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Infestação do Estado de São Paulo por Aedes aegypti e Aedes albopictus

Infestation of S. Paulo State, Brazil, by Aedes aegypti and Aedes albopictus

Resumos

OBJETIVO: Estudar a influência da distância entre áreas infestadas e não infestadas na expansão geográfica das populações de Aedes aegypti e de Aedes albopictus no Estado de São Paulo e os padrões regionais observados, considerando os determinantes relacionados com a ocupação do solo. MÉTODOS: Foram utilizadas informações sobre ocorrência de focos de Ae. aegypti e de Ae. albopictus em municípios do Estado de São Paulo, a cada ano, e sobre a infestação em municípios deste e de Estados vizinhos, ao final de cada ano, de 1985 a 1995. Foram definidos quatro indicadores para a análise do processo de infestação. RESULTADOS/CONCLUSÕES: A análise realizada indicou influência dos Estados do Mato Grosso do Sul e do Paraná no início da infestação do Estado de São Paulo por Ae. aegypti e do Rio de Janeiro e de Minas Gerais por Ae. albopictus. Dentre os municípios com ocorrência de focos dessas espécies, o estabelecimento das mesmas foi mais freqüente naqueles mais próximos de áreas infestadas. Dos municípios em que se verificou o estabelecimento de Ae. aegypti ou de Ae. Albopictus, 75% distavam até 34 km e 60 km, respectivamente, do município infestado mais próximo. Pela análise da velocidade de expansão geográfica de Ae. aegypti, identificaram-se três grandes áreas, com padrões diferentes, observando-se o contrário do esperado: a área com maior densidade demográfica (leste do Estado) foi aquela em que se observou a menor rapidez de expansão geográfica da espécie, indicando a existência de outros fatores com influência preponderante nos padrões macrorregionais. Para Ae. albopictus não ficou evidenciada qualquer relação entre seu padrão de expansão geográfica e a densidade demográfica das regiões.

Aedes; Distribuição espacial; Ecologia de vetores; Aedes aegypti; Aedes albapictus


OBJECTIVE: To study the influence of the distance between infested and non-infested areas in the geographical spread of Aedes aegypti and Aedes albopictuspopulations in the state of S. Paulo. Regional patterns were also studied, considering the determinants related to soil occupation. METHODS: Information related to the counties in the state of S. Paulo where were concentrations of Ae. aegypti and Ae. albopictus and counties infested up to the end of each year (1985 to 1995), both in the state of S. Paulo and in the neighboring states, were used. Four indicators were defined to analyze the infestation process. RESULTS/CONCLUSIONS: The analysis indicated the contribution of the states of Mato Grosso do Sul and Paraná for the initial Ae. aegypti infestation in the state of S. Paulo and Ae. albopictus infestation in the states of Rio de Janeiro and Minas Gerais. In the counties where there was a concentration of these species, their establishment was more frequent among those closer to the infested area. Seventy-five percent of the counties where there were established populations of Ae. aegypti and Ae. albopictus were situated up to 34 km and 60 km, respectively, from the nearest infested county. The analysis of the geographical spread rate of the Ae. aegypti revealed three different large areas with unexpected patterns: the area with greater demographic population density (east of the state) had the lower rate of geographical mosquito spread, indicating the existence of other factors with preponderant influence on the macro-regional patterns. For Ae. albopictus, there was no evidence of a relationship between their geographical spread patterns and the demographic population density.

Aedes; Residence characteristics; Ecology, vectors; Aedes aegypti; Aedes albopictus


Infestação do Estado de São Paulo por Aedes aegypti e Aedes albopictus* * Baseado na dissertação de mestrado apresentada à Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, 1997.

Infestation of S. Paulo State, Brazil, by Aedes aegypti and Aedes albopictus

Carmen Moreno Glassera e Almério de Castro Gomesb

aSuperintendência de Controle de Endemias. São Paulo, SP, Brasil. bDepartamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. São Paulo, SP, Brasil

DESCRITORES
Aedes#. Distribuição espacial#. Ecologia de vetores. ¾ Aedes aegypti. Aedes albapictus. RESUMO

OBJETIVO:

Estudar a influência da distância entre áreas infestadas e não infestadas na expansão geográfica das populações de Aedes aegypti e de Aedes albopictus no Estado de São Paulo e os padrões regionais observados, considerando os determinantes relacionados com a ocupação do solo.

