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O uso de imagens como possibilidade de reflexão para licenciandos sobre a prática docente

The use of images as a possibility of reflection for undergraduates on the teaching practice

Resumo:

Trata de estudo de caso com o objetivo de ampliar as discussões sobre o uso de imagens no contexto educativo. O problema norteador da pesquisa foi: como o uso de imagens na formação inicial de licenciandos de Ciências Biológicas contribui para a reflexão e elaboração de estratégias pedagógicas que se distanciem da metodologia tradicional de ensino? Concerne a estudo de natureza qualitativa realizado com 23 estudantes de uma disciplina pedagógica de um curso de licenciatura em Ciências Biológicas de uma instituição pública de ensino superior no estado do Rio Grande do Sul (RS). Os dados foram coletados durante a realização de três atividades propostas pelas pesquisadoras de duas fontes distintas: (1) produção escrita dos sujeitos durante a realização das atividades e (2) registro em diário de campo pelo pesquisador quanto a impressões sobre diálogos e discussões realizadas. A análise dos dados seguiu os procedimentos da Análise Textual Discursiva, da qual emergiram duas categorias: (1) imagens escolhidas pelos licenciandos e (2) concepções pedagógicas subjacentes às escolhas efetuadas pelos licenciandos. Como resultado, identificou-se uma grande valorização da metodologia tradicional pelos licenciandos ao assinalarem dificuldades para escolher imagens e para diversificar a metodologia de ensino.

Palavras-chave:
prática pedagógica; base de conhecimento; reflexão

Abstract:

The article is a case study that aims to broaden discussions about the use of images in the educational context. The guiding research problem was devoted to how the use of images in the initial training of future teachers of Biological Sciences contributes to the reflection and development of pedagogic strategies that diverge from a traditional teaching methodology. It is a qualitative study, conducted with 23 students of a pedagogical discipline of the course of Biological Sciences in a public institution of higher education in the state of Rio Grande do Sul (RS). Data were collected during the execution of three activities proposed by the researchers from two distinct sources: (1) written production of the subjects during the performance of the activities and (2) records in a field journal made by the researcher, reporting impressions about dialogues and discussions held. Data analysis followed the procedures of Textual Discoursive Analysis, from which two categories have emerged: (1) images chosen by the undergraduates and (2) pedagogical conceptions underlying the choices made by the students. The results identified a great appreciation of the traditional methodology by undergraduates, since they presented difficulties in choosing images and in diversifying the teaching methodology.

Keywords:
pedagogical practice; knowledge base; reflection

Introdução

O cenário contemporâneo, complexo e multifacetado, exige a reorganização dos modos de ensinar a fim de que os sujeitos desenvolvam competências diferentes daquelas de momentos históricos anteriores, quando a memorização e a reprodução de conceitos eram tidas como suficientes. Tal reorganização vincula-se, predominantemente, aos modos de ensinar, tendo em vista a ampliação de oportunidades e de espaços para aprender, seja porque a produção de conhecimento ocorre celeremente, seja porque as tecnologias da informação e comunicação colocam o conhecimento produzido à disposição da sociedade de modo amplificado por meio de múltiplas ferramentas tecnológicas hoje disponíveis.

O grande desafio da profissão docente hoje é propor outras formas de organizar o ensino de modo a vitalizar o ambiente da aula, possibilitando o questionamento, a reflexão e o debate sobre os conteúdos escolares/acadêmicos. É nesse cenário que se insere o estudo aqui apresentado, que problematiza o uso de imagens para o ensino de Ciências e Biologia como uma alternativa, dentre tantas outras possíveis, para aprender e também ensinar, mobilizando os saberes dos estudantes e valorizando a interação.

Para tal, tendo em vista a importância que as imagens vêm desempenhando em nossa sociedade, parece fundamental investir, durante o período de formação inicial, na sensibilização dos licenciandos para a leitura imagética, pois quanto mais códigos eles dominarem e compreenderem, mais poderão interferir na rede de significação cultural de seus futuros alunos. Diante do exposto, o problema norteador dessa pesquisa é: como o uso de imagens na formação inicial de licenciandos de Ciências Biológicas contribui para a reflexão e a elaboração de estratégias pedagógicas que se distanciem da metodologia tradicional de ensino? Nosso interesse neste artigo é ampliar discussões existentes sobre o uso de imagens no contexto educativo, mais especificamente, apresentar como o trabalho com imagens pode tornar-se uma importante via para pensar o ensino de Ciências e Biologia nas escolas nos dias atuais.

O artigo é composto pelas seguintes seções: Referencial Teórico; Material e Método; Análise e Discussão; e Considerações Finais. No Referencial Teórico, abordamos a reflexão docente sobre a sua prática, bem como a utilização de estratégias de ensino que propiciem tal reflexão, destacando a clareza que o professor precisa ter sobre os objetivos e estratégias de ensino. Além disso, discorremos sobre o uso de imagens como estratégia de ensino. Na seção Material e Método, caracterizamos a abordagem metodológica como qualitativa, do tipo estudo de caso, com dados advindos de três atividades desenvolvidas com estudantes em formação inicial do curso de licenciatura em Ciências Biológicas. Na seção Análise e Discussão, apresentamos e discutimos os dados coletados e organizados de forma sistemática durante o desenvolvimento das atividades. Por fim, na seção Considerações Finais, reiteramos a relevância desse estudo e apresentamos algumas implicações para a prática docente com imagens no contexto educativo.

