Perfil sociodemográfico, diagnósticos e cuidados de enfermagem em pacientes pós-COVID-19 em um hospital universitário brasileiro

RESUMO

Objetivos:

analisar o perfil sociodemográfico, diagnósticos e cuidados de enfermagem de pacientes pós-COVID-19 internados em um hospital universitário do sul do Brasil.

Métodos:

estudo de coorte retrospectivo. A amostra foi constituída de 1.467 prontuários, no período de janeiro de 2020 a janeiro de 2021.

Resultados:

dos prontuários analisados, os perfis, respectivamente, mais prevalentes incluíram: pessoas do sexo masculino (52,9%); da cor branca (81,1%); com Diagnóstico de Enfermagem de síndrome do equilíbrio fisiológico prejudicado* (77,3%); cuidados de enfermagem implementar medidas de precauções por aerossóis (94,5%); implementar medidas de precaução por gotículas (93,4%); verificar sinais vitais (91,9%); aplicar desinfetante padrão em equipamentos e superfícies (89,6%).

Conclusões:

a análise do perfil sociodemográfico, diagnósticos e cuidados de enfermagem dos pacientes deste estudo poderá contribuir à implementação do Processo de Enfermagem no contexto pandêmico do coronavírus.

Descritores:
Pandemia; Diagnósticos de Enfermagem; Cuidados de Enfermagem; COVID-19; Enfermagem

ABSTRACT

Objectives:

to analyze the sociodemographic profile, diagnoses and nursing care of post-COVID-19 patients admitted to a university hospital in southern Brazil.

Methods:

a retrospective cohort study. The sample consisted of 1,467 medical records, from January 2020 to January 2021.

Results:

from the analyzed medical records, the most prevalent profiles, respectively, included: males (52.9%); white (81.1%); with Impaired Physiological Balance Syndrome* Nursing Diagnosis (77.3%); nursing care implementing aerosol precautions (94.5%); implementing droplet precautions (93.4%); checking vital signs (91.9%); applying standard disinfectant to equipment and surfaces (89.6%).

Conclusions:

the analysis of the sociodemographic profile, diagnoses and nursing care of patients in this study may contribute to implementing the Nursing Process in the coronavirus pandemic context.

Descriptors:
Pandemic; Nursing Diagnosis; Nursing Care; COVID-19; Nursing

RESUMEN

Objetivos:

analizar el perfil sociodemográfico, diagnósticos y cuidados de enfermería de pacientes post-COVID-19 internados en un hospital universitario del sur de Brasil.

Métodos:

un estudio de cohorte retrospectivo. La muestra estuvo conformada por 1.467 historias clínicas, desde enero de 2020 hasta enero de 2021.

Resultados:

de las historias clínicas analizadas, los perfiles más prevalentes, respectivamente, incluyeron: hombres (52,9%); blanco (81,1%); con diagnóstico de enfermería de síndrome del equilibrio fisiológico alterado* (77,3%); los cuidados de enfermería implementan medidas de precaución por aerosoles (94,5%); implementar medidas de precaución por gotitas (93,4%); control de signos vitales (91,9%); aplicar desinfectante estándar a equipos y superficies (89,6%).

Conclusiones:

el análisis del perfil sociodemográfico, diagnósticos y cuidados de enfermería de los pacientes de este estudio puede contribuir para la implementación del Proceso de Enfermería en el contexto de pandemia del coronavirus.

Descriptores:
Pandemia; Diagnósticos de Enfermería; Cuidados de Enfermería; COVID-19; Enfermería

INTRODUÇÃO

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a COVID-19 pode ser definida como uma doença infecciosa causada pelo coronavírus SARS-COV-2, identificado em dezembro de 2019 em Wuhan, na China. Devido à sua rápida propagação entre os continentes, em 11 de março de 2020, a OMS definiu a situação como pandemia de COVID-19. Até julho de 2022, foram confirmados aproximadamente 574 milhões de casos e 6,39 milhões de mortes no mundo(¹).

