Acessibilidade / Reportar erro

Fatores preditivos de morbidade nas ressecções pancreáticas esquerdas

Resumos

OBJETIVO: Avaliar a morbidade pós-operatória e investigar a existência de seus fatores preditivos. MÉTODOS: O estudo foi realizado de forma retrospectiva, a partir de uma base de dados mantida de forma prospectiva. De 1994 a 2008, 100 pacientes consecutivos foram submetidos à ressecções pancreaticas esquerdas. A principal variável de interesse foi a morbidade pós-operatória, tendo diversas outras características da população sido registradas simultaneamente. Posteriormente, para a análise de fatores preditivos de morbidade pós-operatória o subgrupo de pacientes que foi submetido aos procedimentos de pancreatectomia distal com preservação do baço (n=65) foi analisado separadamente quanto à relevância das diferentes técnicas de secção do parênquima pancreático, assim como, outros possíveis fatores preditivos à ocorrência de morbidade pós-operatória. RESULTADOS: Considerando-se juntamente todas as ressecções pancreáticas esquerdas realizadas, a ocorrência de complicações globais, de complicações relevantes e graves foi 55%, 42% e 20%, respectivamente. Os fatores que se mostraram preditivos à ocorrência de morbidade pós-operatória após pancreatectomia distal com preservação do baço foram a técnica de secção do parênquima pancreático, idade, índice de massa corporal e a realização de operação abdominal concomitante. CONCLUSÃO: A morbidade associada às ressecções pancreáticas, à esquerda dos vasos mesentéricos superiores, foi importante. De acordo com a estratificação adotada baseada na gravidade das complicações, alguns fatores preditivos foram identificados. Estudos futuros com coortes maiores de pacientes são necessários para confirmar tais resultados.

Procedimentos cirúrgicos operatórios; Pancreatectomia; Complicações pós-operatórias; Morbidade; Fístula pancreática


OBJECTIVE: To evaluate the postoperative morbidity of distal pancreatic resections and to investigate its predictive factors. METHODS: The study was conducted retrospectively from a prospectively database maintained. From 1994 to 2008, 100 consecutive patients underwent left pancreatic resections. The primary variable of interest was postoperative morbidity, and various other characteristics of the population were simultaneously recorded. Later, for the analysis of predictors of postoperative morbidity, the subgroup of patients who underwent distal pancreatectomy with spleen preservation (n = 65) was separately analyzed with regards to the different techniques of section of the pancreatic parenchyma, as well as to other possible predictors of postoperative morbidity. RESULTS: Considering all left pancreatic resections performed, the occurrence of overall, relevant and serious complications was 55%, 42% and 20%, respectively. The factors predictive of postoperative morbidity after distal pancreatectomy with spleen preservation were the technique employed for section of the pancreatic parenchyma, age, body mass index and the performance of concomitant abdominal operations. CONCLUSION: The morbidity associated with pancreatic resections to the left of the superior mesenteric vessels was high. According to the stratification adopted based on the severity of complications, some predictive factors have been identified. Future studies with larger cohorts of patients are needed to confirm these results.

Operative surgical procedures; Pancreatectomy; Postoperative complications; Morbidity; Pancreatic fistula


ARTIGO ORIGINAL

Fatores preditivos de morbidade nas ressecções pancreáticas esquerdas

Fábio Athayde Veloso Madureira, TCBC-RJI; Philippe GrèsII; Rodrigo Rodrigues VasquesIII; Hugues LevardIV; Bruto RandoneIV; Brice GayetIV,V

ICirurgião do Hospital Federal da Lagoa (R.J., Brasil)

IICirurgião do Centro Médico Nicolas de Pontoux, Chalon-Sur-Saône, França

IIICirurgião do Instituto Zilberstein. São Paulo, Brasil

IVCirurgião do Hospital Simone Veil, Eaubonne-Montmorency, France

VProfessor da Universidade Paris Descartes, Paris, França

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Fábio Athayde Veloso Madureira E-mail: fabio.madureir@gmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar a morbidade pós-operatória e investigar a existência de seus fatores preditivos.