MÉTODOS:

Foram utilizadas informações sobre ocorrência de focos de Ae. aegypti e de Ae. albopictus em municípios do Estado de São Paulo, a cada ano, e sobre a infestação em municípios deste e de Estados vizinhos, ao final de cada ano, de 1985 a 1995. Foram definidos quatro indicadores para a análise do processo de infestação.

RESULTADOS/CONCLUSÕES:

A análise realizada indicou influência dos Estados do Mato Grosso do Sul e do Paraná no início da infestação do Estado de São Paulo por Ae. aegypti e do Rio de Janeiro e de Minas Gerais por Ae. albopictus. Dentre os municípios com ocorrência de focos dessas espécies, o estabelecimento das mesmas foi mais freqüente naqueles mais próximos de áreas infestadas. Dos municípios em que se verificou o estabelecimento de Ae. aegypti ou de Ae. Albopictus, 75% distavam até 34 km e 60 km, respectivamente, do município infestado mais próximo. Pela análise da velocidade de expansão geográfica de Ae. aegypti, identificaram-se três grandes áreas, com padrões diferentes, observando-se o contrário do esperado: a área com maior densidade demográfica (leste do Estado) foi aquela em que se observou a menor rapidez de expansão geográfica da espécie, indicando a existência de outros fatores com influência preponderante nos padrões macrorregionais. Para Ae. albopictus não ficou evidenciada qualquer relação entre seu padrão de expansão geográfica e a densidade demográfica das regiões.

KEYWORDS
Aedes#. Residence characteristics#. Ecology, vectors. ¾ Aedes aegypti. Aedes albopictus . ABSTRACT

OBJECTIVE:

To study the influence of the distance between infested and non-infested areas in the geographical spread of Aedes aegypti and Aedes albopictuspopulations in the state of S. Paulo. Regional patterns were also studied, considering the determinants related to soil occupation.

METHODS :

Information related to the counties in the state of S. Paulo where were concentrations of Ae. aegypti and Ae. albopictus and counties infested up to the end of each year (1985 to 1995), both in the state of S. Paulo and in the neighboring states, were used. Four indicators were defined to analyze the infestation process.

RESULTS/CONCLUSIONS :

The analysis indicated the contribution of the states of Mato Grosso do Sul and Paraná for the initial Ae. aegypti infestation in the state of S. Paulo and Ae. albopictus infestation in the states of Rio de Janeiro and Minas Gerais. In the counties where there was a concentration of these species, their establishment was more frequent among those closer to the infested area. Seventy-five percent of the counties where there were established populations of Ae. aegypti and Ae. albopictus were situated up to 34 km and 60 km, respectively, from the nearest infested county. The analysis of the geographical spread rate of the Ae. aegypti revealed three different large areas with unexpected patterns: the area with greater demographic population density (east of the state) had the lower rate of geographical mosquito spread, indicating the existence of other factors with preponderant influence on the macro-regional patterns. For Ae. albopictus, there was no evidence of a relationship between their geographical spread patterns and the demographic population density.

INTRODUÇÃO

A infestação do Estado de São Paulo por Aedes aegypti e Aedes Albopictus teve início na década de 80 e, em 1995, dos 626 municípios paulistas, 415 estavam infestados por Ae. aegypti e 450 por Ae. albopictus, sendo que, em 267 municípios, ambas as espécies estavam presentes.

Até 1984, o Ministério da Saúde foi o único responsável pelo controle de Ae. aegypti no Estado de São Paulo. Desenvolvia regularmente atividades em portos e aeroportos internacionais, onde, já no início dos anos 80, foram detectados e eliminados focos, além de realizar esporadicamente atividades em outras áreas do Estado. Em abril de 1985, a Superintendência de Controle de Endemias (Sucen), da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, iniciou seus trabalhos, mantendo regularidade na vigilância de Ae. aegypti da totalidade dos municípios. Desde então, vêm sendo desenvolvidas ações de controle vetorial pela Sucen em conjunto com as prefeituras municipais do Estado.