Os casos de COVID-19 apresentam-se, em sua maioria, assintomáticos ou leves, tendo como principais sinais e sintomas a tosse, a febre, a dor no corpo, a fadiga, a hemoptise, a dispneia e a diarreia. Em quadros mais graves, os pacientes podem apresentar pneumonia, síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA), problemas cardíacos agudos, falência de múltiplos órgãos e morte. Entretanto, conforme a pandemia acomete mais pessoas, os relatos relacionados a sintomas neurológicos têm aumentado. Dentre esses, destacam-se dor de cabeça, anosmia, disgeusia, tontura, convulsão e consciência prejudicada(²).

A infecção pela doença em questão pode causar complicações no organismo do hospedeiro, como encefalite, inflamação sistêmica, disfunção de órgão periférico e alterações cerebrovasculares, podendo ocasionar sequelas neurológicas a longo prazo, o que pode agravar sintomas pré-existentes ou dar início a novas condições e doenças cerebrovasculares, como o acidente vascular encefálico. Além disso, pesquisas indicam que um terço dos sobreviventes apresenta comprometimento cognitivo ou motor no momento da alta, sendo mais acentuado em grupos de risco(³).

Nesse interim, destaca-se o papel do enfermeiro na aplicação do Processo de Enfermagem (PE) com o propósito de identificar e suprir as necessidades de cuidados dos pacientes acometidos pela COVID-19, mitigando complicações e sequelas da infecção(⁴). Desse modo, o enfermeiro assiste seus pacientes de maneira holística, visando adaptar a prescrição de cuidados de enfermagem às especificidades que a infecção por coronavírus impõe.

O PE pode ser definido como um instrumento metodológico que norteia e orienta o cuidado e está estruturado em cinco etapas, sendo elas: histórico de enfermagem; Diagnóstico de Enfermagem (DE); planejamento de enfermagem; implementação de enfermagem; e avaliação de enfermagem(⁵). Nessa direção, há de se destacar a importância da aplicação do PE no cotidiano da assistência de enfermagem, como em tempos de pandemia, contribuindo para a alta qualidade e a segurança dos cuidados da categoria profissional em situações adversas e complexas.

A justificativa para a realização do estudo está alicerçada na escassez de pesquisas envolvendo a implementação do PE em pacientes pós-COVID-19, com vistas à melhoria da qualidade da assistência prestada. Nessa direção, destaca-se a relevância deste estudo, tendo em vista que, no cotidiano do trabalho da equipe de enfermagem, exige-se a elaboração de prescrições de cuidados focadas nas necessidades e singularidade dos pacientes sobreviventes da COVID-19, visando à atenuação dos déficits ocasionados pela doença(³, ⁴). Frente a isso, destaca-se a questão norteadora deste estudo: qual o perfil sociodemográfico, diagnósticos e cuidados de enfermagem de pacientes pós-COVID-19, internados em um hospital universitário do sul do Brasil, no período de janeiro de 2020 a janeiro de 2021?

OBJETIVOS

Analisar o perfil sociodemográfico, diagnósticos e cuidados de enfermagem de pacientes pós-COVID-19 internados num hospital universitário do sul do Brasil.

MÉTODOS

Aspectos éticos

O projeto de pesquisa foi submetido à Comissão de Pesquisa (COMPESQ) da Escola de Enfermagem e ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), sendo aprovado nas instâncias. A pesquisa respeitou as Resoluções 466/2012 e 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e o Ofício Circular nº 2/2021/CONEP/SECNS, que dispõe das diretrizes regulamentadoras para pesquisas envolvendo seres humanos e das orientações para procedimentos em pesquisas com qualquer etapa em ambiente virtual(⁶, ⁷, ⁸). Por se tratar de um estudo que utilizou banco de dados secundários, houve dispensa do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Desenho, período e local do estudo

Trata-se de um estudo de coorte retrospectivo(⁹) que seguiu as recomendações do STrengthening the Reporting of OBservational studies in Epidemiology (STROBE). O campo da pesquisa incluiu Unidades de Internação Clínicas Pós-COVID-19 do HCPA. O Hospital de Clínicas é um hospital público universitário vinculado ao Ministério da Educação e à Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), possuindo 919 leitos e 6.843 colaboradores. Durante a pandemia de COVID-19, foi um dos hospitais de referência para atendimento aos pacientes graves acometidos pela COVID-19. O hospital conta com 62 leitos de Terapia Intensiva de Adultos e Unidade de Cuidados Coronarianos, além de 135 leitos para o Centro de Terapia Intensiva (CTI) de adultos com COVID-19(¹⁰).

