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Doses de N e K no tomateiro sob estresse salino: I. Concentração de nutrientes no solo e na planta

Doses of N and K in tomato under saline stress: I. Concentration of nutrients in the soil solution and plant

Resumos

Em geral, culturas tolerantes à salinidade geralmente apresentam maiores teores foliares de certos nutrientes, sugerindo que a adubação em culturas sensíveis poderia elevar os teores desses nutrientes nas folhas, aumentando sua tolerância aos sais. Este trabalho teve o objetivo de estudar os efeitos do N e do K na condutividade elétrica, pH e concentração de nutrientes da solução do solo e nos teores de nutrientes e prolina nas folhas do tomateiro irrigado com água salina. Os tratamentos foram compostos da combinação de três níveis de N (7,5; 15,0 e 22,5 g por planta) e de K (8, 16 e 24 gK2O por planta) aplicados via fertirrigação por gotejamento, no esquema fatorial 3 x 3, com cinco repetições, sendo que à água de irrigação foram adicionados os sais cloreto de sódio e cloreto de cálcio, para obtenção de condutividade elétrica da água de 9,5 dS m-1. As concentrações de NO3 e K na solução do solo e de N e K nas folhas do tomateiro aumentaram com as doses de N e K mas não promoveram redução dos teores de Cl nem de Na nas folhas das plantas. O aumento do teor de prolina com as doses de K e a redução de Cl/N com as doses de N, sugerem que o aumento na adubação potássica e nitrogenada pode ser benéfico para o tomateiro sob condições de salinidade moderada.

Lycopersicon esculentum; prolina; nutrição de plantas


Crops tolerant to salinity generally present higher concentrations of some nutrients in the leaves, suggesting that the fertilization of sensitive crops could increase the contents of these nutrients in the leaves to increase the crop tolerance to salts. This work had the objective of studying the effects of N and K on electrical conductivity, pH and nutrient concentrations of soil solution and on concentration of nutrients and proline in the leaves of tomatos irrigated with saline water. The treatments were composed of the combination of three levels of N (7.5, 15.0 and 22.5 g per plant) and K (8, 16 and 24 g K2O per plant) applied by drip fertigation, in a 3 x 3 factorial scheme with five replications. Sodium chloride and calcium chloride were added to irrigation water for obtaining an electrical conductivity of 9.5 dS m-1. Concentrations of NO3 and K in soil solution and of N and K in the leaves increased with the doses of N and K, but did not promote the reduction of Cl and Na concentrations in the leaves. The increase of the proline concentration with the doses of K and the decrease of Cl/N with the doses of N suggest that over-fertilization with potassium and nitrogen fertilizers could be benefitial for tomato under moderate salinity conditions.

Lycopersicon esculentum; proline; plant nutrition


MANEJO DE SOLO, ÁGUA E PLANTA

Doses de N e K no tomateiro sob estresse salino: I. Concentração de nutrientes no solo e na planta

Doses of N and K in tomato under saline stress: I. Concentration of nutrients in the soil solution and plant

Flávio F. BlancoI; Marcos V. FolegattiII; Diolino Henriques NetoIII

IEmbrapa Meio Norte, Av. Duque de Caxias 5650, CEP 64006-220, Teresina, PI. Fone: (86) 3225-1141, r.252. E-mail:flavio@cpamn.embrapa.br

IIESALQ/USP. Av. Pádua Dias, 11, CEP 13418-900, Piracicaba, SP. Fone: (19) 3429-4217. E-mail: mvfolega@carpa.ciagri.usp.br

IIIINCRA, Terezina, PI. Fone: (86) 3222-1553. E-mail: diolino.neto@tsa.incra.gov.br