Referencial teórico

Na prática docente, nos deparamos com o currículo escolar e com a cultura do professor, que se organiza em torno dos saberes acadêmicos e não acadêmicos. Nesse sentido, é importante que os professores reflitam sobre suas práticas a fim de inserir novas formas de ensinar em sala de aula, não se limitando apenas a mediar currículos preestabelecidos. Para tanto, é necessário pensar sobre o método tradicional de ensino, no qual o professor é o centro do processo, a inteligência é vista como a capacidade de armazenar/acumular informações e o aluno adquire conhecimento por meio da transmissão (Mizukami, 1986MIZUKAMI, M. da G. N. Ensino: as abordagens do processo. São Paulo: E.P.U., 1986.).

É desejável que o professor supere o método tradicional de ensino, pois, de acordo com Haidt (2010HAIDT, R. C. C. Escolha dos procedimentos de ensino e organização das experiências de aprendizagem. In: HAIDT, R. C. C. Curso de didática geral. São Paulo: Ática, 2010. p. 143-153., p.148):

[...] para que a aprendizagem se torne mais efetiva, é preciso substituir, nas aulas, as tarefas mecânicas que apelam para a repetição e a memorização por tarefas que exijam dos alunos a execução de operações mentais. [...] a função do professor é coordenar e facilitar o processo de reconstrução do conhecimento por parte do aluno.

Nesse sentido, existe a necessidade de refletir sobre a complexidade da tarefa de ensinar, pois as discussões sobre a formação docente revelam que os processos formativos devem ultrapassar a dimensão instrumental, valorizando práticas docentes reflexivas, participativas e, sobretudo, críticas (Brito, 2006BRITO, A. E. Formar professores: rediscutindo o trabalho e os saberes docentes. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.).

Conforme Foreman (2010FOREMAN, J. O uso da dramatização para promover e desenvolver a compreensão dos alunos sobre conceitos científicos. In: WARD, H.; RODEN, J.; HEWLETT, C.; FOREMAN, J. Ensino de Ciências. Porto Alegre: Artmed , 2010. p. 139-160.), os alunos aprendem de diferentes maneiras o tempo todo, e não existe uma única forma certa para que todos compreendam. Desse modo, torna-se importante o uso de diferentes recursos de ensino almejando a aprendizagem.

A formação docente tem papel crucial nos rumos que o professor irá tomar em sua atuação profissional. Entretanto, conforme Brito (2006BRITO, A. E. Formar professores: rediscutindo o trabalho e os saberes docentes. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.), a política de formação dos professores parece não se basear no contexto social, nos lugares de exercício da prática pedagógica nem na realidade em que os sujeitos estão inseridos, o que contribui para um grande distanciamento entre os cursos de formação de professores e a prática profissional.

Particularmente em relação a Ciências, o que se ensina nas escolas são "fragmentos de uma Ciência que vem em pedacinhos e que, na verdade, não dá possibilidade ao aluno de entender a Ciência" (Garcia; Moreira, 2003GARCIA, R. L.; MOREIRA, A. F. B. Começando uma conversa sobre currículo. In: GARCIA, R. L.; MOREIRA, A. F. B. (Orgs.). Currículo na contemporaneidade: incertezas e desafios. São Paulo: Cortez, 2003. p. 7-39., p. 31). Por tal motivo, o profissional docente na educação escolar e na educação não escolar precisa passar para a posição de mediador entre os conhecimentos acadêmicos e os conhecimentos que os estudantes vivenciam em suas experiências cotidianas, reconhecendo que seus saberes locais/particulares são a base para a construção do saber escolar.

Um fator fundamental a ser analisado pelo docente ao elaborar sua aula é a clareza dos objetivos a serem atingidos pelos estudantes de acordo com as estratégias de ensino escolhidas. Segundo Haidt (2010HAIDT, R. C. C. Escolha dos procedimentos de ensino e organização das experiências de aprendizagem. In: HAIDT, R. C. C. Curso de didática geral. São Paulo: Ática, 2010. p. 143-153.), o termo estratégias de ensino é utilizado para referir-se aos meios e aos recursos pedagógicos escolhidos para alcançar os objetivos almejados. Nesta pesquisa, escolhemos como estratégia de ensino a utilização de imagens para que licenciandos do curso de Ciências Biológicas em formação inicial reflitam sobre seu uso com estudantes da educação básica.

As imagens, indiscutivelmente, caracterizam-se como um dos principais objetos de reflexão no campo dos estudos que se dedicam às representações visuais e aos processos de transmissão de significados. Seja ela fixa ou em movimento, mental ou material, a imagem povoa o cotidiano e o imaginário de muitas crianças e adolescentes das nossas escolas.

