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Análise sociojurídica do novo direito do trabalho brasileiro

Social-legal analysis of the new Brazilian labor law

Resumo

O artigo volta-se a uma análise do direito do trabalho emergente da reforma ocorrida no Brasil com a promulgação da Lei 13.467/2017. Tem como objetivo compreender, em um nível macrossociológico, o impacto das mutações societais em curso em sua nova configuração, o que se empreenderá a partir da teoria formatada por António Casimiro Ferreira em torno de uma sociologia do direito situada entre a crise, a austeridade e a exceção, por ele consideradas verdadeiras categorias estruturadoras do presente. A análise será desenvolvida por meio de um caminho metodológico ancorado nos moldes de uma pesquisa qualitativa de caráter prospectivo e concretamente construída através da técnica da pesquisa bibliográfica.

Palavras-chave:
Sociologia do direito; Novo direito do trabalho brasileiro; Reforma trabalhista brasileira de 2017; Crise; Austeridade; Exceção

Abstract

The paper turns to an analysis of labor law emerging from de reform that took place in Brazil with the promulgation of Law 13,467/2017. It proposes do understand, at a macro sociological level, the impact of underway society’s mutations in their new configuration. This understanding will be undertaken based on the theory formatted by António Casimiro Ferreira around a sociology of law between crisis, austerity, and exception, considered by him true structuring categories of the present. The analysis will be developed through a methodological path anchored in the perspective of qualitative research, of a prospective character, and concretely constructed trough the technique of bibliographic research.

Keywords:
Sociology of law; New Brazilian labor law; Brazilian labor reform of 2017; Crisis; Austerity; Exception

1. Introdução11Este trabalho corresponde a parte dos resultados da investigação de pós-doutoramento conduzida junto ao Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra - Portugal, sob supervisão do Professor Doutor António Casimiro Ferreira.

Brasil, 11 de novembro de 2017. Entrava em vigor a reforma trabalhista, promulgada por meio da Lei 13.467, apenas cento e vinte dias após sua publicação oficial, ocorrida em 13 de julho do mesmo ano.

De par com seu diminuto período de vacatio legis, causaram espécie, de um lado, o curto espaço de tempo de tramitação do processo legislativo de que se originou2 2 Dada a composição bicameral do Legislativo federal brasileiro e o fato de a proposição da reforma ter partido do Poder Executivo federal, a Casa iniciadora do processo legislativo foi a Câmara dos Deputados, cabendo ao Senado Federal o papel de Casa revisora. Na primeira fase do processo legislativo, na Câmara, portanto, o projeto foi nomeado Projeto de Lei (PL) 6.787/2016, e tramitou de 23.12.2016 até 28.04.2017. Sendo, após, remetido ao Senado para o início da segunda fase do mesmo processo legislativo, sendo lá renomeado como Projeto de Lei da Câmara (PLC) 38/2017, onde permaneceu até a sua convolação em lei, ocorrida em, conforme dissemos em 13.07.2017 (BRASIL, 2016; 2017b). No total, contabilizam-se precisos 126 dias para aprovação na Câmara dos Deputados e outros ainda mais exíguos 76 dias, no Senado Federal. e, de outro, o fato de ser uma lei alteradora de um número deveras elevado de dispositivos da legislação trabalhista então existente3 3 Para se ter uma ideia, apenas em relação à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a lei de que emergiu a reforma trabalhista de 2017, ao fim e ao cabo de todo o seu trâmite legislativo, acabou por modificar 33 dispositivos de direito do trabalho (entre dispositivos de direito individual e coletivo do trabalho), 21, de direito processual do trabalho, além de inserir na CLT 32 novos dispositivos de direito material e 11, de direito processual. Com tais 97 pontos de mudança, a Lei 13.467/2017, a partir de sua entrada em vigor, passou a ser responsável pela redação de pouco mais de 10% dos dispositivos da CLT – que já contava à época com seus 922 artigos (BRASIL 2017a). – até por esse motivo, seria conveniente um prazo de vacatio legis mais estendido, para que os intérpretes e aplicadores do novo texto melhor se adaptassem aos padrões normativos por ela inaugurados.

Mais alarmante que o número elevado de alterações produzidas pela reforma trabalhista é o teor dessas alterações, que, entre outras coisas, subtraíram direitos antes legalmente previstos aos trabalhadores, retirando-lhes, inclusive, o efeito pansalarial de muitas de suas verbas retributivas, introduziram condições e formas de contratação mais precarizadas, fragilizaram a estrutura institucional de entidades sindicais, esmaeceram a importância e o papel das negociações coletivas e dificultaram a judicialização de conflitos trabalhistas na Justiça do Trabalho4 4 Embora este artigo, por razões a serem expostas no item seguinte, não vá se dedicar a analise de cada um dos novos dispositivos introduzidos na CLT pela Lei 13.467/2017, cabe, neste ponto, nem que a título apenas ilustrativo, especificar aqueles que, a nosso ver: a) subtraíram direitos trabalhistas: arts. 58, §2º; 62, III; e 71, §4º; b) retiraram o efeito pansalarial de verbas retributivas: art. 457, §§1º e 2º; c) introduziram condições e formas de contratação mais precarizadas: arts. 58-A; 134, §1º; e 443, §3º; d) fragilizaram a estrutura institucional de entidades sindicais: art. 578; e) esmaeceram a importância e o papel das negociações coletivas: art. 59, §§5º e 6º; e f) dificultaram a judicialização de conflitos na Justiça do Trabalho: arts. 844, §§2º e 3º; e 790-B (BRASIL, 2017a). . A consequência de todo esse projeto de liberalização da sociedade e erosão de direitos sociais laborais não poderia ser outra, senão o afastamento do direito do trabalho brasileiro de seu pressuposto original de proteção do trabalhador e, consecutivamente, o rompimento de sua identidade político-jurídica – nutrida, nacional e internacionalmente, desde a assunção do Estado-providência e da relação salarial fordista, após o término da II Guerra Mundial.

Como compreender tal ruptura paradigmática do direito do trabalho pós-reforma de 2017? Trata-se de um fenômeno especificamente brasileiro, ou, numa demarcação sociológica cosmopolita, pode ser lido como atinente a outros países do capitalismo financeirizado? Ela se manterá como “novo normal” na regulação das relações de trabalho no Brasil? Eis os problemas que o presente estudo buscará responder, lançando mão, para tanto, da teoria sociojurídica de António Casimiro Ferreira e sua peculiar maneira de pensar a relação entre a política, o direito e a sociedade, captando as transformações sociais, políticas e jurídicas a partir do prisma do que ele considera serem as três categorias estruturantes do presente: a crise, a austeridade e a exceção.

Os principais argumentos aqui expostos estão divididos em quatro seções, além desta introdução e das considerações finais. Na próxima seção, dadas a multiplicidade e a conflitualidade paradigmáticas em que se inspira a sociologia do direito na contemporaneidade, nos ocuparemos de algumas notas sobre o enquadramento teórico e conceitual do presente estudo, no intuito de especificar as nossas opções metodológicas e epistemológicas ao se empreender esta análise acerca do novo direito do trabalho. Na terceira seção, num esforço de análise metateórica, buscaremos realizar uma exposição sistemática – ainda que apertada – do pensamento de António Casimiro Ferreira, com fincas a compreender o mais amplamente possível a teoria em que se conceberam as categorias analíticas da crise, austeridade e exceção. Por fim, na quarta seção, discutiremos sobre as mediações necessárias para a aplicação da referida teoria sociojurídica no contexto da reforma trabalhista brasileira de 2017, assim como analisaremos a nova configuração do direito do trabalho brasileiro com espeque nos pressupostos e categorias de análise sociológica a ele aplicáveis

2. Notas preliminares sobre o enquadramento teórico, conceitual, epistemológico e metodológico do presente estudo

Como dissemos na seção introdutória, para compreender o novo direito do trabalho brasileiro a partir das transformações operadas no contexto da promulgação da Lei 13.467/2017, este trabalho lançará mão de uma teoria sociojurídica específica. À partida, antes mesmo de refletirmos sobre a referida teoria e sobre os motivos que nos levaram à sua escolha, é preciso indagar: há alguma relevância em tal afirmação? Em termos de seu enquadramento teórico, conceitual e epistemológico, dizer que o presente estudo se desenvolverá a partir de um referencial das ciências sociais, em especial da sociologia, tem total relevância. É que, assim, sustentamos a sua filiação ao campo do que se convencionou chamar de “sociologia do direito”, e não ao da “sociologia jurídica”.

Isto equivale a dizer que, aqui, deixaremos de tecer críticas à perspectiva dogmática do direito do trabalho nascente a partir da reforma, objetivo característico de pesquisas alinhadas à sociologia jurídica (FONTAINHA; OLIVEIRA; VERONESE, 2017FONTAINHA, Fernando de Castro; OLIVEIRA, Fabiana Luci de; VERONESE, Alexandre. Por uma sociologia política do direito no Brasil. Revista Brasileira de Sociologia, v. 5, n. 11, p. 29-47, set./dez. 2017., p. 31) – estas comumente produzidas por bacharéis em direito sociologicamente orientados e com base em abordagens teóricas e abstratas mais próximas da filosofia e teoria do direito, ou, de um ponto de vista interdisciplinar, dos Critical Legal Studies norte-americanos e do Mouvement Critique du Droit francês (FARIÑAS DULCE, 1994FARIÑAS DULCE, María José. Sociología del derecho versus análisis sociológico del derecho. Doxa. Cuadernos de Filosofía del Derecho, Universidad de Alicante, v. II, p. 1013-1024, 1994., p. 1016).