Coleta de dados, amostra, critérios de inclusão e exclusão

A amostra da pesquisa foi constituída de 1.467 prontuários de pacientes sobreviventes da COVID-19 que estiveram internados nas unidades clínicas do HCPA no período de janeiro de 2020 a janeiro de 2021.

Os dados foram solicitados por meio de um query da base de dados clínicos associados do Biobanco COVID-19 do HCPA(¹¹), entre os meses de abril e julho de 2022. Os critérios de inclusão foram ser pacientes sobreviventes da COVID-19, com idade igual ou superior a 18 anos, de ambos os gêneros, pós-internação em CTI. Os critérios de exclusão foram ser pacientes sobreviventes da COVID-19 menores de 18 anos que não internaram no CTI e prontuários com informações incompletos.

Análise dos resultados

As variáveis qualitativas foram analisadas e apresentadas em termos de frequências absolutas e relativas [n (%)], e as variáveis quantitativas, em termos de média, desvio padrão, (quartil 1 – quartil 3), menor e maior valores e contagem de dados ausentes. A distribuição das variáveis quantitativas foi avaliada por meio da análise gráfica do histograma e do gráfico quantil-quantil.

Devido à alta assimetria da distribuição das variáveis estudados, a diferença entre grupos foi realizada por meio do Teste de Kruskall-Wallis. Todas as análises foram realizadas no software R versão 4.2.0, utilizando o pacote tidyverse versão 1.3.1(¹², ¹³). As figuras foram elaboradas no formato Scalable Vector Graphics.

RESULTADOS

A pesquisa analisou 1.467 prontuários de pacientes com teste positivo para SARS-CoV-2 pós-alta do CTI, no período de janeiro de 2020 a janeiro de 2021.

Quanto às características sociodemográficas, identificou-se prevalência do sexo masculino (52,9%), média da faixa etária de 58,9 anos, raça/cor branca (81,1%), estado civil casado (42,9%) e aposentados (11,2%). Apresentam-se, a seguir, na Tabela 1, as variáveis sociodemográficas dos pacientes sobreviventes da COVID-19 pós-internação em CTI. Em relação às variáveis clínicas, há de se destacar que o exame diagnóstico da COVID-19 mais prevalente foi o PCRVR, pesquisa de vírus respiratório PCR, realizado em (44%) 646 pacientes. No que se refere ao peso dos pacientes, a média ficou em 82,9 kg, sendo o peso mínimo de 37 kg, e o máximo, de 180 kg.

Tabela 1
Prevalência de Diagnósticos de Enfermagem em pacientes sobreviventes da COVID-19 pós-internação em Centro de Terapia Intensiva, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil, 2022

Diagnósticos de Enfermagem	(n)	(%) total	(%) válido
*Síndrome do Equilíbrio Fisiológico Prejudicado	1134	77,3	77,3
(00004) Risco de Infecção	704	48	48
(00155) Risco de Quedas	682	46,5	46,5
(00249) Risco de Lesão por Pressão	426	29	29
(00032) Padrão Respiratório Ineficaz	358	24,4	24,4
(00044) Integridade Tissular Prejudicada	323	22	22
(00030) Troca de Gases Prejudicada	320	21,8	21,8
(00033) Ventilação Espontânea Prejudicada	290	19,8	19,8
(00206) Risco de Sangramento	218	14,9	14,9
*Síndrome do Déficit do Autocuidado	217	14,8	14,8
(00132) Dor Aguda	201	13,7	13,7
(00087) Risco de Lesão por Posicionamento Perioperatório	154	10,5	10,5
(00108) Déficit no Autocuidado para Banho	106	7,2	7,2
(00245) Risco de Lesão de Córnea	98	6,7	6,7
(00046) Integridade da Pele Prejudicada	95	6,5	6,5
(00047) Risco de Integridade da Pele Prejudicada	94	6,4	6,4
(00179) Risco de Glicemia Instável	80	5,5	5,5
(00002) Nutrição Desequilibrada Menor que as Necessidades Corporais	73	5	5

• *Diagnósticos de Enfermagem cadastrados no sistema AGHUse do Hospital de Clínicas de Porto Alegre em razão de uma demanda dos enfermeiros do Centro de Tratamento Intensivo, porém não incorporado na Classificação Internacional de Diagnósticos (NANDA-I).

