Acessibilidade / Reportar erro

Metástase cervical nos tumores malignos da parótida

Neck metastasis in malignant parotid tumors

Resumos

OBJETIVO: Analisar fatores que influenciam a ocorrência de metástase linfática cervical e a sobrevida nos tumores malignos epiteliais da glândula parótida. MÉTODO: Analisamos retrospectivamente os prontuários de 150 pacientes tratados em nossa instituição de 1974 a 1998. Vinte e quatro pacientes foram excluídos do estudo por não terem sido tratados primariamente por cirurgia. O 126 pacientes restantes foram submetidos a parotidectomia e incluídos neste estudo. Setenta e quatro pacientes tiveram sua cirurgia complementada por radioterapia pós-operatória. Trinta e quatro pacientes foram submetidos ao esvaziamento cervical associado a parotidectomia. A idade média foi de 49 anos. Todos os pacientes foram estadiados pela Classificação TNM da UICC de 1997, sendo 49 pacientes estágio I, 27 estágio II, 22 estágio III, and 28 estágio IV. A influência dos fatores analisados na ocorrência de metástase cervical foi estabelecida pelo teste do chi quadrado e por análise multivariada. A influência de fatores prognósticos na sobrevida específica de doença (SED) em 5 e 10 anos foi estabelecida pelo método de Kaplan-Meier e pelo teste log-rank. RESULTADOS: O tipo histopatológico de 40 pacientes foi o carcinoma mucoepidermóide, de 18 pacientes o adenocarcinoma (SOE), de 18 pacientes o carcinoma de células acinares, de 15 pacientes o carcinoma adenóide cístico, de 11 pacientes o carcinoma exadenoma pleomórfico, de 11 pacientes o carcinoma de ducto salivares, e de 13 pacientes outras histopatologias. Vinte e cinco pacientes apresentaram recidivas, 17 recidivas locais, quatro recidivas regionais, e quatro recidivas loco-regionais. A incidência geral de metástase linfática cervical foi de 17,5%. Metástases linfáticas cervicais ocultas ocorreram em cinco pacientes daqueles submetidos a esvaziamento cervical profilático. A presença de paralisia facial no diagnóstico, a idade, o estágio T, e o grau de malignidade foram relacionados a ocorrência de metástase linfática cervical na análise multivariada. Cinco fatores influenciaram negativamente o prognóstico, estágio T3-T4, alto grau de malignidade, presença de metástase cervical, paralisia facial no diagnóstico, e idade acima de 50 anos. A SED em 10 anos foi de 97% para o estágio I, 81% para o estágio II, 56% para o estágio III, e 20% para estágio IV. CONCLUSÕES: O grau de malignidade e o estágio foram os fatores prognósticos mais importantes. Apesar de ser um estudo retrospectivo e não randomizado, nossos dados sugerem que o esvaziamento cervical profilático deve ser considerado em casos de tumores de alto grau de malignidade, estágio T3-T4, e na presença de paralisia facial no diagnóstico.

Glândula parótida; Metástase linfática; Neoplasias parotídeas; Esvaziamento cervical; Prognóstico


BACKGROUND: Factors influencing the occurrence of neck metastasis and survival in patients with parotid malignant epithelial tumors are analyzed. METHODS: One hundred fifty patients treated at our institution from 1974 to 1998 were retrospectively reviewed. Twenty four patients were not treated by surgery and were excluded from this study. The remaining 126 patients were operated on and 74 patients had postoperative radiotherapy. Thirty four patients were treated with parotidectomy plus neck dissection. The mean age was 49 years old. According to the UICC/1997 TNM Classification 49 patients were Stage I, 27 were Stage II, 22 were Stage III, and 28 were Stage IV. The influence of selected factors on 10 years disease-specific survival was analyzed using Kaplan-Meier actuarial method and log-rank test. RESULTS: Forty patients had mucoepidermoid carcinoma, 18 patients adenocarcinoma, 18 patients acinic cell carcinoma, 15 patients adenoid cystic carcinoma, 11 patients carcinoma ex pleomorphic adenoma, 11 patients salivary duct carcinoma, and 13 patients other pathology. Recurrences occurred on 27 patients, 17 local, 4 had neck recurrences, and 4 loco-regional recurrences. Overall incidence of neck metastasis was 17.5%. Occult neck metastasis occurred in 5 patients who underwent elective neck dissection. Facial nerve dysfunction, age, T stage, grade, and histology were related to the recurrence of neck metastasis in univariate analysis. Prognoses were negatively influenced by five factors: T3- T4 stage, high malignancy grade, presence of cervical metastases, facial nerve palsy at first presentation and age higher then 50 years old. Ten years disease-specific survival was 97% for stage I, 81% for stage II, 56% for stage II, and 20% for stage IV. CONCLUSION: Tumor grade and stage were the most important prognostic factors. In spite of lack of prospective randomized published studies, recommendations to do elective neck dissections in high grade tumors, T3- T4 stage tumors, and facial nerve palsy at presentation should be considered.