MÉTODOS: O estudo foi realizado de forma retrospectiva, a partir de uma base de dados mantida de forma prospectiva. De 1994 a 2008, 100 pacientes consecutivos foram submetidos à ressecções pancreaticas esquerdas. A principal variável de interesse foi a morbidade pós-operatória, tendo diversas outras características da população sido registradas simultaneamente. Posteriormente, para a análise de fatores preditivos de morbidade pós-operatória o subgrupo de pacientes que foi submetido aos procedimentos de pancreatectomia distal com preservação do baço (n=65) foi analisado separadamente quanto à relevância das diferentes técnicas de secção do parênquima pancreático, assim como, outros possíveis fatores preditivos à ocorrência de morbidade pós-operatória.

RESULTADOS: Considerando-se juntamente todas as ressecções pancreáticas esquerdas realizadas, a ocorrência de complicações globais, de complicações relevantes e graves foi 55%, 42% e 20%, respectivamente. Os fatores que se mostraram preditivos à ocorrência de morbidade pós-operatória após pancreatectomia distal com preservação do baço foram a técnica de secção do parênquima pancreático, idade, índice de massa corporal e a realização de operação abdominal concomitante.

CONCLUSÃO: A morbidade associada às ressecções pancreáticas, à esquerda dos vasos mesentéricos superiores, foi importante. De acordo com a estratificação adotada baseada na gravidade das complicações, alguns fatores preditivos foram identificados. Estudos futuros com coortes maiores de pacientes são necessários para confirmar tais resultados.

Descritores: Procedimentos cirúrgicos operatórios. Pancreatectomia. Complicações pós-operatórias. Morbidade. Fístula pancreática.

INTRODUÇÃO

Ressecções pancreáticas esquerdas (Rpe) são procedimentos cirúrgicos associados à importante morbidade pós-operatória, variando de 4% a 60% nas séries relatadas1-12. Diferentes definições de morbidade têm sido adotadas nestas séries, dificultando a interpretação de seus resultados13-19. Visando solucionar este problema, realizou-se uma reunião de consenso do International Study Group on Pancreatic Fistula (ISGPF) com o objetivo de se estabelecer uma definição para uma das principais complicações pós-pancreatectomias, a fístula pancreática (Fp)15.

A técnica de secção do parênquima pancreático, durante ressecções pancreáticas, tem sido citada por diversos autores como um dos fatores preditivos em potencial da fístula pancreática 4,8,10,12,20-22. Várias técnicas vem sendo utilizadas, refletindo o desconhecimento quanto à superioridade de determinada técnica sobre outra. Este fato ocorre principalmente devido às limitações metodológicas dos estudos (viés de seleção e definições de morbidade) ou à ausência de diferenças significativas entre os resultados7,11,22.

Motivados por essa falta de evidências, com o presente estudo, os autores pretenderam avaliar a experiência do Institut Mutualiste Montsouris (Paris, França) na realização de ressecções pancreáticas à esquerda dos vasos mesentéricos superiores, com enfoque na determinação da morbidade pós-operatória e de seus fatores preditivos.

MÉTODOS

O estudo foi realizado de forma retrospectiva, a partir de uma base de dados mantida de forma prospectiva. De 1994 a 2008, 100 pacientes consecutivos foram submetidos à ressecções pancreáticas esquerda. A principal variável de interesse foi a morbidade pós-operatória. As Rpe incluíram procedimentos de esplenopancreatectomia (Spl-Pd), pancreatectomia distal com preservação do baço (Pd) e enucleações de lesões localizadas à esquerda dos vasos mesentéricos superiores. Devido à heterogeneidade do grupo, para a investigação de fatores preditivos de morbidade pós-operatória foram estudados apenas o subgrupo de pacientes submetidos à Pd (n=65). As morbidade pós-operatórias, bem como, características dos pacientes, variáveis relativas aos períodos pré e pós-operatórios, foram registrados em um banco de dados e resumidos na tabela 1.

Padronizou-se morbidade e complicações como sinônimo e foram definidas como quaisquer eventos adversos abdominais ocorridos nos períodos intra ou pós-operatórios. Fístulas pancreáticas foram definidas como qualquer volume de líquido rico em amilase (superior a três vezes a concentração normal sérica de amilase), obtido de dreno ou punção percutânea, após o terceiro dia de pós-operatório. As fístulas pancreáticas foram assim definidas e classificadas conforme o consenso do ISGPF15.

