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Hubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018, 234 p.

Hubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018. 234 p.

Processos puramente cognitivos envolvidos nas atividades de tradução são alvos recorrentes de estudos sobre atividades tradutórias com cunho emotivo, prestando atenção, em sua maioria, em como a linguagem emocional é traduzida. No entanto, pouco se fala sobre como as emoções influenciam as ações de tomada de decisão e solução de problemas feitas pelo tradutor durante o processo tradutório. Com o objetivo de suprir a carência de estudos nessa área do conhecimento e demonstrar as implicações do emocional durante os processos tradutórios, Séverine Hubscher-Davidson, chefe do Departamento de Tradução na Open University (UK) e responsável por inúmeros artigos sobre processos psicológicos ligados à tradução, apresenta Translation and Emotion: a psychological perspective. O volume analisa três áreas distintas nas quais as emoções influenciam os tradutores: o material emocional contido nos textos-fonte, as emoções dos próprios tradutores e as emoções dos leitores dos textos de partida e de chegada. Esses aspectos são detalhados em três dos cinco capítulos do livro, seguindo a concepção de três estágios de processamento da emoção: a percepção, o controle e a expressão da emoção.

No texto introdutório, Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018. justifica a necessidade de documentar a interface afetiva dos tradutores com o seu trabalho, defendendo a união de dois campos de estudo: os Estudos da Tradução e a Ciência Afetiva. A autora desnuda como o tradutor lida com as emoções durante o processo tradutório, por meio da investigação de aspectos específicos dos traços emocionais dos perfis de inteligência emocional dos tradutores, em um estudo de caso com 155 tradutores voluntários. Levanta questionamentos sobre a traduzibilidade dos componentes emocionais do texto fonte para outras línguas em contextos culturais diversos, e como os tradutores em diferentes contextos culturais se posicionam perante o texto e o processo tradutório, sem deixar de considerar as reações do leitor.

Tradicionalmente mudos e invisíveis, Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018. avisa que as vozes dos tradutores estão se fazendo ouvir, e que elas, às vezes, soam persistentes e inquietantes. Informa que os tradutores podem ser fortemente abalados por traduções de textos de conteúdo sensível, tais como relatos de crimes, autópsias, abusos e experiências de luto. Essas reações raramente são discutidas e o tradutor corre o risco de se perder totalmente nas emoções dos outros. No entanto, a autora observa que o contato do tradutor com as emoções dos outros pode aumentar o entendimento e o controle de suas próprias emoções, resultando em maiores chances de sucesso na profissão de tradutor. Desta forma, conclui que o tradutor age como terapeuta e paciente, de um lado detectando e compreendendo as emoções, e de outro, expressando as emoções que brotam de um evento de tradução.

O primeiro capítulo, intitulado A emoção e o processo tradutório, enuncia a inteligência emocional como sendo a forma como os indivíduos lidam com as relações intrapessoais (suas próprias emoções) e com as interpessoais (as emoções dos outros) e pressupõe que a inteligência emocional interage com variáveis culturais, contextuais e individuais. Afirma que há evidências de que pessoas com altos traços de inteligência emocional lidam melhor com situações de estresse e são eficazes em planejar e tomar decisões, e que variáveis de personalidade interpretadas junto com habilidades mentais e cognitivas podem ajudar a prever a probabilidade de sucesso de um indivíduo. A seguir, fala da importância de empregar métodos confiáveis para a análise das emoções, e apresenta conceitos-chave para a área de estudo, como “validade” e “consistência”. Proporciona uma visão geral sobre o desenvolvimento das abordagens psicológicas para estudar as traduções dentro dos Estudos da Tradução, enfatizando como pesquisas em áreas correlatas à tradução demonstram que a inteligência emocional influencia como pessoas bilíngues ou poliglotas lidam com as emoções, e como esse tipo de inteligência impacta a performance dos escritores, já que, para Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018., os tradutores são leitores/escritores bilíngues.