RESUMO

Em geral, culturas tolerantes à salinidade geralmente apresentam maiores teores foliares de certos nutrientes, sugerindo que a adubação em culturas sensíveis poderia elevar os teores desses nutrientes nas folhas, aumentando sua tolerância aos sais. Este trabalho teve o objetivo de estudar os efeitos do N e do K na condutividade elétrica, pH e concentração de nutrientes da solução do solo e nos teores de nutrientes e prolina nas folhas do tomateiro irrigado com água salina. Os tratamentos foram compostos da combinação de três níveis de N (7,5; 15,0 e 22,5 g por planta) e de K (8, 16 e 24 gK2O por planta) aplicados via fertirrigação por gotejamento, no esquema fatorial 3 x 3, com cinco repetições, sendo que à água de irrigação foram adicionados os sais cloreto de sódio e cloreto de cálcio, para obtenção de condutividade elétrica da água de 9,5 dS m-1. As concentrações de NO3 e K na solução do solo e de N e K nas folhas do tomateiro aumentaram com as doses de N e K mas não promoveram redução dos teores de Cl nem de Na nas folhas das plantas. O aumento do teor de prolina com as doses de K e a redução de Cl/N com as doses de N, sugerem que o aumento na adubação potássica e nitrogenada pode ser benéfico para o tomateiro sob condições de salinidade moderada.

Palavras-chave:Lycopersicon esculentum, prolina, nutrição de plantas

ABSTRACT

Crops tolerant to salinity generally present higher concentrations of some nutrients in the leaves, suggesting that the fertilization of sensitive crops could increase the contents of these nutrients in the leaves to increase the crop tolerance to salts. This work had the objective of studying the effects of N and K on electrical conductivity, pH and nutrient concentrations of soil solution and on concentration of nutrients and proline in the leaves of tomatos irrigated with saline water. The treatments were composed of the combination of three levels of N (7.5, 15.0 and 22.5 g per plant) and K (8, 16 and 24 g K2O per plant) applied by drip fertigation, in a 3 x 3 factorial scheme with five replications. Sodium chloride and calcium chloride were added to irrigation water for obtaining an electrical conductivity of 9.5 dS m-1. Concentrations of NO3 and K in soil solution and of N and K in the leaves increased with the doses of N and K, but did not promote the reduction of Cl and Na concentrations in the leaves. The increase of the proline concentration with the doses of K and the decrease of Cl/N with the doses of N suggest that over-fertilization with potassium and nitrogen fertilizers could be benefitial for tomato under moderate salinity conditions.

Key words:Lycopersicon esculentum, proline, plant nutrition

INTRODUÇÃO

O tomateiro (Lycopersicon esculentum Mill.) está entre as principais hortaliças cultivadas no Brasil e talvez seja a mais cultivada em ambiente protegido. O acúmulo de sais no solo em cultivos protegidos é bastante comum em virtude, principalmente, das altas doses de fertilizantes aplicadas, à falta de lixiviação dos sais acumulados após um cultivo e à utilização de águas de poços de má qualidade (Blanco, 2004), o que tem motivado a condução de diversas pesquisas no País nos últimos anos, visando avaliar métodos de controle da salinidade nessas condições de cultivo.

O ajuste osmótico pelas plantas em resposta ao aumento da salinidade do meio, pode ser mediado por uma alteração nas concentrações intracelulares de compostos orgânicos e inorgânicos (Aziz et al., 1999; Glenn et al., 1999). Cultivando três variedades de tomateiro em solução com e sem NaCl, Garcia et al. (2002) verificaram aumento nas concentrações de Na, Cl, K, Ca e Mg na seiva do xilema, tanto para as plantas enxertadas quanto para as não-enxertadas, em meio salino.

A alta concentração salina do meio dificulta a absorção de água e nutrientes pelas plantas devido ao baixo potencial total da solução do solo e da competição química entre nutrientes e sais (Yeo & Flowers, 1989). O método mais direto para se restabelecer os níveis normais de N, P, Ca e K na planta em condições salinas, seria elevando a concentração desses nutrientes na zona radicular, pelo aumento da dosagem de fertilizantes (Cuatero & Muñoz, 1999). Esses autores afirmam que as plantas de tomate absorvendo maior quantidade de Ca e K de um meio salino, apresentarão menores valores das relações Na/Ca e Na/K nas folhas e, conseqüentemente, um equilíbrio nutricional mais próximo daquelas cultivadas em meio não-salino.

