria coletiva, configurando, desse modo, o que se convencionou chamar de “humildade autoral” ou “nós de modéstia”; e o emprego da expressão dêitica “este artigo”, que faz menção à própria atividade expositiva em curso e configura fusão entre discurso teórico e interativo. Essas duas últimas características linguísticas ilustram, inclusive, a afirmação de Bronckart (1999) de que o discurso teórico nunca é completamente autônomo.

Outros mundos discursivos e, consequentemente, outros tipos de discurso também aparecem nos artigos, articulados ao discurso teórico por encaixamento. Esses outros tipos, secundários, estão condicionados à natureza do material em análise, pois correspondem a trechos transcritos ou parafraseados de obras literárias, apresentados como exemplos das interpretações que estão sendo feitas. A construção dos mundos e as características linguísticas dependem, nesse caso, da própria obra. Vejamos um exemplo:

FIGURA 2
Homero (2013, p. 733-743 apud BRUNHARA, 2016BRUNHARA, R. Visualizando a guerra no mundo antigo: o caso de Homero e da Lírica Grega. Nau Literária: Crítica e Teoria da Literatura em Língua Portuguesa, Porto Alegre, v. 12, n. 2, p. 7-18, jul.-dez. 2016. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2MQzyWE >. Acesso em: 24 out. 2017.
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, p. 11)

A Figura 2, um trecho da Ilíada, narra o assassinato de Cebríones, cocheiro de Heitor, por Pátroclo. Esse caso configura-se como narração, pois fatos de natureza ficcional são narrados no passado, com origem espaço-temporal especificada, ou seja, disjuntos das coordenadas do mundo ordinário, além de os agentes mobilizados no texto (personagens e narrador) não estarem implicados na situação física da ação de linguagem. Na análise de corpora compostos prioritariamente por textos literários narrativos, como contos e romances, esse tipo de discurso é bastante recorrente, haja vista a necessidade dos autores dos artigos de apresentarem exemplos das obras para ilustrarem suas interpretações.

Quanto às sequências e outras formas de planificação textual, nos artigos predomina a argumentativa, pois a finalidade do gênero é defender uma tese a respeito de um ponto de vista interpretativo acerca de uma obra literária, com base em argumentos e visando convencer a comunidade científica sobre a validade das afirmações. Observemos este excerto:

FIGURA 3
Brunhara (2016BRUNHARA, R. Visualizando a guerra no mundo antigo: o caso de Homero e da Lírica Grega. Nau Literária: Crítica e Teoria da Literatura em Língua Portuguesa, Porto Alegre, v. 12, n. 2, p. 7-18, jul.-dez. 2016. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2MQzyWE >. Acesso em: 24 out. 2017.
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, p. 7)

A Figura 3 refere-se ao primeiro parágrafo do artigo, em que o autor situa o objetivo e, ao mesmo tempo, lança a tese que será defendida. O próprio expositor faz questão de realçar seu ponto de vista por meio da forma verbal “argumento”, na primeira pessoa do singular. É essa ideia central que permeará a construção da estratégia argumentativa, que, no conjunto dos artigos, vale-se de dois expedientes principais: 1) exemplos do corpus de análise na forma de citação direta, como a Figura 2, e indireta, configurando trechos de sequência narrativa; e 2) apresentação de conceitos advindos de teorias, configurando trechos de sequência explicativa, como o seguinte:

FIGURA 4
Paranhos (2017PARANHOS, K. R. História & teatro, teatro & história: uma relação tão delicada. O Eixo e a Roda: Revista de Literatura Brasileira, Belo Horizonte, v. 26, n. 2, p. 187-205, ago. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2KTlTfH >. Acesso em: 24 out. 2017.
http://bit.ly/2KTlTfH...
, p. 197)

Nesse trecho, o expositor apresenta e explica o conceito de teatro popular, opondo-o ao de teatro comercial no contexto da ditadura militar. Não são apresentados pontos de vista pessoais sobre o assunto, apenas constatações e opiniões de outrem sobre eles, explicitadas na referência ao intertexto científico em nota de rodapé. Esses conceitos, porém, estão a serviço da posição interpretativa do expositor no contexto mais global do artigo, funcionando, em muitos dos casos, como argumentos de autoridade ou de definição.