Na Tabela 1, apresenta-se a prevalência DE em pacientes sobreviventes da COVID-19 pós-internação em CTI. O diagnóstico prevalente foi Síndrome do equilíbrio fisiológico prejudicado (77,3%), seguido, respectivamente, por (00004) Risco de Infecção (48%), (00155) Risco de Quedas (46,5%), (00249) Risco de Lesão por Pressão (29%), (00032) Padrão Respiratório Ineficaz (24,4%) e (00044) Integridade Tissular Prejudicada (22%).

Dos diagnósticos prescritos pelos enfermeiros uma única vez, destacam-se: (00105) Amamentação Interrompida; (00126) Conhecimento Deficiente; (00124) Desesperança; (00256) Dor no Trabalho de Parto; (00052) Interação Social Prejudicada; (00131) Memória Prejudicada; (00096) Privação do Sono; (00301) Luto Desadaptativo; (00139) Risco de Automutilação; (00104) Amamentação Ineficaz; (00290) Risco de Tentativa de Fuga; (00218) Risco de Reação Adversa ao Meio de Contraste Iodado; e (00038) Risco de Trauma Físico.

Nota-se que 9,9% dos pacientes apresentaram alterações no nível de consciência do tipo confusão, letargia, coma e agitação. A Tabela 2 demonstra a associação do nível de consciência/regulação neurológica com os DE: (00128) Confusão Aguda; (00129) Confusão Crônica; (00049) Capacidade Adaptativa Intracraniana Diminuída; (00201) Risco de Perfusão Tissular Cerebral Ineficaz; (00103) Deglutição Prejudicada; (00123) Negligência Unilateral;e (00131) Memória Prejudicada.

Tabela 2
Associação entre nível de consciência/regulação neurológica com Diagnósticos de Enfermagem em pacientes sobreviventes da COVID-19, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil, 2022

Variável	Categorias	Possui pelo menos (1) Diagnóstico de Enfermagem iniciado		Valor de p
		Sim	Não
Lúcido				<0,001
	Sim	34 (4,0)	808 (96,0)
	Não	86 (13,8)	539 (86,2)
Orientado				<0,001
	Sim	29 (3,9)	708 (96,1)
	Não	91 (12,5)	639 (87,5)
Alerta				0,083
	Sim	26 (6,1)	399 (93,9)
	Não	94 (9,0)	948 (91,0)
Confuso				<0,001
	Sim	24 (31,6)	52 (68,4)
	Não	96 (6,9)	1295 (93,1)
Comatoso				1,000
	Sim	2 (9,5)	19 (90,5)
	Não	118 (8,2)	1328 (91,8)
Letárgico				<0,001
	Sim	10 (32,3)	21 (67,7)
	Não	110 (7,7)	1326 (92,3)
Sedado				0,242
	Sim	15 (11,2)	119 (88,8)
	Não	105 (7,9)	1228 (92,1)
Agitado				0,012
	Sim	5 (27,8)	13 (72,2)
	Não	115 (7,9)	1334 (92,1)
Outros*				0,007
	Sim	4 (40,0)	6 (60,0)
	Não	116 (8,0)	1341 (92,0)

• *Outros refere-se à afasia de expressão, ansiedade, hemiparesia à esquerda, disartria, paralisia cerebral, dislalia.

Na Figura 1, demonstra-se a associação entre o escore da Escala de Glasgow e os DE: (00128) Confusão Aguda; (00129) Confusão Crônica; (00049) Capacidade Adaptativa Intracraniana Diminuída; (00201) Risco de Perfusão Tissular Cerebral Ineficaz; (00103) Deglutição Prejudicada; (00123) Negligência Unilateral; (00131) Memória Prejudicada. Salienta-se que a média do escore da Escala de Glasgow foi de 14, com variações entre 8 e 15.

Figura 1
Associação entre diagnósticos de enfermagem e Escore de Glasgow em pacientes sobreviventes da COVID-19 pós-internação no Centro de Terapia Intensiva, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil, 2022

O Teste U de Mann-Whitney detecta diferença entre os Escores de Glasgow (p < 0,001), no qual quem apresenta pelo menos um dos diagnósticos descritos possui um menor escore. A Figura 2 demonstra a associação entre o escore da Escala SAK com o DE “Risco de Quedas”. Cabe ressaltar que a média do escore de SAK na amostra analisada foi de 5,3, com variações entre 0 e 16.

