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Avaliação fisioterapêutica nos músicos de uma orquestra filarmônica

A physiotherapic evaluation of philharmonic orchestra musicians in Brazil

Resumos

Pesquisa exploratória com 40 músicos sobre do risco de surgimento de distúrbios ósteo-musculares relacionados ao trabalho, o mobiliário utilizado pelos musicistas e as posturas adotadas durante os ensaios da Orquestra Filarmônica do Espírito Santo (OFES). A avaliação postural visual utilizou o REBA (Rapid Entire Body Assessment) e as cadeiras e estantes de partitura foram avaliadas seguindo critérios ergonômicos. Os resultados indicam o desajuste postural dos músicos durante os ensaios, assim como a irregularidade do mobiliário utilizado, apontando para a necessidade de ações fisioterápicas imediatas tanto para reabilitação quanto para prevenção de lesões.

doenças ocupacionais; abordagem fisioterapêutica; músicos profissionais; reabilitação e prevenção


Exploratory research with 40 musicians on the risk of osteomuscular disorders related to work, the furniture used by musicians and the postures adopted during rehearsals of the Orquestra Filarmônica do Espírito Santo (OFES) in Brazil. The postural assessment used the visual REBA (Rapid Entire Body Assessment) and the chairs and music stands have been evaluated following ergonomic criteria. The results indicate a postural inadequacy of the musicians during rehearsals, as well as irregularity of the furniture used, pointing to the need of immediate physiotherapic action for both rehabilitation and for injury prevention.

occupational related diseases; physical therapy approach; professional musicians; rehabilitation and prevention


ARTIGOS CIENTÍFICOS

Marina Medici Loureiro SubtilI; Lívia Maria Marques BonomoII

IUFES, Vitória, ES, marina.fisio@hotmail.com

IIUFES, Vitória, ES, livia_bonomo@yahoo.com.br

RESUMO

Pesquisa exploratória com 40 músicos sobre do risco de surgimento de distúrbios ósteo-musculares relacionados ao trabalho, o mobiliário utilizado pelos musicistas e as posturas adotadas durante os ensaios da Orquestra Filarmônica do Espírito Santo (OFES). A avaliação postural visual utilizou o REBA (Rapid Entire Body Assessment) e as cadeiras e estantes de partitura foram avaliadas seguindo critérios ergonômicos. Os resultados indicam o desajuste postural dos músicos durante os ensaios, assim como a irregularidade do mobiliário utilizado, apontando para a necessidade de ações fisioterápicas imediatas tanto para reabilitação quanto para prevenção de lesões.

Palavras-chave: doenças ocupacionais; abordagem fisioterapêutica; músicos profissionais; reabilitação e prevenção.

ABSTRACT

Exploratory research with 40 musicians on the risk of osteomuscular disorders related to work, the furniture used by musicians and the postures adopted during rehearsals of the Orquestra Filarmônica do Espírito Santo (OFES) in Brazil. The postural assessment used the visual REBA (Rapid Entire Body Assessment) and the chairs and music stands have been evaluated following ergonomic criteria. The results indicate a postural inadequacy of the musicians during rehearsals, as well as irregularity of the furniture used, pointing to the need of immediate physiotherapic action for both rehabilitation and for injury prevention.

Keywords: occupational related diseases; physical therapy approach; professional musicians; rehabilitation and prevention.

1 - Introdução

Ao se ouvir o concerto de uma orquestra, experienciamos uma série de sensações que nos remetem à alegria de ouvir uma boa música. No entanto, nem sempre consideramos que aquele que toca um instrumento musical possa ser questionado ou mesmo se questionar quanto à sua saúde e qualidade de vida.

No contexto da música, verifica-se através da história, que a orquestra filarmônica, desde seu nascimento no século XVIII, passou por inúmeras transformações em sua estrutura organizacional em função do desenvolvimento dos instrumentos, da evolução dos gêneros e das formas musicais e o mundo da música orquestral tem apresentado um novo quadro nas últimas três décadas em que, cada vez mais, instrumentistas têm relatado episódios de dor relacionados ao exercício de tocar (COSTA, 2003; PETRUS, 2005).

