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Efeito da implementação de diretriz para profilaxia de tromboembolismo venoso em pacientes cirúrgicos

Resumos

INTRODUÇÃO: Estratégias efetivas para profilaxia do tromboembolismo venoso (TEV) são amplamente disponíveis, mas são ainda subutilizadas, principalmente no nosso meio. OBJETIVO: Avaliar o efeito da implementação de diretriz para profilaxia do TEV, em pacientes cirúrgicos, sobre a conduta da equipe de saúde na prescrição dessa profilaxia. Método. Estudo retrospectivo pré-intervenção - pós-intervenção. Prontuários de 150 pacientes antes e 150 depois da implementação de uma diretriz para a profilaxia (AID e DID) foram sorteados dentre pacientes de mais de 40 anos internados para cirurgia maior abdominal ou ortopédica. Foram registrados dados demográficos, referência a risco de TEV no prontuário, prescrição de profilaxia para TEV e diagnóstico de TEV durante a internação. RESULTADOS: Não houve diferença entre os dois grupos, AID e DID, quanto aos dados demográficos e ao tempo de profilaxia (5,6 x 6,6 dias). A frequência de profilaxia AID x DID antes da cirurgia foi: profilaxia farmacológica (PF), 6% x 9%; meias de compressão graduada (MCG), 4% x 3%; compressão pneumática intermitente (CPI), 2% x 3%. Após cirurgia: PF 53% x 53%; MCG, 23% x 40% (P<0,05); CPI, 26% x 32% . No total, AP, foi prescrita profilaxia para 60,5% dos pacientes AID e para 66,5% DID, mas a profilaxia foi considerada adequada em 34% dos pacientes AID e em 32% DID. Conclusão. A adoção do protocolo, embora com maior a preocupação com a profilaxia, traduzida pelo aumento na prescrição de MCG, melhorou minimamente sua qualidade, indicando a necessidade de outras intervenções ativas e contínuas para aumentar a aderência ao mesmo.

Trombose venosa; Embolia pulmonar; Prevenção & controle


INTRODUCTION: Effective strategies for prevention of venous thromboembolism (VTE) are widely available, but still remain underused, mainly in our country. OBJECTIVE: Our aim was to verify whether the implementation of a guideline for VTE prophylaxis for surgical patients influenced the prescription of prophylaxis by the medical staff. METHODS: This was a retrospective preintervention-postintervention study. Charts of 150 patients before guideline implementation (BGI) and 150 after (AGI) were randomized among all patients admitted during one year in each period. Inclusion criteria: >40 years-old, major abdominal or orthopedic surgeries. Exclusion criteria: Incomplete files and use of anticoagulants for any reason at admission. Data registered: demographic data, reference to VTE risk factors, VTE prophylaxis prescription, diagnosis of deep venous thrombosis or pulmonary embolism during hospitalization. Results. The two groups, BGI and AGI were similar for demographic data and duration of prophylaxis (5.6 x 6.6 days). Frequency of prophylaxis in percentages was BGI x AGI respectively, before surgery: pharmacologic prophylaxis (PP), 6 x 9; graduated compression stockings (GCS), 4 x 3; intermittent pneumatic compression (IPC), 2 x 3. After surgery: PP, 53 x 53; GCS, 23 x 40 (P<0.05); IPC, 26 x 32. Including all patients, prophylaxis was prescribed for 60.5% BGI and 66.5% AGI, but was considered adequate only in 34% BGI and 32% AGI. CONCLUSION: Adoption of a guideline, although increasing concern about prophylaxis, expressed by greater use of GCS, only minimally improved quality of prophylaxis , indicating that other active and continuous interventions are necessary to enforce compliance.