Isto também quer significar que não cuidaremos de abordar problemas estruturais ou de funcionamento internos do sistema justrabalhista da atualidade nem, tampouco, de analisar a validade formal ou as premissas das decisões legais levadas a cabo pela reforma trabalhista brasileira. Embora este seja um esforço cognitivo legítimo para se firmar a compreensão do direito, uma “perspectiva interna do direito” como essa caberia, mais propriamente, a pesquisas conduzidas no campo da ciência jurídica.

Além disso, estando nós sob o paradigma da sociologia do direito, é necessário asseverar que esta investigação não objetivará estudar a eficácia das normas e das instituições jurídicas nem o comportamento de seus destinatários e das organizações sociais – os chamados “fatos do direito”. Atender a aspectos da validade empírica ou da eficácia social do direito seria objeto do que vem sendo denominado de “sociologia do direito dos juristas”. A análise sociojurídica que aqui ora se propõe se inscreve numa outra perspectiva de análise possível à sociologia do direito, alinhando-se à denominada “sociologia do direito dos sociólogos”, vez que busca refletir o fenômeno jurídico em sua totalidade, ou seja, dentro do contexto social, econômico e político de sua produção, tendo em vista a interação desses diferentes fatores (FERREIRA, 2019bFERREIRA, António Casimiro. Sociologia do direito: uma abordagem sociopolítica. Porto: Vida Económica, 2019b., p. 37).

Dentro da constelação de compromissos dos que estão sob o referido paradigma, ao menos na vertente que ora exploramos, está o pressuposto do presente trabalho, de que o direito não é neutro nem é autônomo em relação à sociedade, eis que profundamente imerso no social e no político, sendo, ao mesmo tempo, constitutivo da realidade social e produto de uma construção social, política e institucional (FERREIRA, 2019bFERREIRA, António Casimiro. Sociologia do direito: uma abordagem sociopolítica. Porto: Vida Económica, 2019b., p. 37-38). Daí porque, para proceder a uma observação sistemática da realidade social circundante ao novo direito do trabalho brasileiro, nos socorrermos do diálogo com uma teoria sociojurídica que espelha este mesmo pressuposto: a desenvolvida pelo sociólogo português António Casimiro Ferreira e aplicada, por ele e por outros estudiosos conformados nos moldes do seu pensamento, para compreender as reformas laborais promovidas em Portugal a partir de 2011. Esta, aliás, é a razão da opção por essa específica teoria sociológica., a qual nos propomos a examinar, metodologicamente falando, a partir da revisão bibliográfica de alguns dos escritos do referido sociólogo.

É claro que aqui não se tenciona empreender uma análise comparada entre as reconfigurações jurídicas ocorridas em Portugal e no Brasil por ocasião de suas respectivas reformas laborais. Embora este objetivo possa ser legitimamente perseguido em pesquisas vinculadas à ciência jurídica que apliquem técnicas comparatistas para compreender as estruturas características de diversas ordens jurídicas – geralmente cotejando, de um lado, a pátria e de outro, as alienígenas –, neste estudo, ele será preterido em função de sua filiação, antes mencionada.

As opções metodológicas e epistemológicas aqui detalhadas conformarão o fio condutor da presente pesquisa. O que não quer dizer que as demais vertentes por nós prescindidas não tenham o seu próprio valor. Em outras palavras, pontuar que não faremos comentários acerca de cada uma das mudanças operadas pela reforma trabalhista de 2017, seja eles em tom crítico ou dogmático, ou mesmo do ponto de vista de sua eficácia social, não põe em menoscabo as perspectivas da “sociologia jurídica”, da “sociologia do direito dos juristas” ou das ciências jurídicas propriamente ditas. A opção pelo enquadramento teórico e conceitual específico da chamada “sociologia jurídica dos sociólogos”5 5 Em geral, os sociólogos do direito referem-se de maneira indistinta a tais expressões designativas ao campo. O próprio António Casimiro Ferreira (2019b), autor da teoria sociojurídica aqui perspectivada, assim o entende. Nós, inclusive, somente recorremos à utilização deliberada de expressões como “sociologia jurídica”, “sociologia do direito dos juristas” e “sociologia do direito dos sociólogos” com o único fim de demarcar a epistemologia que orienta o presente estudo. justifica-se, única e tão-somente, em função de sua maior adequação à busca do principal objetivo do presente escrito, que passa, como já repisado, pela compreensão da realidade social brasileira em que se gestou a reforma trabalhista de 2017 e pela percepção, ao menos em um nível macrossociológico, do impacto das mutações societais em curso em relação ao novo direito do trabalho brasileiro.

3. O pensamento sociojurídico de António Casimiro Ferreira em torno das três categorias estruturantes do presente – crise, austeridade e exceção

Como dito na seção introdutória deste texto, a reflexão aqui desenvolvida se enquadra num esforço de análise metateórica, eis que consubstanciada numa tentativa de exposição sistemática da teoria desenvolvida por António Casimiro Ferreira, analisada esta em seus próprios termos, respeitando, portanto, a lógica teórica em que se apoiam os conceitos e as noções edificadas pelo autor. Pretende-se um estudo sistemático, mas não global e longitudinal, já que, em função do fio condutor da presente pesquisa – conforme demonstrado na seção anterior – e tendo em vista os limites deste escrito, optamos por selecionar específicas dimensões teórico-conceituais dos seus trabalhos.

Razão por que, a despeito de sua vasta produção acadêmico-intelectual, nos restringiremos, nesta exposição, a quatro de seus livros e dois de seus artigos científicos. Entre os livros estão: “Sociedade da austeridade e o direito do trabalho de exceção”, de 2012; “Política e sociedade: teoria social em tempo de austeridade”, de 2014; “Sociologia das constituições: desafio crítico ao constitucionalismo de exceção” e “Sociologia do direito: uma abordagem sociopolítica”, os dois últimos publicados em 2019. Entre os artigos perspectivaremos: “A sociedade de austeridade: poder, medo e direito do trabalho de exceção”, de 2011; e “The politics of austerity as politics of law”, de 2016. Em todas essas obras o autor procura estruturar seu programa de investigação em torno do que denomina de sociologia da austeridade e do que ele considera serem as três categorias estruturadoras do presente: a crise, a austeridade e a exceção6 6 Falamos em programa de investigação porque o pensamento do autor sobre aquelas categorias perpassa uma diversidade de abordagens do social e se espraiam em construtos teóricos próprios da ciência política, da sociologia política e da sociologia do direito. É precisamente neste ponto que operamos o critério de seleção e recorte das dimensões teórico-conceituais dos trabalhos aqui analisados, à medida que nos interessam as leituras afeitas ao último campo, máxime as voltadas às alterações produzidas na esfera laboral e dos seus direitos – objeto central deste estudo. .

A crise em questão é a que está a assolar o mundo desde 14 de setembro de 2008, data da falência do grupo Lehman Brothers – o quarto maior banco de negócios dos Estados Unidos –, e que deu início ao colapso do sistema financeiro mundial, afetando vários outros bancos e empresas. Crise esta que, segundo a literatura disponível e ainda em construção, teria decorrido da “falta de regulação dos mercados financeiros” e da “ganância subjacente ao modo de acumulação do capital financeiro” (FERREIRA, 2014FERREIRA, António Casimiro. Política e sociedade: teoria social em tempo de austeridade. Porto: Vida Económica, 2014., p. 29).

Para além de seus óbvios aspectos financeiros e econômicos, o autor reforça a caracterização sociológica da crise destacando a forma “performativa” de interpelação de seu conceito, já que associada aos processos de “legitimação pela performatividade”. Nesta chave de leitura, a invocação da crise pelos poderes políticos dominantes acaba se tornando indissociável do seu uso estratégico, levando a justificar, legitimar – e até naturalizar – a necessidade de intervir e reformar a sociedade (FERREIRA, 2014FERREIRA, António Casimiro. Política e sociedade: teoria social em tempo de austeridade. Porto: Vida Económica, 2014., p. 28).

