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Estudo cefalométrico prospectivo dos efeitos da terapia de tração reversa da maxila associada à mecânica intermaxilar

Resumos

OBJETIVO: o diagnóstico e o tratamento precoce do Padrão III são temas ainda muito discutidos na literatura ortodôntica. A tração reversa associada à expansão rápida da maxila constitui a abordagem mais popular e estudada, produzindo os melhores resultados no menor período de tempo. O foco deste estudo foi avaliar as mudanças gradativas ocorridas no complexo dentofacial em crianças com Padrão III de crescimento tratadas com tração reversa da maxila associada à mecânica intermaxilar. MÉTODOS: a amostra foi constituída por 10 pacientes Padrão III, com média de idade de 8 anos e 2 meses ao início do tratamento, tratados consecutivamente com aparelho expansor de Haas modificado, arco lingual modificado, elásticos intermaxilares e máscara de Petit para tração reversa da maxila por 9 meses. Foram realizadas 4 telerradiografias em norma lateral de cada paciente, uma correspondente ao início do tratamento e as demais em intervalos regulares de 3 meses (T1, T2, T3 e T4). As grandezas cefalométricas foram comparadas entre os tempos através de Análise de Variância de Medidas Repetidas, complementada pelo Teste de Comparações Múltiplas de Tukey. RESULTADOS: pôde-se observar que as alterações esqueléticas mais significativas ocorreram nos primeiros 3 meses de tratamento, sendo que, após esse período, elas se mantiveram constantes até o final do tratamento. Ocorreram poucas compensações dentárias e as alterações verticais ocorridas apresentaram significado clínico reduzido. CONCLUSÃO: a terapia empregada obteve não só uma correção do trespasse horizontal entre as arcadas, mas também uma melhora no relacionamento sagital entre as bases ósseas e na estética tegumentar.

Prognatismo; Técnica de expansão palatina; Aparelhos de tração extrabucal; Má oclusão


OBJECTIVE: The early diagnosis and treatment of skeletal Class III (Pattern III) is still a much debated topic in orthodontic literature. Maxillary protraction associated with rapid maxillary expansion is the most popular and widely researched approach, producing the best results in the shortest period of time. This study aimed to evaluate the gradual changes that occur in the dentofacial complex in children with Pattern III growth treated with maxillary protraction associated with intermaxillary mechanics. METHODS: The sample consisted of 10 patients with Pattern III, whose mean age was 8 years and 2 months at the beginning of treatment, consecutively treated with a modified Haas expander, modified lingual arch, intermaxillary elastics and Petit facemask for maxillary protraction during a 9-month period. Four lateral cephalograms were taken of each patient, one at the beginning of treatment and the other three at regular 3-month intervals (T1, T2, T3 and T4). Cephalometric measurements at each of the four times were compared using ANOVA variance for repeated measures and supplemented by Tukey's multiple comparisons test. RESULTS: It was observed that the most significant skeletal changes occurred in the first 3 months of treatment. After that period the changes remained constant until the end of treatment. There were few dental compensations and the vertical changes which occurred showed reduced clinical significance. CONCLUSIONS: The therapy used in this study accomplished not only the correction of overjet but also improvements in the sagittal relationship of the basal bones and in soft tissue esthetics.

Prognathism; Palatal expansion technique; Extraoral traction appliances; Malocclusion


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Estudo cefalométrico prospectivo dos efeitos da terapia de tração reversa da maxila associada à mecânica intermaxilar

Juliana de Oliveira da Luz FontesI; Guilherme ThiesenII

IEspecialista em Ortodontia pela UNISUL

IIMestre em Ortodontia e Ortopedia Facial PUC/RS. Professor de Ortodontia da UNISUL

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Juliana de Oliveira da Luz Fontes Rua Hermínio Millis, 66 - Bom Abrigo CEP: 88.085-320 - Florianópolis/SC E-mail: juliana.fontes@gmail.com

RESUMO

OBJETIVO: o diagnóstico e o tratamento precoce do Padrão III são temas ainda muito discutidos na literatura ortodôntica. A tração reversa associada à expansão rápida da maxila constitui a abordagem mais popular e estudada, produzindo os melhores resultados no menor período de tempo. O foco deste estudo foi avaliar as mudanças gradativas ocorridas no complexo dentofacial em crianças com Padrão III de crescimento tratadas com tração reversa da maxila associada à mecânica intermaxilar.

