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Evidências da inserção de dispositivo intrauterino por enfermeiros na Atenção Primária à Saúde: revisão integrativa

RESUMO

Objetivos:

sintetizar e analisar as evidências da inserção de dispositivo intrauterino por enfermeiros na Atenção Primária à Saúde.

Métodos:

revisão integrativa, realizada nas bases de dados BDENF, CINAHL, LILACS, SciELO, Scopus, PubMed e Web of Science em junho de 2022, delimitando-se o período de 1960 a 2022.

Resultados:

identificaram-se 141 artigos na busca inicial, e 10 publicações compuseram a amostra final. Quatro (40%) foram desenvolvidos nos Estados Unidos e um (10%) no Brasil, sendo publicações de 1979 a 2021. Os achados foram agrupados em três categorias: Treinamento dos enfermeiros para inserção de dispositivo intrauterino; Competência dos enfermeiros para inserção de dispositivo intrauterino; e Acesso das mulheres aos dispositivos intrauterinos.

Conclusões:

o treinamento teórico e prático dos enfermeiros é um elemento de destaque, consolidado nos desfechos favoráveis das inserções realizadas por enfermeiros e satisfação entre as mulheres, prática que tem ampliado o acesso ao método contraceptivo na Atenção Primária à Saúde.

Descritores:
Dispositivos Intrauterinos; Enfermeiros; Atenção Primária à; Saúde; Prática Avançada de Enfermagem; Contracepção Reversível de Longo Prazo

ABSTRACT

Objectives:

to synthesize and analyze evidence on intrauterine device insertion by nurses in Primary Health Care.

Methods:

an integrative review, carried out in the BDENF, CINAHL, LILACS, SciELO, Scopus, PubMed and Web of Science databases in June 2022, delimiting the period from 1960 to 2022.

Results:

141 articles were identified in the initial search, and 10 studies made up the final sample. Four (40%) were developed in the United States and one (10%) in Brazil, with publications from 1979 to 2021. The findings were grouped into three categories: Nurse training to insert an intrauterine device; Nurses’ competency to insert an intrauterine device; and Women’s access to intrauterine devices.

Conclusions:

nurse theoretical and practical training is a prominent element, consolidated in the favorable outcomes of insertions performed by nurses and satisfaction among women, a practice that has expanded access to the contraceptive method in Primary Health Care.

Descriptors:
Intrauterine Devices; Nurses; Primary Health Care; Advanced Practice Nursing; Long-Acting Reversible Contraception

RESUMEN

Objetivos:

sintetizar y analizar la evidencia sobre la inserción de dispositivos intrauterinos por parte de enfermeras en la Atención Primaria de Salud.

Métodos:

revisión integrativa, realizada en las bases de datos BDENF, CINAHL, LILACS, SciELO, Scopus, PubMed y Web of Science en junio de 2022, delimitando el período de 1960 a 2022.

Resultados:

se identificaron 141 artículos en la búsqueda inicial y 10 publicaciones conformaron la muestra final. Cuatro (40%) fueron desarrollados en Estados Unidos y uno (10%) en Brasil, con publicaciones de 1979 a 2021. Los hallazgos se agruparon en tres categorías: Capacitación de enfermeras para insertar un dispositivo intrauterino; Competencia de las enfermeras para insertar un dispositivo intrauterino; y Acceso de las mujeres a los dispositivos intrauterinos.

Conclusiones:

la formación teórica y práctica de los enfermeros es un elemento destacado, consolidado en los resultados favorables de las inserciones realizadas por los enfermeros y la satisfacción de las mujeres, práctica que ha ampliado el acceso al método anticonceptivo en la Atención Primaria de Salud.

Descriptores:
Dispositivos Intrauterinos; Enfermeros; Atención Primaria de Salud; Enfermería de Práctica Avanzada; Anticoncepción Reversible de Larga Duración

INTRODUÇÃO

Os métodos contraceptivos reversíveis de longa duração, também chamados de long-acting reversible contraception (LARC), vêm motivando novas políticas de saúde pública mundialmente na tentativa de superar os índices de gravidez indesejada, abortos e mortalidade materna(1Barreto DS, Maia DS, Gonçalves RD, Soares RS. Dispositivo intrauterino na Atenção Primária à Saúde: uma revisão integrativa. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2021;16(43):2821. https://doi.org/10.5712/rbmfc16(43)2821
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), destacando-se, entre eles, o dispositivo intrauterino (DIU), objeto do presente estudo.