Complicações foram classificadas conforme proposta de Dindo18, adaptada por De Oliveira14, onde foram divididas em cinco categorias de acordo com a gravidade dos eventos. Nesta classificação, complicações tipos I e II foram eventos simples e que não necessitaram de tratamento invasivo; tipo III eventos que necessitaram de abordagens invasivas de tratamento, onde III-A exigiu drenagem percutânea sob anestesia local e III-B exigiu reintervenção cirúrgica; tipo IV define a situação em que o paciente se apresentava em mau estado geral, com comprometimento de, pelo menos, um sistema orgânico (respiratório, renal, medular etc.) e, geralmente, encaminhamento ao CTI; e tipo V define os eventos que culminaram em óbito ocorrido até o trigésimo dia após o primeiro procedimento cirúrgico. Visando-se investigar a existência de fatores preditivos de complicações pós-operatórias, qualificamos estes cinco eventos (I-V) em três tipos de complicações: não relevantes, relevantes, e graves; definidos da seguinte forma: eventos de gravidade inferior a III-a, complicações não relevantes (I e II); eventos de gravidade igual ou superior a III-a, complicações relevantes; e as mais graves do que III-a (III-B, IV e V), complicações graves.

Para a secção do parênquima pancreático foram utilizadas diferentes técnicas: tesoura ultrassônica (Ultracision™); tesoura auxiliada por coagulação bipolar "de resgate" (pinça bipolar de Gayet); grampeador linear-cortante; além de outras menos frequentes. Em relação à utilização de grampeador para a abordagem do parênquima pancreático, a "linha de grampeamento" foi reforçada com pontos de polydioxanona (PDS) e cargas de grampeador vascular foram utilizadas. Três modelos de staplers foram utilizados no decorrer da experiência. Até 2006, Endo-GIA™ 30-45mm e ETS 30/45mm. Após 2006, Echelon 60mm substituiu os modelos anteriores. Em relação à técnica envolvendo o uso de tesoura e coagulação bipolar "de resgate", o coto pancreático foi fechado com pontos de PDS conforme técnica apelidada em "boca de peixe" (biselamento das bordas do coto pancreático residual para melhor aproximação das bordas).

A preservação esplênica foi priorizada, mesmo quando houve comprometimento da artéria esplênica23. Em relação às EN, avaliação através de ultrasonografia intra-operatória foi rotineiramente realizada visando-se estimar a proximidade da lesão com o ducto pancreático. A administração de medicação antissecretora (derivados de somatostatina) não foi rotineira. Ao fim dos procedimentos cirúrgicos (operatórios?), geralmente um dreno tubular com leve aspiração (tipo Haemovac®) foi posicionado próximo à borda do coto pancreático residual. Este dreno foi mantido durante os primeiros sete dias, após este período, uma tomografia computadorizada (TC) foi rotineiramente realizada visando excluir a presença de coleções líquidas residuais.

Na análise estatística, complicações globais, relevantes e graves foram utilizadas com desfechos independentes nas análises univariadas e multivariadas de fatores preditivos. Para análises univariadas foram utilizados os testes de qui-quadrado e Fisher para as variáveis qualitativas. Para as analises multivariadas foi utilizado o modelo de regressão logística. Visando testar a independência (confirmar) dos fatores preditivos, as variáveis que demonstraram tendências à significância nas análises univariadas (p=0,15) foram incluídas nos modelos de regressão logística. Algumas das variáveis que entraram nas análises univariadas foram: vias de acesso cirúrgico (laparotomia vs. laparoscópica); malignidade vs. benignidade; dimensões do tumor; sexo; idade; IMC; duração do procedimento cirúrgico; administração de derivados de somatostatina; posicionamento de dreno intraoperatório; preservação esplênica; períodos nos quais os procedimentos cirúrgicos foram realizados (1994-2001 vs. 2002-2008); operação abdominal concomitante; ligadura eletiva do ducto pancreático; escore da ASA; e técnicas de secção do parênquima pancreático.

Todos os testes foram bicaudais; o valor de p<0,05 foi considerado como significante.

Este estudo foi aprovado pelos Comitês de Ética em Pesquisa das Instituições de origem dos dados e de origem do pesquisador (Protocolo 134/08 CEP-HUCFF).