Desse modo, percebemos que a organização linear dos artigos pode ser concebida como o produto da combinação de três sequências principais: a argumentativa, já que se defende um ponto de vista interpretativo acerca de uma obra, fundamentado com fragmentos de sequência explicativa, para alicerçar as reflexões teóricas, e narrativa, para ilustrar as considerações acerca do corpus de análise.

Já o plano geral é a categoria que mais varia entre os artigos. Como o próprio Bronckart (1999BRONCKART, J.-P. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: Educ, 1999., 2006) assevera, é a dimensão mais flexível da infraestrutura, pois depende também das condições de produção dos textos, que englobam os agentes, suas crenças e as regras socialmente validadas para as práticas letradas. Sendo assim, é a categoria da infraestrutura que mais nos evidencia as peculiaridades da área dos estudos literários e dos agentes que nela tomam lugar.

Primeiramente, destacamos que alguns dos artigos não possuem divisão em seções ou, quando há divisão, ela não corresponde à tradicional estrutura de introdução, metodologia (referencial teórico e materiais e métodos), resultados e conclusão, mas à progressão dos temas dos artigos. Dos oito artigos aqui analisados, quatro não possuem divisão em seções e outros dois possuem divisão que obedece à progressão dos temas. Sobre esse aspecto, também o questionário aplicado mostra a fluidez da organização do plano de texto para os agentes da área. Perguntamos se é importante organizar os artigos científicos em seções de introdução, desenvolvimento e conclusão, conforme orienta a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Das sete respostas, quatro relativizam a importância de seguir essa estrutura. Eis duas delas:

FIGURA 5
Respostas ao questionário

As respostas confirmam a tendência dos artigos de conferir pouca importância a uma estruturação estanque das seções, a fim de privilegiar uma abordagem que se proponha mais criativa do tema em estudo. Além disso, o Sujeito 2 chama atenção para o fato de que a ausência da nomenclatura tradicional ou mesmo da divisão nas seções não significa que elas não existam nos artigos: elas de fato existem, embora nem sempre claramente delimitáveis.

É o que acontece, por exemplo, com as seções de referencial teórico e de análise dos dados: na maioria dos artigos, o referencial teórico apresenta-se diluído na análise, configurando-se como uma característica forte das práticas letradas da área. Vejamos um exemplo:

FIGURA 6
Cunha (2017CUNHA, R. O verdugo e a revolta como princípio ético. O Eixo e a Roda: Revista de Literatura Brasileira, Belo Horizonte, v. 26, n. 2, p. 301-316, ago. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2nFcf7C >. Acesso em: 24 out. 2017.
http://bit.ly/2nFcf7C...
, p. 306)

Como vemos, o expositor apresenta o conceito de insurreição e, prontamente, aplica-o à interpretação da obra O verdugo. Esse procedimento é uma constante não apenas nesse, mas na maioria dos artigos que analisamos, e é reforçado pelas respostas fornecidas ao questionário. Todos concordam que a teoria é importante para o tratamento do objeto de estudo, e a maioria assume-a como “âncora”, “fundamento”, “suporte”, algo que “enriquece a interpretação”. Entretanto, há ressalvas ao papel dela em quatro respostas, das quais transcrevemos as seguintes:

FIGURA 7
Respostas ao questionário

Prevalece, assim, a opinião de que a teoria é convocada a partir do texto e o orbita. Essa postura suscita diferentes posicionamentos dos sujeitos quando indagados sobre a presença de seção de referencial teórico nos artigos:

FIGURA 8
Respostas ao questionário

Essa escolha, pelo que inferimos, parece estar mais relacionada com as crenças pessoais de cada agente do que com uma imposição institucional. Na verdade, a regularidade institucional parece ser justamente a admissão dessas diferentes formas de organização do conteúdo temático: referencial teórico em seção à parte ou apresentado à medida que se faz necessário quando da interpretação da obra.

