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Sociologia das profissões de Eliot Freidson: interpretação para a Saúde e Enfermagem

RESUMO

Objetivos:

analisar as concepções teóricas da Sociologia das Profissões de Eliot Freidson para o âmbito das Profissões da Saúde e da Enfermagem.

Métodos:

estudo qualitativo sócio-histórico, com fontes orais e documentais. Foram entrevistados oito enfermeiros envolvidos no desenvolvimento do Conselho profissional no recorte temporal de 1975 a 1986. As documentais foram Leis, Portarias, Resoluções, Relatórios, Atas de Reuniões e Escrituras Públicas. As informações foram organizadas a partir da literatura e concepções de Eliot Freidson, e realizada análise de conteúdo temática.

Resultados:

os conceitos emitidos por Eliot Freidson permitiram a criação de um Quadro conceitual que representa a Profissão Enfermagem, podendo ser ampliado para as demais profissões da área da Saúde, em consonância com a organização profissional no país.

Considerações Finais:

o referencial de Eliot Freidson, em interpretação para a Enfermagem, consolida a profissão com autonomia relativa, expertise pela Sistematização da Assistência de Enfermagem e credencialismo pelas normalizações profissionais.

Descritores:
Enfermagem; Profissões da Saúde; Organização de Normalização Profissional; História; Sociologia

ABSTRACT

Objectives:

to analyze theoretical conceptions of Eliot Freidson’s Sociology of Professions scoped on health and nursing professions.

Methods:

Eight nurses were interviewed, all involved in the development of the professional Council on the timeframe from 1975 to 1986. Documental resources were Laws, Ordinances, Resolutions, Reports, Meeting Minutes and Public Deeds. Information was organized as from literature and Eliot Freidson’s conceptions, and thematic content analysis was carried out.

Results:

the concepts authored by Eliot Freidson allowed for the development of a concept chart that portrays the nursing profession and that may be expanded for the other occupations in the health field, in consonance with professional organization in the country.

Final Considerations:

Eliot Freidson’s framework, in interpretation for nursing, consolidates the profession with relative autonomy, expertise by Nursing Care Systematization and credentialism by professional normalizations.

Descriptors:
Nursing; Health Professions; Professional Normalization Organization; History; Sociology

RESUMEN

Objetivos:

analizar las concepciones teóricas de la Sociología de las Profesiones de Eliot Freidson para el alcance de las profesiones de salud y enfermería.

Métodos:

estudio sociohistórico cualitativo, con fuentes orales y documentales. Se entrevistó a ocho enfermeras involucradas en el desarrollo del Consejo Profesional en el período de 1975 a 1986. Los documentales fueron Leyes, ordenanzas, resoluciones, informes, actas de reuniones y escrituras públicas. La información se organizó a partir de la literatura y las concepciones de Eliot Freidson, y se realizó un análisis de contenido temático.

Resultados:

los conceptos emitidos por Eliot Freidson permitieron la creación de un marco conceptual que represente a la profesión de enfermería, que podría ampliarse a otras profesiones de la salud, en línea con la organización profesional del país.

Consideraciones Finales:

el marco de Eliot Freidson, en interpretación de enfermería, consolida la profesión con relativa autonomía, experiencia en Sistematización de la Atención de Enfermería y credencialismo en los estándares profesionales.

Descriptores:
Enfermería; Profesiones de Salud; Organización de Normalización Profesional; Historia; Sociología

INTRODUÇÃO

A história contribui com o fundamento de propósitos e encaminhamentos no interior de uma profissão. É a partir da compreensão do desenvolvimento histórico de eventos vivenciados pela profissão que se dá a construção de identidades no núcleo da categoria profissional. As entidades representativas de uma profissão revelam a dinâmica das intenções e contribuições para a formação identitária profissional, respeitando as divergências e transformações nos contextos econômico, cultural, social e político no mundo do trabalho, direcionando a vida em sociedade.

Ao trazer à tona o desenvolvimento da organização profissional da Enfermagem no estado de Santa Catarina, sob a ótica dos estudos de Eliot Freidson(11 Freidson E. Profissão médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado. São Paulo: Editora UNESP; 2009.), evidencia as influências que a estrutura traz à profissão, procurando ampliar a sua discussão para as profissões de saúde de um modo geral. A compreensão de que a expansão e consolidação de uma profissão acontece por meio da sua organização profissional e do profissionalismo de seus membros permitiu para as autoras deste estudo realizarem uma interpretação dos conceitos de Freidson para a dinâmica sociológica da Saúde e da Enfermagem.

Nos estudos de Freidson, para se enquadrar no conceito de profissão, uma disciplina deve ter suas próprias escolas, apresenta credencialismo em educação, e disciplinamento e diretrizes profissionais para o trabalho, com uma autonomia superficial(22 Pereira Neto A. Eliot Freidson: progression and constraints in the biography of an intellectual. Hist Cienc Saude-Manguinhos. 2009;16(4):941-60. doi: 10.1590/S0104-59702009000400006
https://doi.org/10.1590/S0104-5970200900...
). Na perspectiva do autor, o ideal de profissionalização é constituído por elementos interdependentes, trabalho especializado por corpo teórico específico, ética no uso do conhecimento e das competências profissionais. É ainda consolidado por reconhecimento social do trabalho, programa formal de ensino, credenciais, jurisdição própria e divisão do trabalho.