O próprio caráter polissêmico da imagem provoca dúvidas sobre como lê-la e usá-la em contexto escolar. Nesse sentido, podemos apontar duas condições para o uso da imagem em sala de aula: (a) a formação e preparação contínua dos docentes sobre as múltiplas possibilidades da imagem e seu potencial pedagógico; o (b) reconhecimento das imagens como parte do processo de apropriação dos conteúdos programáticos, como algo que pode ser tão importante quanto a escrita e a leitura da língua materna.

Como usar a imagem? Uma possibilidade é usar a imagem para representar ou ilustrar um determinado conteúdo a ser desenvolvido em aula. Outra possibilidade é gerar reflexões críticas e potencialidades educativas por meio das imagens.

Que tipo de imagem pode ser utilizado em sala de aula? A resposta é simples: qualquer tipo de imagem, desde que o professor tenha clareza dos objetivos de ensino, considere o contexto cultural dos indivíduos que a decodificarão e elabore perguntas adequadas para a mediação entre os elementos da imagem e os saberes a serem aprendidos, o que evidencia a importância da mediação docente.

Refletir sobre estratégias de ensino durante o processo de formação inicial do futuro docente contribui, portanto, para a construção da sua identidade profissional. A formação inicial não dá conta de toda a dinâmica dos processos de ensino e de aprendizagem, mas é coerente buscar nela uma sólida formação teórico-prática, baseada em peculiaridades de tais processos, a fim de formar professores em situações concretas de ensino (Brito, 2006BRITO, A. E. Formar professores: rediscutindo o trabalho e os saberes docentes. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.).

Antunes e Stivanin (2006ANTUNES, H. S.; STIVANIN, N. F. Estágio supervisionado e suas significações sociais: uma perspectiva a partir da formação inicial do curso de Pedagogia - CE/UFSM. In: SEMINÁRIO DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO DA REGIÃO SUL, 6., 2006, Santa Maria, RS. Anais... Santa Maria, RS: ANPEd, 2006. ) acreditam que as contribuições teóricas dos cursos de formação de professores são essenciais para a sustentação das ações práticas em aula. Assim, teoria e prática devem estar intimamente vinculadas, mantendo constante relação de reciprocidade para gerar novas ideias e compreensões sobre a Educação.

O educador, entretanto, pode enfrentar dificuldades para realizar a mudança do método de ensino até então utilizado. De acordo com Anastasiou (2012ANASTASIOU, L. G. C. Estratégias de ensinagem. In: ANASTASIOU, L. G. C.; ALVES, L. P. Processos de ensinagem na universidade: pressupostos para as estratégias de trabalho em aula. Joinville: Univille, 2012. p. 67-100.), tais dificuldades estão diretamente relacionadas às incertezas geradas pela mudança. A falta de preparo ou de conhecimento acerca de determinados questionamentos de alunos pode gerar insegurança no professor.

Quando o professor é desafiado a atuar numa nova visão, em relação ao processo de ensino e de aprendizagem, poderá encontrar dificuldades - inclusive pessoais - de se colocar numa diferenciada ação docente: geralmente essa dificuldade se inicia pela própria compreensão da necessidade de ruptura com o tradicional repasse. Caso esse obstáculo seja vencido, ele ainda se vê diante de novos desafios para atuar de forma diferente: lidar com questionamentos, dúvidas, inserções dos alunos, críticas, resultados incertos, respostas incompletas e perguntas inesperadas. (Anastasiou, 2012ANASTASIOU, L. G. C. Estratégias de ensinagem. In: ANASTASIOU, L. G. C.; ALVES, L. P. Processos de ensinagem na universidade: pressupostos para as estratégias de trabalho em aula. Joinville: Univille, 2012. p. 67-100., p. 78).

É importante destacar que "o trabalho educativo é um ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens" (Wachowicz, 1995WACHOWICZ, L. A. O método dialético na didática. Campinas: Papirus, 1995., p. 25). Portanto, ensinar com o uso de imagens requer dos professores o conhecimento de que elas têm caráter polissêmico. Nesse sentido, torna-se relevante desenvolver, com um coletivo de licenciandos em Ciências Biológicas, reflexões sobre práticas, mediadas pela utilização de imagens, para o ensino de conteúdos científicos.

Material e método

A pesquisa foi desenvolvida com 23 estudantes de uma disciplina pedagógica de um curso de licenciatura em Ciências Biológicas de uma instituição pública de ensino superior no estado do Rio Grande do Sul (RS).

A investigação foi de cunho qualitativo (Bogdan; Biklen, 2013BOGDAN, R. C.; BIKLEN, S. K. Investigação qualitativa em educação. Porto: Porto Editora, 2013.; Triviños, 1987TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em Ciências Sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987.; Denzin; Lincoln, 2006DENZIN, N. K.; LINCOLN, Y. O planejamento da pesquisa qualitativa: teorias e abordagens. Porto Alegre: Artmed, 2006.; Flick, 2009FLICK, U. Introdução à pesquisa qualitativa. Porto Alegre: Artmed , 2009.; Stake, 2011STAKE, R. E. Pesquisa qualitativa: estudando como as coisas funcionam. Porto Alegre: Penso , 2011.), abordagem comum no contexto educacional, principalmente no âmbito das ciências humanas, por responder muito bem às expectativas, uma vez que o pesquisador "aprofunda-se no mundo dos significados das ações e relações humanas" (Minayo, 2011MINAYO, M. C. de S. (Org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 32. ed. Petrópolis: Vozes, 2011., p. 22). Coerente com os princípios da abordagem escolhida, essa pesquisa foi realizada no ambiente em que o fenômeno ocorre, qual seja, aulas de um curso de formação de professores. Assume-se, ainda, como forma de investigação, o estudo de caso, definido por Triviños (1987) como um tipo de pesquisa cujo objeto é uma unidade que se analisa com o intuito de aprofundar a descrição de determinada realidade/experiência (Triviños, 1987TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em Ciências Sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987.; Yin, 2015YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2015.).