Figura 2
Associação entre o Diagnóstico de Enfermagem “Risco de Quedas” e o escore da Escala de SAK em pacientes sobreviventes da COVID-19 pós-internação no Centro de Terapia Intensiva, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil, 2022

O Teste U de Mann-Whitney detecta diferença entre os escores de SAK (p < 0,001), no qual quem tem risco de queda possui um maior escore. Apresenta-se na Tabela 3, a prevalência dos cuidados de enfermagem nas prescrições dos pacientes pós-COVID-19. Foram identificados 564 cuidados de enfermagem, destacando-se os seguintes: implementar medidas de precauções por aerossóis (94,5%); implementar medidas de precaução por gotículas (93,4%); verificar sinais vitais (91,9%); aplicar desinfetante padrão em equipamentos e superfícies (89,6%); implementar medidas de precaução de contato (88,8%); e implementar cuidados de acordo com o protocolo assistencial de quedas (82,9%).

Tabela 3
Prevalência de cuidados de enfermagem prescritos em pacientes sobreviventes da COVID-19, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil, 2022

Cuidados de enfermagem	(n)	(%)
Implementar medidas de precauções para aerossóis	1.387	94,5
Implementar medidas de precauções para gotículas	1.370	93,4
Verificar sinais vitais	1.348	91,9
Aplicar desinfetante padrão em equipamentos e superfícies	1.315	89,6
Implementar medidas de precaução de contato	1.302	88,8
Implementar cuidados de acordo com o protocolo assistencial de quedas	1.216	82,9
Manter cabeceira elevada	1.196	81,5
Implementar cuidados na punção venosa	1.048	71,4
Comunicar alterações do padrão ventilatório	1.001	68,2
Realizar banho de leito	985	67,1
Implementar protocolo assistencial de prevenção e tratamento de lesão por pressão	979	66,7
Verificar oximetria	944	64,3
Realizar higiene oral aplicando antisséptico bucal padrão	932	63,5
Implementar cuidados com oxigenioterapia (óculos nasal)	921	62,8
Aplicar clorexidina aquosa 2% no corpo na troca de conjunto de eletrodos cardíacos	810	55,2

Destacam-se os cuidados implementar medidas de precauções para aerossóis e para gotículas, com 94,5% e 93,5%, respectivamente. Ressalta-se que aproximadamente 47% dos cuidados estão relacionados à prevenção de infecções. Frente ao exposto, fica evidente a preocupação institucional, bem como da equipe de enfermagem, com o risco de infecção, sendo esse o segundo diagnóstico mais elencado na análise da segunda etapa do PE desses pacientes.

DISCUSSÃO

A forma grave da COVID-19 exigiu dos enfermeiros capacidade de raciocínio clínico e julgamento diagnóstico, objetivando a aplicação acurada do PE para o alcance dos resultados na assistência prestada aos pacientes em contextos de cuidados intensivos(⁴).

No que se refere à cor/raça dos participantes deste estudo, identificou-se maior prevalência de pessoas brancas (81%), o que corrobora com as conclusões do estudo desenvolvido em Ponta Grossa, Paraná (PR), em que identificou-se que mais de 80% dos pacientes diagnosticados com COVID-19 eram da cor branca(¹⁴). Isso pode estar relacionado à predominância da cor branca na população do estado Rio Grande do Sul (79%)(¹⁵). Esse achado, portanto, não pode fundamentar a falta de atenção à população negra, quer seja contexto pandêmico ou não. Isso porque a dificuldade de acesso aos serviços de saúde ainda existe e precisa ser superada(¹⁶). Assim, reafirma-se que a sociedade deve incluir essa população e buscar resultados que garantam a igualdade, a equidade e a integralidade de acesso às políticas públicas de saúde.