MÉTODOS: a amostra foi constituída por 10 pacientes Padrão III, com média de idade de 8 anos e 2 meses ao início do tratamento, tratados consecutivamente com aparelho expansor de Haas modificado, arco lingual modificado, elásticos intermaxilares e máscara de Petit para tração reversa da maxila por 9 meses. Foram realizadas 4 telerradiografias em norma lateral de cada paciente, uma correspondente ao início do tratamento e as demais em intervalos regulares de 3 meses (T1, T2, T3 e T4). As grandezas cefalométricas foram comparadas entre os tempos através de Análise de Variância de Medidas Repetidas, complementada pelo Teste de Comparações Múltiplas de Tukey.

RESULTADOS: pôde-se observar que as alterações esqueléticas mais significativas ocorreram nos primeiros 3 meses de tratamento, sendo que, após esse período, elas se mantiveram constantes até o final do tratamento. Ocorreram poucas compensações dentárias e as alterações verticais ocorridas apresentaram significado clínico reduzido.

CONCLUSÃO: a terapia empregada obteve não só uma correção do trespasse horizontal entre as arcadas, mas também uma melhora no relacionamento sagital entre as bases ósseas e na estética tegumentar.

Palavras-chave: Prognatismo. Técnica de expansão palatina. Aparelhos de tração extrabucal. Má oclusão.

INTRODUÇÃO E REVISÃO DE LITERATURA

A má oclusão de Classe III, originalmente definida por Angle como uma relação mesializada de molares inferiores em relação aos molares superiores, está, na realidade, vinculada a inúmeras alterações de ordem esquelética e dentária, que frequentemente resultam em aspecto facial desarmonioso. Assim, o Padrão III pode ser definido como um desequilíbrio anteroposterior singular e marcante que se expressa nos tecidos moles da face, resultante da discrepância esquelética sagital entre as bases ósseas (prognatismo mandibular, deficiência maxilar ou a associação de ambos), acompanhada ou não por alterações nos sentidos vertical e transversal. Essas discrepâncias esqueléticas promovem alterações no posicionamento dos dentes, tanto inter- quanto intra-arcadas4.

Apesar da baixa prevalência, quando comparada às demais más oclusões6,21, suas marcantes características de expressão conduzem à necessidade de abordagens terapêuticas já nos primeiros estágios de desenvolvimento dos indivíduos que apresentam esse atributo. No entanto, o tratamento precoce do Padrão III representa um dos principais desafios para o ortodontista na sua prática clínica, devido ao seu complexo controle e dificuldade de predição do padrão morfogenético de crescimento do paciente até sua fase adulta.

Contrariamente, muitos profissionais preferem aguardar a maturidade esquelética e tratar essa deformidade por meio da cirurgia ortognática, devido às incertezas quanto ao sucesso e à estabilidade do tratamento precoce. Entretanto, estudos recentes com acompanhamento em longo prazo de casos tratados precocemente com ortopedia mecânica têm demonstrado que bons resultados podem ser atingidos num número considerável de pacientes26,28.

Dentre as modalidades de tratamento precoce do Padrão III, a tração reversa da maxila (TRM) constitui a abordagem mais popular e estudada na literatura ortodôntica, produzindo os melhores resultados no menor intervalo de tempo, principalmente em indivíduos que se encontram no final da dentição decídua ou início da dentição mista. Dentre as alterações ocorridas durante o tratamento, pode-se evidenciar o deslocamento maxilar em direção anterior, giro do plano mandibular no sentido horário, deslocamento anterior da arcada dentária superior, inclinação lingual dos incisivos inferiores, aumento da altura facial anteroinferior e aumento da convexidade facial1,6,10,16,18,19,23. Relatos recentemente publicados envolvem o uso de variados expansores maxilares, podendo estar associados a outros dispositivos intra- ou intermaxilares que visem potencializar os efeitos esqueléticos da tração reversa da maxila3,12,14,22.

Tendo em vista a incontestável importância desse tema, bem como as inúmeras controvérsias ainda suscitadas, o presente estudo tem como objetivo avaliar a possibilidade de maximizar os efeitos da já consagrada tração reversa da maxila, por meio do emprego concomitante da protração maxilar com máscara facial de Petit e de uma mecânica intermaxilar com a utilização de elásticos intrabucais de Classe III para uso contínuo. Além disso, inexistem na literatura ortodôntica trabalhos que avaliem os efeitos gradativos dessa terapia ao longo do tratamento, apesar de alguns autores4,7 já especularem que a maior parte dos efeitos esqueléticos ocorre durante os primeiros meses de terapia.