A concentração de nutrientes nas folhas do tomateiro pode variar bastante quando as plantas são submetidas à salinidade. Alian et al. (2000) cultivaram quatro cultivares de tomateiro em solução nutritiva contendo NaCl e verificaram grande aumento nos teores de Na e Cl nas folhas, não havendo diferenças para o teor de K. Em outro trabalho, a irrigação com água de até 9,5 dS m-1 obtida pela adição de NaCl, aumentou os teores foliares de Na, Cl, Ca e Mg, reduziu o teor de K e não teve efeito sobre os de NO3 e N total (Martinez et al., 1987).

Kafkafi et al. (1982) observaram redução dos teores de Cl e Na nas folhas do tomateiro com o aumento das doses aplicadas de N e K, respectivamente. Schachtman & Schroeder (1994) assumiram a existência de um mecanismo comum de absorção de K e Na em plantas superiores, o qual seria regulado pelas concentrações desses nutrientes no substrato; então, níveis elevados de K poderiam modular a absorção e o transporte de Na e limitar os danos atribuídos a este.

Uma resposta freqüentemente observada em plantas sob estresse salino é o acúmulo de prolina (Rains, 1989; Taiz & Zeiger, 1998). A prolina é um iminoácido que protege as proteínas contra a desidratação e esta proteção é proporcional à concentração desta substância (Paleg et al., 1984). Uma vez que a prolina é osmoticamente ativa, ela exibe dupla função: protege contra a desidratação das proteínas e mantém um gradiente osmótico celular mais favorável (Rains, 1989). Rajasekaran et al. (2000) cultivaram dez espécies de tomateiro, incluindo L. esculentum var. cerasiforme e L. esculentum 'Duke', em solução nutritiva com adição de NaCl; para todas as espécies ocorreu aumento no teor de prolina nas folhas, de 11 a 116 vezes maior que o observado para o tratamento controle, sem adição de NaCl. Claussen (2005) verificou aumento do teor de prolina nas folhas do tomateiro com o aumento da concentração de fertilizantes na solução nutritiva e demonstrou haver correlação negativa entre o teor de prolina e a produção de frutos. Aumento do teor de prolina nas folhas do tomateiro com o aumento da salinidade do meio também foi observado por Cruz et al. (1998), Aziz et al. (1999) e Alian et al. (2000).

O objetivo do presente trabalho foi verificar os efeitos de doses de N e K aplicadas via fertirrigação, sobre as concentrações de nutrientes na solução do solo e sobre os teores de nutrientes e prolina nas folhas do tomateiro cultivado em ambiente protegido, irrigado com água salina.

MATERIAL E MÉTODOS

O experimento foi conduzido em um ambiente protegido situado na área experimental do Departamento de Engenharia Rural da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" - USP, no município de Piracicaba, SP, em vasos contendo 60 kg de solo coletado na camada de 0-0,30 m de um Latossolo Vermelho Amarelo, cujas características químicas e físicas, analisadas por ocasião da preparação do solo antes da adubação de fundação, foram: areia, silte e argila = 710, 40 e 250 kg m-3, respectivamente, pH = 5,1, matéria orgânica = 13 g dm-3, P, S e Na = 6, 14 e 6,9 mg dm-3, respectivamente, e K, Ca, Mg = 1,1, 12 e 5 mmolc dm-3, respectivamente.

Em cada vaso foram feitas perfurações na base e adicionada uma camada de 0,03 m de brita coberta com bidim para permitir a drenagem do excesso de água aplicada nas irrigações, caso ocorresse. Para a correção da acidez e elevação dos teores dos nutrientes, aplicaram-se 100 g de termofosfato por vaso em 25/09/2001, o qual foi misturado manualmente ao solo a fim de distribuir, homogeneamente, o fertilizante na camada de 0-0,30 m. Devido às características de correção da acidez do solo do termofosfato, a calagem não foi realizada.