Quanto aos resultados da variável DE encontrados nos registros dos enfermeiros, destacaram-se, respectivamente, como mais prevalentes: Síndrome do Equilíbrio Fisiológico Prejudicado (77,3%); (00004) Risco De Infecção (48%); (00155) Risco de Quedas (46,5%); (00249) Risco de Lesão por Pressão (29%); (00032) Padrão Respiratório Ineficaz (24,4%); e (00044) Integridade Tissular Prejudicada (22%). Os DE, organizados em domínios e classes, podem ser definidos de acordo com a Classificação Internacional NANDA-I como “um julgamento clínico sobre uma resposta humana a condições de saúde/processos da vida, ou uma vulnerabilidade a tal resposta, de um indivíduo, família, grupo ou comunidade”(¹⁷). Assim, os diagnósticos podem estar focados em um problema, em um risco, na promoção da saúde ou ainda aplicado a síndromes.

Frente a isso, pode-se verificar que os diagnósticos prevalentes na população pesquisada, conforme a classificação acima, estão nos domínios Segurança/Proteção (Risco de Infecção, Risco de Quedas, Risco de Lesão Por Pressão e Integridade Tissular Prejudicada) e Atividade/Repouso (Padrão Respiratório Ineficaz). Referente às classes, os mesmos, respectivamente, estão em infecção, lesão física e respostas cardiovasculares/pulmonares(¹⁷).

Diante da gravidade dos casos, evidenciou-se que, na amostra em estudo, o foco dos problemas de enfermagem durante a pandemia esteve nas necessidades psicobiólogicas em detrimento de necessidades psicoespirituais e psicossociais. Semelhante achado evidencia-se no estudo desenvolvido pela Rede de Pesquisa em Processo de Enfermagem (RePPE), que identificou os diagnósticos Risco de Infecção, Risco de Lesão Por Pressão e Ventilação Espontânea Prejudicada para pacientes internados em estado crítico(⁴).

Dentre esses diagnósticos, destaca-se que o DE “Síndrome do Equilíbrio Fisiológico Prejudicado”, em processo de desenvolvimento(¹⁸), foi identificado em mais de 70% dos pacientes. Isso instigou, desse modo, os enfermeiros a prescreverem cuidados, a fim de buscar o equilíbrio fisiológico do organismo do indivíduo cuidado. Ainda, há de se destacar que o diagnóstico acima apontado não foi incorporado até o momento à Classificação NANDA-I, mas, durante a pandemia, os enfermeiros que atuam no HCPA solicitaram a inclusão no sistema de prontuário eletrônico AGHUse, buscando, portanto, o seguimento das demais etapas do PE consoante a esse diagnóstico. Convém destacar que o diagnóstico pontuado reduziria o tempo de realização das etapas do processo e incluiria inúmeros diagnósticos presentes para os casos graves da COVID-19(¹⁸).

Além disso, pontua-se que, dos diagnósticos registrados pelos enfermeiros uma única vez na amostra deste estudo, destacam-se: Amamentação Interrompida; Conhecimento Deficiente; Desesperança; Dor do Parto; Interação Social Prejudicada; Memoria Prejudicada; Mucosa Oral Prejudicada; Padrão de Sono Prejudicado; Pesar; Risco de Agressão; Risco de Amamentação Ineficaz; Risco de Tentativa de Fuga; Risco de Reação Adversa ao Meio de Contraste Iodado; e Risco de Trauma.

No que se refere à regulação neurológica/nível de consciência, sabe-se que a COVID-19 causou sequelas neurológicas transitórias e permanentes, identificadas a partir de manifestações clínicas durante e após a internação no CTI e observadas pela equipe de saúde. Sabe-se que a encefalite, a inflamação sistêmica, a disfunção de órgãos, como fígado, rins, ou pulmões, e alterações cerebrovasculares podem ocasionar sequelas neurológicas a longo prazo, agravando sintomas pré-existentes ou novas doenças cerebrovasculares(³). Das manifestações neurológicas, destacam-se dor de cabeça, anosmia, disgeusia, tontura, convulsão e consciência prejudicada(³, ¹⁹).