O capítulo também trata dos métodos desenvolvidos para analisar o processo de tradução com ênfase nas habilidades interpessoais e suas respectivas implicações, e apresenta uma visão geral sobre a diversidade de tópicos nas pesquisas em processos de tradução. Revisa os estudos pioneiros que exploraram os aspectos da personalidade e das emoções dos tradutores, como os de Fraser (1996), Laukkanen (1996), Jääskeläinen (1999), Hansen (2005), Davou (2007), Lehr (2013) e Rojo & Ramos Caro (2016), apontando a relevância e as lacunas desses estudos, como o uso de amostras muito pequenas ou a falta de evidências empíricas. Essa revisão bibliográfica serve para ressaltar os trabalhos que abriram caminho para pesquisas recentes que se preocupam com os traços de personalidade dos tradutores. Em seguida, contextualiza e detalha o estudo de caso, apresentando o embasamento teórico para o estudo das emoções na área da Psicologia, apoiado nos trabalhos mais influentes dentro dos Estudos da Tradução. Para Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018., investigar os traços de personalidade pode ser a chave para entender como os indivíduos realizam as atividades de tradução. Dada a natureza interdisciplinar da emoção e da tradução, o primeiro capítulo incorpora insights de diferentes teorias da emoção. Discute as abordagens afetiva e cognitiva, incluindo a noção de inteligência emocional segundo Petrides (2011), e como a inteligência emocional pode ser quantificada. No estudo de caso, foi utilizado para a averiguação quantitativa do traço inteligência emocional o modelo de questionário TEIQue, desenvolvido por Petrides (2001, 2004, 2009). Os questionários TEIQue apresentam perguntas cujas respostas são escolhidas entre sete níveis de concordância, que vão desde “concordo totalmente” a “discordo totalmente”. Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018. utiliza um método misto de pesquisa, combinando os dados quantitativos gerados pelo TEIQue com os dados qualitativos coletados por meio de relatos orais e escritos. O uso do método misto permite entender as possíveis razões por trás dos padrões dos dados tabulados, por meio do contexto, e revela a preocupação da autora em humanizar e vocalizar a figura do tradutor, enquanto sujeito senciente.

Ao introduzir o estudo de caso, Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018. enuncia a questão geral de sua pesquisa em “Até que ponto as diferenças nos traços emocionais estão ligadas a vários aspectos do perfil e da vida profissional dos tradutores profissionais?”, e lista dois objetivos, consistindo o primeiro em destacar conceitos e teorias específicas que podem ajudar a explicar a percepção, o controle e a expressão da emoção na tradução, e o segundo em apresentar pesquisa empírica volumosa testando as correlações entre aspectos do traço Inteligência Emocional e uma gama de variáveis relevantes para a tradução profissional. Guiada pela hipótese geral de que tradutores profissionais apresentarão perfis diferentes, de acordo com a idade, experiência e satisfação profissional, e pela perspectiva de que existe uma relação entre os traços emocionais e o comportamento dos tradutores profissionais, a autora defende que seu trabalho apresenta validade ecológica e estatística, já que uma amostra de 155 indivíduos é considerada relativamente grande para a área de pesquisa em processos de tradução. Quanto aos aspectos éticos, informa que seus participantes, voluntários, recrutados e pesquisados via internet, estavam cientes dos procedimentos do estudo e tiveram as informações pessoais codificadas e o anonimato protegido. A autora ressalta a validade externa dos resultados de sua pesquisa, dada a heterogeneidade do grupo de participantes, formado por tradutores de textos de gêneros diferentes e especialidades diversas. No entanto, reconhece a lacuna metodológica devido à composição da amostra, um grupo de 122 mulheres e 33 homens, a maioria tendo o inglês como primeira língua, e recomenda a replicação desse estudo com um grupo de tradutores mais diversificado quanto a gênero, língua materna e nacionalidade. Ressalta, citando o Efeito de Acomodação Cultural de Harzing (2006), que a validade do estudo pode ser ameaçada pelo fato de alguns participantes, que têm o inglês como segunda língua, terem escolhido responder o questionário em língua inglesa, mesmo estando os questionários disponíveis em sua língua materna.

