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Mulheres e COVID-19: reflexões para uma atenção obstétrica baseada nos direitos sexuais e reprodutivos

RESUMO

Objetivo:

Este ensaio se propõe a refletir sobre as repercussões da pandemia na atenção obstétrica à luz dos direitos sexuais e reprodutivos, com enfoque na atenção ao parto e nascimento.

Resultados:

A reflexão demonstra que a pandemia acentuou a violação desses direitos, o que se evidencia pelas desigualdades raciais na mortalidade materna, bem como restrições e intervenções na assistência ao parto sem evidência científica, desvio de recursos, interrupção de serviços, recursos humanos reduzidos, escassez de medicamentos e suprimentos e desequilíbrios na prestação de serviços de saúde.

Conclusão:

Conclui-se que a atenção obstétrica enfrenta barreiras ainda maiores no acesso à saúde, assim como a pandemia da COVID-19 ressaltou as iniquidades, impactando desproporcionalmente populações vulneráveis, cujos direitos humanos são menos protegidos.

Descritores:
Mulheres; Infecções por Coronavírus; Atenção à Saúde; Obstetrícia; Direitos Sexuais e Reprodutivos

ABSTRACT

Objective:

This essay aims to reflect on the repercussions of the pandemic in obstetric care in the light of sexual and reproductive rights, focusing on delivery and birth care.

Results:

The reflection shows that the pandemic has accentuated the violation of these rights, which is evidenced by racial inequalities in maternal mortality, as well as restrictions and interventions in childbirth care without scientific evidence, detour of resources, interruption of services, reduced human resources, shortage of medicines and supplies, and imbalances in the provision of health services.

Conclusion:

It is concluded obstetric care faces even greater barriers in access to health care, just as the pandemic of COVID-19 highlighted inequities, disproportionately impacting vulnerable populations whose human rights are less protected.

Descriptors:
Women; Coronavirus Infections; Health Care; Obstetrics; Sexual and Reproductive Rights

RESUMEN

Objetivo:

Esto ensayo propone reflejarse acerca de repercusiones de la pandemia de COVID-19 en atención obstétrica de acuerdo con los derechos sexuales y reproductivos, basado en la atención al parto y nacimiento.

Resultados:

Reflexión demuestra que la pandemia acentuó la violación de esos derechos, que se evidencia por desigualdades raciales en la mortalidad materna, así como restricciones e intervenciones en asistencia al parto sin evidencia científica, desvío de recursos, interrupción de servicios, recursos humanos reducidos, escasez de medicamentos y suministros y desequilibrios en prestación de servicios de salud.

Conclusión:

Concluyó que aún la atención obstétrica enfrenta barreras mayores en acceso a la salud, así como la pandemia de COVID-19 resaltó las iniquidades, impactando desproporcionadamente poblaciones vulnerables, cuyos derechos humanos son menos protegidos.

Descriptores:
Mujeres; Infecciones por Coronavirus; Atención a la Salud; Obstetricia; Derechos Sexuales y Reproductivos

INTRODUÇÃO

A pandemia causada pela doença do novo coronavírus (COVID-19) foi declarada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em dezembro 2019, como uma emergência global de saúde pública. Mulheres estão sendo desproporcionalmente afetadas pelas consequências da pandemia da COVID-19 - por exemplo, o aumento da violência de gênero, em decorrência do isolamento social com o companheiro agressor. Outro motivo de haver maior impacto sobre elas está no fato de serem maioria entre trabalhadores informais e de saúde. Assim, essa crise sanitária vem agravando as desigualdades vivenciadas por meninas e mulheres e outros grupos em situações de vulnerabilização(11 ONU Mulheres Brasil. Gênero e covid-19 na américa latina e no caribe: dimensões de gênero na resposta [Internet]. Brasília: ONU Mulheres Brasil; 2020[cited 2020 Aug 12]. Available from: http://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2020/03/ONU-MULHERES-COVID19_LAC.pdf
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).