Venous thrombosis; Pulmonary embolism; Prevention & control


ARTIGO ORIGINAL

Efeito da implementação de diretriz para profilaxia de tromboembolismo venoso em pacientes cirúrgicos

Francisco Humberto de Abreu MaffeiI, * * Correspondência: Rua Engenheiro Edgar Egídio de Sousa, n°303/ 51, CEP 01233-020, São Paulo - SP. fhmaffei@uol.com.br ; Ana Claudia SatoII; Francisco Torggler FilhoIII; Sandra Cristina da SilvaIV; Alvaro AtallahV

IProfessor Emérito da Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP e Pesquisador do Instituto de Ensino e Pesquisa - Hospital Sírio-Libanês, São Paulo,SP

IIEnfermeira de Pesquisa do Instituto de Ensino e Pesquisa-Hospital Sírio-Libanês, São Paulo,SP

IIIMédico Assistente do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP, São Paulo,SP

IVDoutora em Ciências da Saúde da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo - USP e Coordenadora de Qualidade do Hospital Sírio-Libanês, São Paulo, SP

VProfessor Titular do Dep artamento de Medicina da Escola Paulista de Medicina - UNIFESP, São Paulo, SP

RESUMO

INTRODUÇÃO: Estratégias efetivas para profilaxia do tromboembolismo venoso (TEV) são amplamente disponíveis, mas são ainda subutilizadas, principalmente no nosso meio.

OBJETIVO: Avaliar o efeito da implementação de diretriz para profilaxia do TEV, em pacientes cirúrgicos, sobre a conduta da equipe de saúde na prescrição dessa profilaxia. Método. Estudo retrospectivo pré-intervenção - pós-intervenção. Prontuários de 150 pacientes antes e 150 depois da implementação de uma diretriz para a profilaxia (AID e DID) foram sorteados dentre pacientes de mais de 40 anos internados para cirurgia maior abdominal ou ortopédica. Foram registrados dados demográficos, referência a risco de TEV no prontuário, prescrição de profilaxia para TEV e diagnóstico de TEV durante a internação.

RESULTADOS: Não houve diferença entre os dois grupos, AID e DID, quanto aos dados demográficos e ao tempo de profilaxia (5,6 x 6,6 dias). A frequência de profilaxia AID x DID antes da cirurgia foi: profilaxia farmacológica (PF), 6% x 9%; meias de compressão graduada (MCG), 4% x 3%; compressão pneumática intermitente (CPI), 2% x 3%. Após cirurgia: PF 53% x 53%; MCG, 23% x 40% (P<0,05); CPI, 26% x 32% . No total, AP, foi prescrita profilaxia para 60,5% dos pacientes AID e para 66,5% DID, mas a profilaxia foi considerada adequada em 34% dos pacientes AID e em 32% DID. Conclusão. A adoção do protocolo, embora com maior a preocupação com a profilaxia, traduzida pelo aumento na prescrição de MCG, melhorou minimamente sua qualidade, indicando a necessidade de outras intervenções ativas e contínuas para aumentar a aderência ao mesmo.

Unitermos: Trombose venosa. Embolia pulmonar. Prevenção & controle.

INTRODUÇÃO

O tromboembolismo venoso (TEV) designação que inclui a trombose venosa e embolia pulmonar, é uma doença comum e importante por sua mortalidade e morbidade 1,2. Em nosso meio, foram estimadas cerca de 28.000 internações por ano de pacientes do Serviço Unificado de Saúde (SUS) em consequência ao TEV, dos quais 4.247 foram a óbito 3. Dados de autopsia mostram uma incidência similar aos da literatura internacional, variando de 4% a 19%,, sendo a causa de óbito em 3,7% a 5%. 4-8. A trombose venosa profunda (TVP) dos membros inferiores, principal fonte de êmbolos pulmonares, ocorre na população entre 0,2 e 0,7 casos por 1000 habitantes/ano 9 e para nosso meio foi estimada incidência em 0,6 casos /1000 habitantes/ano 10.

A complicação tardia da TVP não-mortal, mas causadora de grandes problemas socioeconômicos, é a insuficiência venosa crônica (IVC), neste caso também chamada de síndrome pós-trombótica (SPT), que ocorre em 20% a 50% dos pacientes com TVP tratados com anticoagulação 11- 14.