Parotid gland; Lymphatic metastasis; Parotid neoplasms; Neck dissection; Prognosis


ARTIGO ORIGINAL

Metástase cervical nos tumores malignos da parótida

Neck metastasis in malignant parotid tumors

Roberto Araujo Lima, TCBC-RJI; Marcos Roberto Tavares, TCBC-SPIII; Jacob Kligerman, TCBC-RJI; Fernando Luiz Dias, TCBC-RJII; Mauro Marques Barbosa, TCBC-RJI; Claudio Roberto Cernea, TCBC-SPIII

ITitular da Seção de Cirurgia de Cabeça e Pescoço – INCA

IIChefe da Seção de Cirurgia de Cabeça e Pescoço – INCA

IIIProfessor da Disciplina de Cirurgia de Cabeça e Pescoço HCFM – USP

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Recebido em 05-12-2005 Aceito para publicação em 05-01-2006 Conflito de interesses: nenhum Fonte de financiamento: nenhuma

RESUMO

OBJETIVO: Analisar fatores que influenciam a ocorrência de metástase linfática cervical e a sobrevida nos tumores malignos epiteliais da glândula parótida.

MÉTODO: Analisamos retrospectivamente os prontuários de 150 pacientes tratados em nossa instituição de 1974 a 1998. Vinte e quatro pacientes foram excluídos do estudo por não terem sido tratados primariamente por cirurgia. O 126 pacientes restantes foram submetidos a parotidectomia e incluídos neste estudo. Setenta e quatro pacientes tiveram sua cirurgia complementada por radioterapia pós-operatória. Trinta e quatro pacientes foram submetidos ao esvaziamento cervical associado a parotidectomia. A idade média foi de 49 anos. Todos os pacientes foram estadiados pela Classificação TNM da UICC de 1997, sendo 49 pacientes estágio I, 27 estágio II, 22 estágio III, and 28 estágio IV. A influência dos fatores analisados na ocorrência de metástase cervical foi estabelecida pelo teste do chi quadrado e por análise multivariada. A influência de fatores prognósticos na sobrevida específica de doença (SED) em 5 e 10 anos foi estabelecida pelo método de Kaplan-Meier e pelo teste log-rank.

RESULTADOS: O tipo histopatológico de 40 pacientes foi o carcinoma mucoepidermóide, de 18 pacientes o adenocarcinoma (SOE), de 18 pacientes o carcinoma de células acinares, de 15 pacientes o carcinoma adenóide cístico, de 11 pacientes o carcinoma exadenoma pleomórfico, de 11 pacientes o carcinoma de ducto salivares, e de 13 pacientes outras histopatologias. Vinte e cinco pacientes apresentaram recidivas, 17 recidivas locais, quatro recidivas regionais, e quatro recidivas loco-regionais. A incidência geral de metástase linfática cervical foi de 17,5%. Metástases linfáticas cervicais ocultas ocorreram em cinco pacientes daqueles submetidos a esvaziamento cervical profilático. A presença de paralisia facial no diagnóstico, a idade, o estágio T, e o grau de malignidade foram relacionados a ocorrência de metástase linfática cervical na análise multivariada. Cinco fatores influenciaram negativamente o prognóstico, estágio T3-T4, alto grau de malignidade, presença de metástase cervical, paralisia facial no diagnóstico, e idade acima de 50 anos. A SED em 10 anos foi de 97% para o estágio I, 81% para o estágio II, 56% para o estágio III, e 20% para estágio IV.