Nos capítulos seguintes, Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018. aborda os três diferentes estágios da emoção que influenciam as ações de tomada de decisão e solução de problemas feitas pelo tradutor durante o processo tradutório. Cada um desses diferentes estágios de processamento da emoção é abordado em um capítulo diferente, primeiro introduzindo o conceito em questão, apresentando revisão bibliográfica e associando o estágio da emoção com a inteligência emocional, para, depois, relacioná-lo com a tradução, explorando as experiências dos tradutores por meio de relatos pessoais, e discutindo os resultados mais relevantes da pesquisa. Cada capítulo é finalizado com uma breve conclusão, seguida de notas sobre termos específicos e referências bibliográficas. Apesar de repetitiva, essa organização facilita o fluxo da leitura.

O capítulo dois foca na Percepção da Emoção, entendida como um processo no qual os indivíduos decodificam não só as suas próprias emoções mas também as dos outros, de forma a preparar uma resposta comportamental aos estímulos emocionais. Baseada nas considerações de Brosch, Pourtois, & Sander (2010), Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018. discute brevemente as quatro teorias principais da emoção: a teoria básica da emoção, a teoria da avaliação, a teoria dimensional e a teoria construtivista. Quanto à interação entre a emoção e a percepção, a autora afirma, citando Phelps (2006), que há indícios de que os estímulos emocionais capturam a nossa atenção mais rapidamente e dela se desprendem mais lentamente do que outros tipos de estímulo. A revisão bibliográfica indica que as pessoas, durante a leitura, possuem uma propensão natural às informações prazerosas (Herbert, Junghofer & Kissler, 2008), resultando em melhor memorização de palavras consideradas agradáveis. Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018. não ignora, segundo Aviezer (Aviezer et al. 2008), que informações contextuais podem alterar a emoção percebida. Fala do processo de mimificação e aponta como a diversidade cultural pode ser um fator impactante na percepção da emoção, e que é natural as pessoas serem mais competentes em identificar expressões de emoção em membros e textos de suas próprias culturas (Marsh, Elfenbein & Ambady, 2003).

Embora se sustente nas evidências empíricas da revisão bibliográfica acerca da percepção da emoção, a autora ressalta as limitações dessas pesquisas. Aponta, por meio de Winkielman, Berridge & Wilbarger (2005) que, embora tenha sido possível quantificar tanto as percepções conscientes quanto as inconscientes, os estudos psicológicos das percepções emocionais inconscientes são sugestivos, mas não conclusivos, carecem de consistência e demandam mais investigação e replicação. Afirma ainda que os resultados dessas pesquisas não possuem validade ecológica, já que foram conduzidas em laboratório com participantes levados a escolher respostas pré-formuladas.

A relação entre o processo de percepção da emoção e a inteligência emocional também é discutida no segundo capítulo, ressaltando a sua importância para a boa comunicação social, as relações interpessoais, o sucesso profissional, o comportamento socialmente aceitável e o controle do stress, incluindo a habilidade de mediação de conflitos. Aqui, a percepção da emoção é considerada uma das facetas da inteligência emocional. Na sequência, o capítulo trata de como a percepção da emoção difere entre os tradutores, e como essas diferenças se refletem nos processos tradutórios. A título de confirmação qualitativa, o capítulo apresenta os relatos de Maier (2002 e 2004)1 1 Tradutora profissional e autora de Translation, Dépaysement, and Their Figuration e Translating as a Body: Meditations on Mediation. , detalhando as experiências de percepção da emoção e o impacto psicológico causado por diferentes tipos de textos. Algumas dessas reações são violentas e chegam a incluir sintomas físicos. Essa seção do capítulo explora com profundidade o relato de uma única tradutora, o que sugere insuficiência de dados qualitativos para sustentar a premissa de reação às percepções emocionais. A parte final do capítulo revisa as evidências quantitativas do estudo de caso, com a análise da relação entre a percepção da emoção e os dados dos perfis dos 155 tradutores profissionais envolvidos no estudo. Destacam-se quatro resultados principais para a percepção da emoção: positivamente associada à idade do indivíduo; positivamente associada à experiência em tradução literária; não foi encontrada relação entre a percepção da emoção e a familiaridade com línguas e culturas estrangeiras; emocionalidade associada com a experiência profissional e a satisfação no trabalho.