O TEV ocorre como complicação de outras afecções cirúrgicas ou clínicas em cerca de 70% dos casos 10. Utilizando métodos objetivos de diagnóstico, como a flebografia ou o fibrinogênio marcado, a incidência de TVP em pacientes submetidos a cirurgia geral tem sido estimada em 15%-40% e em grande cirurgia ortopédica entre 40% e 60%, inclusive em nosso meio 15, 16, 17.

Sabe-se hoje que fatores genéticos e circunstanciais aumentam o risco de TEV e que pacientes internados apresentam um ou mais desses fatores, que tem efeito cumulativo 18,19,20. Baseadas na frequência de TEV e no número de fatores presentes em cada grupo de doentes, classificações de risco têm sido propostas. De outro lado a tromboprofilaxia para pacientes internados, cirúrgicos, ortopédicos ou clínicos está hoje baseada em sólidos princípios e em evidência científica, justificando sua indicação para pacientes considerados de risco 21,22 .

Diferentes protocolos visando à classificação dos pacientes de acordo com o risco de TEV, o alerta aos médicos e orientação de profilaxia têm sido propostos, tanto com a finalidade de levantamento de dados, como de padronização de conduta em diferentes hospitais 22-27.

No Hospital Sírio-Libanês (HSL) de São Paulo, em 2004, foi criada uma Comissão Multidisciplinar e Multiprofissional que elaborou uma diretriz para padronização da profilaxia de trombose venosa profunda aguda e de tromboembolismo pulmonar em pacientes adultos internados para tratamento cirúrgico ou clínico, baseada em ensaios clínicos controlados, revisões e em consensos atualizados publicados na literatura nacional e internacional. Para tal foi realizado um levantamento bibliográfico nas bases de dados MEDLINE, LILACS, Centro Cochrane do Brasil, instituições governamentais internacionais e nacionais, utilizando-se estratégias de busca padronizadas para a seleção dos artigos pertinentes ao protocolo. Essa diretriz foi aprimorada em 3 reuniões abertas com participação de todo corpo clínico interessado. Em sua versão final a Diretriz incluiu: algoritmo integrado, tabela de recomendações para profilaxia, protocolo de identificação de pacientes com risco de TEV, a ser preenchido por uma enfermeira na internação, e um alerta a ser afixados aos prontuários dos pacientes. A diretriz teve ampla divulgação pelos convites para as reuniões de consenso, pelo envio na íntegra a todo o corpo clínico e impressa, via correio, para o conjunto dos médicos que foram responsáveis por 80% das internações do hospital nos últimos 12 meses. Todos os chefes de equipes de retaguarda receberam junto à diretriz impressa, uma carta institucional de apresentação da mesma. Houve divulgação também por cartazes nos elevadores e em artigo publicado no Jornal do Médico. Além disso, nos andares onde foi implementada, a enfermeira após fazer a avaliação de risco pelo algorítmo da diretriz, o apresentava pessoalmente ao médico cuidador. Esta diretriz foi implantada, inicialmente, a partir de 2005, em duas unidades de internação de pacientes cirúrgicos, visando verificar sua exequibilidade e praticidade

O objetivo do presente estudo foi o de avaliar o efeito da implementação dessa diretriz para profilaxia do TEV sobre a conduta da equipe de saúde, com relação a essa profilaxia, em pacientes submetidos a cirurgia do aparelho digestivo ou ortopédica no HSL.

A hipótese levantada foi de que após a implementação da diretriz houvesse aumento da preocupação da equipe médica e de enfermagem em relação a presença de fatores de risco para TEV, com consequente aumento na prescrição de medidas profiláticas, de acordo com a padronização proposta.