Uma última especificidade do plano geral dos artigos é a pouca quantidade de informação metodológica, a qual se restringe, na grande maioria dos casos, ao corpus (obra literária) a ser analisado e, em casos excepcionais, à menção explícita de categorias de análise. Observemos este trecho:

FIGURA 9
Martins e Bulhões (2017MARTINS, G. V.; BULHÕES, R. M. Literatura e espetáculo religioso em um conto de Marcelino Freire. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, Brasília, n. 52, p. 66-79, dez. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2OxuGq3 >. Acesso em: 24 out. 2017.
http://bit.ly/2OxuGq3...
, p. 66)

Nesse exemplo, os autores nomeiam o material a ser analisado (o conto “Irmãos”), os conceitos que serão empregados para tal e, ademais, o elemento da narrativa a ser considerado: o narrador. Esse artigo, inclusive, destoa dos demais, que apenas citam o corpus de análise, deixando implícitas outras informações metodológicas, como as técnicas de coleta e de análise.

Os questionários também evidenciam essa característica das práticas letradas nessa área: para a grande maioria, a descrição metodológica é pouco importante, e na própria teoria já estaria subjacente uma abordagem metodológica. Quando perguntados sobre os principais métodos, técnicas e abordagens metodológicas dos trabalhos na área, os sujeitos mencionam principalmente as correntes da teoria literária, como marxismo, feminismo, estruturalismo, estética da recepção e estilística, mas também, em menor quantidade, método analítico, história oral e estudo crítico-comparativo. Já sobre a necessidade de seção de descrição metodológica em trabalhos como artigos, a grande maioria considera pouco importante, desnecessária e até redundante, como relata o Sujeito 7: “Pouco importante porque acaba se tornando redundante. É algo que pode ser relatado na justificativa”. Ressaltemos, entretanto, que isso não significa que haja carência de fundamentação metodológica nos trabalhos; significa, do nosso ponto de vista, que os membros da área não veem necessidade de explicitá-la.

Consideramos que essas características da infraestrutura textual dos artigos, referendadas pelas percepções nas respostas ao questionário, revelam práticas letradas que primam por uma estrutura essencialmente ensaística, que privilegia a argumentação e a criatividade na organização do conteúdo temático dos artigos. Para Larrosa (2003LARROSA, J. O ensaio e a escrita acadêmica. Educação & Realidade, Porto Alegre, v. 28, n. 2, p. 101-115, jul.-dez. 2003. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2MsbrRe >. Acesso em: 17 dez. 2017.
http://bit.ly/2MsbrRe...
), o ensaio é uma forma híbrida, que congrega subjetividade, imaginação, criatividade e flexibilidade com ciência, conhecimento, racionalidade e objetividade, o que lhe confere liberdade formal. Na infraestrutura dos artigos, verificamos certa liberdade formal que destoa das prescrições que tentam estabelecer um pretenso padrão para o gênero, como manuais de metodologia científica e normas da ABNT.

5.2 Os mecanismos enunciativos

Neste trabalho, abordaremos especificamente o posicionamento enunciativo e o gerenciamento das vozes nos artigos e a percepção que membros da área têm desses elementos.