Embora os mecanismos de dispersão passiva de Ae. aegypti e de Ae. albopictus sejam conhecidos, é importante que se estude a influência de diversos fatores na expansão geográfica de suas populações, para subsidiar a formulação de estratégias de vigilância entomológica. O presente trabalho tem por objetivo estudar a influência da distância entre áreas infestadas e não infestadas no processo de expansão geográfica das populações desses culicídeos no Estado de São Paulo, bem como, os padrões de expansão observados nas regiões paulistas diferenciadas quanto à ocupação de solo, aspecto importante para a dispersão e o estabelecimento dessas espécies, tendo em vista sua elevada sinantropia.7-9

MÉTODOS

Realizou-se estudo descritivo da infestação do Estado de São Paulo por Ae. aegypti e por Ae. albopictus, no período de 1985 a 1995. Utilizou-se, como unidade geográfica, o município (exceto para São Paulo, onde a unidade correspondeu a cada uma das dez administrações regionais de saúde) e, como unidade temporal, o ano. As fontes de informações foram: Sucen ¾ municípios com ocorrência de focos e municípios infestados (1985 a 1995); Fundação Nacional de Saúde ¾ municípios infestados dos Estados mais próximos a São Paulo (Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Goiás, Paraná ¾ 1984 a 1994 ¾ e Minas Gerais ¾ 1986 a 1994); e publicações do Governo do Estado de São Paulo sobre a ocupação do solo e a produção econômica das regiões paulistas.1-3,7,11

A expansão geográfica de cada espécie foi conceituada como a área em que a mesma se estabeleceu a cada ano. Considerou-se que a espécie se estabeleceu num município quando, após detecção, delimitação e controle de foco, a vigilância efetuada no local continua a registrar a presença da espécie. Denomina-se foco o encontro da espécie por qualquer atividade em municípios anteriormente livres desta. Um município deixou de estar infestado quando, durante 12 meses, a espécie antes presente não foi detectada por qualquer atividade.

Realizou-se o mapeamento, ano a ano, para cada espécie, sobre ocorrência de focos em municípios do Estado de São Paulo e infestação em municípios deste Estado e daqueles vizinhos, sendo criados quatro indicadores e implantado um banco de dados com as informações necessárias:

• indicador distância-foco: distância** ** Menor distância por via rodoviária entre sedes municipais. dos municípios com ocorrência de focos da espécie, mas sem seu estabelecimento em relação à área infestada até o final do ano anterior, no Estado de São Paulo e Estados vizinhos;

• indicador distância-infestação: distância** ** Menor distância por via rodoviária entre sedes municipais. dos municípios com ocorrência de focos da espécie e com seu estabelecimento em relação à área infestada até o final do ano anterior, no Estado de São Paulo e Estados vizinhos;

• indicador infestação: percentagem de municípios que se infestaram em relação aos que apresentaram focos;

• indicador velocidade: número de anos decorridos para infestar 10%, 50%, 75% e 90% dos municípios, após estabelecimento da espécie em cada região de estudo.

Em 1985, a Sucen iniciou a vigilância de Ae. aegypti, por meio de levantamento centrado na pesquisa larvária de imóveis que favorecem sua dispersão passiva (imóveis que contêm grandes quantidades de recipientes ao relento e promovem seu intercâmbio com fins comerciais), detectando focos de Ae. aegypti em 30 municípios, localizados em sua maioria a Oeste do Estado. Essa situação encontrada e a ausência de informações sobre a infestação do oeste paulista, em 1984, não permitiram configurar, em 1985, o início do estabelecimento de populações de Ae. aegypti, sendo esse ano excluído de várias análises.