O terceiro capítulo, Controle da Emoção, tenta prover respostas para a suposição de que certas formas de controle da emoção podem ser mais úteis e eficientes. O capítulo lida com o controle da emoção como um processo pelo qual os indivíduos modificam as suas experiências emocionais com a finalidade de produzir respostas adequadas a determinadas situações. Por meio de Gross (1998), define o controle da emoção como uma série de processos que influenciam quais emoções sentimos, quando as sentimos e como as experimentamos ou expressamos. Apresenta revisão bibliográfica sobre esse estágio específico do processamento da emoção, incluindo: os cinco tipos de controle da emoção elencados no modelo de Gross (2007), as afirmação de Rydell, Berlin & Bohlin (2003) de que o controle da emoção envolve processos a níveis fisiológicos, cognitivos e comportamentais; as estratégias de controle da emoção, de acordo com Suri, Sheppes & Gross (2013); as aplicações das estratégias de controle da emoção e suas possíveis consequências (Campbell-Sills & Barlow, 2007) e como o mau regulamento das emoções, segundo Dan-Glauser & Gross (2013), está relacionado a diversas desordens mentais e problemas físicos; e as pesquisas de English (English et al.2012) a respeito dos efeitos sociais das estratégias de supressão e reavaliação em ambientes normais de trabalho. A autora mostra preocupação de que o uso constante de estratégias de controle emocional possa levar à exaustão psíquica.

Para Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018., esses estudos, embora relevantes, apresentam dois tipos de limitações: a dos métodos utilizados para acessar o processo e a real complexidade desse processo. De um lado, muitos dos esforços para controlar a emoção são feitos pelos indivíduos de maneira automática e inconsciente, e o fato de a maioria dos pesquisadores ter utilizado questionários respondidos pelos participantes fez com que os indivíduos estivessem conscientes das estratégias para o controle das emoções, e essa consciência influencia no comportamento. Por outro lado, o processo de controle da emoção, dada a sua natureza cíclica, é complexo, maleável e difícil de analisar, e o resultado, de acordo com Gross & Thompson (2007), é que uma estratégia de controle pode ser adaptável em determinado ambiente cultural e ser mal adaptável em outro.

Na sequência, Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018. dedica uma seção inteira do terceiro capítulo para tratar da teoria da personalidade frente ao controle da emoção, direcionando a discussão para as pré-disposições psicológicas e os diferentes traços de personalidade dos indivíduos, e como eles afetam o autocontrole emocional. Ressalta a interdisciplinaridade do controle da emoção e trata do entendimento do controle da emoção frente à inteligência emocional, citando Petrides (2009), que afirma que pessoas emocionalmente inteligentes têm como características o autocontrole, sendo capazes de transformar os sentimentos ruins e prolongar o bom humor, são estáveis psicologicamente e sabem se reerguer de situações emocionalmente difíceis; pessoas com baixos índices de controle e de inteligência emocional são instáveis e sujeitas a períodos prolongados de ansiedade e depressão, têm dificuldades em lidar com os próprios sentimentos e são geralmente mal-humoradas e irritadiças. O capítulo discute ainda como as escolhas e o uso das estratégias de controle da emoção diferem entre os tradutores e fala da relevância do controle da emoção para a tradução e para os tradutores. Quanto ao descontrole emocional, a autora cita o caso relatado por Kaplan (2013), quando o tradutor de um de seus livros se deixou levar pelo entusiasmo exagerado ao traduzir o volume e passou a exigir moldar o texto como se fosse seu, dizendo se sentir “castrado” quando impedido de modificar os nomes e as características dos personagens. A seção final do capítulo examina o controle da emoção nos perfis dos tradutores participantes do estudo de caso, e apresenta como resultados: associações positivas entre o controle da emoção e a experiência como tradutor profissional, o nível de formação educacional, a satisfação profissional e a experiência em tradução literária; relevância estatística da correlação entre o controle da emoção e a experiência como tradutor profissional, o nível de formação educacional e a experiência literária; associação entre o controle da emoção e a satisfação profissional próxima de relevância estatística.