Os dados foram coletados em uma aula com duração de três períodos, na qual foram desenvolvidas três atividades. Os licenciandos foram convidados a organizarem-se em grupos para a realização das atividades.

Atividade 1

Após a formação dos grupos, cada um deles recebeu um conjunto de cinco imagens diferentes, provenientes das seguintes fontes: (a) anúncio publicitário; (b) jornal; (c) livro didático; (d) texto de divulgação científica; e (e) internet, conforme pode ser visto na Figura 1.

Figura 1
Exemplo de conjunto de imagens

Na sequência, foi solicitado aos estudantes que escolhessem alguma daquelas imagens para desenvolver um conteúdo conceitual de Ciências ou de Biologia. Pediu-se, também, o estabelecimento de uma lista de critérios adotados pelo grupo para a escolha da imagem.

Atividade 2

Elaboração, pelos grupos, de uma situação de ensino utilizando a imagem escolhida e explicitação do momento e da forma como ela seria utilizada.

Atividade 3

As atividades foram discutidas em grande grupo como forma de socializar e para oportunizar a reflexão sobre o posicionamento dos próprios licenciandos a respeito do uso de imagens no ensino de Ciências e Biologia. Houve ênfase, também, na discussão sobre os conteúdos conceituais levados em consideração por eles em suas decisões.

Assim, os dados para a presente análise advieram de duas fontes: 1) produção escrita dos sujeitos durante a realização das atividades e 2) registro em diário de campo pelo pesquisador quanto a impressões sobre diálogos e discussões realizadas.

As atividades solicitadas foram registradas de forma escrita pelos grupos e recolhidas pelo pesquisador. Essas produções foram utilizadas como fontes de dados, seguindo as recomendações de Bogdan e Biklen (2013BOGDAN, R. C.; BIKLEN, S. K. Investigação qualitativa em educação. Porto: Porto Editora, 2013.), os quais sugerem a utilização desses materiais para análise por constituírem-se em uma rica fonte de informações que permite rememorar as falas dos grupos durante as discussões e subsidiar as anotações realizadas em diário de campo. A importância do diário de campo está em permitir a anotação de fatos considerados relevantes e que subsidiarão a análise e a reflexão das produções escritas pelos sujeitos. Conforme Bogdan e Biklen (2013BOGDAN, R. C.; BIKLEN, S. K. Investigação qualitativa em educação. Porto: Porto Editora, 2013., p. 150), o diário de campo do pesquisador é o "[...] relato escrito daquilo que o investigador ouve, vê, experiencia e pensa no decurso da coleta de dados". No contexto desta pesquisa, o diário de campo do pesquisador foi utilizado como uma ferramenta para registrar as impressões sobre os diálogos e discussões realizadas pelos licenciandos durante as atividades.

O material coletado foi submetido ao método da Análise Textual Discursiva (Moraes; Galiazzi, 2014MORAES, R.; GALIAZZI, M. do C. Análise textual discursiva. 2. ed. Ijuí: Ed. Unijuí, 2014.). A Análise Textual Discursiva (ATD) é um processo auto-organizado de construção de novas compreensões a respeito do fenômeno estudado por meio de três etapas principais: (a) a desconstrução dos textos do corpus − a unitarização, a fim de obter unidades de sentido particular para a investigação; (b) o estabelecimento de relações entre os elementos unitários, aproximados por semelhanças − a categorização; e (c) a captação do emergente, em que a nova compreensão é comunicada e confirmada por meio de metatextos ou textos descritivos e interpretativos, produto final da categorização.

Ao final, foram estabelecidas duas categorias: (1) imagens escolhidas pelos licenciandos e (2) concepções pedagógicas subjacentes às escolhas efetuadas pelos licenciandos, sobre as quais se discorre na próxima seção.

Análise e discussão

Imagens escolhidas pelos licenciandos

A análise evidenciou aspectos importantes sobre as decisões tomadas pelos licenciandos no decorrer da atividade proposta. Entre eles, destacam-se a escolha da imagem, juntamente com as razões que os levaram a ela, e as escolhas realizadas para elaboração da situação de ensino contemplando a imagem definida pelo grupo. Apresentam-se, a seguir, as descrições e interpretações referentes às duas categorias estabelecidas.