Três fatores caracterizam uma profissão conforme Freidson(22 Pereira Neto A. Eliot Freidson: progression and constraints in the biography of an intellectual. Hist Cienc Saude-Manguinhos. 2009;16(4):941-60. doi: 10.1590/S0104-59702009000400006
https://doi.org/10.1590/S0104-5970200900...
): autonomia técnica, conhecimento/expertise e credencialismo sobre o seu próprio trabalho. Para ele, a sociedade é formada pela população e o meio ambiente onde as pessoas vivem e se inter-relacionam por meio de uma identidade e valor de pertencimento. Esta sociedade compõe o Estado, que é a nação politicamente organizada, constituída pelo povo, seguindo regras de conduta legal, ética, cultural, religiosa e social(33 Pires DEP. Necessary changes for advancing Nursing as caring Science. Rev Bras Enferm. 2013;66(esp):39-44. doi: 10.1590/S0034-71672013000700005
https://doi.org/10.1590/S0034-7167201300...
).

A abordagem sociológica deste estudo se justifica pelas discussões que Freidson traz no tocante à profissão e, principalmente, por trazer ao campo da saúde discussões pertinentes ao que ele chama de profissões de consulta(44 Freidson E. Profissionalism. The third logic. Chicago: The University of Chicago press; 2001.). Embora Freidson faça considerações de que a Enfermagem é uma semiprofissão, por não responder ao “tipo ideal”(44 Freidson E. Profissionalism. The third logic. Chicago: The University of Chicago press; 2001.)descrito para outras profissões, como a Medicina(44 Freidson E. Profissionalism. The third logic. Chicago: The University of Chicago press; 2001.), entende-se que a aplicabilidade desta base teórica fundamente a Enfermagem enquanto ciência, arte, disciplina e profissão. Desta maneira, pretende-se trazer à análise a Profissão Enfermagem, com o mesmo grau de complexidade e abrangência que as demais no campo da Saúde.

OBJETIVOS

Analisar as concepções teóricas da Sociologia das Profissões de Eliot Freidson para o âmbito das Profissões da Saúde e da Enfermagem.

MÉTODOS

Aspectos éticos

Pesquisa avaliada e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina. Os instrumentos referentes à fonte de coleta das informações orais e documentais foram validados a partir de devolutiva da análise desenvolvida. A validade das informações apresentadas em interpretações resulta da triangulação entre oralidade, documentação e sociologia das profissões de Freidson.

Tipo de estudo

Pesquisa sócio-histórica, com uma abordagem descritivo-interpretativa a partir da sustentação teórico-sociológica das Profissões de Eliot Freidson para o âmbito da Enfermagem.

Procedimentos metodológicos

As informações emergiram de fontes orais e documentais(55 Padilha MI, Bellaguarda MLR, Nelson S, Maia ARC, Costa R. He use of sources in historical research. Texto Contexto Enferm. 2017;26(4): e2760017. doi: 10.1590/0104-07072017002760017
https://doi.org/10.1590/0104-07072017002...
). As entrevistas com os 8 enfermeiros tiveram a duração entre 30 e 80 minutos, norteadas por questões referentes ao desenvolvimento do conselho profissional e a Profissão Enfermagem no estado de Santa Catarina. As entrevistas foram transcritas e identificadas com autorização dos participantes. As fontes documentais inventariadas em catálogos foram as Leis, Portarias, Resoluções, Decisões, Relatórios, Atas de Reuniões e Escrituras Públicas, com informações documentais referentes à série, conteúdo pertinente à pesquisa no documento, emissor, destinatário, códigos de identificação, assinaturas e datas. Os dados foram coletados em 2013.

Cenário do estudo

A Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn), a Associação Brasileira de Enfermagem-Seção Santa Catarina, o Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) e o Conselho Regional de Enfermagem de Santa Catarina (COREN) foram os contextos utilizados para investigação documental. Foram também os espaços de opção dos 8 enfermeiros participantes do estudo envolvidos no desenvolvimento do Conselho profissional no recorte temporal de 1975 a 1986(66 Bellaguarda MLR, Padilha MI, Pires DEP. Regional nursing council of santa catarina (1975-1986): Importance for the profession. Texto Contexto Enferm. 2015;24(3):654-61. doi: 10.1590/0104-07072015003750013
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). O critério de inclusão das fontes orais constou que fossem profissionais partícipes do desenvolvimento do Conselho Profissional no Estado. As fontes documentais utilizadas foram produzidas por entidades representativas da profissão, ou sociais e privados (recebidos por pessoas físicas) que influenciaram o fazer da Enfermagem e auxiliaram na historiografia.