MATERIAL E MÉTODOS

Caracterização da amostra

Para realização do estudo cefalométrico prospectivo das alterações dentárias, esqueléticas e tegumentares induzidas durante o tratamento, foram utilizados 10 pacientes (6 do sexo feminino e 4 do sexo masculino; com média de idade de 8 anos e 2 meses ao início do tratamento - com faixa etária entre 5 e 11 anos -; pertencentes ao curso de Especialização em Ortodontia da UNISUL, Florianópolis/SC, Brazil), tratados consecutivamente com os aparelhos expansor de Haas modificado, arco lingual de Nance modificado e máscara facial de Petit para tração reversa da maxila, por um período de 9 meses.

Alguns critérios de seleção foram utilizados para inclusão dos indivíduos no grupo experimental: 1) Padrão III de face com deficiência maxilar, avaliado pelo sulco nasogeniano marcante e deficiência da região malar; 2) Padrão III de crescimento esquelético, determinado pela medida Wits < 0mm; 3) estágio de dentadura decídua ou dentadura mista; 4) mordida cruzada anterior ou relação de topo a topo; 5) ausência de tratamento ortodôntico prévio; 6) ausência de alterações congênitas e/ou outras deformidades faciais.

A idade esquelética dos pacientes foi avaliada por meio do método de maturação das vértebras cervicais proposto por Bacceti, Franchi e McNamara2. Esse método é composto por 6 estágios crescentes de desenvolvimento, sendo que todos os pacientes selecionados para esse estudo apresentavam-se antes do estágio 3, ou seja, antes do pico do surto de crescimento puberal.

Sistema de ancoragem

Arcada superior

O sistema de ancoragem utilizado na arcada superior (Fig. 1), em todos os pacientes, foi um aparelho expansor fixo do tipo Haas modificado, confeccionado com fio de aço 1,2mm (Dentaurum®), contendo barras de conexão vestibular e lingual. A barra vestibular foi estendida para distal a fim de realizar a inserção dos elásticos intrabucais de Classe III. Foram bandados, sempre que possível, os segundos molares decíduos. Quando da impossibilidade de bandagem dos referidos dentes, realizou-se a bandagem dos primeiros pré-molares e molares permanentes (kit com bandas universais, Morelli®, ref. 40.02.900). Os demais dentes posteriores foram, geralmente, colados com compósito (resina composta Z100, 3M). O parafuso expansor utilizado foi o de 11mm (Dentaurum®, ref. 600.303.30) e o protocolo de ativação aplicado envolveu 2/4 de volta por dia, sendo o parafuso aberto até sua amplitude máxima em todos os casos. Já durante a fase ativa da expansão (com 14 dias de ativação do parafuso), instalou-se a máscara facial de Petit para tração reversa da maxila, utilizando-se uma média de força de 400-600g de cada lado. Os pacientes eram instruídos a utilizar a máscara facial por um período médio de 12 horas por dia.


Arcada inferior

O sistema de ancoragem utilizado na arcada inferior (Fig. 2) foi um arco lingual de Nance modificado, confeccionado com fio de aço 1,0mm (Dentaurum®), contendo barra de conexão vestibular com ganchos na região de caninos para o uso de elásticos intrabucais de Classe III. Foram bandados os segundos molares decíduos ou os primeiros molares permanentes (kit com bandas universais, Morelli®, ref. 40.02.900). Os demais dentes posteriores foram colados com compósito (resina composta Z100, 3M).


A partir dos ganchos presentes na região posterior do disjuntor de Haas modificado e os ganchos presentes na região anterior do arco lingual de Nance modificado, foram utilizados elásticos com orientação de Classe III (Fig. 3), sendo os pacientes instruídos a utilizá-los 24 horas por dia (retirando-os somente para alimentação e higienização). A força média aplicada pelos elásticos intrabucais de Classe III foi de 200-350g.


Todos os indivíduos do grupo experimental utilizaram o aparelho Haas modificado, o arco lingual modificado e a máscara facial por um período de 9 meses, atingindo overjet positivo nesse momento.