O quarto capítulo analisa o último dos estágios de processamento da emoção: a Expressão da Emoção, e tenta elucidar o impacto da expressão da emoção na performance da tradução, vista de acordo com Kennedy-Moore & Watson (2001), como uma série de comportamentos verbais e não-verbais. Apresenta o modelo de Kennedy-Moore, Greenburg, & Wortman (1991), que demonstra como as experiências emocionais são traduzidas por meio da expressão da emoção, e revela que as expressões emocionais são estudadas por meio de “canais” separados, e que, segundo definição de Collier (2014), cada canal é um tipo diferente de expressão da emoção. A revisão bibliográfica se refere as principais descobertas na área da expressão da emoção por meio da escrita, apontando os benefícios e as desvantagens desse processo, a saber: a afirmação de Pennerbaker & Chung (2011), de que escrever sobre eventos emotivos resulta em melhorias psicológicas, sociais e fisiológicas; as evidências, segundo Frattaroli (2006), de que a expressão da emoção por meio da escrita se mostra benéfica para pessoas diferentes nas mais adversas situações; as conclusões de Smyth, Pennebaker & Arigo (2012), de que estudantes universitários adeptos da escrita expressiva frequentaram menos os centros de saúde; o impacto positivo em indivíduos experimentando quadros de estresse e depressão, nos estudos de Ullrich & Lutgendorf (2002); as descobertas de Klein & Boals (2001), associando a prática da escrita expressiva ao aumento da capacidade de memória devido à redução de pensamentos intrusos; as confirmações de Kashdan & Biswas-Diener (2014), de que expressar emoções negativas tende a ser útil para promover maior processamento analítico e atenção aos detalhes; os registros de Burton & King (2004), afirmando que expressar emoções positivas por meio da escrita pode acelerar a recuperação emocional do estado negativo; as descobertas de Sheldon & Lyubomirsky (2006), de que a escrita expressiva positiva sustenta as emoções positivas e reduz os sentimentos negativos; os achados de Burton & King (2004), de que escrever sobre emoções positivas ajuda a melhorar a criatividade e a capacidade de solucionar problemas; as noções de que a obtenção de benefícios por meio da escrita expressiva depende, de acordo com Baikie, Geerligs & Wilhelm (2012), do nível de saúde mental do indivíduo, e que o processo de escrita precisa estar de acordo com os valores e os interesses do indivíduo; a ideia de que o despertar de emoções é também causado pelo próprio processo de escrita, segundo D’Mello & Mills (2014); os resultados do estudo de Sloan, Marx & Epstein (2005), que sugerem que escrever repetidamente sobre uma mesma experiência traumática pode trazer melhores resultados; que a prática da escrita expressiva pode despertar a princípio sentimentos altamente negativos e que, de acordo com Sloan, Marx & Greenberg (2011), esses sentimentos vão diminuindo com o passar do tempo; o impacto positivo da prática da escrita expressiva nos vínculos sociais, percebido por Pennebaker & Graybeal (2001); a meta-análise de Frattaroli (2006), que revela que a exposição de sentimentos apresenta mais efeito quando direcionada a alguém; e, por fim, os quatro mecanismos de Baikie & Wilhelm (2005), para explicar o porquê do sucesso da escrita expressiva.

Segundo Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018., a expressão da emoção por meio da escrita, por si só, não é suficiente para proporcionar benefícios à saúde, já que essa prática é geralmente combinada com outros métodos em contextos clínicos. Assim, a autora expõe as limitações das pesquisas na área da expressão da emoção, lembrando que os resultados dessa expressão podem não ser igualmente benéficos para todos os indivíduos. Manifesta, principalmente, interesse em pesquisas futuras relacionadas às implicações de escrever sobre as experiências emocionais de terceiros, intrinsicamente ligadas ao trabalho do tradutor.