Quanto ao posicionamento enunciativo, percebemos o uso do impessoal (voz passiva sintética) e da primeira pessoa do singular, mas prevalece a primeira pessoa do plural, mesmo quando a autoria dos artigos é individual. Eis um exemplo:

FIGURA 10
Paranhos (2017PARANHOS, K. R. História & teatro, teatro & história: uma relação tão delicada. O Eixo e a Roda: Revista de Literatura Brasileira, Belo Horizonte, v. 26, n. 2, p. 187-205, ago. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2KTlTfH >. Acesso em: 24 out. 2017.
http://bit.ly/2KTlTfH...
, p. 194)

Nesse trecho, a primeira pessoa do plural, marcada por formas verbais (“perdemos”, “estamos”) e pronomes (“nossa”, “nos”), funciona como que para lembrar que as reflexões da autora se inserem numa comunidade mais ampla, a qual lhe respalda e da qual se mostra como membro. Essas formas, tanto nesse quanto nos demais artigos, também podem ser vistas como modo de se estabelecer um diálogo com o leitor - até implicando-o naquilo que é afirmado -, o que fica mais evidente pelo uso, em alguns artigos, de formas verbais no imperativo, como “reparemos”, regressemos” e “retornemos”.

Um fato interessante é que há oscilação no índice de pessoa em todos os artigos. Vejamos um exemplo:

FIGURA 11
Furlan (2017FURLAN, S. De Desdêmona a Capitu: Machado de Assis lê Shakespeare. Anuário de Literatura, Florianópolis, v. 22, n. 1, p. 16-30, ago. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2MMbuo5 >. Acesso em: 24 out. 2017.
http://bit.ly/2MMbuo5...
, p. 21)

Nesse caso, o autor oscila entre o impessoal (“se possa responder”, “se pode eliminar”) e a primeira pessoa do plural (“aceitarmos”, “levarmos”). Embora todas essas ações verbais provenham da voz do expositor, avaliamos que aquelas que parecem demandar maior nuance semântica de certeza ou de ação definitiva - pela presença da expressão modalizadora “pode” e pelo sentido dos verbos “responder” e “eliminar” - não são tão explicitamente assumidas por ele quanto outras que se apresentam como mais amenizadas - “aceitarmos” e “levarmos”, flexionadas no futuro do subjuntivo.

No questionário, predomina o entendimento de que a noção de objetividade da linguagem científica não se confunde com o emprego de uma ou de outra marca de pessoa nos textos:

FIGURA 12
Resposta ao questionário

A resposta ataca a crença de que objetividade se confunde com impessoalidade: o fato de não se utilizar uma linguagem impessoal não descaracteriza a objetividade da linguagem e da própria abordagem científica no tratamento do corpus. Pelo contrário, reivindica-se o distanciamento de uma concepção que é julgada positivista.

Além da voz do expositor, aparecem outras nos artigos, entre as quais se destacam as de estudiosos e pesquisadores que fundamentam teoricamente os trabalhos e também as dos autores e das instâncias narrativas (narrador e personagens) das obras literárias em análise.

As primeiras representam vozes da teoria, que servem como ancoragem em determinada área do conhecimento - no nosso caso, na área dos estudos literários, às vezes em interseção com outras, como filosofia, antropologia, psicologia e história. Conforme apontam Motta-Roth e Hendges (2010) e Coracini (1991CORACINI, M. J. R. F. Um fazer persuasivo: o discurso subjetivo da ciência. São Paulo: Educ; Campinas: Pontes, 1991.), a referência a uma literatura prévia tem constituído historicamente uma tradição muito valorizada na ciência, tanto do ponto de vista ético quanto do intelectual, e um dos traços definidores da cientificidade. Vejamos um exemplo:

FIGURA 13
Martins e Bulhões (2017MARTINS, G. V.; BULHÕES, R. M. Literatura e espetáculo religioso em um conto de Marcelino Freire. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, Brasília, n. 52, p. 66-79, dez. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2OxuGq3 >. Acesso em: 24 out. 2017.
http://bit.ly/2OxuGq3...
, p. 70)

No trecho anterior, a citação de estudiosos funciona como argumento de autoridade, a demonstrar que o autor tem conhecimento do que se produz nesse campo e, por conseguinte, qualifica-se como membro que pode atuar nele. No conjunto dos artigos, faz-se menção, por exemplo, a autores da área como Alfredo Bosi, Antonio Candido, Fredric Jameson, Linda Hutcheon, Roland Barthes e Terry Eagleton, mas também a Hannah Arendt, Marilena Chauí, Michel Foucault, Pierre Bourdieu, Roger Chartier e Sigmund Freud. Essa natureza interdisciplinar é reforçada no questionário. Quando perguntamos sobre a relação da literatura com outros campos da ciência, quatro sujeitos mencionaram relações temáticas, ao passo que os demais apontam a intersecção com outras disciplinas, como faz o Sujeito 4: “Percebo, como já disse, que a relação da literatura com outros campos da ciência como uma área muito vasta de possibilidades e olhares, filosofia, física, sociologia, antropologia”.