A evidência da naturalização do pensamento reformista repousa no único tipo de resposta já aventado a todas as crises inscritas nas dinâmicas societais desde os anos 1970. Foi o que sucedeu após a crise do Estado-providência na década de 1970, em que a orientação reformadora se apressou a substituir o pleno emprego e a valorização do fator trabalho pelo controle e redução da inflação como objetivos tendentes ao crescimento econômico. E foi o que igualmente se deu, nas décadas seguintes, após o Consenso de Washington e os processos de globalização, em que a governação internacional do trabalho e dos seus direitos passou a ser colonizada pela agenda de instituições como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI) e suas políticas de reformas estruturais (FERREIRA, 2014FERREIRA, António Casimiro. Política e sociedade: teoria social em tempo de austeridade. Porto: Vida Económica, 2014., p. 32-34)7 7 Sobre a evidência da naturalização do pensamento reformista, é importante notar que António Casimiro Ferreira chega a tal conclusão a partir do estudo, por um lado, das regularidades sociais e, por outro, dos casos singulares de cada uma das crises ocorridas desde os anos 1970 – o que constitui, por assim dizer, o ofício de qualquer sociólogo que, como ele, trabalhe sob as perspectivas teóricas de Émile Durkheim e do tipo ideal de Max Weber. A este respeito, conferir Durkheim (2011) e Weber (2009). Isso quer dizer que, apesar de reconhecer que cada processo de crise tem características próprias, deflagrando, cada um deles, mudanças específicas nos padrões societais, o estudo das dinâmicas político-jurídicas desenvolvidas ao longo de cada período histórico o levou a identificar a recorrência da ideia reformista para a solução das diversas crises. . Assim se pronuncia António Casimiro Ferreira sobre o que ele chamou de “era das reformas” – o que realça, mais uma vez, a normalização do pensamento reformista aqui noticiado:

A era das reformas, assim se pode designar o período em apreço, tem por base uma tecnologia de ponta desenvolvida pelas sociedades capitalistas, assente numa retórica de respostas à crise atendendo a diagnósticos e soluções construídos através da radicalização dos argumentos economicistas que estão na base da construção social de uma realidade em que a produtividade, a competitividade, o abaixamento dos custos salariais, a privatização, a mercantilização, etc. constituem o algoritmo de onde se há de extrair a melhor resposta para as intervenções reformadoras. (FERREIRA, 2014FERREIRA, António Casimiro. Política e sociedade: teoria social em tempo de austeridade. Porto: Vida Económica, 2014., p. 33).

No que se refere à corrente crise econômica e financeira, a sanha reformista volta à cena, desta vez orientada por um projeto de austeridade. Austeridade, aqui, significando “o processo de implementação de políticas e de medidas económicas que conduzem à disciplina, ao rigor e à contenção económica, social e cultural” (FERREIRA, 2011FERREIRA, António Casimiro. Sociedade da austeridade: poder, medo e direito do trabalho de exceção. Revista Crítica de Ciências Sociais, 95, p. 119-136, dez. 2011., p. 119). A especificidade sociológica do conceito está no nexo embaçado que liga os mercados financeiros e os indivíduos e no reconhecimento de ser através destes e das suas privações subjetivas e objetivas – e não da regulação daqueles – que se encontram as soluções para a crise (FERREIRA, 2012FERREIRA, António Casimiro. Sociedade da austeridade e direito do trabalho de exceção. Porto: Vida Económica, 2012., p. 11).

Note-se, neste ponto, uma estratégica inversão do significado do termo austeridade, operada graças à colonização do seu sentido pela lógica neoliberal. De uma virtude, no campo da moral privada, associada à sobriedade, parcimônia, prudência ou comedimento nos desejos para se evitar desperdícios de recursos ou endividamento para saciar caprichos, a noção é utilizada pelos neoliberais para justificar a moderação no crescimento dos salários e na oferta de bens e serviços públicos, não se empregando, contudo, a mesma moderação quanto à poupança dos empresários – pois, segundo se propala, ela seria necessária para a geração de empregos e para o bem-estar futuro dos consumidores – nem quanto aos rendimentos do capital financeiro especulativo – que, pretensamente, não poderiam ser taxados sob pena de fugirem para outros países. E é deste modo que a distribuição heterogênea dos sacrifícios, em sua passagem da moral individual para a coletiva, torna a austeridade mais vantajosa não para o maior número de indivíduos, mas para os mais favorecidos, conduzindo, por conseguinte, ao aprofundamento da pobreza e das desigualdades sociais.

O significado atual da austeridade é, portanto, em meu entender, o de um modelo político-econômico punitivo em relação aos indivíduos, orientado pela crença de que os excessos do passado devem ser reparados pelo sacrifício presente e futuro, enquanto procede à implantação de um arrojado projeto de erosão dos direitos sociais e de liberalização económica da sociedade. A sociedade da austeridade capta esta dinâmica caracterizada por uma perturbação coletiva dos padrões institucionais e individuais. Estes deslocam-se para os valores da resignação, desilusão, culpa, desconfiança, dúvida e medo, a partir dos quais tudo o que é positivo está mesmo assim minado por um desespero latente, onde o provisório, a incerteza e o meio-termo estão na base de todas as estratégias públicas e privadas. O complexo da austeridade é a designação deste fenómeno. (FERREIRA, 2012FERREIRA, António Casimiro. Sociedade da austeridade e direito do trabalho de exceção. Porto: Vida Económica, 2012., p. 13).

Assim, com apoio na teoria weberiana do tipo ideal, tal qual fizeram Ulrich Beck, com a sua “sociedade de risco” (BECK, 2016BECK, Ulrich. Sociedade de risco mundial: em busca da segurança perdida. Tradução de Marian Toldy e Teresa Toldy. Lisboa: Edições 70, 2016.), Robert Castel e Richard Sennett, com a “sociedade precária” (CASTEL, 2003CASTEL, Robert. L'insécurité sociale: qu'est-ce qu'être protégé? Paris: Editions du Seuil, 2003.; SENNETT, 2006SENNETT, Richard. The culture of the new capitalism. New Haven: Yale University Press, 2006.) e Zigmund Bauman, com a sua “modernidade líquida” (BAUMAN, 2001BAUMAN, Zygmunt. Modernidade líquida. Tradução de Plínio Dentzien. Jorge Zahar Editor: Rio de Janeiro, 2001.), Ferreira plasma na noção acima apresentada algumas das dimensões características da “sociedade da austeridade”. Sociedade esta que, segundo o autor, possui padrões de sociabilidade e de organização institucional diferentes das anteriores, o que o leva a considerar que também a crise que a gerou é distinta das crises que a antecederam. Afinal, no seu entender, refletir a crise de 2008 não como uma mera continuidade das crises do capitalismo, mas como uma nova crise, contendo uma fonte sociológica específica de um novo modelo de sociedade – a sociedade da austeridade –, é a melhor maneira de se desvelar o teor retórico utilizado pelo neoliberalismo para justificar o período reformista de que se falou acima (FERREIRA, 2016FERREIRA, António Casimiro. The politics of austerity as politics of law. Oñati Socio-Legal Series, v. 6, n. 3, p. 496-519, 2016., p. 499).

Nesta toada, tomando como plataforma o eixo crise-austeridade, António Casimiro Ferreira chega à sua terceira categoria de análise: a exceção. Ponto em que o autor, como não poderia deixar de ser, passa a dialogar com o pensamento do controverso jurista alemão Carl Schmitt, cuja reflexão antiliberal e antidemocrática está na origem da semântica da exceção. Na verdade, Ferreira apenas faz uso do legado schmittiano e do seu conceito de exceção para o estudo da atual sociedade da austeridade, na explicitação de suas regularidades e singularidades sociais8 8 É importante enfatizar, neste ponto, que o que faz António Casimiro Ferreira é retomar um elemento-chave da estrutura conceitual schmittiana – a “semântica ou linguagem da exceção” – e, a partir dela, viabilizar a compreensão da “necessidade”, outro conceito primordial que tem sido utilizado para justificar medidas excepcionais perante situações de grave crise, seja no plano político ou jurídico. Entenda-se: enquanto o jurista Carl Schmitt, em seu próprio tempo, justificava a exceção como um tipo de resposta ao que ele considerava ser a crise do Estado de direito, a crise da democracia parlamentar, a crise do direito democrático normativamente fundamentado e a crise da representação política democrática – daí porque nominamos sua reflexão de “antiliberal e antidemocrática” –, o sociólogo cuja teoria explicitamos nesta seção, em uma realidade empírica contemporânea, compreende a exceção a partir da emergência da crise financeira e dos modelos econômicos, políticos e jurídicos dela emergentes. Deste modo, António Casimiro Ferreira consegue captar tanto o movimento de legitimação do modelo político-jurídico de exceção por parte do fantasma da crise financeira, como também o processo de normalização desse mesmo modelo, já que aceite com uma baixa intensidade de contestação social. (FERREIRA, 2019a, p. 55-61). . Em suas próprias palavras:

O momento schmittiano, subjacente ao mapa teórico que utilizamos, coloca-nos perante as noções de exceção jurídica, políticas de exceção, estado de necessidade, estado de emergência, medidas de emergência, normalização da exceção, as quais remetem para uma constelação político-jurídica marcada pela suspensão de direitos, aplicação seletiva de direitos ou mesmo para um entendimento mais difuso e extralegal de uma exceção extrainstitucional cuja fonte são as formas de organização da sociedade (FERREIRA, 2019aFERREIRA, António Casimiro. Sociologia das constituições: desafio crítico ao constitucionalismo de exceção. Porto: Vida Económica, 2019a., p. 66).