CONCLUSÕES: O grau de malignidade e o estágio foram os fatores prognósticos mais importantes. Apesar de ser um estudo retrospectivo e não randomizado, nossos dados sugerem que o esvaziamento cervical profilático deve ser considerado em casos de tumores de alto grau de malignidade, estágio T3-T4, e na presença de paralisia facial no diagnóstico.

Descritores: Glândula parótida; Metástase linfática; Neoplasias parotídeas; Esvaziamento cervical; Prognóstico.

ABSTRACT

BACKGROUND: Factors influencing the occurrence of neck metastasis and survival in patients with parotid malignant epithelial tumors are analyzed.

METHODS: One hundred fifty patients treated at our institution from 1974 to 1998 were retrospectively reviewed. Twenty four patients were not treated by surgery and were excluded from this study. The remaining 126 patients were operated on and 74 patients had postoperative radiotherapy. Thirty four patients were treated with parotidectomy plus neck dissection. The mean age was 49 years old. According to the UICC/1997 TNM Classification 49 patients were Stage I, 27 were Stage II, 22 were Stage III, and 28 were Stage IV. The influence of selected factors on 10 years disease-specific survival was analyzed using Kaplan-Meier actuarial method and log-rank test.

RESULTS: Forty patients had mucoepidermoid carcinoma, 18 patients adenocarcinoma, 18 patients acinic cell carcinoma, 15 patients adenoid cystic carcinoma, 11 patients carcinoma ex pleomorphic adenoma, 11 patients salivary duct carcinoma, and 13 patients other pathology. Recurrences occurred on 27 patients, 17 local, 4 had neck recurrences, and 4 loco-regional recurrences. Overall incidence of neck metastasis was 17.5%. Occult neck metastasis occurred in 5 patients who underwent elective neck dissection. Facial nerve dysfunction, age, T stage, grade, and histology were related to the recurrence of neck metastasis in univariate analysis. Prognoses were negatively influenced by five factors: T3- T4 stage, high malignancy grade, presence of cervical metastases, facial nerve palsy at first presentation and age higher then 50 years old. Ten years disease-specific survival was 97% for stage I, 81% for stage II, 56% for stage II, and 20% for stage IV.

CONCLUSION: Tumor grade and stage were the most important prognostic factors. In spite of lack of prospective randomized published studies, recommendations to do elective neck dissections in high grade tumors, T3- T4 stage tumors, and facial nerve palsy at presentation should be considered.

Key words: Parotid gland; Lymphatic metastasis; Parotid neoplasms; Neck dissection; Prognosis.

INTRODUÇÃO

Os tumores malignos da glândula parótida são raros, 1% a 3% de todos os tumores malignos da cabeça e pescoço1. O prognóstico e a sobrevida descritos na literatura são difíceis de interpretar devido à diversidade histopatológica e a sua raridade. Além disso, o curso clínico destes tumores é geralmente insidioso e a avaliação dos resultados requer um seguimento de longo prazo2. A sobrevida específica da doença varia de 47% a 78% dependendo do tempo de seguimento conforme os resultados dos maiores centros internacionais. (Tabela 1)

A ocorrência geral de metástase cervical está acima de 20%, segundo várias séries. (Tabela 2)

Publicações internacionais 3,4 apontam a presença de metástase cervical como um indicador de mau prognóstico, fato que é reconhecida pelo classificação UICC5.

O conhecimento dos fatores preditivos de metástase cervical e das opções de tratamento disponíveis é necessário para a escolha do tratamento adequado.

Este artigo avalia nossa experiência no tratamento dos tumores malignos da glândula parótida focando a influência de fatores prognósticos na incidência de metástase cervical clinica e oculta e seu impacto na sobrevida específica da doença.

MÉTODO

Analisamos retrospectivamente os prontuários de 150 pacientes tratados em nossa instituição entre 1974 e 1998. Vinte e quatro pacientes foram excluídos desta pesquisa por não terem sido tratados primariamente com cirurgia, ou por tempo de seguimento curto.