Já as vozes dos autores das obras literárias e de suas instâncias narrativas aparecem como referência ao corpus em análise nos artigos, com a função de apresentar os dados a serem interpretados. Eis um exemplo:

FIGURA 14
Furlan (2017FURLAN, S. De Desdêmona a Capitu: Machado de Assis lê Shakespeare. Anuário de Literatura, Florianópolis, v. 22, n. 1, p. 16-30, ago. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2MMbuo5 >. Acesso em: 24 out. 2017.
http://bit.ly/2MMbuo5...
, p. 22-23)

Nesse excerto, percebemos as vozes das personagens Bento, que também é narrador, e José Dias, tanto transcritas como parafraseadas. Esse expediente é bastante comum no conjunto dos artigos, como argumento pela exemplificação, para ilustrar a interpretação que está sendo construída e, mais do que isso, conferir a ela consistência e credibilidade, já que é constantemente respaldada na obra literária. Na maioria dos artigos, inclusive, esse segundo conjunto de vozes é predominante, como podemos verificar no quadro:

QUADRO 1
Distribuição dos subconjuntos de vozes por artigo científico

Excetuando-se Paranhos (2017PARANHOS, K. R. História & teatro, teatro & história: uma relação tão delicada. O Eixo e a Roda: Revista de Literatura Brasileira, Belo Horizonte, v. 26, n. 2, p. 187-205, ago. 2017. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/2KTlTfH >. Acesso em: 24 out. 2017.
http://bit.ly/2KTlTfH...
), que é um artigo de revisão de literatura, os demais apresentam os dois subconjuntos de vozes, e em três deles as vozes provenientes do corpus de análise (escritor e instâncias narrativas) predominam. Tal ênfase se justifica, em primeiro lugar, pelo objeto de estudo principal da área, que é o texto literário; em segundo, pelo protagonismo que estudiosos da área e correntes da crítica literária conferem ao texto. A esse respeito, vale mencionarmos Eagleton (2003EAGLETON, T. Teoria da literatura: uma introdução. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003.), quando afirma que o formalismo russo e a nova crítica americana defendem a supremacia do texto, e Moisés (2007MOISÉS, M. A análise literária. São Paulo: Cultrix, 2007., p. 25, grifo do autor), para quem, a despeito de alguns aspectos secundários, como a biografia dos escritores e o contexto cultural, “o campo da análise literária é o texto e apenas o texto […] o texto é ponto de partida e ponto de chegada da análise literária”. Assim, reforça-se a tendência, já apontada anteriormente, de dar voz ao texto literário para que ele convoque a teoria.

A análise dos mecanismos enunciativos, em consonância com os questionários, mostra que as práticas letradas na área primam por uma linguagem mais pessoal, que se distancie do paradigma positivista de linguagem científica. Ademais, verificamos a necessidade de dar voz e protagonismo ao texto literário, o objeto principal de estudo da área.

6 Das propriedades dos textos às questões epistemológicas

Como temos defendido, os seres humanos criam, compartilham e apreendem conhecimento por meio das práticas e usos da linguagem situados e ideológicos, de modo que eles são os elementos fundamentais de interpretação desse conhecimento. Tais práticas, apontam Barton e Hamilton (2000BARTON, D.; HAMILTON, M. Literacy practices. In: BARTON, D.; HAMILTON, M.; IVANIČ, R. (Ed.). Situated literacies: reading and writing in context. London; New York: Routledge, 2000. p. 7-14.), são cultural e historicamente construídas, e seu estudo nos evidencia traços de tradições, convenções, valores e identidades subjacentes a elas.