Uma vez instalado o regime de exceção, as normas jurídicas, sobretudo as relacionadas às funções do Estado social e à despesa pública, são as primeiras a serem interpeladas como expediente – retórico, repita-se – para se debelar a crise. Esta é, precisamente, a linguagem do excepcionalismo austeritário: a austeridade, utilizando a noção da exceção como metodologia de implementação das reformas, a ordem político-jurídica, subvertendo os pressupostos do Estado social, e o direito, por meio de um processo de positivação, consignando os objetivos e os conteúdos austeritários (FERREIRA, 2019aFERREIRA, António Casimiro. Sociologia das constituições: desafio crítico ao constitucionalismo de exceção. Porto: Vida Económica, 2019a., p. 68-70).

No que pertine especialmente ao mundo normativo, o impacto da tríade crise-austeridade-exceção tem sido determinante para a desestabilização do direito existente, nomeadamente o referente à matéria social e laboral, e sua consequente substituição por uma nova face do direito: o chamado “direito de exceção”, assentado este na lógica do constrangimento dos princípios democráticos e do desgaste dos direitos fundamentais e das expectativas sociais que lhe são subjacentes (FERREIRA, 2019bFERREIRA, António Casimiro. Sociologia do direito: uma abordagem sociopolítica. Porto: Vida Económica, 2019b., p. 320-321). Um direito que, permitido o trocadilho, apesar de nomeado excepcional, não é, propriamente, excepcional – na acepção de provisório –, vez que se afirma como um “novo normal” – e, portanto, permanente – da vida social (FERREIRA, 2019bFERREIRA, António Casimiro. Sociologia do direito: uma abordagem sociopolítica. Porto: Vida Económica, 2019b., p. 329).

Ademais, este é um importante ponto de diferenciação entre a teoria desenvolvida por António Casimiro Ferreira e outras análises mainstream das ciências sociais que, por considerarem a crise de 2008 mera continuidade das anteriores crises do sistema capitalista mundial, tende a interpretá-la com os mesmos pressupostos de teorias tradicionais formuladas no passado. O que, no entendimento do autor, além de dificultar a leitura dos processos de decomposição e declínio do social e das sociedades, configura-se em verdadeiro obstáculo epistemológico à compreensão de como a sociedade da austeridade – o novo modelo de organização social e econômica – acaba constrangendo quadros institucionais, legais e padrões de normatividade, que passam a adquirir, a partir de então, a forma da “normalidade da exceção” (FERREIRA, 2019bFERREIRA, António Casimiro. Sociologia do direito: uma abordagem sociopolítica. Porto: Vida Económica, 2019b., p. 308-309).

É nesta formulação acerca da exceção e da normalidade imanente à sua narrativa que António Casimiro Ferreira delineia o chamado “direito do trabalho de exceção”:

A excecionalidade deste direito faz parte do processo de “austerização” suportado por uma racionalidade instrumental e de cálculo custo-benefício, a qual liquidifica e fragiliza os obstáculos colocados pelo direito até então vigente [...]. Este fenómeno é particularmente evidente na esfera laboral, onde o direito de exceção se apresenta em ruptura paradigmática com os pressupostos do direito do trabalho, eliminando o conflito enquanto elemento dinâmico das relações laborais e a proteção do trabalhador enquanto condição de liberdade. As funções protetoras do direito do trabalho são questionadas, nomeadamente, quando se altera de uma forma radical as questões relacionadas com o tempo de trabalho e descanso, se facilita o processo de despedimento e se minimiza o papel da negociação coletiva. (FERREIRA, 2011FERREIRA, António Casimiro. Sociedade da austeridade: poder, medo e direito do trabalho de exceção. Revista Crítica de Ciências Sociais, 95, p. 119-136, dez. 2011., p. 130).

No contexto específico das relações laborais, os elementos do medo da catástrofe e da inevitabilidade dos sacrifícios individuais acabam contribuindo para legitimar visões anômalas sobre a segurança e a insegurança laborais. Com o temor de vir a perder seus empregos e sendo instados a tomar as medidas de austeridade por inevitáveis, os trabalhadores se conformam, quedados em uma espécie de “submissão voluntária”, de que seria melhor sacrificar a qualidade do trabalho, sujeitando-se, por exemplo, a empregos precários, com contratos atípicos, baixos salários ou jornadas de trabalho sem descanso, a não ter emprego algum. Por um lado, a segurança laboral, antes perseguida, na austeridade, tende a ser rejeitada, “construindo-se o consenso” de que a insegurança laboral, por outro lado, seja uma variável de ajustamento para a saída da crise (FERREIRA, 2012FERREIRA, António Casimiro. Sociedade da austeridade e direito do trabalho de exceção. Porto: Vida Económica, 2012., p. 59-61).

Ora, afirmar que vivemos sob os influxos de um direito de exceção ou, mais especificamente, na demarcação que mais nos interessa neste estudo, de um direito do trabalho de exceção, é conferir condições para nos apercebermos da ruptura paradigmática de que vem padecendo o ramo juslaboral, por não mais se julgar oportuno que o mesmo se preste a tutelar o trabalhador, mas sim para deixar agir o mercado. É possibilitar, em outras palavras, a análise sociológica das consequências da transformação do estatuto do Estado, do direito e da Justiça no atual cenário de crise e austeridade.

Não por acaso o autor procedeu à aplicação desta lente específica, calcada, como dissemos, nas três categorias de interpretação do quotidiano, como chave de leitura às reformas trabalhistas ocorridas no contexto português, lá impulsionadas desde 2011 pela Troika – formada pela nebulosa Banco Central Europeu, Comissão Europeia e Fundo Monetário Internacional. Inclusive, esta é a razão para a sua tomada de posição crítica, pautada numa visão de contrariedade em relação a todo o processo político-ideológico ainda em curso de reconfiguração das forças do mundo do trabalho, e não meramente em um conservadorismo ingênuo em defesa dos direitos adquiridos dos trabalhadores. É isto o que pretendemos fazer no tópico seguinte, ao voltarmos os olhos para a reforma trabalhista ocorrida no Brasil em 2017.

4. A crise, a austeridade e a exceção como categorias de análise do direito do trabalho brasileiro pós-reforma de 2017: mediações entre o cosmopolitismo da teoria de António Casimiro Ferreira e as especificidades locais da sociedade brasileira

Exposta a teoria sociojurídica de António Casimiro Ferreira, é chegado o momento de perquirir sobre sua aplicação às transformações por que passou o direito do trabalho brasileiro desde a reforma de 2017. Tal perquirição se justifica pelo fato de a mencionada teoria ter sido concebida em um contexto de produção bastante específico e, em última instância, diverso do brasileiro. Daí porque se justificariam também certas mediações que articulem o cosmopolitismo que inegavelmente a informa com as especificidades locais observáveis na sociedade brasileira dos primeiros anos do século atual.

Mas o que estamos a referir com o termo “cosmopolitismo” acima empregado? A sua compreensão se faz a partir das críticas dirigidas pelo sociólogo alemão Ulrich Beck ao chamado “nacionalismo metodológico”. Em seu entendimento, enquanto o nacionalismo metodológico pode ser definido como uma forma restrita de observação da realidade por parte das ciências sociais, já que vincula a percepção de qualquer questão às dimensões institucionais, políticas e econômicas dos Estados nacionais – tendo sido este o paradigma dominante durante todo o século XX –, o cosmopolitismo constitui o seu movimento teórico e político contrário, com marcos e categorias cognitivas e epistemológicas muito mais amplas que os das sociedades nacionais (MACIEL, 2013MACIEL, Fabrício Barbosa. Ulrich Beck e a crítica ao nacionalismo metodológico. Política & Sociedade. Florianópolis, v. 12, n. 25, p. 85-97, set./dez. 2013., p. 85-86).

Trazendo tais definições para o âmbito da teoria sociojurídica que inspira este trabalho, um grave problema que decorreria, caso estivesse jungida ao paradigma do nacionalismo metodológico, seria a tomada das categorias da crise, austeridade e exceção como estritamente ligadas à sociedade portuguesa. Por outro lado, assumir o cosmopolitismo que a orienta é um passo decisivo para divisar tais categorias como um fenômeno transnacional, que pode impactar tanto a sociedade portuguesa desde dentro, como também qualquer outra sociedade nacional inserida na estrutura capitalista contemporânea, como a brasileira. A nosso ver, o próprio António Casimiro Ferreira, sem negar a base nacional em que organiza o conhecimento sociológico em torno das três categorias analíticas aqui mencionadas, já que vinculadas à revelação de características e funcionamentos da sociedade portuguesa, assume a impossibilidade de tematizá-la como uma realidade confinada no interior de suas fronteiras, à medida que, como vimos no item anterior, a todo momento busca compreendê-la tendo em conta os contextos europeu e mundial em que está inserida.

Olhando para a realidade da regulação do trabalho no Brasil, sobretudo a que tomou corpo com a reforma trabalhista de 2017, não podemos negar a influência, em sua concertação, de fatores globais, assentados nos interesses defendidos pelo mercado financeiro internacional num contexto mundializado de ascensão da racionalidade neoliberal. Mas, ao mesmo tempo, não podemos olvidar que esse processo também foi fruto de peculiaridades brasileiras, que têm relação com a história do país, com o grau de sua integração na divisão social do trabalho mundial e com os patamares de cidadania social particularmente conquistados. Por isso as mediações são tão necessárias tanto para que não corramos o risco de, ao postularmos a aplicação da teoria sociojurídica de António Casimiro Ferreira à sociedade brasileira, mobilizar categorias de percepção que alterem as condições de acolhimento e interpretação originais – o que é perfeitamente compreensível para leitores inseridos em um contexto sociocultural externo ao que a teoria foi produzida –, como para que não apliquemos a ela a lógica do one size fits all, como se cosmopolitismo fosse sinônimo de universalismo. Definitivamente, não é este o caso.