Portanto, foram incluídos neste estudo 126 pacientes, todos tratados primariamente com a parotidectomia. Trinta e três pacientes tiveram sua parotidectomia complementada per operatóriamente por esvaziamento cervical, 12 esvaziamentos cervicais radicais modificados, dois esvaziamentos cervicais supraomohióideos, e 19 esvaziamentos cervicais eletivos dos níveis linfáticos cervicais II e III.

Setenta e quatro pacientes (58,7%) tiveram sua cirurgia complementada por radioterapia (50-55cGy) A idade mediana foi de 49 anos (intervalo de 5 a 92). Sessenta e oito pacientes eram do sexo masculino. Todos os 126 pacientes foram classificados pela classificação TNM da UICC de 1998. (Tabela 3 e 4 ) O tempo médio de seguimento foi de 60 meses (intervalo de 4 a 216 meses)

Os pacientes foram divididos pela idade média em dois grupos etários, maior ou igual a 50 anos ou menor que 50 anos.

A influência dos grupos etários, histopatologia, estágio "T", paralisia facial e grau de malignidade na ocorrência de metástase cervical foram estabelecidos pelo teste do chiquadrado. Estabelecemos a influência da metástase cervical clínica e oculta na sobrevida específica da doença em 10 anos pelo método de Kaplan-Meier e o teste log-rank6,7.

RESULTADOS

O tipo histopatológico mais freqüente foi o carcinoma mucoepidermóide. (Tabela 5)

Os tipos histopatológicos foram relacionados a três graus de malignidade representando diferentes níveis de comportamento biológico. O carcinoma mucoepidermóide, o carcinoma de células acinares e o adenocarcinoma (SOE) foram subclassificados em baixo-médio-alto graus de malignidade de acordo com as características histológicas. Os tipos histopatológicos restantes foram divididos em graus segundo seu comportamento biológico. (Tabela 6)

Vinte e dois pacientes apresentavam metástase linfática cervical, metástase clínica em 13 e oculta em nove pacientes. Nenhum paciente cuja metástase cervical oculta foi detectada no esvaziamento cervical eletivo morreu da doença. (Figura 1)


A ocorrência de metástase linfática cervical clínica e oculta foi relacionada à ocorrência subseqüente de metástase à distância. Da mesma maneira à presença de paralisia facial, ao grau de malignidade, ao estágio da doença, ao tipo histopatológico. (Tabela 7)

Dezesseis (94%) dos pacientes que apresentaram metástase à distância morreram da doença. A sobrevida média destes pacientes foi de 45 meses.

A ocorrência de metástase cervical esteve relacionada à presença de paralisia facial, idade maior que 50 anos, tumores de alto grau de malignidade, estágio T3-T4, e adenocarcinoma e carcinoma de ductos salivares. (Tabela 8)

Vinte e cinco pacientes apresentaram recidivas, 17 recidivas locais, quatro recidivas regionais,e quatro recidivas loco-regionais; 13 pacientes (52%) recidivados morreram da doença. Dezessete pacientes apresentaram metástase à distância subsequentemente ao tratamento, principalmente para pulmão e ossos. O grupo etário acima de 50 anos, o grau de malignidade, os tumores T3 e T4, os estágios III e IV, a presença de metástase cervical, a ocorrência de paralisia facial , e a histopatologia influenciaram negativamente o prognóstico na análise univariada. (Tabela 9)

A sobrevida específica da doença em 10 anos foi de 97% para estágio I, 81% para estágio II, 56% para estágio III, e 20% para estágio IV. A sobrevida em 5 e 10 anos para todos os estágios foi de 72% e 69%, respectivamente.

DISCUSSÃO

Os tumores da glândula parótida compreendem um grupo heterogêneo de doença e um desafio para os patologistas. O tratamento combinado: operação seguida de radioterapia parece ser o mais apropriado para os tumores avançados. Contudo os dados descritos na literatura internacional não são prospectivos e são diversos, dificultando uma conclusão8,9. Renehanl10 relatou alguma melhora na sobrevida de pacientes cuja operação foi complementada pela radioterapia nos casos de tumores de alto grau de malignidade e maiores do que 4 cm.