Para delimitar as regiões utilizadas no presente estudo, partiu-se das 43 regiões de governo ¾ RG do Estado, por se tratar de microrregiões sobre as quais estão disponíveis informações da produção econômica e da ocupação do solo, permitindo, em seguida, o agrupamento daquelas contíguas e com características semelhantes, obtendo-se as 13 regiões do estudo:

• Região 1 ¾ RG Metropolitana de São Paulo;

• Região 2 ¾ RG Santos;

• Região 3 ¾ RG Registro e Itapeva;

• Região 4 ¾ RG Sorocaba, Itapetininga, Botucatu e Avaré;

• Região 5 ¾ RG São José dos Campos, Taubaté, Guaratinguetá, Cruzeiro e Caraguatatuba;

• Região 6 ¾ RG Campinas, Jundiaí, Bragança Paulista, Piracicaba, Limeira, Rio Claro, São João da Boa Vista;

• Região 7 ¾ RG Ribeirão Preto, Araraquara e São Carlos;

• Região 8 ¾ RG Franca, São Joaquim da Barra e Barretos;

• Região 9 ¾ RG São José do Rio Preto, Catanduva, Votuporanga, Fernandópolis e Jales;

• Região 10 ¾ RG Araçatuba e Andradina;

• Região 11 ¾ RG Presidente Prudente e Dracena;

• Região 12 ¾ RG Marília, Tupã, Adamantina, Assis e Ourinhos;

• Região 13 ¾ RG Bauru, Lins e Jaú.

A densidade demográfica foi, dentre os aspectos relacionados à ocupação do solo, aquele que apresentou a maior variação: nas regiões 1, 2, 6 e 5 as taxas foram, respectivamente, de 1.915, 514, 163 e 101 habitantes/km2; nas regiões 4 e 7 a 13, variaram de 96 a 31 habitantes/km2; e, na região 3, foi da ordem de 20 habitantes/km2. As taxas de urbanização foram da ordem de 80% a 90% nas regiões 4 a 13, próximas a 100% na 1 e 2, e da ordem de 60% na 3. Nas regiões 1 e 2 observou-se intensa degradação urbana, apresentando as piores condições de saneamento do Estado e os maiores contingentes populacionais em assentamentos do tipo favela.1-3,7,11 Verificou-se também que quanto maior a densidade demográfica, maior a produção econômica,1,7 o que a torna vulnerável à introdução dos culicídeos em estudo por meio do fluxo de intercâmbio econômico.

RESULTADOS

Análise da expansão geográfica da área infestada por Ae. aegypti

A provável influência de Estados vizinhos na infestação do Estado de São Paulo por Ae. aegypti consta a seguir:

• Goiás: pequena influência, pois sua infestação iniciou-se em 1986 e somente a partir de 1990 Ae.aegypti ocupava extensas áreas desse Estado;

• Rio de Janeiro: em 1984, existiam seis municípios infestados (três na região metropolitana) e, em 1986, a infestação era bastante abrangente, o que provavelmente influiu na ocorrência de focos no Estado de São Paulo, principalmente nas regiões 1 e 5. No entanto, a infestação dessas regiões, até 1995, ficou restrita a pequenas áreas (Figura 1);


• Mato Grosso do Sul e Paraná: provavelmente, o início da infestação do Estado de São Paulo por Ae. aegypti, que se deu na sua área oeste (Figura 1), foi decorrente da existência de municípios infestados, já em 1984, no Mato Grosso do Sul e Paraná (centros regionais que mantêm intercâmbio econômico com o oeste paulista: Campo Grande, Ponta Porã, Novo Mundo, Foz do Iguaçu e dois municípios vizinhos);

• Minas Gerais: em 1986, existiam 19 municípios infestados por Ae. aegypti, concentrados na área centro-leste do Estado (incluindo Belo Horizonte). Assim, sua influência na infestação de São Paulo deve ter ficado restrita às RGs Barretos, Franca, Ribeirão Preto e São João da Bela Vista (Figura 1).

Pela Figura 1, verifica-se ampla ocorrência de focos no Estado. Já o estabelecimento de Ae. aegypti em novos municípios concentrou-se nas proximidades daqueles já infestados, avançando a espécie do oeste para o leste paulista. Assim, as médias encontradas para os indicadores distância-foco e distância-infestação, no período de 1986 a 1995, foram 78,8 km e 32,1 km, respectivamente, e 75% dos municípios que se infestaram distavam no máximo 34 km do município infestado mais próximo. Estudo de correlação entre a distância dos municípios com focos até a área infestada mais próxima e o percentual de municípios infestados para cada uma dessas distâncias mostraram existir correlação negativa entre as variáveis (coeficiente de Pearson = -0,83, -0,85<R< -0,81).