Na saúde reprodutiva, estudos já apontam a hipersexualização das mulheres, as desigualdades em relação à responsabilização pela criação dos filhos; o desvio de recursos dos serviços de saúde de rotina, exacerbando a falta de acesso à continuidade do pré-natal, ao puerpério, contracepção, prevenção de infecções sexualmente transmissíveis, rastreamento do câncer; aborto inseguro; entre outros(11 ONU Mulheres Brasil. Gênero e covid-19 na américa latina e no caribe: dimensões de gênero na resposta [Internet]. Brasília: ONU Mulheres Brasil; 2020[cited 2020 Aug 12]. Available from: http://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2020/03/ONU-MULHERES-COVID19_LAC.pdf
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). Além disso, acentuam-se situações de violência obstétrica(22 Sadler M, Leiva G, Olza I. COVID-19 as a risk factor for obstetric violence. Sex Reprod Health Matters [Internet]. 2020 [cited 2020 Sep 2];28(1):1-4. https://doi.org/10.1080/26410397.2020.1785379
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).

Existem profundas estruturas de desigualdades, o que faz a pandemia atingir as pessoas de maneiras diferentes, de modo que seus efeitos e impactos não são iguais. No contexto de cuidados em saúde sexual e reprodutiva, a pandemia precarizou ainda mais as condições de atendimento, que, em circunstâncias normais, já eram precárias em vários países, com aumento do risco de vida. Como evidência disso, pode-se citar uma abordagem feminista interseccional cujos resultados revelam que a pandemia reforça desigualdades raciais, de classe e gênero, bem como a perspectiva de confinamento faz com que grupos de pessoas se tornem mais vulneráveis à violência de gênero(33 Hinz K, Zubek I. Why the COVID-19 Pandemic Needs an Intersectional Feminist Approach. Rosa-Luxemburg-Stiftung [Internet]. Berlin: Rosa-Luxemburg-Stiftung; 2020 [cited 2020 Aug 20]. Available from: https://www.rosalux.de/en/news/id/42062/why-the-covid-19-pandemic-needs-an-intersectionalfeministapproach?cHash=82963ceb141a9a3480bfe2684d6e797b
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).

Nesse sentido, há necessidade de analisar os efeitos da pandemia pelo viés do gênero, o qual resgata os direitos reprodutivos, entendidos como direitos humanos que garantem o exercício individual, livre e responsável, da sexualidade, da autonomia sobre o próprio corpo e da escolha reprodutiva. Ademais, os direitos reprodutivos devem garantir a atenção obstétrica e acesso ao cuidado de qualidade que contemple as diferentes dimensões da vida das mulheres(22 Sadler M, Leiva G, Olza I. COVID-19 as a risk factor for obstetric violence. Sex Reprod Health Matters [Internet]. 2020 [cited 2020 Sep 2];28(1):1-4. https://doi.org/10.1080/26410397.2020.1785379
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).

Portanto, este ensaio tem como objetivo refletir sobre a atenção obstétrica no contexto da pandemia da COVID-19 e implicações na garantia dos direitos reprodutivos. Para tanto, se propõe a problematizar as repercussões da pandemia na atenção à saúde das mulheres à luz dos direitos sexuais e reprodutivos, com enfoque na atenção ao parto e nascimento.

Pandemia e descaminhos nos direitos sexuais e reprodutivos

Na assistência às mulheres no ciclo gravídico puerperal, a pandemia da COVID-19 impacta diretamente a violação dos direitos humanos. Isso porque, serviços de saúde ao redor do mundo, reconhecidos por oferecerem assistência de qualidade à maternidade nos últimos anos, estão regredindo durante a pandemia da COVID-19. Algumas das restrições e intervenções implementadas no parto devido a essa pandemia não são necessárias, não são capazes de limitar a contaminação do vírus nem apresentam evidências científicas, desrespeitando, assim, a dignidade humana. Portanto, constituem formas de violência obstétrica e resultam em intervenções desnecessárias, feitas sem indicação obstétrica, como cesarianas ou partos acelerados e/ou instrumentais e proibição do acompanhante no trabalho de parto(22 Sadler M, Leiva G, Olza I. COVID-19 as a risk factor for obstetric violence. Sex Reprod Health Matters [Internet]. 2020 [cited 2020 Sep 2];28(1):1-4. https://doi.org/10.1080/26410397.2020.1785379
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).