Para a realização das atividades, os estudantes foram distribuídos em dois grupos com quatro integrantes e três grupos com cinco integrantes. Diante da solicitação de que escolhessem apenas uma imagem, constatou-se que os cinco grupos escolheram imagens de livros didáticos, não optando pelas de outras fontes disponibilizadas - anúncio publicitário, jornal, texto de divulgação científica e internet. Ao serem questionados sobre as razões para a escolha, os estudantes relataram critérios variados, tais como a familiaridade que tinham com as imagens, a relação destas com algum conteúdo conceitual específico e o fato de a imagem direcionar o pensamento do aluno da educação básica para o conceito que o professor pretende que ele aprenda.

A maioria dos licenciandos ressaltou a familiaridade que possuem com as imagens como principal elemento para a tomada de decisão. Afirmaram que já as conheciam desde o ensino médio, e entraram em contato com elas, mais uma vez, durante a realização do estágio curricular supervisionado, ocasião em que livros didáticos foram disponibilizados pelas escolas como forma de orientá-los em suas atividades. Comentaram, ainda, que é mais fácil utilizar a imagem do livro didático por esta possuir legenda, a qual direciona a escolha do conteúdo conceitual e define a profundidade com que esse conteúdo poderá ser trabalhado, conforme se evidencia nos seguintes relatos escritos:

[...] a legenda da imagem do livro já nos dá a direção do conteúdo e também possibilita que nosso aluno já foque no que iremos trabalhar, assim se ganha tempo. (Grupo 2).

[...] a imagem do livro é mais fácil de se utilizar, porque é algo que já temos à mão, não precisamos procurar e também é algo que está disponível facilmente para o aluno que abre o livro em casa. A imagem do livro é meio que padronizada, é fácil encontrar semelhantes em outros livros didáticos, isso facilita para o nosso aluno. (Grupo 4).

Percebe-se, nas falas dos futuros professores, que eles atribuem a escolha efetuada ao fato de as imagens serem familiares a eles e, também, aos alunos da educação básica. Constata-se, ainda, não ser claro para os licenciandos que, por estarem habituados às imagens, é mais fácil a decodificação das mensagens e dos conceitos veiculados e, assim, torna-se possível que seja elaborada uma situação de ensino para a aprendizagem do conteúdo conceitual em questão.

Sobre a afirmação de que determinada imagem é a mais apropriada para o trabalho com um conteúdo específico, os licenciandos afirmaram estar essa característica relacionada à frequência com que os alunos da educação básica podem encontrá-la em diferentes livros didáticos. Deram como exemplo a imagem típica para estudar organelas celulares − com uma célula semelhante a um ovo frito −, que é encontrada na maioria dos livros e também é semelhante à que o professor desenha no quadro quando está trabalhando tal conteúdo. De acordo com os licenciandos:

Algumas imagens são típicas da área, estão em todos os livros. Só de o aluno ver, ele já sabe de que conteúdo é, mesmo não sabendo o conteúdo científico, os conceitos que a imagem traz. Existem imagens que são típicas da área, como, por exemplo, as que envolvem conceitos básicos da Biologia. A célula é o principal exemplo, nos livros vemos sempre o mesmo padrão representado. (Grupo1).

Quanto ao foco que o professor deseja dar utilizando determinada imagem, os estudantes explicaram que quanto mais simples for a imagem, menor será a possibilidade de os estudantes da educação básica questionarem temas que, naquele momento, não interessam para os objetivos de ensino de determinado conteúdo. Segundo eles:

A imagem, quanto mais simples melhor, por isso o professor deve escolher bem, para não correr o risco de os alunos fazerem perguntas que vão tangenciar o assunto principal. A imagem se escolhe tendo o foco, sabendo o que se quer trabalhar, a primeira coisa é ter clareza do conteúdo. (Grupo 3).

A imagem tem que ser exatamente o que se quer trabalhar, não dá para dar margem para outros assuntos, porque senão fica difícil se preparar, a Biologia é muito ampla, não dá para saber tudo, mas se escolhendo bem, os alunos não nos apertam, e tem a questão do tempo, se conversar demais, se passa o tempo do conteúdo. (Grupo 1).

Além de o Grupo 3 destacar a questão de ter um foco - no caso, o conteúdo - para a escolha da imagem, percebe-se o receio quanto a questionamentos em aula, o que também é percebido no relato do Grupo 1. Entretanto, o Grupo 3 associa esses questionamentos a um tangenciamento do assunto principal, e o Grupo 1 relata a questão da amplitude da área da Biologia, que pode não ser conhecida naquele momento pelo professor. Embora autores como Haidt (2010HAIDT, R. C. C. Escolha dos procedimentos de ensino e organização das experiências de aprendizagem. In: HAIDT, R. C. C. Curso de didática geral. São Paulo: Ática, 2010. p. 143-153.) e Anastasiou (2012ANASTASIOU, L. G. C. Estratégias de ensinagem. In: ANASTASIOU, L. G. C.; ALVES, L. P. Processos de ensinagem na universidade: pressupostos para as estratégias de trabalho em aula. Joinville: Univille, 2012. p. 67-100.) estabeleçam como um dos critérios para a escolha dos recursos e das estratégias de ensino a adequação aos objetivos determinados para a aprendizagem, esses objetivos não precisam ser considerados de forma rígida a ponto de impedir o acolhimento à curiosidade dos alunos diante de uma perspectiva de discussão do conceito que não estivesse presente no plano inicial do professor. Em certa medida, é essa prerrogativa que pode ensejar a mobilização dos estudantes da educação básica para aspectos distintos dos inicialmente planejados pelo professor, trazendo riqueza e ampliando a complexidade das apropriações cognitivas que podem efetuar naquela ocasião.