A cultura da dedicação sem limites implica o estabelecimento da relação direta entre dor/sacrifícios e resultados satisfatórios, intensificando a tendência de tocar mesmo na ocorrência de dor e levando alguns profissionais a desconsiderarem sintomas e a não procurarem ajuda especializada em tempo hábil para impedir a cronicidade do quadro (PAULL e HARRINSON, 1997; COSTA, 2003). O alto grau de performance exigido e a técnica rebuscada dos instrumentos solicitam muito do intérprete, que na tentativa de atingir a perfeição e o total domínio técnico, muitas vezes ultrapassa seu limite físico. Isso acarreta distúrbios ósteo-musculares relacionados aos movimentos repetitivos em posturas inadequadas e ao constante uso muscular, forçado e intermitente, principalmente quando se observa a condição, a organização e a falta de orientações a respeito da prevenção do desconforto corporal e de possíveis lesões músculo-esqueléticas (MOURA; FONTES; FUKUJIMA, 2000).

A afirmação de que os músicos constituem um dos principais grupos de risco de adoecimento ocupacional, assinala a falta de conscientização da classe neste tocante e a pouca procura por informação para preservar e gerenciar as condições necessárias ao exercício profissional. Embora tenham ocorrido sensíveis avanços em pesquisa médica e em novos tratamentos, o setor preventivo caminha de forma bem mais lenta. A maior abertura dos músicos para este tópico tem se dado somente após a ocorrência de sintomas que prejudicam a atividade, como a dor recorrente e limitante (NORRIS, 1997).

A Ergonomia, ciência que estuda a relação homem-trabalho considerando o bem-estar, a segurança e a eficácia de quem trabalha, coloca à disposição do músico tanto a bagagem dos "Human Factors", por meio de estudos realizados em laboratório, centrados na adaptação dos equipamentos ao homem e da melhoria das condições de trabalho, quanto a perspectiva da Ergonomia da Atividade, a qual pressupõe a análise das características e contradições presentes na situação de trabalho, complexa e variável por essência. Pois, ao investigar o contexto de produção e bens de serviços na área musical, a Ergonomia da Atividade também sinaliza estratégias e mediações decorrentes da interação entre o músico e sua tarefa, englobando as dimensões física, cognitiva e afetiva, presentes na atividade humana. A ergonomia aplicada às práticas musicais evidencia resultados de pesquisas que consideram fortemente o músico em ação, suas características e seus limites, suas representações sobre seu trabalho e o seu contexto, trazendo como diferencial a articulação das dimensões do trabalho para uma melhor compreensão dos riscos ocupacionais e recomendações para minimizá-los (COSTA, 2005).

Desfaz-se, desta forma, um equívoco presente no senso comum, o de que a ergonomia trata exclusivamente de projeto de mobiliário e da avaliação do posto de trabalho. Seguramente, a boa configuração destes elementos é essencial para evitar sobrecargas posturais e fadiga, em qualquer situação de trabalho. Dada a natureza da tarefa do músico, as condições ambientais existentes, tais como iluminação, ventilação, temperatura e ruído, também podem favorecer ou dificultar o desempenho de suas atividades, levando-os a intensificar demandas cognitivas (em especial em processos envolvendo qualidade de percepção e atenção), e ocasionar maiores desgastes músculo-esqueléticos. Soma-se a este item a regulação constante da variabilidade presente na situação de trabalho, o que pode se justapor a padrões físicos que resultem em tensão excessiva na execução do instrumento ou mesmo na ocorrência de dor (COSTA, 2003).

Observando-se então, a significativa demanda que se apresenta, torna-se necessário aprofundar os conhecimentos sobre as relações entre o fazer do músico e o surgimento dos distúrbios ósteo-musculares relacionados ao trabalho (DORTs), para que medidas preventivas e curativas possam ser instituídas, além de despertar importante desenvolvimento nesta área de atuação da fisioterapia.

Este trabalho tem, portanto, como objetivo avaliar o risco de surgimento de distúrbios ósteo-musculares relacionados ao trabalho (DORTs), o mobiliário adotado pelos musicistas e as posturas adotadas durante os ensaios dos músicos da Orquestra Filarmônica do Espírito Santo (OFES).