O DIU, constituído de material sólido, geralmente em formato de T, é alocado na cavidade uterina e tem como objetivo prevenir a gestação. Está disponível em diferentes conformações, sendo os principais o DIU de cobre e o Sistema Intrauterino liberador de levonorgestrel (SIU-LNG). No Brasil, o Ministério da Saúde (MS) disponibiliza gratuitamente o DIU de cobre pelo Sistema Único de Saúde (SUS)(2Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia. Uso de dispositivos intrauterinos (DIU) em nulíparas [Internet]. São Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia; 2018. 24p. [cited 2023 Jan 3]. Available from: https://www.febrasgo.org.br/media/k2/attachments/16-serie_diu.pdf
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).

Nessa perspectiva, os critérios de elegibilidade para o uso de cada método contraceptivo devem ser considerados. O DIU de cobre e o DIU hormonal podem ser ofertados para a maioria das mulheres, nulíparas e multíparas, após o parto vaginal ou cesáreo, após abortamento no primeiro trimestre, para adolescentes e mulheres em perimenopausa. Para aquelas que têm contraindicação de métodos hormonais, o DIU de cobre é uma opção(3Ministério da Saúde (BR). Manual técnico para profissionais de saúde: DIU com cobre TCu 380ª [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2018[cited 2022 Dec 10].14p.. Available from: https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/wp-content/uploads/2018/12/manual_diu_08_2018.pdf
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-5Hara JT, Bakonyi CD, Silva MFPTB, Sousa RA, Paglia BAR. Dispositivos intrauterinos hormonais disponíveis no Brasil: revisão sistemática. Braz J Dev. 2022;8(9):64810-27. https://doi.org/10.34117/bjdv8n9-290
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).

Os DIU são vantajosos por serem facilmente reversíveis, apresentarem baixos índices de gravidez, poucos efeitos indesejados, não dependerem de comportamentos frequentes de manutenção por parte da usuária e possuírem ação local (intrauterina). Especificamente sobre o DIU de cobre, o mesmo possui um melhor custo-benefício, eficácia de até 10 anos, e pode ser utilizado como contraceptivo de emergência, não tendo efeito sobre a lactação ou função sexual(3Ministério da Saúde (BR). Manual técnico para profissionais de saúde: DIU com cobre TCu 380ª [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2018[cited 2022 Dec 10].14p.. Available from: https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/wp-content/uploads/2018/12/manual_diu_08_2018.pdf
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,6Andrade MS, Silva CCS, Belo Neto RV, Santos AMG, Martins MCV, Souza Neto CM, et al. Planejamento familiar no Sistema Único de Saúde: uso do dispositivo intrauterino. Res, Soc Develop. 2022;11(3):e38211326386. https://doi.org/10.33448/rsd-v11i3.26386
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). Além disso, seu mecanismo de ação não utiliza hormônios, vantagem esta que, na maioria das vezes, mostra-se como o principal critério de escolha entre as mulheres(7Trigueiro TH, Ferrari JC, Souza SRRK, Wall ML, Barbosa R. Follow-up of copper intrauterine device insertion by nurses: a prospective longitudinal study. Rev Bras Enferm. 2020;73(suppl 4):e20200156. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0156
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). Já o SIU-LNG possui como vantagens específicas a eficácia de até cinco anos, a redução do volume menstrual e cólica, e pode ser utilizado como tratamento para sangramento excessivo(5Hara JT, Bakonyi CD, Silva MFPTB, Sousa RA, Paglia BAR. Dispositivos intrauterinos hormonais disponíveis no Brasil: revisão sistemática. Braz J Dev. 2022;8(9):64810-27. https://doi.org/10.34117/bjdv8n9-290
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).