Na esteira dessa acuidade epistemológica, a análise das especificidades locais brasileiras deve principiar pela recuperação de alguns momentos cruciais da história recente do país9 9 Nas linhas que se seguem, com a finalidade de recuperar esses momentos cruciais da história recente do Brasil, lançaremos mão de muitos argumentos focados na questão econômica. Não aqueles ligados à ortodoxia de grande parte dos programas de investigação em Economia, mas, essencialmente, aqueles voltados a reconstruir a historicidade dos fatos econômico-sociais, algo no sentido de uma análise sociológica da economia, nos termos propostos por José Madureira Pinto (2013, p. 145-148) e pelo próprio António Casimiro Ferreira (2019b, p. 302-303). Por isso, apesar de não trabalharmos com modelagens, axiomas ou suposições econômicas, os argumentos aqui apresentados possuem sólida sustentação em base empírica, à medida que são provenientes de estudos desenvolvidos a partir da tomada de dados da realidade econômica brasileira como fontes primárias. A este respeito, conferir Carvalho (2018), Harvey (2011) e Fundação Friederich Ebert Stiftung (2016), todos devidamente referenciados nesta seção. .

Em 2008, marco inaugural da crise no mundo capitalista desenvolvido, o Brasil vivia tempos de crescimento econômico, graças a uma política fiscal expansionista iniciada em 2003 e fundada em três pilares fundamentais: a distribuição de renda na base da pirâmide social, por meio do aumento real do valor do salário mínimo e dos programas de distribuição de renda; o amplo acesso ao crédito, reunindo linhas de financiamento habitacional, rural e ao consumo; e maiores investimentos públicos em infraestrutura física, social e urbana, priorizando áreas como energia, habitação, saneamento e logística (rodovias, aeroportos, ferrovias, hidrovias e portos). Esse período coincidiu com os dois mandatos exercidos por Luiz Inácio Lula da Silva à frente da presidência da República, ao final dos quais – no ano de 2010 – puderam ser observadas a redução de diversos indicadores de desigualdade social e a expansão do nível de emprego formal, como há muito não se via na história do país. Tudo isso acompanhado de um maior crescimento do PIB, em vários de seus componentes, de menor inflação, maior dinamismo do mercado interno, dívidas pública e externa em queda e um acúmulo expressivo de reservas internacionais (CARVALHO, 2018CARVALHO, Laura. A valsa brasileira: do boom ao caos econômico. São Paulo: Todavia, 2018., p. 10-23).

Diante desse quadro, não obstante a crise econômico-financeira de 2008 tenha produzido no Brasil efeitos similares aos que atingiram outros países de economias majoritariamente exportadoras, como a queda no preço das commodities e, com a forte saída de capitais estrangeiros, a desvalorização da moeda nacional frente ao dólar (HARVEY, 2011HARVEY, David. O enigma do capital: e as crises do capitalismo. Tradução de João Alexandre Peschanski. São Paulo: Boitempo, 2011., p. 13), no segundo trimestre de 2009, a economia brasileira já havia voltado a crescer, inclusive, mantendo um crescimento superior à média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) até meados de 2011. O que, em parte, se deveu às políticas que já vinham sendo implementadas antes daquela crise e que foram mantidas, sobretudo no que tange ao aumento das transferências sociais, do salário mínimo e nos investimentos em infraestrutura, evitando, com isso, uma queda ainda maior da demanda doméstica (CARVALHO, 2018CARVALHO, Laura. A valsa brasileira: do boom ao caos econômico. São Paulo: Todavia, 2018., p. 27).

É como se aquela crise produzida pelo colapso do sistema financeiro global não fosse, propriamente, global. Ao menos, não em sua segunda onda, aquela observada na economia real dos países. Conquanto a primeira onda – a financeira – tenha chegado ao Brasil, fazendo com que a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) encerrasse 2008 em uma das maiores quedas históricas do indicador até então (LOURENÇON; CRESPO, 2008LOURENÇON, Ana Carolina; CRESPO, Sílvio. Bolsa fecha 2008 com queda de 41%, a maior desde 1972; volume financeiro é recorde. Uol Economia Cotações, 30.12.2008. Disponível em: <http//:economia.uol.com.br/cotacoes/ultnot/2008/12/30/ult1918u1604.jhtm>. Acesso em: 09 abr. 2020.), na economia real, o país fora poupado dos seus impactos, que atingiram mais seriamente EUA e países da Europa, entre eles Portugal. Quem não se recorda da expressão utilizada pelo presidente brasileiro à época, em pronunciamento televisionado à população, referindo-se à crise como uma “marolinha”? Na verdade, ele se fiava nessa percepção de que a crise não era do Brasil – era somente dos outros – e que, portanto, não desaceleraria a economia brasileira em função de suas vultosas reservas internacionais e da força de seu mercado interno (CARVALHO, 2018CARVALHO, Laura. A valsa brasileira: do boom ao caos econômico. São Paulo: Todavia, 2018., p. 27).

Seguindo o lastro histórico até aqui explorado, em 2011, teve início o primeiro mandato de Dilma Rousseff, a primeira mulher eleita Presidente da República no Brasil. A despeito de pertencer à mesma legenda partidária do presidente que lhe antecedeu e de ter subido ao poder muito graças ao capital político de Lula, que se esforçou muitíssimo em fazê-la sua sucessora, vários elementos da política econômica do período anterior foram abandonados e outros eixos passaram a nortear a nova estratégia de desenvolvimento. Em substituição ao estímulo ao mercado interno e ao consumo por meio dos pilares da distribuição de renda, acesso ao crédito e investimentos públicos, sua atuação deu lugar a um modelo de crescimento centrado no desenvolvimento industrial, com destaque para as exportações. Por conta disso, a renúncia da política fiscal antes expansionista – com crescimento, como vimos, de investimentos públicos – por uma política fiscal contracionista, com cortes de gastos e investimentos públicos, além de juros mais baixos que facilitassem a desvalorização da moeda frente ao dólar. Registre-se também a adoção de uma política de incentivos ao setor privado, via desonerações tributárias cada vez mais amplas e expansão do crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) às empresas a juros subsidiados, ou seja, viabilizada por aportes de recursos do Tesouro Nacional brasileiro (CARVALHO, 2018CARVALHO, Laura. A valsa brasileira: do boom ao caos econômico. São Paulo: Todavia, 2018., p. 43-46).

Os efeitos dessa nova estratégia não se mostraram animadores. Já que não havia expectativas de crescimento da demanda, as empresas do setor privado, apesar dos vultosos incentivos recebidos via política fiscal e creditícia, não expandiram seus investimentos como se esperava que fizessem e, por consequência, não agiram para expandir a sua capacidade produtiva. Resultantes desse quadro, ao final do primeiro mandato de Dilma Rousseff, no ano de 2014, tínhamos a desaceleração da economia – observável em todos os componentes do PIB –, a deterioração fiscal – por conta, principalmente, da queda das arrecadações tributárias e não, propriamente, da elevação dos gastos públicos –, uma inflação mais alta e uma moeda mais desvalorizada. Malgrado os níveis de desemprego, na altura, ainda se apresentassem baixos e estáveis, estavam criadas as condições para uma segunda mudança de modelo econômico, a partir do início de seu segundo mandato, em 2015 (CARVALHO, 2018CARVALHO, Laura. A valsa brasileira: do boom ao caos econômico. São Paulo: Todavia, 2018., p. 55-78).

Tendo sido reeleita por uma apertada margem dos votos válidos, Dilma Rousseff iniciou o ano de 2015 adotando a estratégia econômica que os perdedores do pleito de 2014 perfilhavam em seu programa eleitoral. Após nomear para seu Ministro da Fazenda o então Diretor Superintendente do Banco Bradesco Joaquim Levy – tido como um dos economistas mais ortodoxos do Brasil –, o governo realizou um duro ajuste fiscal e monetário, sob a justificativa de que o setor privado necessitava retomar a confiança e voltar a investir. Esta foi a gênese da implementação da austeridade econômica no Brasil, tomada à época como uma verdadeira panaceia para a estabilização da trajetória da dívida pública brasileira e para o aumento dos lucros das empresas e de sua competitividade (FUNDAÇÃO FRIEDRICH EBERT STIFTUNG, 2016, p. 8).

O resultado, no entanto, é por todos sabido: o remédio amargo da austeridade não promoveu cura alguma. Muito ao contrário. Aparentemente, produziu a progressão da doença que pretensamente buscava extinguir, gerando o aumento dívida e do déficit públicos e transformando a desaceleração em uma recessão econômica – hoje sabemos, a mais grave e duradoura de toda a história econômica do Brasil. A elevação do desemprego e a consequente perda de valor real dos salários completavam o cenário em que se deu a deposição, em 31 de agosto de 2016, da presidente democraticamente reeleita, em decorrência de um processo de impeachment iniciado alguns meses antes.