2 - Método

Foram avaliados 40 músicos da Orquestra Filarmônica do Espírito Santo (OFES) em seus locais de ensaio: Teatro Carlos Gomes e Teatro Carmélia, ambos em Vitória/ES. Do total de integrantes avaliados, 13 músicos são do sexo feminino e 27, do sexo masculino. O critério de inclusão consistiu na assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, distribuído aos músicos no primeiro contato com a OFES. Foram excluídos aqueles que não desejaram participar da pesquisa. O presente estudo teve a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Infantil Nossa Senhora da Glória, seguindo as diretrizes do Ministério da Saúde, protocolo de número 16/2009.

Para a coleta de dados foi aplicado o instrumento de avaliação visual REBA (Rapid Entire Body Assessment), validado por HIGNETT E MCATAMNEY (2000), e utilizado nesta pesquisa para observar as posturas adotadas durante o período de ensaio em relação aos membros superiores, membros inferiores, tronco e cabeça.

O protocolo REBA foi utilizado para avaliar o risco de surgimento de DORTs, considerando as posturas de diferentes segmentos corporais separados em 2 grupos. No grupo A, o total é dado pela somatória dos pontos obtidos durante a avaliação do tronco, pescoço e membros inferiores; e o grupo B é composto pelos pontos obtidos na avaliação dos braços, antebraços e punhos, divididos pela lateralidade (direita e esquerda). A pontuação final do REBA analisa o nível de risco de desenvolvimento de DORT e determina a necessidade de ações de intervenção, possuindo as seguintes categorias de ações: nível de ação (0 a 4); escore REBA (1 a 15); nível de risco (nenhum, baixo, médio, elevado e muito elevado) e ações (não é necessário; pode ser necessário; necessário; é necessário logo; é urgente), conforme mostra o Ex.1 .

Foi observada a estação de trabalho, na qual se avaliou a cadeira e a estante de partituras dos músicos. Para avaliação da cadeira seguiram-se as recomendações de IIDA (2000) e COUTO (2002), que caracterizam uma cadeira ergonômica por estofamento de preferência com tecido que permita a transpiração; ter altura regulável; com borda anterior arredondada; a profundidade não deve permitir compressão da região posterior do joelho; o assento deve estar na posição horizontal e é desejável que o assento se incline 10 a 15 graus para frente; o ângulo entre o assento e o apoio dorsal deve ser regulável; caso não o seja, assento e encosto devem ser posicionados num ângulo de 100 graus; o apoio para o dorso deve ter uma forma que acompanhe as curvaturas da coluna, sem retificá-las, mas também sem acentuá-las, além de regulagem de altura.

As posturas dos músicos foram registradas em fotografias (MÁQUINA SONY T-7) e posteriormente analisadas.

Os dados foram mostrados de forma descritiva e ilustrados por meio de tabelas.

3 - Resultados

3.1 - Protocolo REBA

O escore final do REBA, como visto no Ex. 01 , pode variar de 1 a 15 em sua escala de risco. Neste estudo, o escore final variou de 4 a 15 para os 40 músicos avaliados. O nível de risco de desenvolvimento de lesões músculo-esqueléticas entre os músicos indicou que a maioria (62,5%) apresentou risco médio para o desenvolvimento de lesões, seguido por 32,5% com risco elevado e 5% com risco muito elevado. O resultado revela a necessidade de abordagem da fisioterapia no grupo estudado, com ações de necessárias a urgentes, tanto para reabilitação, quanto para prevenção de novas disfunções.

3.2 - Avaliação da cadeira e da estante de partituras

Na avaliação ergonômica da cadeira, pôde-se observar inadequação deste mobiliário, tendo como pontos irregulares: o apoio dorsal e a altura do assento não reguláveis, ausência de material anti-transpirante, ângulo entre o assento e o apoio dorsal não regulável e de 90º de inclinação.

Apesar de não existir nenhum instrumento na literatura validado para avaliar a estante utilizada em orquestras, os conhecimentos de ergonomia e biomecânica permitiram a análise deste mobiliário. Todas as estantes de partituras utilizadas pelos musicistas da OFES e pelo maestro tinham a mesma altura, independente das características antropométricas de cada integrante da OFES. Uma mesma estante era utilizada para dois musicistas, exigindo dos mesmos, rotações de cabeça, pescoço e ombros a fim de lerem e acompanharem a partitura durante os ensaios.