O indicador infestação teve grandes variações para as diversas regiões: as regiões 7 a 13 apresentaram valores superiores a 50%; para as regiões 6 e 4, os valores foram intermediários; as regiões 1 a 3 apresentaram percentuais próximos de 10% e, na região 5, Ae. aegypti não se estabeleceu até 1995 (Tabela 1).

O número de municípios onde se eliminou Ae. aegypti foi bastante reduzido (27). A eliminação foi alcançada após intensas atividades de controle em municípios recém infestados. Nas regiões 6 a 13, após 1 ou 2 anos, verificou-se reinfestação na maioria deles e, nas demais regiões, a leste do Estado, esse tempo foi maior ou a reinfestação não ocorreu até 1995.

A intensidade do avanço da espécie para ocupação de novos municípios não se deu de forma homogênea no decorrer dos anos (Tabela 2). O indicador velocidade permitiu diferenciar três áreas no Estado: área A (regiões 7 a 13), onde a expansão geográfica de Ae. aegypti foi mais rápida; área B (região 6), onde a velocidade foi intermediária e área C (regiões 1 a 5), onde a velocidade foi mais lenta. Ou seja, na área com menor densidade demográfica houve maior rapidez na expansão geográfica da espécie e vice-versa. No entanto, dentro de cada área, verificou-se exatamente o contrário: nas áreas A e B, o avanço de Ae. aegypti foi mais rápido na região 7 e nas RG Limeira, Piracicaba e Campinas, onde a densidade demográfica era mais elevada. Na área C, foram os centros econômicos estaduais, como São Paulo e Santos, e regionais, como Botucatu, Avaré e Itapeva, os primeiros a se infestar. Nas três áreas, dentro de cada região, os municípios mais populosos mostraram-se mais vulneráveis à infestação por Ae. aegypti, pois para o período de 1986 a 1995, o indicador distância-infestação nos municípios com menos de 20 mil habitantes foi de 26,1 km, quase dobrando naqueles com 20 mil a 50 mil habitantes, e ainda maior para aqueles com mais de 50 mil habitantes (Tabela 2).

Análise da expansão geográfica da área infestada por Ae. albopictus

A provável influência de Estados vizinhos na infestação do Estado de São Paulo por Ae. albopictus, consta a seguir:

• Mato Grosso do Sul, Goiás e Paraná: nenhuma influência, pois permaneceram sem infestação, até 1994;

• Rio de Janeiro e Minas Gerais: em 1988, havia mais de 50 municípios infestados com distribuição ampla no Rio de Janeiro, e mais de 200, em Minas Gerais, concentrados a sudeste e em torno de Belo Horizonte, além de alguns na divisa com as regiões 6 a 8. Portanto, devem ter exercido grande influência na infestação do Estado de São Paulo, principalmente nas regiões 5 a 8.

Em 1986, foram detectados os primeiros focos de Ae. albopictus no Estado de São Paulo, na região 5. Foram efetuadas medidas de controle e a vigilância realizada a seguir considerou a espécie eliminada. No ano seguinte, novos focos foram detectados nessa e em outras regiões, registrando-se o estabelecimento de Ae. albopictus em municípios paulistas. Dessa forma, Ae. albopictus foi avançando do nordeste do Estado em direção ao sudoeste.

Os municípios com estabelecimento de Ae. albopictus, no período de 1987 a 1992, concentraram-se na proximidade de outros já infestados (Figura 2) e, conseqüentemente, as distâncias referentes ao indicador distância-foco foram maiores que as do indicador distância-infestação. Nos três anos seguintes, esses indicadores apresentaram valores muito próximos, coincidindo com o avanço da espécie para as regiões 9 a 13, integralmente infestadas por Ae. aegypti, e o indicador infestação ficou muito próximo de 100% ( Figura 2).


Para o período de 1987 a 1992, as médias dos indicadores distância-foco e distância-infestação foram, respectivamente, 92,7 km e 46,0 km e 75% dos municípios que se infestaram distavam no máximo 60 km do município infestado mais próximo. Estudo de correlação entre a distância dos municípios com focos até a área infestada mais próxima e o percentual de municípios infestados para cada uma dessas distâncias mostrou a existência de correlação negativa entre as duas variáveis (coeficiente de Pearson = - 0,87, -0,89<R<-0,85).