Análise e tratamento de dados

A análise seguiu a análise de conteúdo temática(77 Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2016.) e, nesta perspectiva, a de enunciação. O foco centrou-se nas concepções sociológicas de Freidson de expertise/conhecimento, credencialismo, autonomia, status profissional, Sociedade e Estado. Iniciou-se com a pré-análise na leitura contínua da história oral e documentos acerca do Conselho profissional catarinense. Os conceitos indicaram o material a ser explorado, dando-se sequência à inferência e interpretação das informações. Ao final, resultaram as subcategorias que trazem à tona a interpretação das concepções Freidsonianas para as profissões, contextualizando-as para a Enfermagem.

RESULTADOS

A análise do enunciado pelas fontes orais cruzada com as fontes documentais possibilitou realizar uma análise interpretativa a partir da dinâmica de organização profissional, fundamentada no referencial teórico sociológico de Freidson. Das enunciações compiladas, a partir da oralidade dos participantes do estudo, os elementos interdependentes a uma profissão refletem a Enfermagem com credencialismo, expertise e autonomia. Desta forma, há padronização de suas ações e atitudes profissionais à autorregulação, por meio de organizações profissionais e relação com o Estado. Das significações emergentes, interpretadas para o credencialismo, tratam da autorregulação, da ética, da autonomia, das organizações profissionais, de trabalho e do profissionalismo. Seguem algumas expressões:

Foi uma bandeira que a Enfermagem colocou, que era uma definição profissional ter o seu próprio Conselho. (Solange Wink)

O Conselho viria para mudar a assistência de verbas, para exigir que os postos de saúde tivessem enfermeiras(os), para fazer com que aquela sonhada Enfermagem pudesse se transformar em realidade. (Ingrid Elsen)

Nós tínhamos valores muito firmes a serem preservados pela Enfermagem. O ideal da profissão, postura profissional e ética era o que prevalecia. (Eloita Pereira Neves)

O credencialismo se consubstancia na expertise/conhecimento próprios e específicos da profissão, o que se inter-relaciona com a enunciação:

Nós assumíamos o compromisso com o grupo, que tinha que crescer, desenvolver, motivar pessoas a fazer o Curso, trazer mais pessoas para cá, porque a necessidade aqui era grande. (Nelcy Teresinha Coutinho Mendes)

O princípio dos grupos profissionais está na autonomia/autorregularão que cada grupo tem sobre o seu trabalho, no entanto não faz emergir com clareza o domínio dos fazeres profissionais, para fundamentar a autonomia. Autonomia é o domínio de uma profissão em controlar o seu trabalho, mas garantido pela sociedade.

Houve, sim, um crescimento tanto com relação ao reconhecimento do Conselho, como da profissão que estava começando a ser reconhecida, a Profissão da Enfermagem. (Lydia Ignes Rossi Bub)

Temos uma profissão que ainda é muito vinculada a outras da área da Saúde, quer dizer, essa discussão de autonomia, de qual é o papel realmente. A gente, hoje, desenvolve cerca de 90% ou mais das atividades na área da saúde. Mesmo assim, tem que estar todos os dias provando, que a tua profissão é importante. (Edison José Miranda)

A autonomia é entendida como relativa, uma vez que se apresenta em relações profissional/profissional, profissional/sociedade e profissional/profissional das demais áreas. Assim, a sociedade é composta pelo grupo profissional, pelos protagonistas do cuidado a ser recebido e pelo conjunto social organizado e gerido pelo Estado. A relação do Estado com as profissões estabelece-se por meio dos seus Órgãos representativos, os quais disciplinam e fiscalizam o exercício profissional.

O Conselho foi criado e foi imediatamente absorvido pela Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina e pelos grandes Hospitais. (Rosita Alves da Silva Morgado)

A Enfermagem apresenta formação específica de nível superior, onde sua educação se faz a partir de credenciais de autorregulação e controladas pelo próprio grupo profissional. Apresenta um corpo teórico específico, e o exercício ético se estabelece pelo código de ética, requerido no âmbito interno da profissão, disciplinado e fiscalizado por órgão representativo próprio.

Já falavam das dificuldades de instalar um Conselho, quando ainda era questionado se era uma profissão. Então, eu acho que essa é uma luta constante, não sei se ela já acabou ou se ainda temos que provar que somos uma profissão. (Eloita Pereira Neves)

Nós queríamos uma Enfermagem emancipada, correta. O paciente, que era o nosso centro, nós queríamos ele numa condição boa de atendimento, então isso era uma questão de idealismo e nós éramos fortíssimos. (Lúcia Herta Rockembach)

As enunciações identificadas e interligadas aos conceitos sociológicos do referencial elucidam na figura o eixo central Profissão Enfermagem, circundado pelos contextos do credencialismo, autonomia, expertise/conhecimento, Sociedade, Estado e status profissional. O status profissional, de acordo com a interpretação, vem ao encontro da visão que a profissão tem de si, imprime valor à especificidade do exercício profissional, reconhece a diversidade do meio que integra, aprimora a expertise e sustenta-se em autorregulação. Assim, essas enunciações influenciam a estrutura social e afirma o seu status profissional. São apresentadas por meio da representação conceitual, que traz para discussão uma interpretação sociológica das profissões de Freidson, para a Enfermagem.