O conhecimento profissional docente é uma construção que exige prática, reflexão e estudo sobre as ações empreendidas a fim de que se torne uma estrutura consistente, capaz de dar suporte aos encaminhamentos pedagógicos do professor no desenvolvimento da docência. Atribui-se, pois, o alinhamento entre escolhas dos graduandos e o senso comum pedagógico ao fato de o grupo investigado estar em processo de formação inicial, não tendo ainda estabelecido seu referencial pedagógico. Embora estudem as dimensões do conhecimento profissional docente em disciplinas pedagógicas, os saberes teóricos construídos não asseguram que eles serão mobilizados de imediato. Daí a importância de, nos cursos de formação inicial, haver uma intensa exposição a situações que problematizem as dinâmicas do fazer docente em sua complexidade, trabalhando seus eixos principais e complementares, quais sejam a dimensão pessoal, a dimensão prática, a dimensão do conhecimento profissional e a dimensão contextual (Grillo, 2014GRILLO, M. C. O professor e a docência: o encontro com o aluno. In: ENRICONE, D. (Org.). Ser professor. Porto Alegre: Ed. PUCRS, 2014. p. 55-66. ).

No elenco de razões que justificam a escolha de imagens de livros didáticos, apresentam-se, também, algumas menções diferenciadas que associam a tal familiaridade à possibilidade de identificar os conhecimentos prévios dos alunos sobre o conceito a ser trabalhado. Três grupos mencionaram a importância de ouvir o que os estudantes conhecem a fim de reconhecer os saberes que determinada imagem os faz recordar e a relação por eles estabelecida com outros conteúdos. Além disso, comentaram que identificar as concepções dos estudantes permite ao professor aprofundar determinados pontos do conteúdo. Segundo eles:

A imagem pode ser usada para saber o que os alunos sabem e faz com que o professor possa usar desses saberes, até para enriquecer a exemplificação. Dá para ter noção do nível de conhecimento que os alunos têm, e a partir disso começar a desenvolver o conteúdo. (Grupo 2).

Considerando a aprendizagem na perspectiva epistemológica do construtivismo, é possível dizer que aprender é construir significados, construir representações, e para tal é necessária a efetivação de vínculo entre o conhecimento novo e os conhecimentos prévios que os sujeitos possuem. No movimento para compreender uma situação nova, o conflito entre os conhecimentos prévios e as novas informações ocupa um lugar de destaque, pois é por meio das reflexões ocorridas nesse período que o sujeito vai estabelecendo as relações necessárias para ampliar a compreensão referente aos conceitos trabalhados (Cubero, 2000CUBERO, R. Como trabajar con las ideas de los alumnos. Sevilla: Díada, 2000.; Pozo, 2002POZO, J. I. Aprendizes e mestres. Porto Alegre: Artmed , 2002.). Desse modo, o uso de imagens pode se configurar em uma estratégia adotada pelo professor para identificar os saberes prévios que são mobilizados por seus estudantes para a leitura daquelas, tendo em vista que é sobre as imagens que o professor vai construir as situações de ensino e acompanhar o processo de construção conceitual dos estudantes. Ao tomar as imagens como ponto de partida, o docente identifica fragilidades e lacunas ali existentes e passa a desempenhar seu papel mediador, num esforço para a complexificação das teorias pessoais inicialmente expressas pelos estudantes.

A mediação entre o aluno e o objeto cognoscível é, talvez, a função de maior relevância entre as muitas atribuições do professor. Para além de apontar o que é importante o aluno saber, durante a mediação pedagógica o professor compromete-se com a atribuição de significado, pelo estudante, ao conteúdo a ser aprendido. Esse movimento, ao ensejar que o aluno torne-se insatisfeito com seus saberes pessoais, propicia que ele se disponha a revisá-los e modificá-los (Mauri, 1998MAURI, T. O que faz com que os alunos aprendam os conteúdos escolares? In: COLL, C.; MARTIN, E.; MAURI, T.; MIRAS, M.; ONRUBIA, J. SOLÉ, I; ZABALA, A. O construtivismo na sala de aula. São Paulo: Ática , 1998. p. 79-121. ; Coll; Palacios; Marchesi, 2004COLL, C.; PALACIOS, J.; MARCHESI, A. Desenvolvimento psicológico e educação. Porto Alegre: Penso, 2004. ).

Ao final da análise desta categoria, é importante mencionar que a escolha de imagens do livro didático por si só não representa um demérito, posto que as imagens presentes nesses materiais podem constituir-se em excelentes coadjuvantes em situações de ensino bem estruturadas. Entretanto, é necessário que, ao

[...] reconhecer o potencial pedagógico das imagens em situações didáticas, considerar que elas também são capazes de transmitir mensagens, conceitos, ideias, valores, desempenhando, desse modo, importante papel na formação dos jovens. (Pralon, 2012PRALON, L. Imagem e produção de sentido: as fotografias no livro didático. In: MARTINS, I.; GOUVÊA, G.; VILANOVA, R. (Eds.). O livro didático de Ciências: contextos de exigência, critérios de seleção, práticas de leitura e uso em sala de aula. Rio de Janeiro, 2012. p. 159-170. Disponível em: <http://www.nutes.ufrj.br/arquivos/O_livro_didatico_de_Ciencias.pdf>.
http://www.nutes.ufrj.br/arquivos/O_livr...
, p. 163).