3.3 - Análise fotográfica das posturas adotadas pelos músicos

As fotografias das principais posturas adotadas pelos musicistas durantes seus ensaios revelaram uma série de irregularidades posturais que foram organizadas e separadas de acordo com os instrumentos tocados conforme ilustra o Ex.2 .

4 - Discussão

O estudo realizado com os integrantes da Orquestra Filarmônica do Espírito Santo (OFES) teve como principais achados o risco elevado para o surgimento de DORT's, a inadequação do mobiliário e a adoção de posturas irregulares durante os ensaios.

O desenvolvimento das DORTs em músicos pode ocorrer por vários motivos tais como: predisposição genética, condições físicas inadequadas, aumento do tempo de estudo e ensaios, erros de técnicas, erros em hábitos e práticas, reabilitação inadequada das lesões prévias, postura e mecanismos corporais inadequados e ausência de programa preventivo ao surgimento das lesões, tais como a atuação da fisioterapia (PETRUS, 2005).

Para DUL e WEERDEMEESTER (2004), uma postura prolongada é capaz de gerar contração contínua da musculatura envolvida em determinada atividade, provocando fadiga muscular localizada, resultando em desconforto e queda do desempenho no trabalho. TAUBE (2002) considera que quando se exige uma postura estática, os indivíduos que as executam passam a adotar posturas que lhes pareçam confortáveis, mas que nem sempre são adequadas ou biomecanicamente ideais para a determinada atividade, contribuindo ao surgimento de dores musculares, que podem passar despercebidas no início, tornando-se possível motivo de afastamento do trabalho ou resultar em incapacidades funcionais.

As principais posturas irregulares adotadas pelos músicos da orquestra e fotografadas durante os ensaios foram: joelhos dobrados a mais de 90º, quadril girado para dentro ou para fora excessivamente, ombros elevados, cotovelos dobrados a mais de 90º, ombros girados para dentro, punhos com desvio para dentro ou para fora, cabeça projetada para frente, peso não distribuído uniformemente entre os membros inferiores, tronco inclinado anterior e lateralmente, pés girados para dentro e postura sentada sobre os ossos do sacro.

Essas irregularidades posturais puderam ser percebidas tanto com a aplicação do protocolo REBA, quanto na análise das fotos tiradas durantes os ensaios, indicando que os músicos da OFES além de permanecerem muito tempo em posturas estáticas, mantêm uma organização corporal inadequada, contribuindo sobremaneira ao surgimento de DORTs. O risco para o surgimento de DORTs avaliado pelo REBA variou de médio a muito elevado, indicando a necessidade de intervenção tanto para a reabilitação quanto para a prevenção de lesões.

A adoção de certas posturas durante a prática musical faz-se necessário quando se toca determinado instrumento, sendo que, alguns desses arranjos posturais levam à fadiga muscular e, posteriormente, ao surgimento de lesões agudas ou crônicas. No entanto, mesmo frente à necessidade de manutenção do corpo de forma nem sempre adequada, é possível minimizar as irregularidades posturais através de uma proposta de intervenção fisioterapêutica, mostrando aos musicistas as maneiras menos agressivas de posicionar-se durante o ato de tocar seu instrumento musical. Orientações simples junto aos músicos no momento da prática musical garantem maior qualidade de vida profissional além de prevenir dores, desconfortos e prejuízos a sua saúde.

IIDA (2000) considera que nos dias atuais, as pessoas passam horas sentadas em suas atividades, por isso o assento deve ser adequado para cada tipo de função. Ele deve permitir variações de postura, evitando os processos de fadiga, dores lombares e câimbras. De acordo com a lista de itens da estação de trabalho da OFES, todas as cadeiras estavam inadequadas, sendo de material sintético, apoio dorsal não regulável, a altura do assento não regulável, ângulo entre o assento e o apoio dorsal não regulável e de 90º. A posição sentada é constantemente mantida no decorrer dos ensaios e dos concertos.

O trabalho de COSTA (2003) com violinistas mostra que o posto de trabalho é constituído de cadeira preta estofada de altura fixa, havendo três modelos com ângulos distintos entre assento e encosto, e de estantes para partituras em madeira e estrutura metálica com altura regulável, posicionada de frente para cada par de instrumentistas. Essas medidas proporcionam melhor adequação postural durante as atividades profissionais.