Toda essa digressão nos conduz ao momento político-econômico imediatamente anterior à promulgação da reforma trabalhista brasileira: aquele no qual, tão logo iniciada a gestão de Michel Temer à frente do Executivo federal, o discurso austeritário ganha ainda mais força, por meio da proposição e efetiva implementação do que ficou conhecido como novo regime fiscal. Para tanto, procedeu-se a uma modificação na Constituição brasileira de 1988, em seu Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) – o que se operacionalizou com a Emenda Constitucional (EC) n. 95, de 2016 –, no intuito de congelar os gastos públicos primários por 20 anos, com a possibilidade de revisão em 10 anos. Ao deixar intocados gastos ou despesas de outra natureza, na prática, a nova determinação passou a limitar, por aquele interregno de tempo e, portanto, para uma geração inteira de milhões de brasileiros já desprovidos de direitos fundamentais, investimentos estatais em saúde, educação, seguridade social e infraestrutura, restando, no entanto, plenamente permitidos os gastos mais significativos dos orçamentos públicos, quais sejam, os que envolvem pagamentos dos juros e encargos da dívida pública (LELIS, 2017LELIS, Davi Augusto Santana de. Ideologia constitucional e políticas públicas: uma crítica ao Novo Regime Fiscal. Revista de Desenvolvimento e Políticas Públicas, v. 1, n. 2, p. 143-153, 2017., p. 149-150).

É nesse contexto de transformações institucionais e legais provocadas pela crise econômica brasileira que chegamos à reforma trabalhista, promulgada, como se disse, por meio da Lei 13.467, de 2017.

Diante de tais particularidades locais da sociedade brasileira10 10 Tendo em vista o limite de páginas imposto ao presente trabalho, necessário esclarecer a nossa opção por não tecer maiores comentários sobre alguns específicos eventos ocorridos na história recente do país. Apesar de guardarem correlação com o resultado aqui explicitado, tais eventos mereceriam trabalhos próprios em que pudessem ser tratados com a profundidade que lhes é devida. Falamos aqui: a) das “Jornadas de Junho”, um movimento de contestação pública ocorrido em 2013, que poderia ser explorado em sua conexão com a vitória pírrica alcançada pela então Presidente Dilma Rousseff nas eleições do ano de 2014 ou mesmo com o processo de impeachment que levou à sua destituição; b) da chamada “Agenda FIESP”, um conjunto de perspectivas econômicas sustentadas pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo que era a base estruturante do Programa “Ponte para o Futuro”, lançado pelo partido do então vice-Presidente da República Michel Temer, e que, mais tarde, revelou-se a espinha dorsal de sua política econômica tão logo assumida a chefia do Estado brasileiro; e c) da provável ingerência direta da Confederação Nacional da Indústria (CNI) na formulação dos termos que, a partir de um certo ponto da tramitação legislativa, passaram a constar do texto do projeto de lei que resultou na Lei 13.467/2017. , impossível não se enxergar a conexão entre esta lei e a crise, ainda mais quando examinada em conjunto com a EC 95, de 2016. Tomando a crise enquanto narrativa, viabilizada para transportar emoções e impingir medos e sentimentos, entre eles a pressão e a urgência de reverter a recessão econômica em que se encontrava – e ainda se encontra – o Brasil, resta evidente que ambas as normatividades teriam papeis diferenciados, mas complementares, a desempenhar. Se, ao novo regime fiscal reservar-se-ia a tarefa de reduzir a dívida pública, à reforma trabalhista caberia à flexibilização dos entraves legais alegadamente existentes na contratação de mão-de-obra pelas empresas privadas. Ao menos era isso o que o conjunto de comentadores e opinion makers, sobretudo no campo político e no espaço da mídia, sustentavam como a única maneira para retornar a confiança do mercado, aumentar os lucros das empresas e sua competitividade e, assim, retomar o crescimento, tudo sob a aparência do mais insuspeito tecnicismo econômico.

Aliás, é na suposta neutralidade desse tecnicismo econômico que repousa o cerne do conceito de austeridade, consistente na visão de que seriam necessários sacrifícios no campo dos direitos sociais – possibilitados pela EC 95/2016 –, especialmente nos laborais – levados a cabo pela Lei 13.467/2017 –, para que a economia pudesse voltar a crescer e a recessão fosse, assim, superada.

Ao viabilizar, no entanto, uma abordagem sociológica sobre o conhecimento acerca da crise e da austeridade – território anteriormente sob o monopólio de interlocutores ditos peritos em economia –, a aplicação da teoria sociojurídica de António Casimiro Ferreira afigura-se como uma importante ferramenta para desvelar o teor retórico desse discurso economicista. Graças a ela, conseguimos perceber que o controle da dívida pública leva, tão-somente, à diminuição do Estado, mas apenas pelo lado dos gastos públicos, que, com isso, deixam de ser voltados à concretização dos direitos fundamentais sociais. O mesmo Estado que, relembre-se, é mantido máximo pelo lado do pagamento dos juros da dívida aos bancos e ao setor financeiro privado como um todo. Ora, sabendo que podem contar com a remuneração garantida dos títulos da dívida, é comum os bancos passarem a conceder empréstimos a taxas altíssimas, afetando, por conseguinte, todos os setores da economia real que dependem de crédito. O que nos leva ao verdadeiro motor – já que propositalmente opaco – da reforma trabalhista: em um contexto de falta de demanda decorrente de um mercado interno desaquecido, ela nunca poderia resultar em um aumento da produtividade e competitividade das empresas, servindo meramente, isto sim, para tornar o mercado de trabalho brasileiro mais atrativo ao grande capital e, portanto, mais adequado às normas de reprodução do capitalismo globalizado e financeirizado.

É por isso que, além de alinhada à crise e à austeridade, a reforma trabalhista de 2017 também pode ser compreendida como uma espécie de normatividade de exceção, sendo ela fruto de um excepcionalismo que, por mais paradoxal que possa parecer, aposta na juridificação, positivação e mobilização do direito para desestabilizar o próprio direito e, assim, às custas do enfraquecimento dos direitos fundamentais sociais, transformar em poder político os interesses especulativos dos mercados financeiros. Dito de outro modo, perante a tensão entre os direitos fundamentais sociais e os mercados financeiros, o direito de exceção austeritário deliberadamente opta pelos últimos. A isto nos referimos quando, na seção introdutória deste estudo, aludimos à ruptura paradigmática do direito do trabalho dela emergente.

É como se, conforme bem menciona João Leal Amado, houvesse uma mudança no “código genético” no direito do trabalho. De início, “[...] um direito cuja função originária consistia em limitar a concorrência entre os trabalhadores no mercado de trabalho, evitando uma ‘corrida para o fundo’, uma race to the bottom por parte destes [...]”. E, em um momento posterior, ele se subverte em um “[...] ‘novo’ e ‘reformado’ Direito do Trabalho [...]”, chancelador do “[...] chamado ‘mercado dos produtos legislativos’, colocando os ordenamentos jurídico-laborais nacionais em concorrência feroz, sob a égide dos mercados financeiros – corrida à desregulamentação social, race to the bottom [...]”, só que, agora, em ordem a tentar acalmar os mercados, atrair os clientes e cativar os investidores (AMADO, 2013AMADO, João Leal. O direito do trabalho, a crise e a crise do direito do trabalho. Revista Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 4, n. 8, p. 163-186, jul./dez. 2013., p. 164/169-170). Temos aí a negação das funções antropológicas e sociológicas que o ramo juslaboral sempre desempenhou e a consequente eliminação de sua própria identidade jurídico-política.

Note o leitor, neste ponto, que não nos ressentimos das mudanças legislativas empreendidas no direito do trabalho brasileiro simplesmente porque não nos agradamos delas. De fato, elas não nos agradaram, mas não por mero conservadorismo ingênuo em defesa dos direitos adquiridos dos trabalhadores. O nosso entendimento é que tais mudanças, assim como as que atingiram o direito do trabalho no mundo europeu e português – analisadas naqueles contextos, como dissemos, por António Casimiro Ferreira –, possivelmente não são as respostas mais adequadas às mudanças objetivas nas práticas de trabalho decorrentes das novas tecnologias. Dito de outro modo, sabemos que o mundo do trabalho está a mudar – isto é óbvio – e sabemos que a regulação das relações trabalhistas deve tentar acompanhar tais mudanças; só não acreditamos no sucesso das reformas legislativas impostas no Brasil e na maior parte dos países europeus, limitadas que estão em depreciar as condições de vida e de trabalho digno, fundadas na falaciosa suposição de que a legislação trabalhista constituiria o principal obstáculo à empregabilidade e à competitividade das empresas. Falácia esta que, no Brasil, antes de ser empregada de modo a validar a promulgação da Lei 13.467/2017, há tempos vinha justificando a contratação de trabalhadores fora da rede de proteção dos direitos trabalhistas, seja por meio das práticas de “pejotização”, contratação de falsos trabalhadores autônomos e toda sorte de atos perpetrados com o único fim de desvirtuar, impedir ou fraudar os preceitos voltados à tutela dos trabalhadores11 11 Ainda não há respostas definitivas acerca de quais mecanismos devam ser gestados para que o direito do trabalho permaneça como estrutura de proteção ao trabalhador e ao trabalho no cenário das mudanças socioeconômicas da contemporaneidade. Aliás, nunca foi objeto deste breve texto buscá-las. No entanto, pensamos que o presente trabalho possa ter sido, isto sim, um importante e necessário passo anterior a isso. Afinal, buscar reinventar as proteções trabalhistas para o atual contexto, antes de qualquer coisa, demanda que nos apercebamos dos discursos falaciosos em que se fundamentou a Lei 13.467/2017 para, assim, nos darmos conta da inadequação das medidas por ela trazidas. Esperamos que este tenha sido o contributo desta investigação. .