Nesse sentido, com uma compreensão limitada dos efeitos da COVID-19 durante a gravidez, médicos/as estão tomando decisões desinformadas, não baseadas em evidências científicas. A comunidade médica e acadêmica deveria reconhecer as lacunas de conhecimento, em vez de tentar preenchê-las com especulações(44 Schmid MB, Fontijn J, Ochsenbein-Kölble N, Berger C, Bassleret D. COVID-19 em mulheres grávidas. Lancet Infect Dis. 2020;20(6):653-3. https://doi.org/10.1016/S1473-3099(20)30175-4
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).

Em se tratando da atenção ao recém-nascido, há evidências de que o isolamento dele, o clampeamento precoce do cordão e a restrição do aleitamento materno podem levar a consequências prejudiciais em longo prazo, se aplicados à população em geral(44 Schmid MB, Fontijn J, Ochsenbein-Kölble N, Berger C, Bassleret D. COVID-19 em mulheres grávidas. Lancet Infect Dis. 2020;20(6):653-3. https://doi.org/10.1016/S1473-3099(20)30175-4
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). Ademais, o isolamento do recémnascido pode atrapalhar os mecanismos de prevenção de infecções, perturbar sua fisiologia, considerando que, quando separados das mães, apresentam frequência cardíaca e respiratórias mais altas e níveis mais baixos de glicose do que os que são colocados no contato pele a pele. A separação interfere no aleitamento materno e pode interromper a proteção imunológica inata e os benefícios do leite materno, impactar a construção do vínculo, além de sobrecarregar o sistema de saúde, pois o isolamento da mãe e do bebê requer o dobro dos recursos para atendimento do binômio(55 Stuebe A. Should infants be separated from mothers with COVID-19? first, do no harm. Breastfeed Med. 2020;15(5):351-2. https://doi.org/10.1089/bfm.2020.29153.ams
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).

As diretrizes da OMS para o manejo clínico da COVID-19 recomendam que todas as gestantes, incluindo aquelas com infecção confirmada ou suspeita pelo coronavírus, devem ter acesso aos cuidados centrados na mulher, respeitosos e qualificados. Nessa discussão, a via de parto deve ser individualizada, e a cesárea deve ser realizada apenas quando justificada clinicamente - não há evidências para sugerir uma contraindicação ao parto vaginal. Também, indica-se praticar o contato pele a pele, a amamentação e o alojamento conjunto com a presença contínua do recémnascido independentemente de suspeição, probabilidade ou confirmação da COVID-19. Informações sobre as precauções - tais como lavagem das mãos, uso de uma máscara se tiver tosse, desinfecção de ambientes e superfícies - devem fazer parte da rotina de cuidados nos serviços de saúde materna(66 World Health Organization (WHO). Clinical management of severe acute respiratory infection (SARI) when COVID-19 disease is suspected: interim guidance[Internet]. Genebra: World Health Organization; 2020 [cited 2020 Mar 13]. Available from: https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/331446/WHO-2019-nCoV-clinical-2020.4-eng.pdf?sequence=1&isAllowed=y
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).

No Brasil, são preocupantes as mortes maternas em consequência da COVID-19. A primeira pesquisa que descreve os resultados da doença em mulheres grávidas e no pós-parto, realizada no período de 26 de fevereiro a 18 de junho de 2020, aponta 978 diagnosticadas e 124 mortes de mulheres grávidas ou puérperas, mostrando um número 3,4 vezes maior que o número total de mortes maternas relacionadas à COVID-19 em todo o mundo. Isso representa uma taxa de mortalidade de 12,7% na população obstétrica brasileira, também superior às taxas internacionais relatadas até o momento. Este estudo explica que vários fatores contribuem para elevada taxa de mortalidade no Brasil, como atendimento pré-natal de baixa qualidade, recursos insuficientes para administrar cuidados críticos e de emergência, violência obstétrica, altas taxas de cesarianas. Além disso, outro fato são as disparidades raciais e sociais no acesso aos serviços de maternidade, conforme se evidencia pelos determinantes sociais, já que 71% dos óbitos maternos foram de mulheres pretas, e 68% dos óbitos foram de mulheres que moravam na Região Norte ou Nordeste(77 Takemoto MLS, Menezes MO, Andreucci CB, Nakamura-Pereira M, Amorim MM, Katz L, et al. The tragedy of COVID‐19 in Brazil: 124 maternal deaths and counting. Int J Gynaecol Obstet. 2020;154-156. https://doi.org/10.1002/ijgo.13300
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).