As diferentes indicações de radioterapia complementar na nossa casuística nos impedem de tirar qualquer conclusão, mesmo assim, nossos pacientes com tumores de alto grau de malignidade apresentaram menor índice de recidivas locais (operação+radioterapia - 17.4% versus operação 47.2%) (p = 0.05). Entretanto, nenhum estudo prospectivo randomizado foi publicado com a intenção de avaliar o benefício real da radioterapia complementar em pacientes com tumores malignos da glândula parótida.

Publicações da literatura internacional apresentam diferentes freqüências dos tipos histopatológicos dos tumores malignos da glândula parótida. Em nosso estudo o resultado histopatológico mais freqüente foi o carcinoma mucoepidermóide, seguido pelo adenocarcinoma (SOE), pelo carcinoma de células acinares, e pelo carcinoma adenóide cístico. Spiro 11 em 1975 publicou um artigo com 288 casos de câncer da parótida, onde o carcinoma mucoepidermóide foi o mais freqüente. Estes dados foram confirmados por outros autores9,10. Nossos dados sugerem uma distribuição histopatológica similar, assim como em outras publicações2,12,13. Contudo, o carcinoma indiferenciado da parótida apresentou uma baixa freqüência em nossa casuística (1,6%), diferente de outras8,10,14 que apresentaram um incidência mais alta, entre 12 e 18%. Uma das maiores séries 15 de tumores malignos das glândulas salivares com um total de 1695 pacientes com tumores na parótida atribuiu uma freqüência de 1,3% ao carcinoma indiferenciado da parótida, esta baixa freqüência foi confirmado por outros1,13,16.

As diferentes freqüências dos tipos histológicos publicadas podem ser explicadas pelo uso de testes de imunohistoquímica. A classificação histológica de 1990 da OMS 17 também influencia as diferentes incidências destes tumores já que um grande número de publicações inclui casos de antes de 1990.

A incidência de metástase cervical oculta nos tumores malignos das glândulas salivares varia na literatura internacional, de 22% a 48%1,9,14,18. Medina 19 sugere que os pacientes com alto risco para metástase cervical oculta devam ter o pescoço tratado eletivamente com radioterapia. Baseia esta assertiva na extensa experiência, que a irradiação eletiva do pescoço controla as metástases subclínicas do carcinoma epidermóide da cabeça e do pescoço20-22. Contudo nenhum trabalho prospectivo e randomizado, com a intenção de avaliar capacidade da radioterapia controlar a metástase linfática cervical oculta foi publicado.

Stennert23 relata uma incidência de 45% em 160 casos de tumores malignos das glândulas salivares maiores, classificados como N0, e submetidos a esvaziamento cervical eletivo. Descreve uma incidência de metástase oculta excepcionalmente alta, mesmo para tipos histopatológicos associados a baixo risco de metástase cervical como o carcinoma adenóide cístico e carcinoma de células acinares. Da mesma forma, a incidência de metástase linfática cervical oculta em tumores T1 e T2 é também elevada, 29% e 54%, respectivamente. Outros24 acham uma incidência de 20% de metástase oculta, elevada em tumores de baixo grau de malignidade e tumores T2, e recomenda esvaziamento cervical eletivo em todos os casos, pelo menos esvaziamento cervical dos níveis linfáticos cervicais I e II.

As recomendações para esvaziamento cervical eletivo nos tumores malignos das glândulas salivares incluem casos de tumores de alto grau de malignidade25,26 e estágio T26, em meio a outros fatores14,19. Entretanto a dificuldade do estabelecimento do grau de malignidade, e em alguns casos do tipo histopatológico por citologia ou exame de congelação, pré-operatóriamente ou durante a cirurgia, é bem conhecido, chegando a 55%24.

Em nossa série a incidência de metástase cervical oculta foi de 26% (cinco casos), nos casos submetidos a esvaziamento cervical eletivo. Em quatro casos encontramos metástase linfática em linfonodos periparotídeos e intraparotídeos. Dos novecasos de metástase cervical oculta, cinco casos ocorreram em tumores T1-T2 (p = 0,67) e três casos em tumores de baixo grau de malignidade (p = 0,69).