Na postura sentada, a maioria dos músicos mantém os joelhos com ângulo maior que 90º de flexão. Segundo MAEHLER (2003), para evitar ou melhorar os problemas posturais de indivíduos que trabalhem sentados, o eixo do fêmur deve estar paralelo ao chão, formando um ângulo de 90º graus com a parte posterior da perna, podendo chegar a 115º. Ao se trabalhar com um ângulo de flexão dos joelhos menor que 90º, comprimi-se a região posterior do joelho, podendo levar a transtornos circulatórios. Quando se trabalha com angulação maior que 115º graus ou menor que 90º graus a coluna lombar encontra-se em posição de sobrecarga constante.

Os ângulos assumidos na posição sentada podem acarretar dores lombares e o esforço para permanecer ereto provoca contrações contínuas dos músculos envolvidos na manutenção da postura, ocasionando redução do fluxo sanguíneo, o acúmulo de metabólitos e o aparecimento de dores (NORRIS, 1997).

Verificou-se também que os músicos da OFES ajustavam a estante (que contém a partitura musical), aumentando ou reduzindo a distância entre a cadeira e posicionando-a mais para a esquerda, à direita ou ao centro, ação que se repetiu com frequência durante os ensaios observados. Esses ajustes buscavam a manutenção do plano de visão em relação aos gestos do maestro, a fim de atender à necessidade de efetuar a leitura das partes musicais.

PAULL e HARRINSON (1997), afirmam que o posicionamento e a altura das estantes interferem no conforto do músico que necessita conjugar a visão do maestro à leitura das partituras, ao tamanho do seu instrumento e à posição para tocá-lo.

Nos ensaios, verificou-se que os músicos modificavam frequentemente o posicionamento do corpo, enquanto tocavam ou mesmo nos momentos de pausa (para correções da partitura), ou pelas intervenções do maestro, demonstrando sinais de desconforto por permanecer na posição sentada. Como os postos de trabalho durante os ensaios ficam num mesmo plano e o espaço físico não permite outro arranjo do mobiliário, os músicos sentados nas primeiras estantes têm uma visão mais fácil do maestro, enquanto que da terceira estante para trás esse plano visual fica prejudicado em função da posição dos outros músicos. Além disso, como a estante é objeto comum de trabalho entre os pares, torna-se necessária uma interação entre os músicos para a execução do trabalho, o que implica lidar com modos operatórios distintos e adaptar-se ao "fazer" do outro, o que pode gerar sinais e sintomas dolorosos.

Para LONGEN (2003), a intervenção ergonômica deve considerar o trabalho e quem o executa, oferecendo aos trabalhadores instruções de como se deve sentar, regular as cadeiras, fazer pausas ou ginástica laboral. ASSUNÇÃO (2000) confere a importância da abordagem ergonômica às propostas de medidas preventivas, protegendo os trabalhadores contra os riscos presentes durante as atividades laborais.

Considerando a variabilidade antropométrica dos músicos da OFES, de alturas e pesos corpóreos diferentes, a ausência de mecanismos reguláveis nos equipamentos induz à elaboração de estratégias pessoais que possibilitem compensar a inadequação do posto de trabalho. Essas medidas compensatórias criam um círculo vicioso de dor e desconforto corporal. A dor associada à postura adotada pelo músico para compensar a inadequação da cadeira reflete-se em dificuldades quando associada ao tempo em que o sujeito permanecerá sentado. Assim, os integrantes da OFES buscam adotar o melhor posicionamento do corpo, visando promover equilíbrio e distribuição do peso corporal para obter maior controle motor e precisão dos movimentos na execução instrumental. Nessa busca por ajuste corporal que nem sempre é correta, para atender as necessidades do tocar bem, os processos de adoecimento surgem gradativamente, contribuindo cada vez mais para o aumento nos índices de lesões em músicos profissionais.

5 - Considerações finais

Portanto, percebemos em nosso estudo, que a padronização das cadeiras e a ausência de mecanismos de regulagem, contribuem para acentuar as dificuldades identificadas no posto de trabalho, pois esta parte do mobiliário não contempla a diversidade dos instrumentistas ou as características de seu trabalho de forma satisfatória.