RESULTADOS

Na morbidade pós-operatória, considerando as Rpe (n=100), a incidência global de complicações, de complicações não relevantes, relevantes e graves foi 55%, 13%, 42% e 20%, respectivamente. Considerando-se somente as Pd (n=65), a incidência global de complicações, de complicações não relevantes (£ II), relevantes (e" III-a) e graves (III-B) foi 59%, 17%, 42% e 18%, respectivamente. Em relação especificamente às Fp, estas incidências foram de 24%, 4,5%, 20% e 4,5%, respectivamente. As complicações incluíram, além de FP, hemorragias em 9%, coleções em 15% e abscessos em 16%. Não houve mortalidade durante o procedimento operatório.

Na análise univariada, idade e IMC foram preditivos para a ocorrência de complicações globais. Na análise multivariada, essas duas variáveis permaneceram como tais (p<0,05). A mediana das idades foi 53 anos naqueles indivíduos com complicações (dp=15,4) e 61 anos naqueles sem complicações (dp=12,8). Da mesma forma, a mediana do IMC foi 24kg/m2 naqueles com complicações (dp=3,8) e 20kg/m2 naqueles sem complicações (dp=2,6).

De acordo com a estratificação de complicações adotada, as complicações não relevantes ocorreram em apenas 16,7% dos procedimentos. Por serem raros e sem relevância clínica, uma análise mais detalhada não foi realizada. Para as complicações relevantes, resultados da análise univariada mostraram uma maior morbidade ao se usar uma tesoura ultrassônica em comparação com a tesoura bipolar (p=0,01 OR=13; IC95%=1,3 125). Estes resultados foram confirmados na análise multivariada (p=0,03 OR=13; IC95%=1,2 140). Embora a abordagem cirúrgica (laparotomia versus laparoscópica) tenha mostrado significância estatística limítrofe na análise univariada, isso não se confirmou na análise multivariada.

Em relação às complicações graves, a análise univariada sugere uma morbidade significativamente maior ao se usar grampeador comparado à tesoura bipolar (p=0,01 40% e 5,5%, respectivamente). Estes resultados foram confirmados na análise multivariada (p=0,01 OR=10,9; IC95%=1,72 69,2).

O mesmo ocorreu com a variável "operação abdominal concomitante" cujos resultados também sugerem maior morbidade quando estes procedimentos foram realizados, comparando-se a quando não foram realizados (p=0,03 50% e 14%, respectivamente), o que também se confirmou na análise multivariada (p=0,04 OR=7,6; IC95%=1,05 54,7).

Outras variáveis analisadas foram a abordagem cirúrgica (laparotomia vs. laparoscópica) e período de tempo das intervenções (1994-2001 versus 2002-2008). Embora ambas as variáveis tenham mostrado significância limítrofe na análise univariada, isso não se confirmou na análise multivariada.

DISCUSSÃO

As Rpe são procedimentos considerados seguros, com uma taxa de mortalidade próxima de zero, em centros especializados1-3,7,11,12,24-29, o que dificulta a realização de estudos de fatores preditivos de mortalidade pós-operatória. Por outro lado, há importante morbidade pós-operatória associada, com destaque para as fístulas pancreáticas7,17,28-33, tornando tal avaliação de fatores de risco factível e de grande interesse clínico.

Para a realização destes tipos de análises é fundamental que sejam utilizadas definições de morbidade padronizadas7,10,14-18,21. Antes da publicação de DeOliveira14, as definições de morbidade utilizadas eram as mais diversas, explicando a variabilidade de seus resultados. Somente após a adoção de definições uniformes de morbidade é que a aferição destes eventos se tornou mais precisa, assim como, foi possível a investigação de possíveis fatores preditivos de morbidade pós-operatória. Alguns destes fatores preditivos em potenciais já previamente investigados são: doença pancreática subjacente, o papel da preservação do baço12,29,30, uso de derivados da somatostatina, diferentes técnicas de secção do parênquima pancreático5,10,21 e outros4,8,20.

Goh et al. relataram índices de morbidade global de 47%, incluindo Fp em 31% dos casos. Sobre a Fp, a ligadura do ducto pancreático e esplenectomia foram fatores preditivos de ocorrência12. Ferrone et al. relataram índices de Fp de 29%. Nesta série, o coto pancreático foi seccionado com lâmina de bisturi em 49% ou através de grampeador em 19% dos casos. Contrariamente à técnica de secção do parênquima pancreático, que neste estudo não se mostrou um fator preditivo de Fp, o IMC (>30kg/m2) e a ocorrência de operação abdominal concomitante se confirmaram como tais11.