Apesar das vantagens, os LARC são subutilizados em todo o mundo. Segundo estudo das Nações Unidas(8United Nations (UN). Contraceptive use by method 2019: data booklet [Internet]. New York: United Nations; 2019[cited 2023 Jan 3]. 28p. Available from: https://www.un.org/development/desa/pd/sites/www.un.org.development.desa.pd/files/files/documents/2020/Jan/un_2019_contraceptiveusebymethod_databooklet.pdf
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), a prevalência estimada do uso de DIU entre mulheres em idade reprodutiva (15-49 anos) em 2019 era de 8,4% no mundo, sendo 10,7% na Ásia, 8,1% na Europa, 7,6% na América do Norte, 4,6% na América Latina e Caribe, 3,4% na Oceania e 2,6% na África. Entre as barreiras para o uso do método, destacam-se as organizacionais, como a baixa disponibilidade do método ou elevado número de critérios para a sua inserção, a ausência de protocolos institucionais, a restrição da atuação do enfermeiro ou a limitação no treinamento dos profissionais, e as individuais, sobretudo o baixo nível de conhecimento sobre o método(1Barreto DS, Maia DS, Gonçalves RD, Soares RS. Dispositivo intrauterino na Atenção Primária à Saúde: uma revisão integrativa. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2021;16(43):2821. https://doi.org/10.5712/rbmfc16(43)2821
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,9Gonzaga VAS, Borges ALV, Santos AO, Rosa PLFS, Gonçalves RFS. Organizational barriers to the availability and insertion of intrauterine devices in Primary Health Care Services. Rev Esc Enferm USP. 2017;51:e03270 https://doi.org/10.1590/s1980-220x2016046803270
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).

Evidências mostram que o enfermeiro tem um papel relevante na inserção de DIU em diferentes locais no mundo, a exemplo da Austrália(10Kemeny F, Digiusto E, Bateson D. Insertion of intrauterine contraceptive devices by registered nurses in Australia. Aust N Z J Obstet Gynaecol. 2016;56(1):92-6. https://doi.org/10.1111/ajo.12427
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), do Estados Unidos(11Thompson CM, Broecker J, Dade M, Nottingham K. Influences on intentions to place long-acting reversible contraceptives: a pilot study comparing according to provider specialty in Ohio. J Pediatr Adolesc Gynecol. 2018;31(5):509-15. https://doi.org/10.1016/j.jpag.2018.03.007
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-12Jacobson L, Garbers S, Helmy H, Roobol H, Kohn JE, Kavanaugh ML. IUD services among primary care practices in New York City. Contraception. 2016;93(3):257-62. https://doi.org/10.1016/j.contraception.2015.11.002
https://doi.org/10.1016/j.contraception....
), da Inglaterra(13Andrews GD, French K, Wilkinson CL. Appropriately trained nurses are competent at inserting intrauterine devices: an audit of clinical practice. Eur J Contracep Repr Health Care. 1999;4(1):41-4. https://doi.org/10.3109/13625189909043479
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), da Índia(14Yadav V, Balasubramaniam S, Das S, Srivastava A, Kumar S, Sood B. Comparison of outcomes at 6 weeks following postpartum intrauterine contraceptive device insertions by doctors and nurses in India: a case-control study. Contraception. 2016;93(4):347-55. https://doi.org/10.1016/j.contraception.2015.12.012
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) e do Brasil(15Lacerda LDRC, Arma JC, Paes LG, Siqueira EF, Ferreira LBB, Fetzner RRT, et al. Inserção de dispositivo intrauterino por enfermeiros da atenção primária à saúde. Enferm Foco. 2021;12(suppl 1):99-104. https://doi.org/10.21675/2357-707X.2021.v12.n7.SUPL.1.5209
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). No país, os enfermeiros têm sua prática regulamentada pelo Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) desde 2010, no qual consta que esse profissional possui capacidade e competência legal para a inserção e retirada do DIU após capacitação e treinamento(16Conselho Federal de Enfermagem (Cofen). Parecer de Câmara Técnica nº 17, de 11 de novembro de 2010 [Internet]. Viabilidade dos enfermeiros realizarem procedimentos com medicamentos e insumos para planejamento familiar reprodutivo. 2010[cited 2023 May 25]. Available from: http://www.cofen.gov.br/parecer-n-172010-cofen-ctln_6148.html
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). Em 2022, nova resolução passou a normatizar essa prática do enfermeiro, prevendo suas competências a respeito da inserção, revisão e retirada do dispositivo, inclusive detalhando o tempo de capacitação e os locais de atuação dos mesmos para as ações de planejamento reprodutivo, como na Atenção Primária à Saúde (APS)(17Conselho Federal de Enfermagem (Cofen). Resolução nº 690, de 4 de fevereiro de 2022 [Internet]. Normatiza a atuação do enfermeiro no planejamento familiar e reprodutivo. Brasília; 2022 [cited 2023 May 25]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resolucao-cofen-no-690-2022_96063.html
http://www.cofen.gov.br/resolucao-cofen-...
).