MÉTODOS

Foi realizado um estudo retrospectivo pré e pós-intervenção de duas amostras de doentes internados, antes da implementação da diretriz (AID) e depois da implementação da diretriz (DID), por meio de revisão dos prontuários. A casuística incluiu pacientes com mais de 40 anos, de ambos os sexos, internados para cirurgia do aparelho digestivo ou cirurgia ortopédica, durante os anos de 2004 (AID) e 2005 (DID), em duas unidades de internação do HSL, cujo porte cirúrgico anotado no banco de dados do centro cirúrgico tivesse sido classificado como médio ou grande. Foram incluídos os pacientes que preenchiam os critérios acima descritos, inclusive os falecidos durante a internação. Foram excluídos pacientes cujos prontuários não pudessem ser recuperados ou fossem ilegíveis ou ainda estivessem com perda de folhas ou registros na anotação médica ou de enfermagem na rotina hospitalar. Foram excluídos também pacientes que tivessem transitado por diversas unidades de internação durante sua estadia, e que nos períodos de pré e pós-operatório não permaneceram nas unidades estudadas, com exceção do pós-operatório imediato na Unidade de Terapia Intensiva. Foram ainda excluídos pacientes que, no momento da internação, fizessem uso de anticoagulantes por qualquer indicação.

A partir de uma listagem do Serviço de Arquivo Médico e Estatístico do Hospital incluindo nome e registro dos pacientes que preenchiam as condições discriminadas foram sorteados, utilizando uma lista de números aleatórios, 150 pacientes AID e 150 DID. Como critério do estudo, metade dos pacientes sorteados foram submetidos à cirurgia ortopédica e outra metade à cirurgia abdominal. De cada paciente sorteado, foi realizada revisão do prontuário, no intuito de buscar informações sobre: dados de identificação, demográficos, diagnóstico, tipo de cirurgia, tipo de anestesia, tempo de cirurgia, tempo de internação, classificação de risco para TEV (moderado ou de alto risco), anotação referente ao risco de TEV, presença de fatores de risco (de acordo com a diretriz), utilização de algum tipo de profilaxia farmacológica (heparina não fracionada, heparina de baixo peso molecular ou cumarínico) ou mecânica (meia elástica de compressão progressiva ou compressão pneumática intermitente) prescrita pelo médico ou adotado pela enfermagem ou fisioterapia; sinais e sintomas de TEV (para TVP: dor, cianose, edema em um ou ambos membros e para EP relato de dispnéia súbita ou falência cárdio-circulatória sem outra causa determinada), diagnóstico clínico de TEV feito por médico, diagnóstico confirmado de TEV (ultrassom ou flebografia para TVP e cintilografia pulmonar ou tomografia computadorizada para EP), tratamento para TEV, óbito (data, causa, realização de autopsia). Essas informações foram anotadas em impresso próprio.

Foi utilizada estatística descritiva das variáveis categóricas, calculando-se a porcentagem sobre o número total de pacientes estudados e das variáveis contínuas, média seguida do desvio padrão ou mediana com limites extremos. Comparações entre grupos foram feitas usando o teste do Qui quadrado.

O estudo foi aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa do HSL em 2 de agosto de 2006 sob o número HSL2006/01.

RESULTADOS

Não houve diferença entre os grupos AID (2004) e DID (2005) quanto aos dados demográficos, as características e tempo de internação dos pacientes encontram-se na Tabela 1.

Todos os pacientes ortopédicos foram por nós classificados como de alto risco, de acordo com a diretriz do HSL, pois foram submetidos à cirurgia de quadril, joelho ou fêmur. Dos submetidos à cirurgia abdominal, 82% AID e 86% DID, foram considerados de alto risco por terem mais de 40 anos e serem portadores de câncer ou de outro fatores adicionais como história prévia de TEV e, os demais, de risco moderado, (pacientes de 40 a 60 anos sem fatores adicionais submetidos a grande cirurgia). Dos 150 pacientes internados DID, 96 tiveram o protocolo sobre fatores de risco preenchido pela enfermagem. Foi anotada pelo médico assistente a classificação de risco no prontuário para apenas um dos pacientes AID e dois DID e a presença de algum fator de risco para 39 pacientes (26%) AID e para 43 (29%) DID. Foram realizados 29 exames ultrassonográficos AIP para TVP, todos normais, e 27 DID, sendo três positivos para TVP. Esses exames foram realizados como rotina, por indicação de alguns dos ortopedistas, no momento da alta dos pacientes, sem que houvesse suspeita clínica de TVP.