O importante, neste ínterim, é compreender – e nisso subjaz a teoria sociojurídica de António Casimiro Ferreira – que os sacrifícios infligidos ao social não o são como parte de uma conjuntura desfavorável. São um projeto. Um projeto de refundação do Estado em bases mais caras à austeridade – a forma musculada do neoliberalismo – e à prevalência dos mercados financeiros. Daí o direito de exceção surgir como algo incontornável e inevitável, o “novo normal” dos padrões sociopolíticos, já que ele é o mecanismo pelo qual tudo isso se legitima.

O efeito perverso disso, observado no plano macrossociológico, é a aceitação e o conformismo acríticos, que se abalam sobre os indivíduos, as famílias e a sociedade como um todo e os levam a pensar que não haveria mesmo como o direito do trabalho continuar protegendo o trabalhador, como se tal proteção pudesse realmente impedir as empresas de contratar e o capitalismo produtivo de crescer. Apesar de ser exatamente o que a lógica neoliberal austeritária deseja infundir, tudo sob a aparência da naturalidade e neutralidade da técnica, a história recente do país – discutida linhas atrás – é o demonstrativo de que, num cenário de economia em alta, isso não resta verdadeiro. Ao mesmo tempo, tendo em conta o incontestável crescimento econômico alcançado pelo Brasil nos anos de 2003-2010, ela é a prova de que recessão se combate com crescimento nos investimentos públicos, centrados estes fundamentalmente em direitos sociais, e não com ajuste fiscal.

5. Considerações finais: reflexões sobre o porvir

Diante de todas as reflexões lançadas é possível concluir que a teoria sociojurídica de António Casimiro Ferreira é plenamente aplicável como lente de análise da reforma trabalhista brasileira de 2017. Como se verificou no item anterior, levando em consideração as especificidades locais existentes, percebemos como a crise, a austeridade e a exceção – tomadas estas como as categorias analíticas da mencionada teoria – foram capazes de impactar, desde dentro, a sociedade brasileira das primeiras décadas deste século. Por isso, podemos enxergar o novo direito do trabalho brasileiro como uma medida que, por mais que justificada pela necessidade de solução da crise econômica, encontra-se fundada na lógica da austeridade, utilizando-se da noção de exceção como metodologia para subverter os pressupostos do Estado social. É assim que devemos compreender a ruptura paradigmática nele ocorrida.

Como também pudemos observar, tal fenômeno não é exclusivo do Brasil. Ele, seguramente, pode ser lido como atinente a outros países do capitalismo financeirizado. Não podemos esquecer que a própria teorização perspectivada neste estudo foi aplicada para analisar a mesma ruptura, só que sucedida no direito do trabalho português. Um fenômeno que, lá como aqui, apesar do termo que lhe é designativo – exceção –, não se postula como excepcional ou transitório, mas sim duradouro, tanto que referido como “novo normal” na regulação das relações de trabalho.

Uma questão que se coloca, neste ponto, é saber se, no Brasil, ele se manterá assim – como o “novo normal” – daqui para frente. Embora não tenhamos a pretensão de incursionar por nenhum exercício de futurologia, já há sinais a indicar que a reforma trabalhista de 2017 pode não ter sido o fim desse caminho.

O primeiro desses sinais é o grupo de atos normativos editados pelo governo que se seguiu ao que produziu a reforma trabalhista. Desde que Jair Bolsonaro passou a ocupar o cargo de presidente da República, após as eleições de 2018, a regulação trabalhista tem seguido a tendência da exceção austeritária, pendendo muito mais para os mercados financeiros e quase nada – ou nada – para a garantia de patamares mínimos civilizacionais aos trabalhadores. Basta uma vista d’olhos sobre suas três Medidas Provisórias (MP) relacionadas com a seara trabalhista, todas exaradas ao longo de seu primeiro ano de mandato: a) a MP 873, de 01.03.2019, que dispunha sobre a contribuição sindical (BRASIL, 2019a); b) a MP 881, de 30.04.2019, que instituiu o que denominou de “direitos de liberdade econômica” e “garantias de livre mercado” (BRASIL, 2019b); e c) a MP 905, de 11.11.2019, com o objetivo de instituir o chamado “contrato verde e amarelo” e continuar alterando a legislação trabalhista (BRASIL, 2019c). Ainda que a primeira delas tenha caducado, por não ter sido discutida até o final de seu prazo de vigência, e a terceira tenha sido revogada no último dia de sua vigência, pela MP 955, de 20 de abril de 2020 (BRASIL, 2020d), justamente para evitar os efeitos da caducidade, a segunda convolou-se na Lei 13.784, de 2019 e passou a produzir efeitos por tempo indeterminado (BRASIL, 2020a).

Tendência esta aparentemente não abandonada, nem mesmo quando do início do Estado de Calamidade Pública, instaurado em 20.03.2020, por meio do Decreto Legislativo 6/2020, em função da emergência de saúde pública internacional decorrente do novo Coronavírus. Este é o segundo sinal. Em um momento em que o mundo, em sua esmagadora maioria, começa a encarar o sentimento de solidariedade como o mais eficaz remédio para os males sociais e, concomitantemente, se aperceber que a lógica neoliberal não faz sentido algum e a divisar o Estado social, e não o mercado, como a única instituição capaz de lidar com situações extremas como essa pandemia, o Brasil, em sentido completamente oposto, edita mais duas Medidas Provisórias, em grande medida, desfavoráveis aos interesses dos trabalhadores.

Falamos aqui: a) da MP 927, de 22.03.2020, que, entre outras providências, permitiu o acordo individual firmado com o empregador sobre direitos cruciais dos trabalhadores, como a negociação de banco de horas pelo prazo de compensação de 18 meses, o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e a antecipação de férias só que desacompanhadas da correspondente remuneração e do terço constitucional de férias, cujos pagamentos também serão diferidos (BRASIL, 2020b); e b) da MP 936, de 01.04.2020, que a despeito de instituir um “Programa Emergencial de Manutenção de Emprego e da Renda”, garantindo um benefício emergencial a ser pago aos trabalhadores que tenham reduzidos jornada de trabalho e salários, ou daqueles que tenham seus contratos de trabalho suspensos temporariamente, ventila a possibilidade dessa redução proporcional ou suspensão serem pactuadas por meio de acordo individual com o empregador (BRASIL, 2020c). Novamente o acordo individual, sendo tomado como meio de pactuação prevalente sobre as leis e as negociações coletivas.

Pode até ser que ambas as Medidas Provisórias tenham seus dispositivos revistos ou mesmo desaprovados pelo Congresso Nacional, a quem cabe, agora, realizar a discussão sobre a sua transformação em lei ou não (BRASIL, 2020a). Somente o tempo dirá. Ainda assim, como as medidas chegaram a ser editadas e têm a capacidade de produzir efeitos jurídicos desde então, não podemos ignorar a atuação do Estado brasileiro na contramão de quase todos os outros países que têm se preocupado muito mais em preservar empregos e garantir a sobrevivência das pessoas e famílias durante essa nova crise que está a assolar o mundo neste instante.

De toda a sorte, em função de não dispormos, na presente altura, do distanciamento temporal necessário que nos permita discernir e adequadamente interpretar as dinâmicas sociais imbricadas nessa nova crise, ainda não temos condições de saber se a exceção austeritária se manterá por mais algum tempo como ideologia fundante do direito do trabalho brasileiro. Os sinais sugerem que sim. Não podemos desconsiderá-los. Mas, isso é assunto para outros trabalhos. Queremos crer que os construtos deste escrito possam eventualmente figurar, no futuro, como o chão teórico e analítico para o aprofundamento destes e de outros temas que ainda restam se consolidar na sociedade brasileira.