Figura 1
Representação da Profissão Enfermagem, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil, 2017

DISCUSSÃO

Nos múltiplos cenários de atenção à saúde, em que a Enfermagem desenvolve suas atividades laborais da questão da educação em saúde às comunidades e aos cuidados em nível hospitalar, perpassam por análises diagnósticas em meio a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE). Esta atividade compreende o pensar e o fazer em definições do plano de cuidados, na busca de alcançar resultados e registrar a evolução de toda a história de saúde e assistencial do ser cuidado. Essas são ações que demandam autonomia profissional de conhecimento, habilidade e atitude na prestação da assistência em saúde da profissional enfermeiro.

É necessário que uma profissão11 Freidson E. Profissão médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado. São Paulo: Editora UNESP; 2009. tenha o monopólio sobre o seu exercício profissional. Isto nos remete ao exercício profissional da Enfermagem, quando desenvolve suas atividades dentro de padrões técnicos, tecnológicos, científicos e éticos, que requerem uma sistematização da assistência a ser prestada.

A Enfermagem pode ser considerada, então, uma profissão caracteristicamente autônoma, haja vista a complexidade da estrutura e do conhecimento organizado em torno da SAE. Segue, desta forma, o argumento de que a “autonomia técnica está na essência daquilo que é próprio e único na profissão”(11 Freidson E. Profissão médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado. São Paulo: Editora UNESP; 2009.). A reivindicação pela posição de autonomia se consubstancia na perícia esotérica ou complexa de sua especificidade(11 Freidson E. Profissão médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado. São Paulo: Editora UNESP; 2009.).

A autonomia profissional é, para Freidson, uma qualidade que confere poder à profissão, a qual alcança o seu status quando desempenha o seu fazer sob a égide da sociedade e do controle estatal. Este conhecimento ou perícia esotérica é entendido como habilidade adquirida de conhecimentos nas diversas áreas do saber e da formação profissional que leigos e profissionais de outras áreas não possuem controle do conhecimento complexo e único às profissões(11 Freidson E. Profissão médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado. São Paulo: Editora UNESP; 2009.). Nesta perspectiva, a autorregulação profissional mostra-se como fator para a autonomia quando a Enfermagem apresenta legislação própria no tocante a este conhecimento complexo e ao exercício da profissão fundamentado na SAE, como pode ser identificado na Resolução COFEN nº 358, de 15 de outubro de 2009(88 Pires DEP, Bellaguarda MLR, Zago AT, Matos E. Série Cadernos Enfermagem Consolidação da Legislação e Ética Profissional. Florianópolis: Coren-SC; 2010.-99 Conselho Federal de Enfermagem (COFEN). Resolução 358, de 15 de outubro de 2009. Dispõe sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE). [cited 2018 May 21]. Available from: http://www.site.portalcofen.gov.br/node/4384.
http://www.site.portalcofen.gov.br/node/...
).

Os escritos de Freidson mostram a Enfermagem como uma ocupação ou mesmo como atividade paraprofissional, que depende das determinações de outro profissional para exercer a sua prática. Ao mostrar que uma profissão evidencia sua autonomia quando não depende de outros para interagir na prática, recorre a uma incongruência então entre autonomia profissional, e as características de uma profissão e os valores de uma profissão(1010 Bellaguarda MLR, Padilha MI, Peres MAA, Paim L. The nursing profession: its status - that is the question. Rev Enferm UERJ. 2016;24(2):e8591. doi: 10.12957/reuerj.2016.8591
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). Se o status de uma profissão depende de seu credencialismo, de leis e conhecimentos específicos e complexos e, da sua relação com o Estado e a sociedade, reflete-se uma autonomia relativa, interdependente.

O argumento de autonomia de Freidson(11 Freidson E. Profissão médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado. São Paulo: Editora UNESP; 2009.) está no domínio de uma profissão em controlar o seu trabalho, mas que seja garantido pela sociedade. O sociólogo considera uma qualidade que confere poder à profissão, a qual alcança o seu status (1111 Bellaguarda MLR, Padilha MI, Pereira Neto AF, Pires D, Peres MAA. Reflection on the legitimacy of the autonomy at nursing in the field of the health professions in the light of Eliot Freidson's ideas. Esc Anna Nery. 2013;17(2):369-74. doi: 10.1590/S1414-81452013000200023
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)..Nesta abordagem, o status profissional é a posição de autoridade técnica e legal na divisão do trabalho de uma ocupação. A posição de importância e necessidade que a profissão apresenta no interior da sociedade são os atributos específicos que fazem da profissão necessária e reconhecidamente importante à resolutividade das situações de saúde e doença, no caso das profissões da área da Saúde.

Caracteriza-se por trabalho especializado, corpo teórico específico, ética no uso da expertise, programa formal de ensino superior e reconhecida pela importância do trabalho profissional para a sociedade. Reafirma as metas do projeto profissional(1212 Pimenta AL, Souza ML de. The professional identity of nursing in the papers published by Reben. Texto Contexto Enferm. 2017;26(1): e4370015. doi: 10.1590/0104-07072016004370015
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) por meio do reconhecimento legal do Estado e legislação profissional como instrumentos de caráter identitário. Define quem pode e quem não pode exercer e desenvolver a profissão.