O exposto até aqui fortalece a argumentação em torno da essencialidade de que, nos cursos de formação inicial, os licenciandos sejam expostos a oportunidades não só para vivenciar ações de docência, mas, principalmente, para revisitar suas concepções sobre ensinar e aprender.

Concepções pedagógicas subjacentes às escolhas efetuadas pelos licenciandos

As respostas da segunda atividade, referente às propostas metodológicas escolhidas para organização de uma possível aula utilizando as imagens, foram reunidas em dois grupos: o primeiro grupo é o daqueles licenciandos que escolheram trabalhar apenas com a exposição da imagem, caracterizando uma abordagem pedagógica tradicional, centrada no professor, enquanto o aluno executa prescrições que são fixadas por ele (Mizukami, 1986MIZUKAMI, M. da G. N. Ensino: as abordagens do processo. São Paulo: E.P.U., 1986.); o outro grupo, com menor número de licenciandos, propôs a disponibilização da imagem para que os estudantes falassem sobre ela, estabelecendo relações com o conteúdo conceitual nela representado, relatando seus saberes em uma proposta metodológica coerente com a abordagem cognitivista (Mizukami, 1986MIZUKAMI, M. da G. N. Ensino: as abordagens do processo. São Paulo: E.P.U., 1986.).

Essa atividade permitiu questionar os licenciandos relacionando o que tinham exposto na atividade anterior, na qual três grupos relataram a importância de mapear os saberes prévios dos alunos. Entretanto, nenhum desses três grupos escolheu uma metodologia que procurasse fazer os estudantes da educação básica exporem aqueles saberes. Nesse ponto, os licenciandos perceberam sua contradição e expuseram que uma organização metodológica que possibilite maior interação e liberdade dos estudantes é mais complicada de elaborar. Afirmaram, ainda, que as perguntas mediadas pelo professor não podem dar pistas do conteúdo, mas, ao mesmo tempo, devem direcionar a respostas pelas quais o professor tem interesse. O posicionamento dos licenciandos evidencia uma maior facilidade para adoção de uma postura tradicional.

As dificuldades encontradas pelos licenciandos no desenvolvimento de uma prática pedagógica diversificada que estimule a aprendizagem, vinculando teoria e prática, podem ser consequência, principalmente, da formação inicial. Uma possível explicação para essa dificuldade reside, como afirmam Pimenta e Lima (2011)PIMENTA, S. G.; LIMA, M. S. L. Estágio e docência. São Paulo: Cortez , 2011., no fato de os currículos de formação constituírem-se em um aglomerado de disciplinas isoladas, sem qualquer explicitação de seus nexos com a realidade:

Assim, nem sequer se pode denominá-las teorias, pois são apenas saberes disciplinares em curso de formação, que em geral estão completamente desvinculados do campo de atuação profissional dos professores. (Pimenta; Lima, 2011PIMENTA, S. G.; LIMA, M. S. L. Estágio e docência. São Paulo: Cortez , 2011., p. 33).

Nesse sentido, a formação técnica, estática, deve ceder espaço para um processo dinâmico de formação docente, no qual seja prática permanente a busca de autonomia, reconstrução de saberes e de competência pedagógica (Brito, 2006BRITO, A. E. Formar professores: rediscutindo o trabalho e os saberes docentes. Belo Horizonte: Autêntica, 2006.).

Na atividade 3, quanto a quais e se os saberes dos futuros alunos dos licenciandos foram considerados para a escolha metodológica, apenas o grupo que destacou a questão dos saberes prévios, na atividade 1, levou em conta os estudantes para efetuar a escolha metodológica.

Em relação à relevância ou não da utilização de imagens em aulas de Ciências e Biologia, os estudantes consideraram as imagens interessantes para o ensino. Expuseram que gostaram de pensar em como utilizar as imagens para dar aula, mas sentiram dificuldade em saber qual o melhor momento da aula para utilizá-las e de que forma. Relataram que gostaram de ouvir as ideias dos colegas e, mesmo a maioria optando por uma metodologia mais próxima da tradicional, conseguiram perceber as diferenças de enfoques de acordo com cada uma das propostas.

Os outros grupos afirmaram que o mais importante é a transmissão dos saberes pelo professor e, então, a escolha da imagem deve basear-se no nível de conhecimento do professor sobre determinado conteúdo, o que, segundo eles, possibilita ao docente escolher a imagem mais adequada para a criação da proposta de ensino.

Claro que é importante saber o que o aluno sabe, mas mais importante que isso é que o material escolhido esteja de acordo com o que o professor sabe, porque um material pode ser de excelente qualidade, mas se o professor não souber o conteúdo todo, vai ficar constrangido e não vai acrescentar nada para os alunos. (Grupo 3).