A APS constitui um importante cenário para a oferta do DIU, já que é a principal porta de entrada nos sistemas de saúde, destacando-se a relevância do enfermeiro nas ações de planejamento e saúde reprodutiva nesse espaço de cuidado, mediante orientações dos métodos contraceptivos, contribuindo na ampliação do acesso das mulheres ao DIU(1Barreto DS, Maia DS, Gonçalves RD, Soares RS. Dispositivo intrauterino na Atenção Primária à Saúde: uma revisão integrativa. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2021;16(43):2821. https://doi.org/10.5712/rbmfc16(43)2821
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,6Andrade MS, Silva CCS, Belo Neto RV, Santos AMG, Martins MCV, Souza Neto CM, et al. Planejamento familiar no Sistema Único de Saúde: uso do dispositivo intrauterino. Res, Soc Develop. 2022;11(3):e38211326386. https://doi.org/10.33448/rsd-v11i3.26386
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).

Diante do exposto, considerando que a gravidez indesejada permanece como um problema de saúde pública e que a regulamentação da prática de inserção do DIU pelo enfermeiro no Brasil constitui objeto de constante discussão, este estudo se justifica pela possibilidade de conhecer as evidências científicas de inserção do dispositivo pelos enfermeiros da APS no contexto mundial, o que poderá contribuir para o fortalecimento dessa prática avançada do enfermeiro nesse cenário do cuidado para a sua sustentação legal e consolidação institucional, bem como para a ampliação do acesso ao DIU pela atuação do enfermeiro e para que novas pesquisas sobre o tema sejam vislumbradas.

OBJETIVOS

Sintetizar e analisar as evidências da inserção de DIU por enfermeiros na APS.

MÉTODOS

Trata-se de uma revisão integrativa da literatura, que seguiu as etapas sugeridas por Ganong(18Ganong LH. Integrative reviews of nursing research. Res Nurs Health. 1987;10(1):1-11. https://doi.org/10.1002/nur.4770100103
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) (1987): 1) formulação do objetivo da revisão e seleção das perguntas norteadoras; 2) determinação dos critérios de inclusão e exclusão para a busca na literatura; 3) busca e seleção dos estudos primários, dispondo em tabelas e organizando as ideias em comum; 4) análise crítica dos estudos incluídos; 5) discussão e interpretação dos dados; e 6) apresentação clara e completa da revisão.

Na primeira etapa, definiu-se como questão norteadora da revisão: quais as evidências sobre a inserção de DIU por enfermeiros na APS? Em seguida, delimitaram-se os critérios de elegibilidade dos estudos, incluindo-se pesquisa original, relatos de experiência, estudos de caso e de revisão, de abordagem quantitativa ou qualitativa, publicados no período de 1960 a 2022, em periódico indexado, no formato de artigo e nos idiomas português, inglês ou espanhol, e que tiveram como participantes enfermeiros de APS, mesmo que não exclusivamente. Os critérios de exclusão foram cartas, editoriais, teses, dissertações, monografias, livros, trabalhos indisponíveis na íntegra eletronicamente ou impresso e aqueles não relacionados com o tema do estudo ou que não respondem à pergunta de pesquisa, além dos estudos duplicados nas bases de dados. O recorte temporal da pesquisa se justifica pelo fato de a literatura científica registrar as primeiras inserções de DIU por enfermeiros no mundo na década de 1960(19Vaillant HW, Cummins GTM, Richart RM, Barron BA. Insertion of lippes loop by nurse-midwives and doctors. BMJ. 1968;3(5619):671-3. https://doi.org/10.1136/bmj.3.5619.671
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).

As buscas foram conduzidas em junho de 2022, utilizando-se a ferramenta de busca avançada nas bases de dados: Base de Dados de Enfermagem (BDENF); Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL); Embase; Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS); Scientific Electronic Library Online (SciELO); Scopus; U.S. National Library of Medicine (PubMed); e Web of Science (WOS) via Virtual Private Network (VPN) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Para a definição dos descritores, foram utilizados os termos sistematizados nos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e no Medical Subject Headings (MeSH). Utilizaram-se diferentes combinações dos operadores booleanos “AND” e “OR” para a identificação do maior número de artigos possíveis. A estratégia de busca foi adaptada para cada base conforme suas especificidades, o que foi realizado pela pesquisadora juntamente com uma bibliotecária da UFSC (Quadro 1).