O avanço de Ae. albopictus na ocupação de novos municípios não se deu de forma homogênea no decorrer dos anos. Em função da grande ampliação de área ocupada pela espécie no triênio 1992-1994, o número de municípios infestados por Ae. albopictus (Tabela 4) ultrapassou, em 1994, o daqueles infestados por Ae. aegypti (Tabela 3).

O indicador infestação variou de 29,9% a 100% (Tabela 3), podendo-se identificar três diferentes áreas:

• Área A1 (regiões 1 a 6), onde esse indicador ficou abaixo de 50%, com exceção da região 2, composta de pequeno número de municípios. Nessa área, teve início a infestação do Estado por Ae. albopictus e, até 1995, permaneceu praticamente sem infestação por Ae. aegypti.

• Área B1 (regiões 7 e 8), onde o indicador ficou em torno de 65%. Sua infestação pelas duas espécies se deu de forma quase concomitante, com pequena defasagem em favor de Ae. aegypti.

• Área C1 (regiões 9 a 13), onde o indicador variou de 73% a 100%. Quando essa área se infestou por Ae. albopictus, já estava quase que integralmente infestada por Ae. aegypti.

O número de municípios onde se considerou eliminada a espécie, após seu estabelecimento, foi pequeno (37). Quase a metade desses municípios se reinfestou 1 a 2 anos depois.

Pela Tabela 4, pode-se verificar o comportamento do indicador velocidade. Destacam-se as regiões 1, 2, 4 e 13 com a maior velocidade, seguidas das regiões 3, 5 e 12.

A análise sobre a possível influência de fatores ligados à ocupação do solo ficou restrita às regiões 1 a 8, onde as atividades de vigilância e de controle de focos de Ae. albopictus foram homogêneas. Verificou-se que a espécie passou por rápida expansão geográfica nas regiões 1 e 2, onde a taxa de densidade demográfica assumiu os maiores valores do Estado, e na região 3, que representou o outro extremo dessa taxa. Além disso, na região 4, onde a taxa se apresentou inferior à das regiões 5 e 6 e semelhante à da região 7, o avanço da espécie foi mais rápido (Tabela 4). Por meio dos indicadores distância-foco e distância-infestação, verificou-se maior vulnerabilidade dos municípios mais populosos à ocorrência de focos, mas o mesmo não se observou para o estabelecimento de Ae. albopictus.

DISCUSSÃO

A falta de regularidade nas ações de vigilância entomológica na área oeste do Estado até 1984, os resultados do levantamento realizado em abril de 1985 e a expansão geográfica de Aedes aegypti no ano seguinte (a maior do período estudado) permitem levantar a hipótese de que o início da infestação do Estado de São Paulo tenha ocorrido anteriormente a 1985, provavelmente como decorrência da presença da espécie em municípios do Mato Grosso do Sul e do Paraná. Apesar de Ae. aegypti estar estabelecido no Rio de Janeiro desde 1977, muito antes da infestação de outros Estados vizinhos a São Paulo, as regiões do Vale do Paraíba e da Grande São Paulo (regiões 5 e 1), com localização mais próxima ao Rio de Janeiro e mantendo com este intenso fluxo de transportes, permaneceram praticamente livres de infestação por esta espécie, durante o período estudado.

As informações existentes indicam que o início da infestação do Estado de São Paulo por Ae. albopictus ocorreu em 1987, provavelmente como decorrência da existência de municípios infestados nos Estados do Rio de Janeiro e de Minas Gerais, ou mesmo no Espírito Santo, que embora não limítrofe, é próximo a São Paulo.

A distância dos municípios até a área infestada mais próxima teve influência na ocorrência de focos e no estabelecimento de qualquer uma das espécies. Quanto menor a distância, maior o percentual de municípios com estabelecimento das espécies estudadas, dentre aqueles com focos. Verificou-se que 75% dos municípios em que se constatou o estabelecimento de populações desses dois culicídeos estavam muito próximos, se não vizinhos, a municípios infestados (indicador distância-infestação igual a 34 km e 60 km, respectivamente, para Ae. aegypti e Ae. albopictus). Para distâncias dessa ordem, é importante que se considere, além da dispersão passiva de formas imaturas, a dispersão de adultos na definição de estratégia para conter a expansão geográfica desses culicídeos.