De acordo com a taxonomia NANDA-I, destacam-se os DE frequentemente utilizados para pacientes acometidos por afecções neurológicas e que também apresentam consequências neurológicas secundárias à doença: Sofrimento Espiritual; Hipertermia; Dor Aguda; Náusea; Nutrição Desequilibrada Menos do que as Necessidades Corporais; Deglutição Prejudicada; Confusão Aguda;

Risco de Confusão Aguda; Memória Prejudicada; Processo de Pensamento Perturbado; Interação Social Prejudicada; Fadiga; Ansiedade; Eliminação Urinária Prejudicada; Constipação; Risco de Constipação; Diarreia; Mobilidade Física Prejudicada; Déficit de Autocuidado para Alimentação; Déficit de Autocuidado para Banho; Déficit de Autocuidado para Higiene Íntima; Déficit de Autocuidado para Vestir-se; Risco de Síndrome do Estresse por Mudança; Risco de Infecção; Risco de Queda; Risco de Úlcera por Pressão; Risco de Integridade da Pele Prejudicada; Integridade da Pele Prejudicada; Proteção Ineficaz; Padrão Respiratório Ineficaz; Troca de Gases Prejudicada; Ventilação Espontânea Prejudicada; Volume de Líquidos Excessivos; e Risco de Desequilíbrio Eletrolítico(¹⁷, ¹⁸, ²⁰).

Partindo dessa premissa, buscou-se verificar a associação entre o escore da Escala de Glasgow e os DE relacionados aos domínios NANDA-I com foco no nível de consciência e regulação neurológica: (00128) Confusão Aguda; (00129) Confusão Crônica; (00049) Capacidade Adaptativa Intracraniana Diminuída; (00201) Risco de Perfusão Tissular Cerebral Ineficaz; (00103) Deglutição Prejudicada; (00123) Negligência Unilateral; e (00131) Memória Prejudicada.

A Escala de Coma de Glasgow (ECG), desenvolvida em 1974 na Universidade de Glasgow, na Escócia, por Graham Taeasdaale e Bryan Jennet, é utilizada ao redor do mundo para identificar disfunções neurológicas e monitorar a evolução do nível de consciência, além de predizer prognóstico e padronizar a linguagem dos profissionais de saúde no que se refere à avaliação do nível de consciência dos pacientes. O escore total da escala pode variar entre 3 e 15 pontos, sendo obtido a partir da avaliação de atividades espontâneas e da aplicação de estímulos verbais e/ou dolorosos. A escala é composta por três domínios que avaliam a abertura ocular, a resposta verbal e a resposta motora dos pacientes(²¹).

Salienta-se que a média do escore da ECG foi de 14, com variações entre 8 e 15. A média do escore na ECG demonstra que o quadro de confusão esteve presente em grande parte dos pacientes, o que pode estar relacionado com o delirium pós sedação prolongada.

Nota-se que 9,9% dos pacientes apresentaram alterações no nível de consciência do tipo confusão, letargia, coma e agitação. Houve associação significativa entre os 842 pacientes com o status “lúcido” e 34 (4,0%) tiveram pelo menos um dos 7 diagnósticos relacionados ao nível de consciência e regulação neurológica, enquanto os que não tiveram o status “lúcido” (13,8%) tiveram pelo menos um dos 7 diagnósticos. O Teste Qui-Quadrado de Independência detectou associação entre o status “lúcido” e ter pelo menos um dos diagnósticos (p < 0,001). Assim, 120 (8,2%) dos pacientes em estudo apresentaram pelo menos um dos 7 diagnósticos. Tal evidência denota que os pacientes que possuíam no seu nível de consciência a lucidez apresentaram risco ou algum tipo de alteração no nível de consciência durante ou após a internação no CTI, corroborando com os estudos desenvolvidos em São Paulo e Pernambuco, que identificaram as alterações neurológicas pós-COVID- 19(³, ¹⁹).

Em relação ao escore da Escala de SAK e o DE “Risco de Quedas”, ressalta-se que a média do escore de SAK na amostra analisada foi de 5,3, com variações entre 0 e 16. A Escala de Risco de Quedas SAK, desenvolvida por Severo, Almeida e Kuchenbecker, inclui sete variáveis: desorientação/confusão; micções frequentes; limitações para deambular; ausência de acompanhante; estado pós-operatório; quedas anteriores; e número de medicamentos administrados nas 24 horas. Os escores pelo sistema de pontuação da escala classificam os pacientes em classes de risco como: baixo risco: menor ou igual a 6,0; risco moderado: 6,5 a 10,0; e alto risco: maior ou igual a 10,5(²²). A associação entre escore de SAK e DE “Risco de Quedas” foi significativa, demonstrando-se que os enfermeiros identificaram o diagnóstico para todos os pacientes com escore moderado ou elevado na avaliação do risco de quedas utilizando a escala SAK.