Particularmente em nosso estudo, entendemos que os textos (artigos e respostas ao questionário), ao materializarem práticas e usos da escrita, relacionam-se com valores, identidades e concepções de ciência e de fazer científico que se estabelecem e são compartilhadas entre membros e instituições do campo dos estudos literários. De acordo com Lea (2005LEA, M. R. “Communities of practice” in higher education. In: BARTON, D.; TUSTING, K. (Ed.). Beyond communities of practice: language, power and social context. Cambridge: Cambridge University Press, 2005. p. 180-197. Doi: https://doi.org/10.1017/CBO9780511610554.010
https://doi.org/10.1017/CBO9780511610554...
), as pesquisas dos letramentos acadêmicos indicam que as práticas de escrita nesse domínio transcendem a apreensão de habilidades puramente linguísticas e textuais, para considerarem, sobretudo, questões de epistemologia e do que é aceito como conhecimento válido em cada área. Assim, as práticas de escrita nos ajudam a entender como as disciplinas se constroem e funcionam, como seus membros negociam a construção de significados e identidades para si e para o grupo.

Desse modo, embora as disciplinas não sejam homogêneas, suas práticas possam ser contestáveis e mutáveis e as pessoas possam engajar-se nelas de diferentes modos, podemos inferir e compreender certas convenções e regularidades da área, que definem características epistemológicas. Mediante análise dos nossos dados, vislumbramos as seguintes: postura interpretativista, primado do texto e interdisciplinaridade.

A postura interpretativista manifesta-se pela predominância, nos artigos, de um discurso teórico, marcadamente argumentativo, de uma estrutura ensaística, tendo em vista defender um ponto de vista interpretativo acerca de um objeto de estudo, valendo-se, para isso, de argumentos de autoridade e de exemplos do corpus de análise. Além disso, convém citar a opção por um posicionamento enunciativo em primeira pessoa, assinalando, de forma mais explícita, a responsabilidade do expositor sobre o que é dito. Até a pouca quantidade de informação metodológica, restrita basicamente a citar o corpus de análise, leva-nos a inferir que os membros da área entendem que esse caráter interpretativo de abordagem do texto literário não necessita ser explicitado em cada trabalho. Essa característica pode ser entendida como oposição a certa forma de racionalidade técnico-científica e de escrita que, grosso modo, tem dominado os textos prescritivos do fazer acadêmico.

O primado do texto literário evidencia-se, de modo mais explícito, pela abundância de citações de trechos da obra literária nos artigos, o que mostra o protagonismo que a área reivindica para o objeto de estudo. Ademais, o fato de alguns autores dos artigos optarem pela construção de referencial teórico diluído na análise e/ou de não dividirem o artigo em seções revela a percepção de que a obra em apreciação convoca a teoria, cujos conceitos são apresentados à medida que emergem das interpretações em curso.

A interdisciplinaridade revela-se desde a constituição do objeto de estudo até a abordagem teórica utilizada. O que se chama de texto literário parece ter um sentido bastante amplo, a englobar também interseções com outras linguagens, mídias e artes, como o teatro, abordado em dois artigos. Já as abordagens teóricas da crítica literária e a fundamentação teórica dos artigos indicam forte diálogo com diferentes áreas do conhecimento, a exemplo da filosofia, da história e da sociologia, demonstrando a complexidade dos estudos da área e de seu objeto de estudo.