Mudas de tomateiro, híbrido Facundo, foram transplantadas para os vasos em 23/10/2001; cada vaso recebeu apenas uma muda e a disposição dos vasos no interior do ambiente proporcionou um espaçamento de 1 x 0,5 m entre plantas. No início e no final de cada linha de plantas foram adicionadas três plantas a mais, que não pertenciam aos blocos experimentais, e foi adicionada uma linha de plantas em cada lado do ambiente protegido para que estas exercessem a função de bordadura e para fins de proteção das parcelas experimentais, uma vez que as plantas localizadas nas laterais dos ambientes protegidos geralmente são mais afetadas por pragas e doenças. As plantas foram conduzidas em haste única, com desbrotas semanais. Após o início da frutificação também foi realizado, semanalmente, o raleio, a fim de permitir o desenvolvimento de apenas quatro frutos por cacho.

O delineamento experimental foi em blocos casualizados e os tratamentos se compunham de três níveis de nitrogênio (N1 = 7,5; N2 = 15,0; N3 = 22,5 g planta-1) e de potássio (K1 = 8; K2 = 16 e K3 = 24 gK2O planta-1) em um fatorial completo com nove tratamentos e cinco repetições, arranjados no esquema fatorial 3 x 3. O fornecimento dos nutrientes se deu pela fertirrigação, a qual era aplicada em todas as irrigações, utilizando-se o cloreto de potássio e o nitrato de amônio. Também foi adicionado cloreto de cálcio nas águas de irrigação para prevenir problemas de podridão apical, enquanto a quantidade de cada nutriente aplicada durante o ciclo da cultura seguiu a marcha de absorção de nutrientes pelo tomateiro em ambiente protegido (Fayad, 1998). A condutividade elétrica da água de irrigação foi elevada a 9,5 dS m-1, utilizando-se cloreto de sódio e cloreto de cálcio, e apresentou pH médio de 6,3.

Adotou-se um sistema de irrigação por gotejamento com dois, três ou quatro emissores por planta, de acordo com o tratamento correspondente. Nas irrigações, prepararam-se três diferentes soluções, sendo uma para o N + Ca, outra para K + Ca e uma terceira para a complementação das quantidades de água e Ca necessárias em cada irrigação, de modo que cada planta recebesse as quantidades preestabelecidas de cada nutriente e um mesmo volume de água. Utilizaram-se gotejadores de vazão 2 L h-1, instalados a 0,01 m de altura em relação à superfície do solo nos vasos e foram conectados às linhas de irrigação por microtubos. O manejo da irrigação foi feito por tensiômetros instalados a 0,15 e 0,30 m de profundidade, sendo a irrigação realizada sempre que o potencial mátrico médio de cada tratamento se aproximava de -30 kPa e o volume de água aplicado era calculado com base na curva de retenção de água pelo solo.

A solução do solo foi coletada em intervalos de aproximadamente 15 dias, com o auxílio de um extrator da solução do solo, que consiste em um tubo de PVC com uma cápsula de cerâmica porosa em sua extremidade, a qual foi enterrada na profundidade de 0,15 m em todos os vasos. Vácuo de aproximadamente -70 kPa foi aplicado nos extratores entre 24 e 48 h após a irrigação, quando os tensiômetros instalados a 0,15 m de profundidade indicavam potencial mátrico em torno de -6 kPa, que corresponde ao potencial mátrico na capacidade de campo. A solução foi coletada com uma seringa conectada a uma mangueira de silicone 24 h após a aplicação do vácuo nos extratores.

Após a coleta, as amostras da solução do solo eram armazenadas em frascos plásticos e levadas ao laboratório, onde eram feitas as leituras da condutividade elétrica (CEs) e do pH (pHs) por um condutivímetro de bancada microprocessado e potenciômetro, respectivamente, ambos com compensação automática de temperatura. As concentrações de nitrato (NO3s), potássio (Ks) e sódio (Nas) na solução do solo, foram determinadas por testes rápidos, utilizando-se medidores de íons específicos e corrigidas através das curvas de calibração, determinadas para cada medidor.