Qualquer tipo de profilaxia para TEV foi prescrita pelos médicos antes da realização da cirurgia AID para 8 % dos pacientes, sendo profilaxia farmacológica (PF), 6%, meias de compressão graduada (MCG), 4% e compressão pneumática intermitente (CPI), 2%. DID a frequência de prescrição pré-cirúrgica de profilaxia foi de 9 % , sendo PF 8%, MCG 3% e CPI 3%, Após realização da cirurgia, AID a profilaxia foi prescrita para 61 % dos pacientes, sendo PF 53%, MCG 23% e CPI 26% e DID para 67% dos pacientes, sendo PF 53%, MMC 40% (AIP x DIP < 0,05) e CPI 32%. As frequências de prescrição pelos médicos de profilaxia para cada tipo de cirurgia, após o ato cirúrgico, encontram-se representadas na Figura 1. Como pode-se observar pelos números, em muitos dos pacientes, foram utilizados concomitantemente método farmacológico e mecânico, principalmente MCG, utilização esta prevista como facultativa na Diretriz do HSL.


O tempo de utilização da profilaxia foi inferior ao tempo de internação na maioria dos casos. Levando-se em conta o tempo e o tipo de profilaxia utilizados, houve adequação da profilaxia à diretriz, após cirurgia abdominal de 28% AID e de 24% DID. Para cirurgia ortopédica, essa adequação foi de 40% antes e após a implantação da diretriz (Fig. 2). No total, AP foi prescrita profilaxia para 60,5% dos pacientes AID e para 66,5% DID, mas a profilaxia foi considerada adequada em 34% dos pacientes AID e em 32% DID.


Antes da implantação do protocolo não foi feito nenhum diagnóstico de trombose venosa profunda, sendo feito dois diagnósticos de embolia pulmonar. Após a implantação do protocolo foram feitos três diagnósticos de TVP (dois após cirurgia ortopédica, um após cirurgia abdominal e um diagnóstico de EP após cirurgia ortopédica) . Houve um óbito, cuja causa foi infecção pulmonar.

DISCUSSÃO

O presente estudo, embora observacional, avaliou a efetividade, no mundo real, de uma diretriz para utilização de profilaxia de TEV, implantada em duas unidades de internação, em um hospital privado, em que os pacientes eram de responsabilidade de diferentes médicos independentes.

Nos pacientes estudados, a prescrição de profilaxia para TEV antes da realização de ato cirúrgico foi muito baixa, tanto para pacientes submetidos à cirurgia abdominal como cirurgia ortopédica. Esse baixo uso, aparentemente, não esteve ligado apenas ao medo de hemorragia intraoperatória, eventualmente precipitada pelo uso de anticoagulantes, justificativa para seu início no pós-operatório ou para a utilização de varfarina, que tem retardo no início de sua ação 22, desde que ocorreu também com relação aos métodos mecânicos. No caso do HSL em que a maioria dos doentes provêm de convênios ou de clínica particular, este fato pode ser ligado ao curto período de internação antes da cirurgia, não havendo tempo hábil para seu uso. Quando observamos a frequência de utilização de profilaxia pós-operatória, sua utilização no HSL foi maior que a encontrada na maioria dos hospitais brasileiros estudados 23,24,27-30 . A utilização de meias elásticas de compressão graduada e de aparelhos de compressão pneumática intermitente foi maior do que a descrita em outras instituições do país 27-31, possivelmente pela situação socioeconômica dos pacientes. Com relação à frequência de utilização de uma profilaxia adequada, levando em conta os protocolos usados como referência, nossos dados são similares aos de outros centros em que esse tipo de estudo foi feito, tanto em nosso país como no exterior, chegando a 62,5% dos tratados profilaticamente (40% do total de pacientes) nos casos de cirurgia ortopédica e 48% dos tratados (28% do total), nos casos de cirurgia abdominal24,32-34. Chama também a atenção, a maior utilização da profilaxia pelos cirurgiões ortopédicos que pelos cirurgiões gastrointestinais