Tais especificidades materializam-se em textos cuja arquitetura deve ser vista como parte das convenções e das próprias regras de cientificidade da área, historicamente construídas e compartilhadas pelos seus agentes. Os editores e pareceristas, primeiros destinatários dos artigos, parecem não fazer objeções a essas peculiaridades, já que os avaliam e os aprovam. Também as normas das revistas, de modo geral, não balizam a estrutura dos artigos. As respostas ao questionário direcionado a outros membros da área, nessa mesma direção, acabam por corroborar que as concepções epistemológicas e as operações de linguagem que guiam a produção dos artigos coadunam-se com as normas socialmente validadas pelo grupo. Assim, longe de constituírem um desvio de um pretenso padrão de referência, são o resultado de um processo intencional de adaptação de um gênero e de modos de fazer ciência em função das regras e dos valores que permeiam as atividades e ações linguageiras na disciplina.

7 Conclusão

A especificidade do campo dos estudos literários, como procuramos demonstrar neste artigo, não está somente no tratamento de um dado objeto de estudo, mas também nos diferentes juízos de valor ou de visões de mundo, ou de ciência e de fazer científico, que permeiam e (con)formam as ações linguageiras que têm lugar na instância acadêmica.

Como vemos, as práticas letradas acadêmicas, por um lado, mostram que as operações de linguagem empregadas nas ações de linguagem mobilizam conhecimentos que são específicos, de acordo com a adaptação que se faz do gênero mediante valores, normas e identidades da área. Por outro, revelam concepções epistemológicas que caracterizam a área dos estudos literários e influenciam as formas de produzir e divulgar conhecimento, ou seja, as ações linguageiras dos agentes nas situações de interação verbal. Diferentemente dos manuais de metodologia científica e das normas da ABNT - que tentam, grosso modo, na maioria das vezes, criar um suposto padrão de linguagem, de texto e de fazer científico que desconsidera as peculiaridades de diferentes áreas do conhecimento quanto a sua natureza epistemológica e linguística -, nosso estudo, ao caracterizar práticas letradas que materializam o fazer científico nos estudos literários, reivindica que estas sejam compreendidas levando em consideração sua natureza heterogênea, situada e complexa e sua relação com as características epistemológicas que são social e historicamente construídas e partilhadas pelo grupo, pois é assim que elas são vivenciadas pelos membros da área e apreendidas por aqueles que nela pretendem inserir-se.

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  • 1
    Este artigo está vinculado às ações do projeto Ateliê de Textos Acadêmicos, com apoio do Programa Nacional de Pós-Doutorado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (PNPD/Capes), via processo nº 23038.007066/2011-60.
  • 2
    No original: “what the particular practices and concepts of reading and writing are for a given society depends upon the context; that they are already embedded in an ideology and cannot be isolated or treated as ‘neutral’ or merely ‘technical’” (STREET, 1984, p. 1).
  • 3
    No original: “Learning in higher education involves adapting to new ways of knowing: new ways of understanding, interpreting and organizing knowledge. Academic literacy practices - reading and writing within disciplines - constitute central processes through which students learn new subjects and develop their knowledge about new areas of study. A practices approach to literacy takes account of the cultural and contextual component of writing and reading practices, and this in turn has important implications for an understanding of student learning” (LEA; STREET, 1998, p. 157).
  • 4
    Hyland (2010HYLAND, K. Disciplinary discourses: social interactions in academic writing. Ann Arbor: University of Michigan Press, 2004. p. 1-19.) afirma que cada disciplina pode ser vista como uma cultura, com seus valores, normas, conteúdos, comportamentos e relações de poder, daí a denominação de cultura disciplinar. Dentro de cada cultura, que não se caracteriza como completamente homogênea, os indivíduos se engajam em interações por meio das quais se podem depreender as concepções e as práticas que constroem a especificidade daquela cultura.
  • 5
    Um panorama mais amplo e mais completo dos estudos sobre gêneros e práticas letradas da esfera acadêmica é oferecido por Motta-Roth (2008) e Bawarshi e Reiff (2013BAWARSHI, A. S.; REIFF, M. J. Gênero: história, teoria, pesquisa, ensino. São Paulo: Parábola, 2013.).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Out 2018
  • Data do Fascículo
    2018

Histórico

  • Recebido
    26 Dez 2017
  • Aceito
    27 Jul 2018
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