Mensuração das alterações

As alterações dentárias, esqueléticas e tegumentares foram avaliadas por meio de telerradiografias em norma lateral obtidas em quatro tempos distintos: T1) início do tratamento, antes da instalação dos aparelhos; T2) após 3 meses de tratamento; T3) após 6 meses de tratamento e T4) após 9 meses de tratamento, imediatamente antes da remoção dos aparelhos.

Todas as radiografias foram realizadas no Serviço de Radiologia do Instituto Odontológico Nivaldo Nuernberg (IONN, Florianópolis/SC), com proteção de colete de chumbo e sem ônus para os pacientes, utilizando-se sempre o mesmo aparelho de raios X (Siemens®, tipo Germador, com cefalostato de Margolis).

As radiografias foram processadas pela funcionária da unidade de radiologia do IONN, em processadora AI-pró Imagcorp modelo A/T 2000M, na câmara escura do Serviço de Radiologia, utilizando-se um tempo total de processamento de 3,5 minutos.

Os traçados cefalométricos foram realizados manualmente pelo mesmo examinador, previamente calibrado, utilizando lápis HB preto. A análise comparativa entre os dois grupos foi realizada por meio de mensurações angulares e lineares obtidas nas telerradiografias de perfil, com escala de 0,5º e 0,5mm, pareando-se os quatro tempos do grupo experimental (T1, T2, T3 e T4). Nenhuma correção foi feita para a ampliação linear das imagens radiográficas (aproximadamente 7% em relação ao plano mediano).

Para determinação do cálculo do erro intraexaminador, 20% das radiografias do grupo experimental foram, de maneira aleatória, novamente traçadas e medidas com um intervalo de duas semanas entre a primeira e a segunda avaliação. O cálculo do erro foi realizado pelo teste t de Student para amostras pareadas, comparando-se os valores obtidos na primeira mensuração com os valores encontrados na segunda mensuração, a um nível de significância de 5%. Para o cálculo do erro casual, foi utilizada a fórmula de Dahlberg.

Após a coleta dos dados, realizou-se a estruturação de um banco de dados, para possibilitar a aplicação de testes estatísticos, utilizando-se o software Statistica for Windows versão 6 (StatSoft). As grandezas cefalométricas foram comparadas entre os tempos através de Análise de Variância de Medidas Repetidas, considerando-se um nível de significância de 5%, uma vez que o mesmo indivíduo foi mensurado em diferentes períodos. Para complementar a análise de variância, foi aplicado o Teste de Comparações Múltiplas de Tukey, também ao nível de significância de 5%, indicando entre quais tempos houve diferença entre as médias (T1, T2, T3 e T4). As alterações dentárias, esqueléticas e tegumentares foram mensuradas utilizando-se grandezas cefalométricas angulares (SNA, SNB, ANB, SN.Ocl, SN.PP, SN.GoMe, 1.NA, 1.NB, FMA, IMPA, 1./PP) e lineares (Wits, Ena-Me, Co-A, Co-Gn, NPerp-A, NPerp-Pog, Ls, Li, 1/-NA, /1-NB).

RESULTADOS

O cálculo do erro intraexaminador foi realizado por meio da aplicação do teste t de Student para amostras pareadas, considerando-se um nível de significância de 5%, não sendo encontrada diferença estatisticamente significativa para nenhuma das medidas analisadas. Para o erro casual, também não foi encontrado valor representativo de erro significativo para as medidas angulares e lineares. A maior diferença de mensuração encontrada foi de 0,5º e 0,7mm respectivamente.

Por meio da Tabela 1, pôde-se observar que a maior parte das alterações esqueléticas sagitais na maxila ocorreu nos primeiros 3 meses da terapia, conforme elucidado pelas medidas SNA, NPerpA e CoA. Além disso, pôde-se constatar que os incisivos superiores apresentaram inclinação lingual nos primeiros 3 meses de TRM, sendo que, após esse período, esses dentes apresentaram vestibularização progressiva com o tratamento. Essa retroinclinação inicial provavelmente ocorreu devido à grande expansão maxilar a que foram submetidos os pacientes, assim aumentando o perímetro da arcada superior5,27. Após esse período inicial, a inclinação vestibular aumentou no sexto e no nono mês de terapia, confirmando os achados de outros estudos3,15.