Quadro 1
Bases de dados com suas respectivas estratégias de busca

Após a busca nas bases de dados, todas as citações encontradas foram exportadas para o aplicativo da web Rayyan - Intelligent Systematic Review, desenvolvido pelo Qatar Computing Research Institute (QCRI), para auxiliar na seleção e organização dos estudos. O Rayyan QCRI consiste em uma ferramenta que auxilia na exploração e filtragem de buscas por estudos elegíveis para as revisões sistemáticas, principalmente na fase de triagem de títulos e resumos. Permite avaliar os estudos com o cegamento do revisor auxiliar, o que contribui para a fidedignidade na seleção das informações e a precisão metodológica(20Ouzzani M, Hammady H, Fedorowicz Z, Elmagarmid A. Rayyan: a web and mobile app for systematic reviews. Syst Rev. 2016;5:210. https://doi.org/10.1186/s13643-016-0384-4
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). Posteriormente, procedeu-se à exclusão dos estudos duplicados.

Para a seleção dos artigos que constituíram a amostra, duas pesquisadoras independentes realizaram a leitura dos títulos e resumos. A partir disso, ambas realizaram a leitura dos estudos na íntegra, os quais foram selecionados a partir dos critérios de inclusão e exclusão. Cabe destacar que os estudos que apresentaram conflito de decisão no processo de seleção foram analisados por uma terceira pesquisadora. Ainda, empregaram-se as recomendações do checklist do Statement for Reporting Systematic Review and Meta-Analyses of Studies (PRISMA) para a seleção dos estudos(21Galvão TF, Pansani HSA, Harrad D. Principais itens para relatar revisões sistemáticas e meta-análises: a recomendação PRISMA. Epidemiol Serv Saúde [Internet]. 2015 [cited 2023 May 25];24(2):335-42. Available from: http://scielo.iec.gov.br/pdf/ess/v24n2/v24n2a17.pdf
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), conforme a Figura 1.

Figura 1
Fluxograma de identificação e seleção dos estudos, elaborado a partir da recomendação PRISMA

Para organização e análise dos dados, foi elaborada pela pesquisadora uma planilha no Google Planilhas® com os dados: título; ano de publicação; país de realização da pesquisa; delineamento do estudo; objetivo; participantes; principais resultados; conclusão; e nível de evidência. Cada estudo recebeu um código de identificação composto pela letra “E” seguida de um número arábico (E1, E2…).

Para a análise crítica dos resultados, interpretação dos achados e discussão, os temas que emergiram foram subdivididos em três categorias: Treinamento de enfermeiros para a inserção de dispositivo intrauterino; Competência dos enfermeiros para inserção de dispositivo intrauterino; e Acesso das mulheres aos dispositivos intrauterinos.

Sobre o nível de evidência científica dos estudos, aplicou-se a classificação em sete níveis: no nível I, evidências oriundas de revisão sistemática ou metanálise de todos os ensaios clínicos randomizados (ECR) controlados relevantes; no nível II, evidências provenientes de ECR controlado com bom delineamento; no nível III, evidência derivada de ensaios clínicos bem delineados sem randomização; no nível IV, evidências obtidas de estudos de coorte e de caso-controle bem delineados; no nível V, evidências resultantes de revisão sistemática de estudos descritivos e qualitativos; no nível VI, evidências de um único estudo descritivo ou qualitativo; no nível VII, evidências originadas da opinião de autoridades e/ou relatos de comitês de especialistas(22Melnyk BM, Gallagher-Ford L, Fineout-Overhol E. Implementing the evidence-based practice (EBP) competencies in healthcare: a practical guide to improving quality, safety, and outcomes. Indianapolis: Sigma Theta Tau International; 2016. 194p.).

O presente estudo, por se tratar de uma revisão integrativa da literatura, não necessitou de apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa, porém foram considerados todos os aspectos éticos previstos na Lei nº 9.610/98 sobre os direitos autorais, a exemplo da citação dos autores dos artigos selecionados e preservação das ideias, dos conceitos e achados apresentados nas investigações(23Presidência da República (BR). Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998 [Internet]. Altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências. Brasília;1998[cited 2023 May 25]. Available from: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9610.htm
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).