Sendo assim, pode-se demonstrar que as posturas irregulares constantes adotadas durante o ato de tocar, a falta de pausas regulares, a inadequação do mobiliário e a falta de intervenção da fisioterapia na orquestra influenciam direta ou indiretamente no risco de desenvolvimento de DORTs. Medidas de intervenção ergonômicas precisam ser pensadas e executadas no ambiente de ensaios e apresentações da OFES. As adequações do espaço de trabalho às necessidades físicas dos musicistas constituem fatores de urgência a fim de garantir a saúde ocupacional desses profissionais.

A fisioterapia apresenta-se neste contexto com conhecimento técnico científico e capacidade de atuação junto a músicos profissionais, tanto em seus ambientes de ensaios, quanto durante suas apresentações, a fim de implementar programas que envolvem avaliação e diagnóstico, intervenções terapêuticas e prevenção continuada.

Agradecimentos:

Ao Maestro Titular na Orquestra Filarmônica do Espírito Santo, Helder Trefzger e aos músicos participantes da pesquisa.

Marina Medici Loureiro Subtil é fisioterapeuta graduada pelo Centro Universitário Vila Velha, com formação em Pilates, atuação nas áreas de saúde do músico e do trabalhador, com foco reabilitador e preventivo; mestre em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo; Professora da disciplina Saúde do Músico; então bolsista de mestrado pela Fundação de Apoio à Ciência e Tecnologia do Espírito Santo (FAPES); autora do livro Fisioterapia para Músicos.

Lívia Maria Marques Bonomo é fisioterapeuta graduada pela Faculdade Salesiana de Vitória; mestre em Psicologia pela Universidade Federal do Espírito Santo;então bolsista de mestrado pelo Fundo de Apoio à Ciência e Tecnologia do Município de Vitória (FACITEC).

  • ASSUNÇÃO, A. A. Os aspectos Biomecânicos explicam as Lesões por Esforços Repetitivos? Belo Horizonte: Associação Nacional de Medicina do Trabalho, 2000.
  • COSTA, C. P. Quando tocar dói: análise ergonômica da atividade de violinistas de orquestra. Universidade de Brasília, Instituto de psicologia, 2003.
  • ______. Contribuições da ergonomia à saúde do músico: consideração sobre a dimensão física do fazer musical. Revista Música Hodie, v. 5, n. 2, 2005.
  • DUL, J.; WEERDMEESTER, B. Ergonomia prática. 2 ed, São Paulo: Edgard Blücher, 2004.
  • HIGNETT, S.; MCATAMNEY, L. Rapid entire body assessment (REBA). Applied Ergonomics. 31:201-205, 2000.
  • IIDA, I. Ergonomia: projeto e produção. 6 ed, São Paulo: Edgard Blücher, 2000.
  • LONGEN, W. C. Ginástica laboral na prevenção de LER/DORT? Um estudo reflexivo em uma linha de produção. Universidade Federal de Santa Catarina, Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção, Florianópolis, 2003.
  • MAEHLER, P. Estudo das sobrecargas posturais em acadêmicos de odontologia da Universidade Estadual do Oeste do Paraná. Cascavel, 2003.
  • MOURA, R. C.; FONTES, S. V.; FUKUJIMA, M. M. Doenças ocupacionais em músicos: uma abordagem fisioterapêutica. Revista Neurociências, v. 8, n. 3, 103 - 107, 2000.
  • NORRIS, R. The musician's survival manual: a guide to preventing and treating injuries in instrumentalists. 3Ş ed. St. Louis, MO: MMB Music, 1997.
  • PAULL, B.; HARRISON, C. The Athletic Musician: a Guide to Playing Without Pain. Scarecrow Press, Lanham, 1997.
  • PETRUS, A. M. F. Produção musical e desgaste musculoesquelético: elementos condicionantes da carga de trabalho dos violinistas de uma orquestra. Belo Horizonte: Escola de Engenharia, Departamento de Engenharia de Produção da UFMG, 2005.
  • TAUBE, O. L. S. Análise da incidência de distúrbios músculo-esqueléticos no trabalho do bibliotecário. Considerações ergonômicas com enfoque preventivo de LER/DORT. Dissertação de Mestrado em engenharia de produção. Programa de pós-graduação de engenharia de produção, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2002.
  • Avaliação fisioterapêutica nos músicos de uma orquestra filarmônica

    A physiotherapic evaluation of philharmonic orchestra musicians in Brazil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Fev 2012
    • Data do Fascículo
      Jun 2012
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