Em relação ao método de secção do parênquima pancreático são descritas várias técnicas, das quais duas se destacam por serem as mais frequentemente utilizadas: o grampeamento (corte e grampeamento com grampeador mecânico) e secção com lâmina fria (bisturi ou tesoura)5,7,10,11. Kleef et al. mostraram que a adoção do grampeador se mostou um fator preditivo para Fp (p=0,003). Estes autores relataram uma incidência cerca de duas vezes maior de Fp após usar grampeadores, comparado a quando se utilizou lâmina de bisturi (OR=2:56, IC95%=1,18 5,93)21. No entanto, esta definição de Fp foi mais seletiva do que a definição do ISGPF15. De forma oposta, uma meta-análise mostrou uma em favor da técnica de grampeamento (menor índice de Fp) quando comparada ao uso do bisturi7. No entanto, estes resultados foram influenciados pela inclusão de pequenos estudos e outras limitações metodológicas dos estudos (viés de seleção e também definições heterogêneas de morbidade).

No presente estudo, embora 55% dos procedimentos tenham resultado em complicações, eventos graves, dentre eles as fístulas graves, ocorreram em somente 20% e 6%, respectivamente. O manejo destes eventos foi limitado à drenagens percutâneas em mais de 70% dos casos, alcançando 80% nos casos de fístulas. Como justificativa para a escolha do subgrupo de pacientes submetidos aos procedimentos de Pd para as análises de fatores preditivos, consideramos que incluindo todos as Rpe, tais resultados seriam prejudicados pela heterogeneidade dos procedimentos cirúrgicos realizados e demais variáveis de confusão relacionadas; além disso, o grupo Pd se mostrou representativo do grupo total de Rpe (Tabela 1).

Quanto aos fatores preditivos identificados, IMC e a realização de operação abdominal concomitante se confirmaram como fatores preditivos de complicações globais e graves, de forma semelhante aos resultado relatados por Ferrone et al.11.

Os resultados do presente estudo sugerem também que o uso de tesoura ultrassônica correlacionou-se com uma incidência quase dez vezes maior de complicações (morbidade geral) do que o uso de lâmina fria. O mesmo ocorreu quando se comparou o uso de grampeador ao uso da lâmina fria em relação ao desfecho complicações graves; além disso, a realização de operação abdominal concomitante culminou em uma incidência quase oito vezes maior de complicações graves quando comparada a sua não realização. Para explicar estes resultados, alguns detalhes sobre a coorte de pacientes estudada devem ser apontados (Tabela 1): aproximadamente metade dos procedimentos foram realizados por via laparoscópica; a preservação do baço foi possível em cerca de 80% das Rpe (n=80), 95% de Pd (n=62) e, onde a artéria esplênica foi preservada, em 58,5% das Pd (n=38). Os tumores malignos representaram cerca de 65% das lesões operadas, demonstrando a posição dos autores em favor de uma abordagem laparoscópica também para ressecções de tumores pancreáticos malignos9,13. Tal postura contrasta com grande parte das outras séries publicadas, nas quais a abordagem laparoscópica raramente tem predominado1,3,11,12,14,21,27-33, há menor índice de preservação esplênica, assim como, não predominam tumores malígnos nas casuísticas13.

Em relação às limitações do estudo, a natureza retrospectiva incorre inevitavelmente em um viés de seleção. A pequena população do estudo impede que na análise multivariada seja possível identificar pequenas diferenças estatísticas (erro tipo 2), erro este que somente poderia ser evitado ao se conceber um ensaio clínico controlado.

Com base nos resultados deste estudo, pode-se concluir que idade, IMC e operação abdominal concomitante se mostraram como fatores preditivos de morbidade pós-pancreatectomia distal com preservação do baço; além disso, o método de secção do parênquima pancreático se mostrou fator preditivo de complicações relevantes ou graves, o que permite aos autores sugerir utilização de lâmina em relação às demais técnicas. Devido à sua concepção metodológica, este estudo deve ser considerado um estudo piloto e análises de coortes maiores, multicêntricas, devem ser estimuladas para confirmar as direções para as quais apontam os resultados deste estudo.