A Tabela 2 demonstra que as medidas SNB e NPerp-Pog mantiveram-se praticamente estáveis ao longo de todo o tratamento, apresentando uma ligeira redução nos primeiros 3 meses de terapia (embora sem significância estatística). O comprimento efetivo da mandíbula aumentou durante o tratamento, comprovando o crescimento dos pacientes no período de avaliação. Entretanto, esse crescimento mandibular não se traduziu na projeção da mandíbula, provavelmente devido ao autogiro da mesma ocorrido nesse período.

Os incisivos inferiores apresentaram suave retroinclinação ao longo do tratamento, conforme demonstrado pelas medidas 1-NB, 1.NB e IMPA.

Observou-se na Tabela 3 que com o tratamento ocorreram mudanças significativas na relação maxilomandibular (ANB e Wits), sendo que essas alterações foram significativas nos primeiros 3 meses de terapia e se mantiveram praticamente estáveis até seu término.

Na Tabela 4 avaliou-se as alterações verticais ocorridas durante o período de tratamento. Apesar de ter ocorrido um giro mandibular durante a terapia (aumento do FMA e SN.GoMe), essa alteração não apresentou diferença estatisticamente significativa para nenhum dos tempos avaliados. Da mesma forma, o plano palatino não sofreu alterações significativas durante o tratamento.

Entretanto, houve alterações estatisticamente significativas na altura facial anteriorinferior (Ena-Me) e no plano oclusal (SN.Ocl). Vale ressaltar que, embora tenham ocorrido alterações no plano oclusal ao longo da terapia, essas podem ser consideradas bastante reduzidas e clinicamente inexpressivas ao término do tratamento.

Na Tabela 5 encontram-se as grandezas que avaliam a projeção dos lábios superior e inferior em relação à linha S de Steiner (S-Ls e S-Li). Pôde-se observar que houve projeção do lábio superior, com aumento significativo da medida S-Ls ao longo do tratamento. De maneira inversa, o lábio inferior teve sua projeção reduzida gradativamente até o final do tratamento.

DISCUSSÃO

Na Ortodontia atual, a terapia com protração maxilar tem se tornado a técnica mais comum para corrigir o desenvolvimento do Padrão III de crescimento maxilomandibular. A popularidade da protração da maxila tem aumentado devido à consciência de que a deficiência maxilar tem responsabilidade parcial ou total na etiologia estrutural do Padrão III. Além disso, numerosos relatos demonstram que esse aparelho apresenta um maior índice de sucesso em longo prazo quando comparado a outras técnicas, como a mentoneira, aparelhos funcionais ou terapia de camuflagem8,23,25.

Independentemente da estabilidade pós-tratamento, o que se pretende de imediato em um tratamento precoce para o Padrão III é o máximo de mudanças esqueléticas com o mínimo de compensação dentária. Assim, uma série de dispositivos extra- e intrabucais tem sido desenvolvida na tentativa de potencializar os efeitos ortopédicos almejados durante o tratamento ortopédico desses pacientes12,14.

Somam-se a isso os resultados apresentados por Holberg, Mahani e Rudziki9, que relataram que as forças comumente empregadas para promover a protração maxilar por meio da máscara facial são, aparentemente, insuficientes para estimular de modo significativo a formação óssea nas suturas circum-maxilares. Segundo os autores, que analisaram a protração maxilar por meio do método de elementos finitos, não parece provável que a magnitude das tensões induzidas nas áreas suturais da face média durante a terapia seja suficiente para gerar importantes efeitos esqueléticos.

Assim, o intuito dessa pesquisa foi avaliar a utilização da tração reversa da maxila associada à mecânica intermaxilar, por meio da análise dos gradativos efeitos esqueléticos, dentários e tegumentares induzidos pelo tratamento. Deste modo, a maior pretensão da terapia proposta nesse trabalho - com o uso concomitante de uma mecânica intermaxilar associada à máscara facial - seria elevar ao máximo o efeito ortopédico do tratamento precoce do Padrão III.

A mecanoterapia empregada nesse estudo mostrou-se superior para promover o avanço esquelético da maxila, quando comparado com a maioria dos estudos presentes na literatura6,17,19,21,23,29; entretanto, apresentou-se similar ou inferior quando comparado a outros12,13,15,22. O mesmo ocorreu com a relação maxilomandibular, na qual se observou que a mecanoterapia aplicada no presente trabalho apresentou-se efetiva para o tratamento do Padrão III, porém similar a alguns trabalhos que empregavam máscara facial isoladamente10,11,15,22. Em relação à mandíbula, as medidas que avaliaram sua projeção anterior apresentaram suave redução, sendo essas insignificantes estatisticamente e estando de acordo com outros estudos10,13,15,16,18,22,23.