Devido as diferentes indicações de esvaziamento cervical eletivo em nossa série não foi possível estabelecer o benefício real do esvaziamento cervical eletivo. Além disso, os pacientes que apresentavam fatores normalmente associados à presença de metástase cervical (alto grau de malignidade e estágio T3-T4), foram submetidos à radioterapia complementar, na maioria dos casos. A influência negativa da ocorrência de metástase linfática cervical no prognóstico dos pacientes com câncer da glândula parótida tem sido descrita em alguns trabalhos4,9,10,13,14,18. A incidência geral de metástase linfática cervical em nossa série foi de 17,5% e influenciou negativamente o prognóstico.

Além da presença de metástase linfática cervical, outros fatores prognósticos têm sido descritos. O diagnóstico histopatológico é considerado um forte indicador prognóstico, no entanto a raridade destes tumores e as diferentes classificações histopatológicas dificultam o estabelecimento de dados prognósticos mais confiáveis. É bem conhecido que o carcinoma mucoepidermóide de alto grau de malignidade, o carcinoma ex-adenoma pleomórfico, e o carcinoma de ducto salivar são tumores com um comportamento biológico mais agressivo, e são agrupados como tumores de alto grau de malignidade8,9,13. A graduação do adenocarcinoma (SOE) representa um ponto de controvérsia, já que tem sido reclassificado em outros tipo histopatológicos27,28.

Em nosso estudo o carcinoma de ducto salivar teve o pior prognóstico, a sobrevida em cinco anos foi de 21% e nenhum paciente viveu por 10 anos. Os pacientes acometidos pelo carcinoma ex-adenoma pleomórfico também tiveram uma sobrevida mais curta que os outros tipos histológicos avaliados, 25% em 5 e 10 anos.

A invasão perineural tem sido identificada em análises multivariadas como um indicador de sobrevida 29 e de metástase à distância em tumores malignos da parótida. 30 Da mesma forma, a presença de paralisia facial é considerada indicador de risco prevendo recidivas 9, metástases a distância30, e influenciando o prognóstico31.

Em nosso estudo a presença de paralisia facial parcial ou total no diagnóstico ocorreu em 31 pacientes, 11 pacientes (35,5%) apresentaram recidivas loco-regionais e 10 pacientes (32,3%) tiveram metástase à distância, influenciando o prognóstico na análise univariada.

O grau de malignidade e o estágio da doença são considerados como os mais importantes fatores prognósticos 3,10,29.

Os tumores de alto grau de malignidade (grupo III) apresentaram uma sobrevida bem abaixo (20%) dos de médio (70%) e baixo (88%) grau de malignidade. Da mesma forma os pacientes com tumores T3-T4 e estágio III-IV tiveram uma sobrevida menor, 47% e 41% respectivamente13. Magnano8 dividiu os tumores em apenas 2 graus de malignidade concluindo que os tumores de alto grau tiveram uma sobrevida em cinco anos de 42% e os de baixo grau de 52%. Da mesma forma, Renehan 10 em um estudo com 103 tumores malignos da parótida estabeleceu o grau de malignidade e o estágio "T" como fatores prognósticos importantes, porém os pacientes com médio grau de malignidade obtiveram uma sobrevida menor que os de alto grau de malignidade, 41% e 50% respectivamente. É importante salientar que este autor classificou todos os casos de carcinoma adenóide cístico como médio grau de malignidade o que pode ter influenciado este resultado. Harbo31 classificou o carcinoma adenóide cístico de padrão sólido como alto grau de malignidade, este grupo apresentou uma sobrevida em 10 anos de 19%.

Em nosso trabalho os pacientes de alto grau de malignidade apresentaram uma sobrevida em 10 anos de 43%, e os pacientes com tumores T3-T4 uma sobrevida em 10 anos de 47%, ambos os fatores influenciaram a sobrevida na análise univariada e multivariada.

Recidivas loco-regionais nos tumores malignos da parótida são freqüentes, ocorrendo entre 15% a 33% dos casos8,9,32,33.

Vinte e cinco pacientes (19,8%) de nosso estudo apresentaram recidivas loco-regionais da doença, as quais estavam associadas a tumores de alto grau e de estágios avançados.

A sobrevida em 5 e 10 anos publicada na literatura internacional está descrita na Tabela I. Em nossa série a sobrevida específica da doença em 5 e 10 anos foi de 72% e 69%, respectivamente.