A relação do Estado, agentes e agências oficiais formaliza a profissão e atribui a ela o controle da ocupação sobre o seu trabalho. Neste sentido, traz à discussão esta autonomia, a autorregulação e sua relação com a organização profissional e com os interesses políticos do Estado(11 Freidson E. Profissão médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado. São Paulo: Editora UNESP; 2009.). O caráter técnico do trabalho é de responsabilidade da profissão, ficando sob a responsabilidade do Estado a organização econômica e social do trabalho. A produção de conhecimentos e o conhecimento, em si, instrumentaliza o processo de tomada de decisões e a luta da categoria por condições adequadas de trabalho, incluindo: salário; jornada e regras de aposentadoria e de contratos trabalhistas; ambiente e quantidade e qualidade de instrumentos de trabalho seguros, tecnologicamente apropriados; equipamentos de proteção individual e coletiva; dimensionamento de pessoal e adequada divisão do trabalho(1313 Pires DEP. Nursing as discipline, profession, and labour. Rev Bras Enferm. 2009;62(5):739-44. doi: 10.1590/S0034-71672009000500015
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). Há necessidade de produção de políticas que fundamentem as lutas por legislação trabalhista apropriada para o trabalho na Saúde e na Enfermagem e, essencialmente, atendimento às necessidades de saúde da população.

Expertise ou conhecimento é entendido como um corpo de fatos, possivelmente verdadeiros, ordenado por algumas ideias ou teorias que fornecem a essência formal do aprendizado dos experts em escolas profissionais(11 Freidson E. Profissão médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado. São Paulo: Editora UNESP; 2009.). O autor alega, para ser considerada uma profissão, a inclusão de formação específica, treinamentos e a construção de conhecimentos próprios, constante em todos os seus escritos desde a década de 70 do século XX. Este é um destaque na Sociologia das Profissões de Freidson, uma vez que ele atribui valor à perspectiva da cognição, a qual traz explicações sobre à organização profissional e a partir do conhecimento específico alcançam a autonomia.

A formação deverá estar submetida a regulamentos formais fundamentados em legislação pertinente, bem como a regulamentações e resoluções vinculadas a instituições políticas, organizações profissionais e educacionais. As Teorias de Enfermagem propiciam um corpo organizado de conhecimentos, com a função de orientar os eventos a serem estudados, conceitualizar fenômenos para facilitar a comunicação por meio da significação e prever os fatos a partir das observações realizadas rumo a descobertas.

As Teorias de Enfermagem, do ponto de vista da Sociologia das Profissões, são entendidas como a expertise necessária à formação da profissional enfermeira, auxiliam no esclarecimento e compreensão potencial de práticas e eventos da profissão. As Teorias de Enfermagem são proposições para contribuir com a assistência de Enfermagem, possibilitando emergir as relações entre os profissionais e os indivíduos que necessitam de cuidados(77 Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2016.,1414 Schmitz EL, Gelbcke FL, Bruggmann MS, Luz SCL. Philosophy and conceptual framework: collectively structuring nursing care systematization. Rev Gaúcha Enferm. 2016;37(esp):e68435. doi: 10.1590/1983-1447.2016.esp.68435
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).

Neste sentido, a diferença entre profissão e profissionalismo(11 Freidson E. Profissão médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado. São Paulo: Editora UNESP; 2009.) é importante ao entendimento de que uma refere-se à ocupação em si e a outra às atitudes no trabalho desenvolvido pelo profissional. Profissão é uma ocupação com posição especial na divisão do trabalho, expertise que garante a especificidade do seu saber-fazer e credenciais qualificacionais por meio de órgãos disciplinadores da profissão. O profissionalismo caracteriza-se pelo conjunto de atributos característicos dos profissionais(11 Freidson E. Profissão médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado. São Paulo: Editora UNESP; 2009.). Este afirma que o profissionalismo existe independente do status profissional.

As autoras interpretam que esta questão semântica é pertinente, já que a profissão não se faz separadamente do trabalhador que a compõe. Não há de se falar da sociologia que circunda a organização profissional sem se analisar a competência do indivíduo que aprimora seus conhecimentos com vistas à qualificação e significação do seu profissionalismo.

O conhecimento profissional ou expertise, como defende Freidson(11 Freidson E. Profissão médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado. São Paulo: Editora UNESP; 2009.), torna-se avaliado de maneira mais adequada se for observado atentamente o trabalho profissional. É importante observar que a expertise segundo o referencial confere autonomia no controle de definição de problemas sob seu domínio, como na forma pela qual realiza o seu trabalho. De acordo com, Eliot Freidson: “O que os profissionais fazem representa o seu efetivo conhecimento e expertise; a maneira como regulam o que fazem em prol do interesse público representa sua efetiva orientação para o serviço e a ética”(11 Freidson E. Profissão médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado. São Paulo: Editora UNESP; 2009.).