Recebido em 22/04/2012

Aceito para publicação em 06/07/2012

Conflito de interesse: nenhum

Fonte de financiamento: nenhuma

Trabalho realizado no Institut Mutualiste Montsouris, Paris, France.

  • 1. Lillemoe KD, Kaushal S, Cameron JL, Sohn TA, Pitt HA, Yeo CJ. Distal pancreatectomy: indications and outcomes in 235 patients. Ann Surg. 1999;229(5):693-8; discussion 698-700.
  • 2. Adam U, Makowiec F, Riediger H, Trzeczak S, Benz S, Hopt UT. Distal pancreatic resectionindications, techniques and complications. Zentralbl Chir. 2001;126(11):908-12.
  • 3. Balcom JH 4th, Rattner DW, Warshaw AL, Chang Y, Fernandez-del Castillo C. Ten-year experience with 733 pancreatic resections: changing indications, older patients, and decreasing length of hospitalization. Arch Surg. 2001;136(4):391-8.
  • 4. Fahy BN, Frey CF, Ho HS, Beckett L, Bold RJ. Morbidity, mortality, and technical factors of distal pancreatectomy. Am J Surg. 2002;183(3):237-41.
  • 5. Takeuchi K, Tsuzuki Y, Ando T, Sekihara M, Hara T, Kori T, et al. Distal pancreatectomy: is staple closure beneficial? ANZ J Surg. 2003;73(11):922-5.
  • 6. Christein JD, Kendrick ML, Iqbal CW, Nagornev DM, Farnell MB. Distal pancreatectomy for resectable adenocarcinoma of the body and tail of the pancreas. J Gastrointest Surg. 2005;9(7):922-7.
  • 7. Knaebel HP, Diener MK, Wente MN, Büchler MW, Seiler CM. Systematic review and meta-analysis of technique for closure of the pancreatic remnant after distal pancreatectomy. Br J Surg. 2005;92(5):539-46.
  • 8. Pannegeon V, Pessaux P, Sauvanet A, Vullierme MP, Kianmanesh R, Belghiti J. Pancreatic fistula after distal pancreatectomy: predictive risk factors and value of conservative treatment. Arch Surg. 2006;141(11):1071-6; discussion 1076
  • 9. Palanivelu C, Shetty R, Jani K, Sendhilkumar K, Rajan PS, Maheshkumar GS. Laparoscopic distal pancreatectomy: results of a prospective non-randomized study from a tertiary center. Surg Endosc. 2007;21(3):373-7.
  • 10. Ridolfini MP, Alfieri S, Gourgiotis S, Di Miceli D, Rotondi F, Quero G, et al. Risk factors associated with pancreatic fistula after distal pancreatectomy, which technique of pancreatic stump closure is more beneficial? World J Gastroenterol. 2007;13(38):5096-100.
  • 11. Ferrone CR, Warshaw AL, Rattner DW, Berger D, Zheng H, Rawal B, et al. Pancreatic fistula rates after 462 distal pancreatectomies: staplers do not decrease fistula rates. J Gastrointest Surg. 2008;12(10):1691-7; discussion 1697-8.
  • 12. Goh BK, Tan YM, Chung YF, Cheow PC, Ong HS, Chan WH, et al. Critical appraisal of 232 consecutive distal pancreatectomies with emphasis on risk factors, outcome, and management of the postoperative pancreatic fistula: a 21-year experience at a single institution. Arch Surg. 2008;143(10):956-65.
  • 13. Briggs CD, Mann CD, Irving GR, Neal CP, Peterson M, Cameron IC, et al. Systematic review of minimally invasive pancreatic resection. J Gastrointest Surg. 2009;13(6):1129-37.
  • 14. DeOliveira ML, Winter JM, Schafer M, Cunningham SC, Cameron JL, Yeo CK, et al. Assessment of complications after pancreatic surgery: A novel grading system applied to 633 patients undergoing pancreaticoduodenectomy. Ann Surg. 2006;244(6):931-7; discussion 937-9.
  • 15. Bassi C, Dervenis C, Butturini G, Fingerhut A, Yeo C, Izbicki J, et al. Postoperative pancreatic fistula: an international study group (ISGPF) definition. Surgery. 2005;138(1):8-13.
  • 16. Bassi C, Butturini G, Molinari E, Mascetta G, Salvia R, Falconi M, et al. Pancreatic fistula rate after pancreatic resection. The importance of definitions. Dig Surg. 2004;21(1):54-9.