RESULTADOS

Identificou-se, inicialmente, um total de 141 estudos, dos quais 10 constituíram a amostra final da presente revisão. Desse quantitativo amostral, quatro (40%) estudos foram desenvolvidos nos Estados Unidos, três (30%), na Inglaterra, um (10%), na Burkina Faso, um (10%), nas Filipinas, e um (10%), no Brasil, sendo esse realizado no município de Florianópolis, Santa Catarina. A variação temporal entre a primeira e a última publicação foi de 42 anos (1979 - 2021), sendo apenas três (30%) publicadas nos últimos cinco anos (Quadro 2).

Quadro 2
Características dos estudos que compuseram a amostra da revisão, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil, 2022

A maioria (n=9; 90%) dos estudos foi publicada em periódicos científicos internacionais e em inglês. Há um predomínio de estudos de relato de experiência (n=6; 60%), seguidos pelas revisões de literatura (n=2; 20%) e pesquisas (n=2; 20%) quantitativas ou de métodos mistos. Sobre os níveis de evidência, destaca-se que oito (80%) estudos possuem nível VII. Quanto aos participantes, os enfermeiros (n=5; 50%), enfermeiros de APS (n=2; 20%), de família (n=1; 10%), de saúde da mulher (n=1; 10%) e pediátricos (n=1; 10%) foram os principais sujeitos dos estudos (n=8; 80%), uma vez que, em dois (20%), por se tratarem de revisões de literatura, desconsidera-se essa informação (Quadro 2).

Os principais resultados em relação às evidências de inserção de DIU por enfermeiros na APS, aos objetivos dos estudos e à síntese das respectivas conclusões encontram-se no Quadro 3.

Quadro 3
Estudos selecionados para a revisão segundo os objetivos, principais resultados e conclusão, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil, 2022

A partir da análise dos estudos(15Lacerda LDRC, Arma JC, Paes LG, Siqueira EF, Ferreira LBB, Fetzner RRT, et al. Inserção de dispositivo intrauterino por enfermeiros da atenção primária à saúde. Enferm Foco. 2021;12(suppl 1):99-104. https://doi.org/10.21675/2357-707X.2021.v12.n7.SUPL.1.5209
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,24Saniel FL. The Bohol IUD program. Stud Fam Plann [Internet]. 1979 [cited 2023 May 25];10(6-7):211-2. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/483349/
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/483349/...
-32Chin-Quee DS, Ridgeway K, Onadja Y, Guiella G, Bai GM, Brennan C, et al. Evaluation of a pilot program for task sharing short and long-acting contraceptive methods in Burkina Faso. Gates Open Res. 2020;3:1499. https://doi.org/10.12688/gatesopenres.13009.2
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), emergiram três categorias: Treinamento de enfermeiros para a inserção de dispositivo intrauterino; Competência dos enfermeiros para inserção de dispositivo intrauterino; e Acesso das mulheres aos dispositivos intrauterinos.

Treinamento de enfermeiros para inserção de dispositivo intrauterino

Evidenciaram-se diferentes experiências de treinamentos para inserção e remoção de DIU [E1, E3, E4, E5, E6, E8, E9]. Nota-se a variabilidade de profissionais que participaram dos treinamentos, como enfermeiros [E1, E9, E10], enfermeiros pediátricos [E8], enfermeiros de saúde da família [E8], enfermeiros de APS [E6, E10], enfermeiros de saúde da mulher [E6], enfermeiros residentes [E10], parteiras [E1, E9] e médicos [E8]. As experiências mostram que o quantitativo de profissionais treinados variou de 45 a 115 profissionais [E1, E8, E9, E10]. Os enfermeiros foram citados como supervisores dos treinamentos [E1, E4]. Um estudo aponta o enfermeiro formador inicialmente capacitado por um médico [E4].

Estudos também abordam a respeito do número mínimo de inserções de DIU necessário para o profissional ser considerado capacitado, com variação de um [E8], cinco [E3] e 20 [E1] inserções, e também sobre as retiradas do dispositivo, que oscilou entre uma [E8] e duas [E3].