Por ocasião do florescimento do quinto cacho de cada planta, coletou-se a terceira folha a partir do ápice da planta para determinação da concentração de prolina. A folha foi destacada da planta e, imediatamente, congelada em nitrogênio líquido e armazenada em congelador até o momento da análise. A metodologia utilizada foi aquela descrita por Torello & Rice (1986) com as modificações utilizadas por Rossi et al. (1997). Aproximadamente 0,5 g de amostra foi homogeneizada em almofariz de porcelana com 10 ml de ácido sulfossalicílico a 3% e, em seguida, submetida a centrifugação a 5000 rpm e 3100 g por 20 min. Em um tubo de ensaio, adicionaram-se 0,5 ml do sobrenadante, 0,5 mL de ácido acético glacial e 0,5 mL de ninhidrina ácida (Bates et al., 1973), o qual foi mantido em banho-maria fervente por 60 min. Após o resfriamento, a intensidade da cor foi medida a 520 nm em um espectrofotômetro e as absorbâncias obtidas foram comparadas com a curva-padrão de prolina.

No final do período de cultivo, as plantas foram arrancadas e suas folhas secadas em estufa, trituradas e homogeneizadas. Determinaram-se os teores de macro e micronutrientes nas folhas de acordo com a metodologia apresentada por Malavolta et al. (1997).

Os efeitos dos diferentes níveis de N e K sobre as variáveis medidas foram avaliados pelos métodos convencionais da análise de variância (teste F), aplicando-se o teste de regressão polinomial de segunda ordem para os casos em que ocorreu efeito significativo, conforme recomenda Nogueira (1997). Para dados em que ocorreram medidas repetidas ao longo do tempo, foi realizada a análise multivariada para dados repetidos no tempo e, na presença de efeito significativo, procedeu-se à análise estatística univariada, com o objetivo de verificar o efeito de cada fator estudado para cada época de coleta dos dados (Morrison, 1990; Lima, 1996).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Características químicas da solução do solo

Os valores de condutividade elétrica, pH e concentrações de NO3, K, Na e Ca na solução do solo (CEs, pHs, NO3s, Ks, Nas e Cas, respectivamente) ao longo do período experimental, para cada fator estudado, são apresentados na Figura 1.


A CEs apresentou aumento ao longo do período de cultivo para todos os níveis de N e K; em média, a CEs aumentou de 9,8 dS m-1 aos 36 dias após o transplantio (DAT) para 14,7 dS m-1 aos 122 DAT, correspondendo a um aumento de 50%, sendo a CEs final 55% superior à condutividade elétrica média da água de irrigação (Figura 1). O pHs apresentou um ligeiro aumento entre a primeira e a segunda amostragem, reduzindo após este período, o que pode ser devido à nitrificação do amônio.

No processo de nitrificação, para cada molécula de NH4 que é convertida em NO3 ocorre a liberação de dois átomos de hidrogênio na solução do solo. Sob condições de alta temperatura e umidade do solo dá-se uma aceleração do processo de nitrificação e, conseqüentemente, uma redução gradativa do pH do solo, a qual é acelerada com a aplicação contínua de fertilizantes amoniacais (Tisdale et al., 1993), o que explica o decréscimo do pHs ao longo do tempo. A produção de ácidos orgânicos provenientes da decomposição da matéria orgânica e a lixiviação de bases trocáveis pela água também podem ter contribuído para a redução do pHs, como observado por Moraes (1991).

Os valores de NO3s e Ks tiveram rápido aumento após o início da aplicação dos tratamentos e apresentaram certa estabilização para as três últimas coletas realizadas (Figura 1). Como esperado, as concentrações de NO3s e Ks foram proporcionais às doses de N e K aplicadas na fertirrigação, embora para Ks as diferenças só tenham sido evidenciadas a partir da quarta coleta da solução.