O mesmo estudo ressalta barreiras para acessar ventiladores e cuidados intensivos. Ainda, demonstrou que, dos 978 casos positivos em gestantes ou puérperas, 207 (21,2%) foram admitidos na UTI (134 casos recuperados e 73 casos fatais), 22,6% das mulheres que morreram não foram admitidas na UTI, apenas 64% estavam sob ventilação invasiva, bem como nenhum suporte ventilatório foi oferecido em 14,6% de todos os casos fatais, enquanto os 21,4% restantes receberam apenas ventilação não invasiva(77 Takemoto MLS, Menezes MO, Andreucci CB, Nakamura-Pereira M, Amorim MM, Katz L, et al. The tragedy of COVID‐19 in Brazil: 124 maternal deaths and counting. Int J Gynaecol Obstet. 2020;154-156. https://doi.org/10.1002/ijgo.13300
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).

Portanto, além das repercussões negativas na atenção obstétrica, outro estudo evidenciou que há um impacto racial desproporcional da COVID-19 entre mulheres pretas e brancas. O perfil de idade e de morbidades associadas são equivalentes, mas as mulheres pretas são hospitalizadas em piores condições. Enquanto 30% das mulheres brancas são internadas com saturação de oxigênio baixa, 50% das mulheres pretas são internadas com esse parâmetro, demonstrando menor acesso à assistência para esse grupo. Ademais, elas têm maior probabilidade de internação em UTI (19,4%) com ventilação mecânica (7,3%) e de morrer (8,9%)(88 Santos DS, Menezes MO, Andreucci CB, Nakamura-Pereira M, Knobel R, Katz L, et al. Disproportionate impact of coronavirus disease 2019 (COVID-19) among pregnant and postpartum black women in Brazil through structural racism lens. Clin Infect Dis. 2021;72(11):2068-9. https://doi.org/10.1093/cid/ciaa1066
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).

Esses dados mostram que políticas limitadas que não visam a populações vulneráveis e não incluem os determinantes sociais de saúde aumentam as iniquidades sociais e as injustiças sexuais e reprodutivas(99 Hall KS, Samari G, Garbers S, Casey SE, Diallo DD, Orcutt M, et al. Centring sexual and reproductive health and justice in the global COVID-19 response. Lancet Infect Dis. 2020;395(10231):1175-7. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(20)30801-1
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). Por exemplo, a situação atual dos direitos humanos das mulheres no parto durante esta pandemia é um exemplo perfeito de quão pouco é necessário para os sistemas de saúde violarem os direitos das mães e de seus bebês(22 Sadler M, Leiva G, Olza I. COVID-19 as a risk factor for obstetric violence. Sex Reprod Health Matters [Internet]. 2020 [cited 2020 Sep 2];28(1):1-4. https://doi.org/10.1080/26410397.2020.1785379
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). Além do que, mulheres grávidas enfrentam desafios específicos devido às suas responsabilidades na força de trabalho, como cuidadoras de crianças e outros membros da família, no contato com serviços de maternidade e ambientes clínicos, onde o risco de exposição à infecção é maior(1010 Hussein J. COVID-19: What implications for sexual and reproductive health and rights globally?. Sex Reprod Health Matters. 2020;28(1):1-3. https://doi.org/10.1080/26410397.2020.1746065
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).