Na sequência, o quarto capítulo demonstra, por meio dos processos de personalidade, como as pessoas diferem no modo como expressam as suas emoções e como esse fator pode afetar o seu bem-estar. Assinala que indivíduos altamente expressivos tendem a responder mais intensamente a estímulos emocionais, enquanto que, conforme demonstrado por Beyer (2014), indivíduos introvertidos não respondem bem a interrupções e instruções quando da produção de material emocional, já que, segundo Pennebaker & Graybeal (2001), a forma como as pessoas se expressam linguisticamente é uma marca de personalidade, sendo essa uma área promissora para pesquisas em Estudos da Tradução. O capítulo ainda considera a expressão da emoção um aspecto da inteligência emocional, e informa que a relação da inteligência emocional com a escrita expressiva recebeu, até então, pouca atenção dos pesquisadores. Quanto à expressão da emoção e a tradução, trata da tradução como escrita expressiva, e discute as semelhanças e diferenças entre elas, já que ambas são tipos de produção textual. Apresenta, a fim de contribuir qualitativamente sobre a relação entre a expressão da emoção e a tradução, as experiências de Rose (2013), ao traduzir as memórias angustiantes de Gorz, e as de Holierhoek (2008), ao traduzir Les Bienveillantes, um controverso livro sobre crimes de guerra cometido pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial, e registra as singularidades da expressão da emoção relacionadas à tradução de poesia, considerada uma exceção para a qual os benefícios da escrita expressiva nem sempre são aplicados. Fala ainda sobre a experiência de escrever para si e escrever para o outro, e cita a tese de Lehr (2014) que indica que as emoções podem influenciar no uso de expressões idiomáticas, na adequação do estilo e na precisão terminológica. Como nos capítulos anteriores, o foco volta-se, por fim, para o estudo de caso, e apresenta como resultados para a expressão da emoção: positivamente associada com o tempo de experiência profissional em tradução, satisfação no trabalho, sucesso profissional, nível de formação acadêmica e experiência em tradução literária.

O quinto capítulo, intitulado Discussão, resume os principais resultados do estudo empírico de caso, enfatizando sua contribuição para o campo de estudo. Recapitula as diferentes áreas em que as emoções desempenham papel importante e trata das implicações dos resultados da pesquisa para o ensino e para o desenvolvimento profissional. Enfatiza, relembrando Miao, Humphrey, & Qian (2017), que os educadores devem ajudar os tradutores em formação a desenvolver suas próprias competências emocionais por meio de atividades guiadas, e ressalta que, quanto à inteligência emocional, não existe um “perfil dos sonhos”, pontuando que embora geralmente visto como fator positivo, altos níveis de inteligência emocional podem ser, dependendo da situação, um fator negativo. Questiona se os traços emocionais podem ser desenvolvidos ao longo do tempo e as consequências do bom e do mau funcionamento emocional para os tradutores. Discute as estratégias de controle emocional, acrescentando a importância de incluí-las nos programas de formação de tradutores. Quanto à responsabilidade profissional, Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018. aconselha que os tradutores sejam proativos e assumam suas responsabilidades, e tenham comportamento ético e saudável.

Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018. encerra o volume com Conclusão e Direcionamentos Futuros, retomando o objetivo principal do trabalho, os métodos e as ferramentas de pesquisa, os resultados e correlações mais relevantes, a importância de se levar em conta o papel das emoções na formação de tradutores, as características desejáveis nos perfis dos tradutores, a necessidade de colaboração entre as diferentes áreas do conhecimento, a importância dos relatos pessoais dos tradutores, a importância das pesquisas já realizadas e o quanto ainda precisa ser feito, e a contribuição do próprio trabalho para a área de Estudos da Tradução.

A intenção de Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018. de humanizar e vocalizar a figura do tradutor como sujeito senciente e passível dos efeitos das emoções inerentes ao seu trabalho é louvável. Ela o retira da obscuridade da função invisível e automatizada e o coloca sob os holofotes, revelando suas angústias, medos e fragilidades. No entanto, talvez, a maior contribuição de Tradução e Emoção: uma perspectiva psicológica, seja a de enfatizar, a cada revisão bibliográfica, as limitações deixadas pelos trabalhos anteriores e apontar as lacunas a serem preenchidas com estudos futuros. A autora não foge da autocrítica e também aponta as insuficiências do próprio trabalho. Cada afirmação de Hubscher-DavidsonHubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective. New York: Routledge, 2018. é acompanhada de extensa bibliografia, preciosa para os estudantes da área.

  • 1
    Tradutora profissional e autora de Translation, Dépaysement, and Their Figuration e Translating as a Body: Meditations on Mediation.

Referências

  • Hubscher-Davidson, Séverine. Translation and Emotion: a psychological perspective New York: Routledge, 2018.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Mar 2021
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2020

Histórico

  • Recebido
    19 Ago 2020
  • Aceito
    13 Out 2020
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