A concentração ótima de K na solução do solo é entre 10 e 60 mg L-1, dependendo da cultura, estrutura e fertilidade do solo e suprimento hídrico (Tisdale et al., 1993). As concentrações observadas estiveram sempre dentro ou acima deste limite, podendo-se afirmar que a concentração de Ks foi suficiente para fornecer a quantidade de K requerida pelas plantas durante todo o período de cultivo, mesmo para aquelas que receberam o nível K1.

Nas e Cas também aumentaram ao longo do período experimental (Figura 1). Observa-se relação inversa entre Nas e Cas com os níveis de N; uma vez que a CEa era mantida em torno de 9,5 dS m-1 para todas as irrigações, então um aumento na quantidade de N era compensado pela redução nas quantidades de NaCl e CaCl2 aplicadas, resultando em menor Nas e Cas. O mesmo efeito não foi observado para os diferentes níveis de K.

A análise multivariada indicou que todas as variáveis estudadas da solução do solo variaram ao longo do tempo, sendo o pHs e a concentração de Cas independentes das doses de N e K (Tabela 1). As doses de N tiveram efeito sobre CEs, NO3s e Nas ao longo do tempo, enquanto os níveis de K exerceram efeito apenas sobre a concentração de Ks.

A CEs apresentou aumento linear com as diferentes doses de N apenas para a primeira amostragem realizada aos 36 DAT e variou de 8,8 a 10,7 dS m-1 (CEs = 0,1274N + 7,87, r2 = 1,00), não havendo efeito para as amostragens seguintes (Tabela 2). A concentração de NO3s aumentou linearmente com o nível de N para todas as coletas da solução do solo realizadas ao longo do período de cultivo, enquanto o Ks aumentou com os níveis de K apenas nas três últimas amostragens e a concentração de Nas reduziu com os níveis de N apenas nas três últimas amostragens (Tabela 3).

Um dos processos que ocorrem com o K no solo é a sua fixação entre as lâminas de argila (Kardos, 1964; SparKs & Huang, 1985; Tisdale et al., 1993). Resultados apresentados pelo Instituto Internacional de la Potasa (1977) revelaram que, para dois solos distintos, em termos de conteúdo de argila (30 e 250 kg m-3), para obtenção de Ks de 122 mg L-1, foi necessário em torno de três vezes mais K na CTC do solo mais argiloso em comparação com o solo menos argiloso, demonstrando que o maior conteúdo de argila no solo exigiu grande quantidade de K na CTC para obtenção de uma mesma concentração na solução; além disso, para o solo mais argiloso um grande aumento de Ks foi observado quando o teor de K no solo superou 24,9 mmolc dm-3, nível a partir do qual o solo já se encontrava "saturado" com K, de modo que não ocorria fixação e um número suficiente de posições do complexo de troca já estava ocupado pelo K; sendo assim, a fixação de K pelas argilas e sua retenção na CTC do solo podem ter contribuído para a ausência de diferenças significativas para concentração de Ks nas três primeiras amostragens.

Visto que o NH4 pode ser fixado entre as plaquetas de argila de maneira similar ao K, na presença de NH4 pode ocorrer o bloqueio do K fixado, o qual não é liberado para a solução do solo, o que pode ter contribuído para a obtenção de baixos valores relativos de Ks nas amostragens iniciais, pois metade do N aplicado foi na forma de NH4. Em geral, a quantidade de K necessária para aumentar o teor de K trocável no solo em 1 mmolc dm-3 pode variar de 44 a 1967 kg ha-1, dependendo do tipo de solo; esta diferença é devida, em parte, à variação do potencial de fixação de K entre os solos (Tisdale et al., 1993).

Teores de nutrientes e prolina nas folhas

Os teores foliares observados de nutrientes, Na e Cl (Tabela 4) foram similares àqueles obtidos por outros autores (Fontes et al., 2004; Rodrigues et al., 2002; Gent & Ma, 2000). O aumento na dose de N resultou no aumento linear dos teores de N e B, apresentando relação quadrática com os teores de P e S e redução linear da relação Cl/N, enquanto os teores de K e de prolina nas folhas aumentaram linearmente com a dose de K aplicada via fertirrigação.