  • 17. Behrman SW, Rush BT, Dilawari RA. A modern analysis of morbidity after pancreatic resection. Am Surg. 2004;70(8):675-82; discussion 682-3.
  • 18. Dindo D, Demartines N, Clavien PA. Classification of surgical complications: a new proposal with evaluation in a cohort of 6336 patients and results of a survey. Ann Surg. 2004;240(2):205-13.
  • 19. Martin RC 2nd, Brennan MF, Jaques DP. Quality of complication reporting in the surgical literature. Ann Surg. 2002;235(6):803-13.
  • 20. Sledzianowski JF, Duffas JP, Muscari F, Suc B, Fourtanier F. Risk factors for mortality and intra-abdominal morbidity after distal pancreatectomy. Surgery. 2005;137(2):180-5.
  • 21. Kleeff J, Diener MK, Z'graggen K, Hinz U, Wagner M, Bachmann J, et al. Distal pancreatectomy: risk factors for surgical failure in 302 consecutive cases. Ann Surg. 2007;245(4):573-82.
  • 22. Pierce RA, Spitler JA, Hawkins WG, Strasberg SM, Linehan DC, Halpin VJ, et al. Outcomes analysis of laparoscopic resection of pancreatic neoplasms. Surg Endosc. 2007;21(4):579-86.
  • 23. Fernández-del Castillo C, Rattner DW, Warshaw AL. Standards for pancreatic resection in the 1990s. Arch Surg. 1995;130(3):295-9; discussion 299-300.
  • 24. Büchler MW, Friess H, Wagner M, Kulli C, Wagener V, Z'Graggen K. Pancreatic fistula after pancreatic head resection. Br J Surg. 2000;87(7):883-9.
  • 25. McClusky DA 3rd, Skandalakis LJ, Colborn GL, Skandalakis JE. Harbinger or hermit? Pancreatic anatomy and surgery through the agespart 3. World J Surg. 2002;26(12):1512-24.
  • 26. Büchler MW, Wagner M, Schmied BM, Uhl W, Friess H, Z'graggen K. Changes in morbidity after pancreatic resection: toward the end of completion pancreatectomy. Arch Surg. 2003;138(12):1310-4; discussion 1315.
  • 27. Resnick AS, Drebin JA. Distal pancreatectomy. In: Lowy AM, Leach SD, Philip P, editors. Pancreatic cancer. New York: Springer; 2008. p.341-50.
  • 28. Dimick JB, Welch HG, Birkmeyer JD. Surgical mortality as an indicator of hospital quality: the problem with small sample size. JAMA. 2004;292(7):847-51.
  • 29. Carrère N, Abid S, Julio CH. Spleen-preserving distal pancreatectomy with excision of splenic artery and vein: a case-matched comparison with conventional distal pancreatectomy with splenectomy. World J Surg. 2007;31(2):375-82.
  • 30. Kah Heng CA, Salleh I, San TS, Ying F, Su-Ming T. Pancreatic fistula after distal pancreatectomy: incidence, risk factors and management. ANZ J Surg. 2010;80(9):619-23.
  • 31. Yoshioka R, Saiura A, Koga R, Seki M, Kishi Y, Morimura R, et al. Risk factors for clinical pancreatic fistula after distal pancreatectomy: analysis of consecutive 100 patients. World J Surg. 2010;34(1):121-5.
  • 32. Reeh M, Nentwich MF, Bogoevski D, Koenig AM, Gebauer F, Tachezy M, et al. High surgical morbidity following distal pancreatectomy: still an unsolved problem. World J Surg. 2011;35(5):1110-7.
  • 33. Subhedar PD, Patel SH, Kneuertz PJ, Maithel SK, Staley CA, Sarmiento JM, et al. Risk factors for pancreatic fistula after stapled gland transection. Am Surg. 2011;77(8):965-70.
  • Endereço para correspondência:
    Fábio Athayde Veloso Madureira
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Jan 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      22 Abr 2012
    • Aceito
      06 Jul 2012
    Colégio Brasileiro de Cirurgiões Rua Visconde de Silva, 52 - 3º andar, 22271- 090 Rio de Janeiro - RJ, Tel.: +55 21 2138-0659, Fax: (55 21) 2286-2595 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
    E-mail: revista@cbc.org.br