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    Dada a composição bicameral do Legislativo federal brasileiro e o fato de a proposição da reforma ter partido do Poder Executivo federal, a Casa iniciadora do processo legislativo foi a Câmara dos Deputados, cabendo ao Senado Federal o papel de Casa revisora. Na primeira fase do processo legislativo, na Câmara, portanto, o projeto foi nomeado Projeto de Lei (PL) 6.787/2016, e tramitou de 23.12.2016 até 28.04.2017. Sendo, após, remetido ao Senado para o início da segunda fase do mesmo processo legislativo, sendo lá renomeado como Projeto de Lei da Câmara (PLC) 38/2017, onde permaneceu até a sua convolação em lei, ocorrida em, conforme dissemos em 13.07.2017 (BRASIL, 2016; 2017b). No total, contabilizam-se precisos 126 dias para aprovação na Câmara dos Deputados e outros ainda mais exíguos 76 dias, no Senado Federal.
  • 3
    Para se ter uma ideia, apenas em relação à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a lei de que emergiu a reforma trabalhista de 2017, ao fim e ao cabo de todo o seu trâmite legislativo, acabou por modificar 33 dispositivos de direito do trabalho (entre dispositivos de direito individual e coletivo do trabalho), 21, de direito processual do trabalho, além de inserir na CLT 32 novos dispositivos de direito material e 11, de direito processual. Com tais 97 pontos de mudança, a Lei 13.467/2017, a partir de sua entrada em vigor, passou a ser responsável pela redação de pouco mais de 10% dos dispositivos da CLT – que já contava à época com seus 922 artigos (BRASIL 2017a).
  • 4
    Embora este artigo, por razões a serem expostas no item seguinte, não vá se dedicar a analise de cada um dos novos dispositivos introduzidos na CLT pela Lei 13.467/2017, cabe, neste ponto, nem que a título apenas ilustrativo, especificar aqueles que, a nosso ver: a) subtraíram direitos trabalhistas: arts. 58, §2º; 62, III; e 71, §4º; b) retiraram o efeito pansalarial de verbas retributivas: art. 457, §§1º e 2º; c) introduziram condições e formas de contratação mais precarizadas: arts. 58-A; 134, §1º; e 443, §3º; d) fragilizaram a estrutura institucional de entidades sindicais: art. 578; e) esmaeceram a importância e o papel das negociações coletivas: art. 59, §§5º e 6º; e f) dificultaram a judicialização de conflitos na Justiça do Trabalho: arts. 844, §§2º e 3º; e 790-B (BRASIL, 2017a).
  • 5
    Em geral, os sociólogos do direito referem-se de maneira indistinta a tais expressões designativas ao campo. O próprio António Casimiro Ferreira (2019b)FERREIRA, António Casimiro. Sociologia do direito: uma abordagem sociopolítica. Porto: Vida Económica, 2019b., autor da teoria sociojurídica aqui perspectivada, assim o entende. Nós, inclusive, somente recorremos à utilização deliberada de expressões como “sociologia jurídica”, “sociologia do direito dos juristas” e “sociologia do direito dos sociólogos” com o único fim de demarcar a epistemologia que orienta o presente estudo.
  • 6
    Falamos em programa de investigação porque o pensamento do autor sobre aquelas categorias perpassa uma diversidade de abordagens do social e se espraiam em construtos teóricos próprios da ciência política, da sociologia política e da sociologia do direito. É precisamente neste ponto que operamos o critério de seleção e recorte das dimensões teórico-conceituais dos trabalhos aqui analisados, à medida que nos interessam as leituras afeitas ao último campo, máxime as voltadas às alterações produzidas na esfera laboral e dos seus direitos – objeto central deste estudo.
  • 7
    Sobre a evidência da naturalização do pensamento reformista, é importante notar que António Casimiro Ferreira chega a tal conclusão a partir do estudo, por um lado, das regularidades sociais e, por outro, dos casos singulares de cada uma das crises ocorridas desde os anos 1970 – o que constitui, por assim dizer, o ofício de qualquer sociólogo que, como ele, trabalhe sob as perspectivas teóricas de Émile Durkheim e do tipo ideal de Max Weber. A este respeito, conferir Durkheim (2011)DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. Tradução de Eduardo Lúcio Nogueira. 11.ed. Lisboa: Presença, 2011. e Weber (2009)WEBER, Max. Conceitos sociológicos fundamentais. Tradução de Artur Morão. Lisboa: Edições 70, 2009.. Isso quer dizer que, apesar de reconhecer que cada processo de crise tem características próprias, deflagrando, cada um deles, mudanças específicas nos padrões societais, o estudo das dinâmicas político-jurídicas desenvolvidas ao longo de cada período histórico o levou a identificar a recorrência da ideia reformista para a solução das diversas crises.
  • 8
    É importante enfatizar, neste ponto, que o que faz António Casimiro Ferreira é retomar um elemento-chave da estrutura conceitual schmittiana – a “semântica ou linguagem da exceção” – e, a partir dela, viabilizar a compreensão da “necessidade”, outro conceito primordial que tem sido utilizado para justificar medidas excepcionais perante situações de grave crise, seja no plano político ou jurídico. Entenda-se: enquanto o jurista Carl Schmitt, em seu próprio tempo, justificava a exceção como um tipo de resposta ao que ele considerava ser a crise do Estado de direito, a crise da democracia parlamentar, a crise do direito democrático normativamente fundamentado e a crise da representação política democrática – daí porque nominamos sua reflexão de “antiliberal e antidemocrática” –, o sociólogo cuja teoria explicitamos nesta seção, em uma realidade empírica contemporânea, compreende a exceção a partir da emergência da crise financeira e dos modelos econômicos, políticos e jurídicos dela emergentes. Deste modo, António Casimiro Ferreira consegue captar tanto o movimento de legitimação do modelo político-jurídico de exceção por parte do fantasma da crise financeira, como também o processo de normalização desse mesmo modelo, já que aceite com uma baixa intensidade de contestação social. (FERREIRA, 2019aFERREIRA, António Casimiro. Sociologia das constituições: desafio crítico ao constitucionalismo de exceção. Porto: Vida Económica, 2019a., p. 55-61).
  • 9
    Nas linhas que se seguem, com a finalidade de recuperar esses momentos cruciais da história recente do Brasil, lançaremos mão de muitos argumentos focados na questão econômica. Não aqueles ligados à ortodoxia de grande parte dos programas de investigação em Economia, mas, essencialmente, aqueles voltados a reconstruir a historicidade dos fatos econômico-sociais, algo no sentido de uma análise sociológica da economia, nos termos propostos por José Madureira Pinto (2013PINTO, José Madureira. A sociologia perante a crise: quatro ideias para um debate. Revista de Estudos Sociais, Cuiabá, n. 19, p. 141-152, 2013., p. 145-148) e pelo próprio António Casimiro Ferreira (2019bFERREIRA, António Casimiro. Sociologia do direito: uma abordagem sociopolítica. Porto: Vida Económica, 2019b., p. 302-303). Por isso, apesar de não trabalharmos com modelagens, axiomas ou suposições econômicas, os argumentos aqui apresentados possuem sólida sustentação em base empírica, à medida que são provenientes de estudos desenvolvidos a partir da tomada de dados da realidade econômica brasileira como fontes primárias. A este respeito, conferir Carvalho (2018)CARVALHO, Laura. A valsa brasileira: do boom ao caos econômico. São Paulo: Todavia, 2018., Harvey (2011)HARVEY, David. O enigma do capital: e as crises do capitalismo. Tradução de João Alexandre Peschanski. São Paulo: Boitempo, 2011. e Fundação Friederich Ebert Stiftung (2016), todos devidamente referenciados nesta seção.
  • 10
    Tendo em vista o limite de páginas imposto ao presente trabalho, necessário esclarecer a nossa opção por não tecer maiores comentários sobre alguns específicos eventos ocorridos na história recente do país. Apesar de guardarem correlação com o resultado aqui explicitado, tais eventos mereceriam trabalhos próprios em que pudessem ser tratados com a profundidade que lhes é devida. Falamos aqui: a) das “Jornadas de Junho”, um movimento de contestação pública ocorrido em 2013, que poderia ser explorado em sua conexão com a vitória pírrica alcançada pela então Presidente Dilma Rousseff nas eleições do ano de 2014 ou mesmo com o processo de impeachment que levou à sua destituição; b) da chamada “Agenda FIESP”, um conjunto de perspectivas econômicas sustentadas pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo que era a base estruturante do Programa “Ponte para o Futuro”, lançado pelo partido do então vice-Presidente da República Michel Temer, e que, mais tarde, revelou-se a espinha dorsal de sua política econômica tão logo assumida a chefia do Estado brasileiro; e c) da provável ingerência direta da Confederação Nacional da Indústria (CNI) na formulação dos termos que, a partir de um certo ponto da tramitação legislativa, passaram a constar do texto do projeto de lei que resultou na Lei 13.467/2017.
  • 11
    Ainda não há respostas definitivas acerca de quais mecanismos devam ser gestados para que o direito do trabalho permaneça como estrutura de proteção ao trabalhador e ao trabalho no cenário das mudanças socioeconômicas da contemporaneidade. Aliás, nunca foi objeto deste breve texto buscá-las. No entanto, pensamos que o presente trabalho possa ter sido, isto sim, um importante e necessário passo anterior a isso. Afinal, buscar reinventar as proteções trabalhistas para o atual contexto, antes de qualquer coisa, demanda que nos apercebamos dos discursos falaciosos em que se fundamentou a Lei 13.467/2017 para, assim, nos darmos conta da inadequação das medidas por ela trazidas. Esperamos que este tenha sido o contributo desta investigação.

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  • 1
    Este trabalho corresponde a parte dos resultados da investigação de pós-doutoramento conduzida junto ao Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra - Portugal, sob supervisão do Professor Doutor António Casimiro Ferreira.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Jun 2021
    • Data do Fascículo
      Apr-Jun 2021

    Histórico

    • Recebido
      17 Abr 2020
    • Aceito
      12 Jul 2020
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