Dos quinze cuidados de enfermagem prevalentes identificados nas prescrições de enfermagem, ressalta-se que aproximadamente 47% dos cuidados estão relacionados à prevenção de infecções. Frente ao exposto, fica evidente a preocupação institucional, bem como da equipe de enfermagem, com o Risco de Infecção, sendo esse o segundo diagnóstico mais elencado na análise da segunda etapa do PE implementado aos pacientes, seguindo-se as orientações da RePPE para pacientes graves com COVID-19 internados em CTI(⁴).

Limitações do estudo

Tratando-se das limitações do estudo, destaca-se que os resultados deste estudo não podem ser generalizados, porque são correspondentes ao encontrado nos prontuários de pacientes de um hospital. Para tanto, necessitaria de estudos multicêntricos. Ainda, foi identificado a escassez de estudos voltados à aplicação do processo de DE em situações de pandemia. Assim, fazem-se necessárias novas pesquisas qualitativas com objetivo de identificar as percepções dos enfermeiros em relação à baixa seleção de DE relacionados aos domínios princípios de vida e classes valores, crenças e coerência entre valores, crenças e atos.

Contribuições para as áreas da enfermagem e saúde

A análise do perfil sociodemográfico, diagnósticos e cuidados de enfermagem mais prevalentes identificados neste estudo permite à enfermagem o conhecimento quanto ao foco que se tem dado na assistência ao paciente. Além disso, oportuniza apontamentos para a necessidade da identificação/investigação das necessidades psicossocias e psicoespirituais na implementação do PE e seu consequente registro em contextos pandêmicos, como o do coronavírus.

CONCLUSÕES

A COVID-19 acometeu, em sua maioria, homens brancos, casados e aposentados na faixa etária de 58 anos. Os diagnósticos e os cuidados de enfermagem demonstraram contribuir para a qualidade do cuidado na prática clínica de enfermagem, com destaque para os DE: Síndrome do Equilíbrio Fisiológico Prejudicado (77,3%), Risco de Infecção (48%), Risco de Quedas (46,5%), Risco de Lesão Por Pressão (29%); e Padrão Ventilatório Ineficaz (24,4%). Evidenciou-se a supervalorização das dimensões necessidades psicobiológicas em detrimento das psicoespirituais e psicossociais, sendo essa uma lacuna a ser considerada pela equipe de enfermagem no contexto da prática clínica, em específico, diante de pandemias, pois trata-se de um contexto de cuidado em que estas se revelam.

Nessa direção, ressalta-se a importância do ensino do raciocínio clínico e das habilidades de pensamento crítico holístico aos futuros enfermeiros, preparando-os para uma avaliação de enfermagem global para atender todas as dimensões de necessidades humanas básicas dos pacientes, à luz de uma teoria, sobretudo, de enfermagem. Os achados do estudo poderão subsidiar a prática clínica e a aplicação do processo diagnóstico pelos enfermeiros em situações pandêmicas, como a do coronavírus. As evidências encontradas orientam as etapas do PE com acurácia, o que denota a aplicação das habilidades de pensamento crítico e raciocínio clínico na execução do julgamento clínico do enfermeiro na prática assistencial. Os pacientes que são internados em CTI exigem cuidados específicos na alta para unidade de internação. Considerando a infecção por coronavírus, os cuidados devem ser redobrados e focados nas complicações decorrentes da doença.

O processo de DE se torna um aliado do enfermeiro, possibilitando um olhar crítico e holístico acerca das necessidades desses pacientes em contextos pandêmicos. A pesquisa evidenciou a necessidade de capacitação permanente da equipe para o olhar humano e holístico sem se descuidar das necessidades psicoespirituais e psicossociais, consequentemente dos diagnósticos focados no domínio princípios de vida da Classificação Internacional de Diagnósticos (NANDA-I) associados aos diagnósticos com foco nas necessidades psicobiológicas.

• FOMENTO
  Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pelo financiamento deste trabalho.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Barbosa

EDITOR ASSOCIADO: Jules Teixeira

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  31 Jul 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  09 Dez 2022
• Aceito
  20 Fev 2023