Para cada aumento unitário (1 g planta-1) da dose de N aplicada, ocorreu aumento nas concentrações foliares de N e B de 0,068 dag kg-1 e 0,844 mg kg-1, respectivamente (Figura 2). A relação Cl/N reduziu significativamente com o aumento da dose de N, como resultado da maior absorção de NO3 em relação ao Cl.


Resultados obtidos por Bernstein et al. (1974) e Kafkafi et al. (1982) também demonstram redução da relação Cl/N porém, ao contrário do resultado obtido no presente estudo, esta redução se deve à menor concentração de Cl nas folhas quando se aumentaram as doses de N. A composição da membrana radicular, principalmente a composição lipídica, exerce importante papel na absorção ou rejeição de Cl e uma alteração na composição catiônica das raízes pode refletir na composição aniônica, em virtude das alterações na estrutura e composição da membrana radicular (Kafkafi, 1984). Neste trabalho, talvez a concentração catiônica da solução do solo, como as concentrações de K e Na, as quais podem interferir na concentração de lipídios (Stuiver et al., 1981), tenha sido favorável à absorção de Cl, fazendo com que sua concentração nas folhas se mantivesse constante para todos os níveis de N.

Dechen (1980) verificou que altas concentrações de Ca na solução nutritiva reduziu o teor de B nas folhas do tomateiro. Assim, a diminuição da quantidade de CaCl2 adicionada à água de irrigação para elevar a CEa nos níveis mais elevados de N pode ter sido a causa do aumento do teor de B com os níveis de N.

Para cada aumento unitário da dose de K2O aplicada, houve aumento nas concentrações foliares de K e prolina de 0,104 dag kg-1 e 1,14 mg kg-1, respectivamente (Figura 3).


Altas concentrações de Na geralmente inibem a absorção de K pelas plantas (Tester & Davenport, 2003) e se tem sugerido que o acúmulo de putrescina nas folhas ocorre em resposta à deficiência de K em plantas sob estresse salino (Harborne, 1977). Uma vez que tanto a putrescina quanto a prolina são formadas a partir do glutamato (Thompson, 1980), então a redução na síntese de putrescina com o aumento da absorção de K pode favorecer a síntese de prolina, o que explicaria o aumento no teor de prolina nas folhas com as maiores doses de K.

A partir dos resultados apresentados, pode-se afirmar que, em termos de absorção do nutriente aplicado, o tomateiro respondeu melhor ao K que ao N; entretanto, o aumento da dose de N proporcionou certo restabelecimento do equilíbrio nutricional pela redução da relação Cl/N, enquanto as doses de K não tiveram efeito sobre Na/K e Na/Ca, embora tenha elevado o teor de prolina nas folhas. Esses resultados demonstram possíveis mecanismos de adaptação do tomateiro à salinidade com o aumento da adubação, o qual deve ser mais bem estudado sob condições de salinidade moderada.

CONCLUSÕES

1. A concentração de NO3 na solução do solo aumentou proporcionalmente às doses de N para todas as amostragens, enquanto a concentração de K só aumentou a partir da quarta coleta da solução do solo, fato atribuído à fixação do K no complexo de troca do solo.

2. Os teores de N e K na matéria seca das folhas aumentaram com a dose aplicada desses nutrientes e não promoveram redução dos teores de Cl e Na.

3. A aplicação de altas doses de N favoreceu o restabelecimento do equilíbrio nutricional do tomateiro, reduzindo a relação Cl/N nas folhas.

4. O aumento da dose de K aplicada elevou o teor de prolina nas folhas do tomateiro.

AGRADECIMENTOS

À "Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo-FAPESP", pelo suporte financeiro, e ao professor Dr. Murilo Melo, do Centro de Biotecnologia da ESALQ/USP, por viabilizar a análise de prolina.

LITERATURA CITADA

Protocolo 124.05 - 02/09/2005 - Aprovado em 14/09/2007

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Jan 2008
  • Data do Fascículo
    Fev 2008

Histórico

  • Recebido
    02 Set 2005
  • Aceito
    14 Set 2007
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