Em nosso estudo, embora tenha havido maior preocupação com o tromboembolismo venoso, tanto por parte dos médicos quanto pela equipe de enfermagem, não houve um aumento da utilização dos meios profiláticos de acordo com a diretriz elaborada pelo comitê hospitalar, baseada nas evidências clínicas disponíveis. Estas evidências indicam maior utilização dos métodos farmacológicos, reservando os métodos mecânicos para os casos de maior risco hemorrágico ou para uso associado aos métodos farmacológicos 22 . É interessante observar que o aumento isolado no uso de meias elásticas foi também observado em outros trabalhos em que se acompanhou a implantação de protocolos visando melhoria na tromboprofilaxia 25,35. Mesmo levando-se em conta um certo grau de proteção anti-trombótica propiciada pelas meias elásticas de compressão progressiva 36,37, o resultado da implantação do protocolo ainda deixa a desejar, desde que o tempo de utilização desse método foi freqüentemente de curta duração, quando comparado com o tempo total de internação dos pacientes.

A falta de um resultado mais efetivo na implantação do protocolo de TVP nas duas Unidades de Internação do HSL está, possivelmente, ligada à ausência de continuidade na divulgação do mesmo e, principalmente, na discussão contínua das diretrizes para profilaxia, embora, no início da implantação do protocolo, tenha-se contado com a mobilização do Corpo Clínico do Hospital e com uma campanha de divulgação. Esta continuidade de propagação foi referida como fator importante, em outros estudos considerados de sucesso, tanto nos casos em que foi utilizado um alerta eletrônico para o risco de trombose 25 como em estudos que utilizaram métodos similares aos utilizados no HSL para propiciar um aumento da tromboprofilaxia. 38,39. Por outro lado, parece existir, em um hospital com as características do estudado, uma certa resistência dos médicos ao que ele sente como uma interferência em sua conduta pessoal para com o paciente, devendo portanto esse processo ser mais de contínua conscientização da necessidade da profilaxia que de um indicador da conduta a ser tomada, perante uma classificação de risco realizada por outros membros da equipe de saúde. Um sistema de auditoria dos casos pela equipe responsável pela implementação de diretrizes e o "feedback" aos médicos poderiam também melhorar os resultados obtidos com as mesmas.22.

Como implicações para prática, a análise de nossos resultados pode auxiliar na implantação de outros protocolos que visem uma alteração de conduta dos médicos e demais membros da equipe de saúde e indicam para necessidade de que a implementação de diretrizes inclua um processo contínuo de avaliação de desfechos e correção de falhas detectadas, com discussão de resultados com o corpo clínico, necessitando a intervenção ser duradora até que se alcancem os objetivos desejados.

Como implicações para pesquisa, há necessidade de realização de ensaios clínicos prospectivos e de avaliação do impacto no desenho global e de cada grupo de profissionais da saúde envolvidos no processos.

SUPORTE FINANCEIRO:

Instituto de Ensino e Pesquisa - Hospital Sírio-Libanês, São Paulo

Conflito de interesse: não há

Artigo recebido: 17/7/08

Aceito para publicação: 4/6/09

Trabalho realizado no Hospital Sirio-Libânes, São Paulo,SP

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    Correspondência: Rua Engenheiro Edgar Egídio de Sousa, n°303/ 51, CEP 01233-020, São Paulo - SP.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Nov 2009
    • Data do Fascículo
      2009

    Histórico

    • Aceito
      04 Jun 2009
    • Recebido
      17 Jul 2008
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