Percebe-se aqui que o foco da escolha não está na imagem em si, mas nas concepções, nos conhecimentos e na cultura do professor que irá julgar determinada imagem.

Quando, como educadores, fazemos a escolha de uma imagem para utilização em sala de aula, devemos saber que elas têm caráter polissêmico, além do que "a imagem é efetivamente real, é ela própria uma realidade, mas não tem a realidade daquilo que representa." (Wolff, 2005WOLFF, F. Por trás do espetáculo: o poder das imagens. In: NOVAES, A. (Org.). Muito além do espetáculo. São Paulo: SENAC, 2005. p. 17-45., p. 22). Nesse sentido, devemos aprender a ler e proporcionar a leitura crítica de imagens por nossos alunos.

A utilização de imagens em aulas de Ciências e Biologia, enquanto recurso pedagógico, gera insegurança e é vista por alguns como algo complexo quando se pensa em utilizá-las nos planos de aula. Basicamente, isso se deve a dois aspectos iniciais: a) a falta de percepção da imagem como provocadora de discussões, como objeto de aprendizado; b) no pouco tempo disponível para preparar dezenas de aulas, para avançar no conteúdo que se exige. Logo, as imagens acabam sendo pouco influentes no programa de ensino dos docentes, já que não há dedicação à mediação do seu uso. Utilizar imagens para ensinar Ciências e Biologia é como ensinar a ler o mundo, é vincular conhecimento científico à cultura do indivíduo para facilitar a aprendizagem dos conteúdos curriculares.

É importante que os professores e licenciandos, ao depararem-se com dificuldades para utilização de qualquer recurso pedagógico, encarem isso como desafio e compartilhem os êxitos e as angústias com seus pares. Anastasiou (2012ANASTASIOU, L. G. C. Estratégias de ensinagem. In: ANASTASIOU, L. G. C.; ALVES, L. P. Processos de ensinagem na universidade: pressupostos para as estratégias de trabalho em aula. Joinville: Univille, 2012. p. 67-100., p.80) afirma que

[...] mesmo que a instituição ainda não se constitua como impulsionadora desses processos, há a autonomia docente, que possibilita a implementação de estratégias diferenciadas, ainda que num nível de ação individual. Temos acompanhado processos onde os professores iniciam a mudança em duplas e/ou grupos pequenos, que depois vão se ampliando numérica e qualitativamente.

Por isso, consideramos relevante a dinâmica dessas três atividades utilizadas na formação inicial desses estudantes de licenciatura, no sentido de sensibilizar para o uso de imagens no âmbito escolar, para uma reflexão e para a elaboração de estratégias pedagógicas que se distanciem da metodologia tradicional de ensino, além de contribuírem para discussões em grupo e para a troca e construção de saberes.

Considerações finais

Os resultados apontam uma grande valorização da metodologia tradicional pelos licenciandos ao assinalarem dificuldades para escolher as imagens e diversificar a metodologia de ensino. Consideramos as imagens ricas ferramentas a serem utilizadas na formação de docentes, por possibilitarem aos indivíduos a articulação de saberes prévios a novos saberes por meio da reflexão suscitada pela leitura. Isso possibilita compreender a significação e os saberes/conceitos que os licenciandos mobilizam para escolher/interpretar determinada imagem, bem como perceber se eles estão avançando na construção de saberes pedagógicos mais complexos.

A partir do que foi percebido na pesquisa, e a fim de clarear o entendimento sobre como as imagens podem ser utilizadas com finalidade pedagógica em sala de aula de maneira mais ampla, podemos afirmar que o uso delas depende das concepções dos professores, ou futuros professores (licenciandos), sobre os critérios para escolha dessas imagens e sobre as propostas metodológicas escolhidas. O trabalho com imagens na formação inicial em Ciências Biológicas contribui para a reflexão e elaboração de estratégias didáticas que podem se distanciar da metodologia tradicional, desde que se compreenda a importância dos papéis dos sujeitos envolvidos nos processos de ensino e de aprendizagem, a contribuição cultural de cada indivíduo ou grupo de indivíduos quando se gera oportunidade para tal.

Por fim, asseveramos que as decisões tomadas pelos licenciandos amparam-se em suas convicções sobre a melhor forma de iniciar situações de ensino que contemplem imagens. Para o grupo que fez parte do estudo, tal seleção foi centralizada nos conhecimentos e sentimentos próprios. Entretanto, acredita-se que, na educação básica, um bom conjunto de critérios para utilização de imagens precisa contemplar: (a) a adequação da imagem ao conteúdo e ao objetivo de ensino; (b) as potencialidades que a imagem possui para engajamento com outros conteúdos; (c) a importância das imagens no contexto da metodologia didática escolhida; e (d) a potencialidade de leitura pelos estudantes a fim de facilitar a aprendizagem de conteúdos escolares.

Com isso em mente, é essencial possibilitar aos licenciandos oportunidades de pensar sua prática docente e refletir sobre estratégias de ensino para que possam compreender as concepções próprias sobre ensinar e aprender.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2016

Histórico

  • Recebido
    01 Set 2015
  • Aceito
    22 Fev 2016
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