Neste sentido, a regulação do trabalho profissional por meio de legislações e códigos de ética aplica-se, conforme Freidson, ao profissionalismo. Portanto, não garante que a expertise e a ética, regidas sobre o trabalho profissional, assegurem assistência regular e de qualidade aos que dependem da prática do grupo profissional específico. Entretanto, o argumento de Freidson(11 Freidson E. Profissão médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado. São Paulo: Editora UNESP; 2009.) quanto à relação conhecimento e ética é de que o fato de praticar o conhecimento faz com que a atividade profissional seja desenvolvida por quem, essencialmente, tem expertise.

A Enfermagem mostra-se como profissão que vem ao longo de sua trajetória histórica construindo um corpo específico de conhecimentos delineado por princípios éticos e de autorregularão(1313 Pires DEP. Nursing as discipline, profession, and labour. Rev Bras Enferm. 2009;62(5):739-44. doi: 10.1590/S0034-71672009000500015
https://doi.org/10.1590/S0034-7167200900...
). Pertinente conceituar a Enfermagem a partir das ideias de Freidson, uma vez que seu pensamento é basilar ao desenvolvimento deste estudo. No entanto, ao mesmo tempo que a retórica do sociólogo traz à discussão aquilo que caracteriza uma profissão expõe uma interpretação da Enfermagem como uma paraprofissão. Entende-se que um referencial é alicerce de uma discussão, mas há de ser interpretado e ser dialogado com ele, para que o conhecimento se faça e se amplie. Assim sendo, as autoras deste estudo trazem um conceito de Enfermagem delineado pelas ideias Freidsonianas, mas discordante do referido em seus escritos.

Consideram, desta forma, que a Enfermagem é uma profissão de assistência à saúde fundamentada no conhecimento científico, na sua autorregulação e na autonomia do seu fazer por meio de práticas de cuidado, educação e gestão cooperativas às pessoas, em interdependência com seus pares e demais profissionais da área da saúde.

Na perspectiva deste trabalho, a expertise cria condições para que os membros da organização profissional da Enfermagem estruturem bases para o exercício autônomo e ao interesse da assistência competente e segura de saúde à sociedade. Os aspectos da prática e as normas orientadoras para o exercício da profissão incluem legitimidade do fazer da Enfermagem.

As credenciais qualificacionais sobre o próprio trabalho definidos na Enfermagem estão nas formas identitárias que esse grupo profissional atribui para si na atenção à saúde. O credencialismo mostra-se como sendo o conjunto de regras e regulamentos formais corporificados em Leis ou a regulamentos e resoluções vinculados a instituições políticas, associações profissionais e organizações educacionais(11 Freidson E. Profissão médica: um estudo de sociologia do conhecimento aplicado. São Paulo: Editora UNESP; 2009.).

O credencialismo posiciona-se como proteção à expertise e reitera-se por meio de um título ou credencial, formação por meio de treinamentos e estratégias de certificação determinados por associações, pressupondo, desta forma, uma regulamentação profissional por lei e atuação dos Conselhos Profissionais. O credencialismo de uma profissão mostra-se como prerrogativa de institucionalização, de aplicabilidade da deontologia profissional, da acreditação da formação acadêmico-profissional e adequação do funcionamento no mercado profissional. A autonomia das profissões do Estado é um recurso entendido como fundamental à profissionalização, se observar acerca da autorregulação das profissões realizada pelo órgão representativo da profissão, como as Ordens, Colégios e/ou Conselhos. Observa-se que a criação e o desenvolvimento de Associações e Conselhos profissionais apresenta-se como referência para o reconhecimento de uma profissão. Assim, apropriadamente credencia uma ocupação em profissão reconhecida pelo Estado e, assim sendo, traz garantias de sua utilidade como tal à sociedade.

No âmbito da Enfermagem, a relação da profissão com o Estado se dá por meio das credenciais qualificacionais, no que tange à educação formal e às premissas da Lei para o Exercício profissional nº 7.498/86, garantidas pelo Conselho Profissional da categoria. A ABEn mostra a trajetória de profissionalização da Enfermagem brasileira, em interação com a construção do conhecimento, qualificação profissional e a organização da profissão até a criação e desenvolvimento do COFEN.

Para Freidson a expertise e o credencialismo balizam as profissões para que sustentem uma determinada autonomia profissional. Assim sendo, a expertise se consubstancia na formação superior da enfermeira, com treinamentos, sob o uso e aprimoramento de técnicas de cuidado à saúde e tecnologias específicas. Este saber é construído por meio de pesquisas e acompanha as transformações sociais. A formação profissional, entendida nesta perspectiva, é o treinamento, a capacitação e a construção de conhecimento próprio e específico, que proporciona autoridade técnica e teórica sobre saberes em determinadas áreas.

As Teorias de Enfermagem e novas formas de sistematizar a assistência fazem emergir o conhecimento, a perícia esotérica que é determinada por corpo próprio de conhecimentos e que define a Enfermagem como profissão do cuidado. Nesta interpretação, adiciona-se a consulta como prática advinda da expertise e da autorregulação. O reconhecimento legal da Enfermagem, enquanto profissão da área da Saúde, é estabelecido na Lei do Exercício profissional nº 7.498/86, bem como em Resoluções do COFEN. Na prática assistencial, consolida-se na assistência de saúde a sociedade nos contextos hospitalar, ambulatorial e do Sistema Único de Saúde por meio da Estratégia Saúde da Família (ESF) e a partir da prática de consulta em estabelecimentos privados de saúde(33 Pires DEP. Necessary changes for advancing Nursing as caring Science. Rev Bras Enferm. 2013;66(esp):39-44. doi: 10.1590/S0034-71672013000700005
https://doi.org/10.1590/S0034-7167201300...
).