A velocidade de ocupação do Estado pelas duas espécies foi bastante elevada. A maior velocidade encontrada para Ae. albopictus deve estar, em parte, relacionada com o trabalho de vigilância e de controle menos intenso e oportuno efetuado sobre esta espécie: em municípios infestados por Ae. aegypti, a vigilância entomológica visa a nortear as atividades de controle de Ae. aegypti e não a detecção precoce de focos de Ae. albopictus. Quando esses focos em municípios já infestados por Ae. aegypti foram detectados, não foi realizada sua delimitação e controle. Além disso, as ações rotineiras de vigilância e controle destes dois culicídeos são dirigidas a ecótopos artificiais existentes nas habitações humanas e em suas imediações. Embora estes sejam utilizados por formas imaturas das duas espécies, Ae. albopictus utiliza também como habitat recipientes naturais.4,6

Comparando-se as três áreas do Estado, onde foram encontrados padrões diferenciados na expansão geográfica de Ae. aegypti, verificou-se a existência de um paradoxo. Observou-se o contrário do que tem ocorrido em muitos países subdesenvolvidos, onde as regiões com maior densidade demográfica e maiores níveis de urbanização, em função da deterioração do meio urbano, têm tido uma proliferação maior de Ae. aegypti.5,8 Acredita-se que existam outros fatores influindo preponderantemente nesses padrões macrorregionais no Estado de São Paulo. Os resultados foram diferentes, no entanto, quando foram comparados regiões e municípios dentro de cada área: nas regiões onde a densidade demográfica era maior, verificou-se maior rapidez na expansão geográfica de Ae. aegypti e, dentro de cada região, os municípios mais populosos se mostravam mais vulneráveis à infestação.

Para Ae. albopictus, foram identificadas três áreas com padrões diferentes para o indicador infestação, os quais parecem estar relacionados, principalmente, com as variações na metodologia de vigilância e de controle ocorridas para cada área. Não se observou qualquer relação entre os padrões de velocidade do avanço de populações de Ae. albopictus na ocupação das regiões paulistas e sua densidade demográfica. Identificou-se maior vulnerabilidade para ocorrência de focos nos municípios mais populosos, o mesmo não ocorrendo para o estabelecimento da espécie.

Considerando que Ae. albopictus tem capacidade de se estabelecer em áreas com diferentes níveis de ocupação antrópica, utilizando ecótopos naturais e artificiais,6 pode-se afirmar que não seria factível conter a expansão geográfica da população desse culicídeo. Quanto a Ae. aegypti, espécie que utiliza preferencialmente ecótopos artificiais e mantém geralmente sua distribuição limitada a áreas urbanas e aglomerados rurais,10 pode-se afirmar que o controle da sua expansão geográfica, no Estado de São Paulo, poderia ter obtido melhores resultados se tivesse sido implementado nos municípios não infestados um sistema de vigilância entomológica mais sensível à detecção de focos, utilizando metodologia diferenciada de acordo com a proximidade de áreas infestadas, o porte populacional e a importância econômica dos municípios; se tivesse sido efetuado um controle sistemático nas áreas infestadas, especialmente em imóveis que, pela sua atividade, propiciam a dispersão passiva da espécie; se tivesse sido aumentada a abrangência geográfica, a rapidez e a taxa de cobertura da atividade de delimitação e de controle dos focos detectados.

Correspondência para/Correspondence to:

Carmem Moreno Glasser

Superintendência de Controle de Endemias (Sucen)

Rua Paula Souza, 166

01027-000 São Paulo, SP, Brasil

E-mail: carmen@sucen.sp.gov.br

Edição subvencionada pela Fapesp (Processo nº 00/01601-8).

Recebido em 4/11/1999. Reapresentado em 17/8/2000. Aprovado em 11/9/2000.

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  • *
    Baseado na dissertação de mestrado apresentada à Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, 1997.
  • **
    Menor distância por via rodoviária entre sedes municipais.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Ago 2001
    • Data do Fascículo
      Dez 2000

    Histórico

    • Recebido
      04 Nov 1999
    • Revisado
      17 Ago 2000
    • Aceito
      11 Set 2000
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