No que tange o aspecto das alterações dentárias suscitadas pela terapia, constatou-se que, ao final do tratamento proposto nesse estudo, ocorreram compensações dentoalveolares suaves na arcada superior (ligeira vestibularização dos incisivos, avaliada pelas medidas 1.Na, 1-Na e 1.PP). Já na arcada inferior, a lingualização dos incisivos inferiores apresentou-se um pouco mais acentuada, porém similar à relatada por outros autores3,8,15.

Enfim, esses resultados deixam claro que o emprego concomitante da máscara facial e terapia intermaxilar, conforme proposto no atual artigo, pode até não potencializar exageradamente o efeito ortopédico almejado no tratamento interceptativo do Padrão III, mas também não maximiza a participação dentoalveolar no tratamento.

Analisando-se, ainda, os 4 tempos distintos de avaliação, pôde-se constatar que a maior parte das alterações esqueléticas promovidas pela terapia ocorreu nos primeiros 3 meses de tratamento, sendo que, após esse período, as mesmas se mantiveram praticamente constantes até o final do tratamento (conforme evidenciado pelas medidas SNA, NPerp-A, Co-A, ANB e Wits, Tab. 1 e 3).

Apesar da maior parte das alterações esqueléticas ter ocorrido nos primeiros 3 meses, vale lembrar que a interrupção do tratamento nesse momento poderia levar a recidivas, sendo necessários estudos adicionais para elucidar tais questionamentos.

As compensações dentárias foram mais evidentes nos últimos meses de TRM (T3 e T4), sendo que os incisivos superiores e os incisivos inferiores apresentaram, respectivamente, vestibularização e retroinclinação progressivas com o tratamento. No entanto, as alterações dentárias ocorridas nesse estudo podem ser consideradas reduzidas. Isso leva a concluir que, ao longo do tratamento, há tendência a uma progressiva compensação dentoalveolar, com manutenção dos efeitos ortopédicos alcançados nos primeiros meses da terapia de protração maxilar.

Os dados apresentados nesse estudo, por avaliarem a TRM a cada 3 meses, apresentam valor clínico expressivo, pois buscam trazer maiores esclarecimentos dos efeitos gerados ao longo do tratamento, definindo de maneira mais clara seus reais efeitos e buscando atingir um tempo ideal de intervenção com esse tipo de abordagem. Entretanto algumas limitações desse trabalho devem ser ponderadas, entre elas a inexistência de grupo controle, atualmente inviável por questões éticas. A amostra utilizada nesse estudo, apesar de apresentar-se dentro de uma distribuição normal, pode ser considerada um tanto reduzida. Além disso, acompanhamentos longitudinais são necessários para avaliar se os efeitos positivos aqui atingidos irão permanecer até o término do período de crescimento dos pacientes.

CONCLUSÃO

Analisando os efeitos esqueléticos gradativos ocorridos durante o tratamento, pôde-se observar que praticamente todas as alterações esqueléticas significativas ocorreram nos primeiros 3 meses de tratamento, sendo que, após esse período, elas se mantiveram constantes até o final do tratamento. No aspecto dentário, ocorreram poucas compensações dentárias. As alterações verticais também se apresentaram reduzidas e com pouco significado clínico. Ao término do tratamento, constatou-se que a terapia de tração reversa da maxila associada à mecânica intermaxilar obteve não só uma correção do trespasse horizontal entre as arcadas, mas também uma melhora no relacionamento sagital entre as bases ósseas e na estética tegumentar, embora essas alterações não tenham sido maximizadas significativamente quando comparadas aos achados presentes na literatura.

Enviado em: 18 de outubro de 2008

Revisado e aceito: 14 de maio de 2009

» Os autores declaram não ter interesses associativos, comerciais, de propriedade ou financeiros, que representem conflito de interesse, nos produtos e companhias descritos nesse artigo.

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  • Endereço para correspondência
    Juliana de Oliveira da Luz Fontes
    Rua Hermínio Millis, 66 - Bom Abrigo
    CEP: 88.085-320 - Florianópolis/SC
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Mar 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2011

    Histórico

    • Recebido
      18 Out 2008
    • Aceito
      14 Maio 2009
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