O conhecimento formalizado e atribuído à enfermeira em formação incrementa, entre outros fatores, a pesquisa em Enfermagem e Saúde, que se amplia gradativamente, para intensificar o credencialismo da profissão. O Estado intervém por meio das normas postas no mundo do trabalho em resposta aos movimentos políticos e econômicos instaurados. Exige, desta forma, a aplicabilidade, disciplina e fiscalização, ou seja, a autorregulação profissional dos órgãos representativos, em Associações e/ou Conselho. Em relação à Enfermagem, a autorregulação corresponde ao COFEN e seus Regionais, em parceria com a Abem e os sindicatos profissionais(33 Pires DEP. Necessary changes for advancing Nursing as caring Science. Rev Bras Enferm. 2013;66(esp):39-44. doi: 10.1590/S0034-71672013000700005
https://doi.org/10.1590/S0034-7167201300...
).

Esta prática se reflete na organização do trabalho e no profissionalismo dos membros constituintes de uma profissão. Todo este complexo de conceitos e organização característica para a formalização de uma profissão só se consolida com a aceitação da sociedade e fundamentada pela função da ética profissional em convencer o Estado e a sociedade do valor e necessidade desta profissão.

Ações de disciplinamento e de apuração de denúncias éticas fazem do Conselho Profissional de Enfermagem um importante articulador nas redes de apoio a práticas assistenciais seguras à população, sustentadas pelo Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem. A organização profissional corresponde à prática de relações de trabalho. A relação entre os membros de uma profissão, com integrantes de outras profissões e ainda entre as pessoas/usuários dos serviços de saúde, responde à organização profissional(88 Pires DEP, Bellaguarda MLR, Zago AT, Matos E. Série Cadernos Enfermagem Consolidação da Legislação e Ética Profissional. Florianópolis: Coren-SC; 2010.). Nesta perspectiva, a estrutura profissional corresponde a uma organização de trabalho, uma vez que as relações estabelecidas entre os profissionais seguem a divisão do trabalho em Saúde e em Enfermagem. Inter-relaciona a qualidade individual do profissional com a condição do meio onde o trabalho é exercido e, ainda, com as redes de relações informais e formais entre os pares e os profissionais das variadas profissões.

A autonomia se estabelece pela relativização de autoridade apresentada pelas profissões para se governarem. No universo da organização profissional, existe a autoridade que acontece no âmbito do desenvolvimento das ações, que contemplam práticas específicas, características aos procedimentos de Enfermagem. Refere-se à autonomia entre os membros da equipe de Enfermagem, e entre as atividades de competência de cada um. A autonomia se dá nos espaços em que há divisão de trabalho da Enfermagem entre outras profissões, conforme especificidade das áreas do conhecimento definido e desenvolvido por elas(33 Pires DEP. Necessary changes for advancing Nursing as caring Science. Rev Bras Enferm. 2013;66(esp):39-44. doi: 10.1590/S0034-71672013000700005
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).

Entende-se que a autonomia aparece entre profissionais da mesma categoria, que identifica-se como sendo autonomia profissional x profissional, ou seja, aquela que se estabelece a partir do conhecimento, autorregulação e organização do trabalho, relações de orientação e supervisão dos fazeres no interior das práticas assistenciais e educacionais entre membros da mesma categoria. A relativização da autonomia caracteriza-se no caso da Enfermagem pelos limites que cada membro da equipe apresenta para desenvolver a sua atividade e fazer emergir o seu conhecimento, habilidade e atitudes próprias dentro da mesma especificidade. Ao se compreender que a Enfermagem desenvolve suas ações com e para a sociedade, a autonomia profissional x sociedade é entendida como a relação entre o profissional e os usuários dos serviços prestados por este profissional, a partir da competência e expertise que lhe é própria. Deve-se haver liberdade na assistência a ser desenvolvida e tomada de decisões, no compartilhamento de orientação e discussão com os membros da sociedade que utilizam esses serviços especializados.

As variadas formas de relações no âmbito do trabalho fazem-se entender a partir deste estudo como a autonomia profissionais x profissionais da área da Saúde e demais áreas. Esta relação de autonomia é percebida como a independência na efetivação das atividades próprias a cada área profissional, e liberdade nas tomadas de decisão que se aplicam à educação, gestão e assistência no âmbito da Perícia Esotérica de cada profissional.