Nossos dados identificaram o grau de malignidade e o estágio como os fatores prognósticos mais importantes. Apesar de ser um estudo retrospectivo e não randomizado, nosso estudo sugere que o esvaziamento cervical profilático deve ser considerado em casos de tumores de alto grau de malignidade, estágio T3-T4, e na presença de paralisia facial no diagnóstico.

Roberto Araújo Lima

Estrada da Barra da Tijuca, 1006 – BL 2/603 - Itanhangá

22641-003 – Rio de Janeiro – RJ

E-mail: rlimamd@globo.com

Trabalho realizado na Seção de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Instituto Nacional de Câncer, Rio de Janeiro-RJ.

  • 1. Kane WJ, McCaffrey TV, Olsen KD, Lewis JE. Primary parotid malignancies. A clinical and pathologic review. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 1991; 117(3):307-15.
  • 2. Therkildsen MH, Christensen M, Andersen LJ, Schiodt T, Hansen HS. Salivary gland carcinomas - prognostic factors. Acta Oncol. 1998;37(7-8):701-13.
  • 3. Pedersen D, Overgaard J, Sogaard H, Elbrond O, Overgaard M. Malignant parotid tumors in the 110 consecutive patients: treatment results and prognosis. Laryngoscope. 1992;102(9):1064-9.
  • 4. Calearo C, Pastore A, Storchi OF, Polli G. Parotid gland carcinoma: analysis of prognostic factors. Ann Otol Rhinol Laryngol. 1998;107(11 Pt 1):969-73.
  • 5. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Instituto Nacional de Câncer. TNM: classificação dos tumores malignos. 5Ş ed. Rio de Janeiro: INCA; 1998.
  • 6. Kaplan EL, Meier P. Nonparametric estimation from incomplete observations. J Am Statist Assoc. 1958;53:457-81.
  • 7. Peto R, Pike MC, Armitage P, Breslow NE, Cox DR, Howard SV, Mantel N, McPherson K, Peto J, Smith PG. Design and analysis of randomized clinical trials requiring prolonged observation of each patient. II. analysis and examples. Br J Cancer. 1977;35(1):1-39.
  • 8. Magnano M, Gervasio CF, Cravero L, Machetta G, Lerda W, Beltramo G, Orecchia R, Ragona R, Bussi M. Treatment of malignant neoplasms of the parotid gland. Otolaryngol Head Neck Surg. 1999;121(5):627-32.
  • 9. Zbaren P, Schupbach J, Nuyens M, Stauffer E, Greiner R, Hausler R. Carcinoma of the parotid gland. Am J Surg. 2003;186(1):57-62.
  • 10. Renehan AG, Gleave EN, Slevin N J, McGurk M. Clinicopathological and treatment-related factors influencing survival in parotid cancer. Br J Cancer. 1999;80(8):1296-300.
  • 11. Spiro RH, Huvos AG, Strong EW. Cancer of the parotid gland. A clinicopathologic study of 288 primary cases. Am J Surg. 1975;130(4):452-9.
  • 12. Spiro RH, Dubner S. Salivary gland tumors. Curr Opin Oncol. 1990;2(3):589-95.
  • 13. Godballe C, Schultz J H, Krogdahl A, Moller-Grontved A, Johansen J. Parotid carcinoma: impact of clinical factors on prognosis in a histologically revised series. Laryngoscope. 2003;113(8):1411-7.
  • 14. Brito Santos IR, Kowalski LP, de Araújo VC, Logullo A, Magrin J. Multivariate analysis of risk factors for neck metastases in surgically treated parotid carcinomas. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 2001;127(1):56-60.
  • 15. Spiro RH. Salivary neoplasms: overview of a 35-year experience with 2807 patients. Head Neck Surg. 1986;8(3):177-84.
  • 16. Stafford ND, Wilde A. Parotid cancer. Surg Oncol. 1997;6(4):209-13.
  • 17. Seifert G, Brocheriou C, Cardesa A, Eveson JW. WHO International Histological Classification of Tumours. Tentative Histological Classification of Salivary Gland Tumours. Pathol Res Pract. 1990;186(5):555-81.
  • 18. Kelley DJ, Spiro RH. Management of the neck in parotid carcinoma. Am J Surg.1996;172(6):695-7.