Em âmbito global, os estudos referentes à saúde da mulher reforçam um árduo caminho para a garantia de seus direitos durante a pandemia da COVID-19. A implementação rigorosa de abordagens orientadas pela ciência pode não corresponder ao ritmo das ameaças dessa doença, devido à capacidade humana reduzida, escassez de medicamentos e suprimentos bem como aumento da demanda por serviços de saúde sexual e reprodutiva já sobrecarregados(99 Hall KS, Samari G, Garbers S, Casey SE, Diallo DD, Orcutt M, et al. Centring sexual and reproductive health and justice in the global COVID-19 response. Lancet Infect Dis. 2020;395(10231):1175-7. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(20)30801-1
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).

Dessa forma, a pandemia da COVID-19 interfere nos direitos humanos de várias formas, em pessoas, sistemas e níveis sociais, seja pelos danos causados durante a gravidez, seja pela implementação de recomendações rigorosas de controle de isolamento e infecção, assim como pelos desequilíbrios na prestação de serviços de saúde, interrupção dos serviços essenciais de rotina e realocação de escassos profissionais de saúde. A pandemia também mostrou aumento de intervenções sem evidências científicas², além de desvio de recursos dos cuidados essenciais de saúde sexual e reprodutiva ao se priorizar a resposta da COVID-19. Ainda, os riscos de morbimortalidade materna e infantil aumentaram diante de gestações não planejadas e falta de acesso aos serviços(1010 Hussein J. COVID-19: What implications for sexual and reproductive health and rights globally?. Sex Reprod Health Matters. 2020;28(1):1-3. https://doi.org/10.1080/26410397.2020.1746065
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).

Portanto, adversidades na saúde reprodutiva poderão ser superadas apenas quando as respostas de saúde pública à COVID-19 alavancarem estruturas intersetoriais baseadas em direitos humanos. Isso posto, é urgente a necessidade de garantir ações voltadas à saúde materna na assistência, durante e após a pandemia, que valorizem o acesso à equipe e serviços de saúde qualificados para um modelo de atenção obstétrica centrado nas mulheres(99 Hall KS, Samari G, Garbers S, Casey SE, Diallo DD, Orcutt M, et al. Centring sexual and reproductive health and justice in the global COVID-19 response. Lancet Infect Dis. 2020;395(10231):1175-7. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(20)30801-1
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).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Mundialmente, as consequências da COVID-19 estão recaindo com mais força sobre as mulheres, seja pelos impactos econômicos e sociais evidenciados nas condições de trabalho, em especial na esfera privada, seja pelas iniquidades na saúde sexual e reprodutiva, que não reconhecem as desigualdades de gênero, raça e classe social, as quais, além de estruturais, são evitáveis, injustas e mantenedoras de diferentes formas de violências. No Brasil, a assistência à mulher no ciclo gravídico-puerperal encontra-se fragilizada, ora por ausência de planejamento de políticas públicas específicas, ora por mudanças frequentes na gestão do Ministério da Saúde brasileiro, ora pela ausência de monitoramento da Rede Cegonha. Um exemplo é a política de contracepção que, quando não fortemente ofertada e acompanhada nos seus riscos, pode agravar o aumento da mortalidade materna e neonatal, o aumento de abortos inseguros e gestações indesejadas. Assim, o acesso adequado aos serviços de atenção ao ciclo gravídico puerperal, o planejamento reprodutivo e as queixas que tragam ameaça à saúde da mulher devem ser considerados essenciais.

Tal instabilidade colocou, vergonhosamente, o Brasil no primeiro lugar dentro do ranking das mortes maternas por COVID-19 até agosto de 2020. As recomendações que incluem as gestantes como grupo de risco não possibilitam políticas adequadas para isolamento social oportuno. Ademais, outras propostas transitam em projetos pelo Congresso brasileiro em um ritmo que não atende à necessidade atual, colaborando para que as mulheres continuem expostas e vulneráveis.

Medidas de contenção que priorizem a saúde materna são urgentes, assim como transparência do Ministério da Saúde brasileiro na divulgação de dados para intervenção oportuna. Tais fatos impõem ao país um obstáculo para atingir as prioridades da agenda global e cumprir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável até 2030, em especial pelos casos de near miss materno e mortalidade materna.

  • EDITOR ASSOCIADO: Mitzy Reichembach

REFERENCES

Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Barbosa

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Jul 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    27 Out 2020
  • Aceito
    02 Abr 2021
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