Para a efetividade desta autonomia, é pertinente utilizar interdependência, coparticipação e compartilhamento de expertise e treinamento, para o alcance da qualidade de atenção à sociedade. Além disso, deve haver respeito aos limites legais e ético-profissionais de cada organização profissional(1111 Bellaguarda MLR, Padilha MI, Pereira Neto AF, Pires D, Peres MAA. Reflection on the legitimacy of the autonomy at nursing in the field of the health professions in the light of Eliot Freidson's ideas. Esc Anna Nery. 2013;17(2):369-74. doi: 10.1590/S1414-81452013000200023
https://doi.org/10.1590/S1414-8145201300...
).

Tratando-se de autonomia, a Lei do Exercício profissional da Enfermagem no. 7.498/86, em seu “art. 11”, dispõe que o enfermeiro exerce todas as atividades de Enfermagem, cabendo-lhe: c) planejamento, organização, coordenação, execução e avaliação dos serviços da assistência de Enfermagem; i) consulta de enfermagem; j) prescrição de enfermagem”(88 Pires DEP, Bellaguarda MLR, Zago AT, Matos E. Série Cadernos Enfermagem Consolidação da Legislação e Ética Profissional. Florianópolis: Coren-SC; 2010.). Declara também a independência do enfermeiro quanto ao direito de realizar a consulta de Enfermagem, bem como outras prerrogativas para esta ação. Outras normatizações indicam a autonomia que a Enfermagem apresenta na organização das suas ações, como a SAE, definida na Resolução COFEN no. 358/2009, que no seu art. 3 “o processo de enfermagem deve estar baseado em um suporte teórico que oriente a coleta de dados, o estabelecimento de diagnósticos de enfermagem e o planejamento das ações ou intervenções de enfermagem, e que forneça a base para a avaliação dos resultados de enfermagem alcançados”(99 Conselho Federal de Enfermagem (COFEN). Resolução 358, de 15 de outubro de 2009. Dispõe sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE). [cited 2018 May 21]. Available from: http://www.site.portalcofen.gov.br/node/4384.
http://www.site.portalcofen.gov.br/node/...
).

Este movimento social da profissão tem o propósito de efetivação do trabalho, de partilhamento de ideias e saberes, para o atendimento das necessidades de saúde da população. O status profissional se amplia e se estabelece a partir da relação entre o verdadeiro conhecimento construído no seio das profissões e a maneira pela qual se utilizam dele para que a integração com a sociedade reverta em bem-estar, saúde, qualidade e respeito à vida humana.

Analisando as ideias de Freidson, “acredita ser a mais alta expressão de um profissional: transparência, responsabilidade pública e uma preocupação com o bem-estar da nossa aldeia global”(44 Freidson E. Profissionalism. The third logic. Chicago: The University of Chicago press; 2001.). A visão que a profissão tem de si e do meio que integra demarca a busca da expertise e recorre à autorregulação, assim, influencia a estrutura social e dota a ocupação de um determinado status profissional. Este movimento se faz num continnum que prescreve e reescreve a história das profissões.

Limitações do estudo

Há relação da discussão das autoras e o referencial Freidsoniano, no tocante à defesa do sociólogo, de a Enfermagem ser uma paraprofissão.

Contribuições para a área da Enfermagem, Saúde ou Política Pública

Como contribuição, há o argumento em defesa da Enfermagem como profissão, em meio às características da autonomia, do credencialismo e da expertise numa abordagem sociológica. Instiga-se o movimento dos profissionais no envolvimento com as causas da Enfermagem, com vistas à luta coletiva por valorização e visibilidade profissional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir da interpretação dos conceitos sociológicos da profissão fundamentados em Eliot Freidson e na história da Enfermagem, conclui-se que a dinâmica social da profissão tem o propósito de efetivação do trabalho e do partilhamento de saberes, com foco nas necessidades e atendimento de saúde da população. Para tanto, a visibilidade interna que a profissão tem de si e do meio que a compõe legitima a demarcação da expertise, fundamenta a autorregularão e configura o seu status profissional. Este movimento de refletir e conhecer como a profissão se conceitua e se organiza evidencia o reconhecimento e a necessidade da Profissão Enfermagem pela sociedade.

Certamente, com a percepção de todo o contexto de desenvolvimento da Enfermagem nos últimos 30 anos, considerando-se a análise fundamentada em Freidson, as transformações advêm da produção do conhecimento, da ampliação dos cuidados do individual ao coletivo, da expansão da empregabilidade no setor público e no privado. Vêm, atrelado a isso, mudanças nos modelos de cuidado compartilhado e do credencialismo consolidado nas normalizações e políticas públicas, que exigem a competência profissional no âmbito técnico, científico, tecnológico, ético e sistematizado.

Esta interpretação da sociologia das profissões para a Enfermagem vem ao encontro das metas da Organização Mundial da Saúde para o Programa Nursing Now. Corrobora ao fortalecimento educacional, de trabalho, de pesquisa e de liderança dos profissionais da Enfermagem. Haja vista que, para o alcance da autonomia e do status profissional, há desafios referentes ao trabalho, à distribuição de profissionais e ao entendimento, que o protagonismo profissional é proporcional à compreensão que a própria comunidade da Enfermagem tem do seu valor.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Aparecida Barbosa
EDITOR ASSOCIADO: Elucir Gir

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Ago 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    30 Abr 2019
  • Aceito
    02 Ago 2019
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