  • 19. Medina JE. Neck dissection in the treatment of cancer of the major salivary glands. Otolaryngol Clin North Am. 1998;31(5):815-22.
  • 20. Mendenhall WM, Million RR, Cassisi NJ. Elective neck irradiation in squamous-cell carcinoma of the head and neck. Head Neck Surg.1980;3(1):15-20.
  • 21. Shasha D, Harrison LB. Elective irradiation of the N0 neck in squamous cell carcinoma of the upper aerodigestive tract. Otolaryngol Clin North Am. 1998;31(5):803-13.
  • 22. Weiss MH, Harrison LB, Isaacs RS. Use of decision analysis in planning a management strategy for the stage N0 neck. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 1994;120(7):699-702.
  • 23. Stennert E, Kisner D, Jungehuelsing M, Guntinas-Lichius O, Schroder U, Eckel HE, Klussmann JP. High incidence of lymph node metastasis in major salivary gland cancer. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 2003;129(7):720-3.
  • 24. Zbaren P, Schupbach J, Nuyens M, Stauffer E. Elective neck dissection versus observation in primary parotid carcinoma. Otolaryngol Head Neck Surg. 2005;132(3):387-91.
  • 25. Ferlito A, Shaha AR, Rinaldo A, Mondin V. Management of clinically negative cervical lymph nodes in patients with malignant neoplasms of the parotid gland. ORL J Otorhinolaryngol Relat Spec. 2001;63(3):123-6.
  • 26. Armstrong JG, Harrison LB, Thaler HT, Friedlander-Klar H, Fass DE, Zelefsky MJ, Shah JP, Strong EW, Spiro RH. The indications for elective treatment of the neck in cancer of the major salivary glands. Cancer. 1992(3);69:615-9.
  • 27. Luna MA, Batsakis JG, Ordonez NG, Mackay B, Tortoledo ME. Salivary gland adenocarcinomas: a clinicopathologic analysis of three distinctive types. Semin Diagn Pathol. 1987;4(2):117-35.
  • 28. Batsakis JG, el Naggar AK, Luna MA. "Adenocarcinoma, not otherwise specified": a diminishing group of salivary carcinomas. Ann Otol Rhinol Laryngol. 1992;101(1):102-4.
  • 29. Frankenthaler RA, Luna MA, Lee SS, Ang KK, Byers RM, Guillamondegui OM, Wolf P, Goepfert H. Prognostic variables in parotid gland cancer. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 1991;117(11):1251-6.
  • 30. Gallo O, Franchi A, Bottai GV, Fini-Storchi I, Tesi G, Boddi V. Risk factors for distant metastases from carcinoma of the parotid gland. Cancer. 1997; 80(5):844-51.
  • 31. Harbo G, Bundgaard T, Pedersen D, Sogaard H, Overgaard J. Prognostic indicators for malignant tumours of the parotid gland. Clin Otolaryngol Allied Sci. 2002;27(6):512-6.
  • 32. Vander Poorten VL, Balm AJ, Hilgers FJ, Tan IB, Loftus-Coll BM, Keus RB, Hart AA. Prognostic factors for long term results of the treatment of patients with malignant submandibular gland tumors. Cancer. 1999;85(10):2255-64.
  • 33. Vander Poorten VL, Balm AJ, Hilgers FJ, Tan IB, Loftus-Coll BM, Keus RB, van Leeuwen FE, Hart AA. The development of a prognostic score for patients with parotid carcinoma. Cancer. 1999;85(9):2057-67.
  • Endereço para correspondência

    Recebido em 05-12-2005
    Aceito para publicação em 05-01-2006
    Conflito de interesses: nenhum
    Fonte de financiamento: nenhuma
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Set 2006
    • Data do Fascículo
      Jun 2006

    Histórico

    • Recebido
      05 Dez 2005
    • Aceito
      05 Jan 2006
    Colégio Brasileiro de Cirurgiões Rua Visconde de Silva, 52 - 3º andar, 22271- 090 Rio de Janeiro - RJ, Tel.: +55 21 2138-0659, Fax: (55 21) 2286-2595 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
    E-mail: revista@cbc.org.br