Competência dos enfermeiros para inserção de dispositivo intrauterino

As experiências de enfermeiros com a prática do DIU revelam um quantitativo expressivo de inserções do dispositivo nas Filipinas e no Brasil, onde foram realizadas mais de 2.000 [E1] e 2.024 [E10] inserções, respectivamente. Ainda, foram evidenciados desfechos positivos, como ausência de complicação grave após o procedimento [E1, E9], poucos efeitos indesejáveis [E9] e satisfação entre as mulheres [E5, E9]. Com isso, os estudos defendem a inserção de DIU pelos enfermeiros, considerando esses profissionais competentes e qualificados para o procedimento [E3, E5, E7, E8, E10] tanto quanto os médicos [E2, E3, E4, E5].

Acesso das mulheres aos dispositivos intrauterinos

Os estudos evidenciam barreiras no acesso aos serviços de planejamento reprodutivo, como a restrição da atuação dos enfermeiros [E2], a falta de treinamento dos profissionais [E3], o modelo de treinamento médico-centrado [E8], a sobrecarga de alguns serviços de atenção primária e o tempo de espera pelo atendimento [E9]. Em contrapartida, a inserção do DIU por enfermeiros se mostra uma estratégia positiva para solucionar o problema de acesso ao DIU [E2, E7, E9, E10].

DISCUSSÃO

O conjunto de evidências analisadas permitiu compreender os fatores que permeiam a inserção de DIU por enfermeiros na APS em âmbito mundial. Nesse meandro, destacam-se nos estudos o treinamento dos enfermeiros e a competência que esses profissionais possuem para realizar a inserção de DIU, bem como o acesso das mulheres a esse método contraceptivo, visando diminuir o problema frequente da gravidez indesejada.

Os achados evidenciaram registros da inserção de DIU por enfermeiro há mais de 40 anos(24Saniel FL. The Bohol IUD program. Stud Fam Plann [Internet]. 1979 [cited 2023 May 25];10(6-7):211-2. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/483349/
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/483349/...
-25Bibb BN. The effectiveness of non-physicians as providers of family planning services. J Obstet Gynecol Neonatal Nurs. 1979;8(3):137-43. https://doi.org/10.1111/j.1552-6909.1979.tb00819.x
https://doi.org/10.1111/j.1552-6909.1979...
) e, desde então, diferentes formas de treinamento desses profissionais para a realização do procedimento foram documentadas(24Saniel FL. The Bohol IUD program. Stud Fam Plann [Internet]. 1979 [cited 2023 May 25];10(6-7):211-2. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/483349/
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/483349/...
,27Elton J. Managing change in primary care: part 2. Pract Nurs[Internet]. 2009 [cited 2023 May 25];37(1):28-33. Available from: https://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=c8h&AN=105450851⟨=pt-br&site=ehost-live
https://search.ebscohost.com/login.aspx?...
,29Harper CC, Stratton L, Raine TR, Thompson K, Henderson JT, Blum M, et al. Counseling and provision of long-acting reversible contraception in the US: national survey of nurse practitioners. Prev Med. 2013;57(6):883-8. https://doi.org/10.1016/j.ypmed.2013.10.005
https://doi.org/10.1016/j.ypmed.2013.10....
,31Rubin SE, Maldonado L, Fox K, Rosenberg R, Wall J, Prine L. Establishing and conducting a regional, hands-on long-acting reversible contraception training Center in Primary Care. Womens Health Issues. 2018;28(5):375-8. https://www.doi.org/10.1016/j.whi.2018.04.010
https://www.doi.org/10.1016/j.whi.2018.0...
-32Chin-Quee DS, Ridgeway K, Onadja Y, Guiella G, Bai GM, Brennan C, et al. Evaluation of a pilot program for task sharing short and long-acting contraceptive methods in Burkina Faso. Gates Open Res. 2020;3:1499. https://doi.org/10.12688/gatesopenres.13009.2
https://doi.org/10.12688/gatesopenres.13...
). Estudo realizado em 1979 descreveu como se deu o treinamento de enfermeiras e parteiras para inserção e retirada de DIU, no qual cada profissional precisou inserir 20 dispositivos para serem consideradas capacitadas(24Saniel FL. The Bohol IUD program. Stud Fam Plann [Internet]. 1979 [cited 2023 May 25];10(6-7):211-2. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/483349/
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/483349/...
). Embora o estudo seja um dos mais antigos desta revisão, dispõe de critérios muito atuais sobre treinamento, se considerada a Resolução vigente no. 690/2022 do COFEN, a qual atualiza no Brasil as exigências da carga horária teórica e teórico-prática, ampliadas para um total de 70 horas, estabelecendo o mínimo de 20 inserções de DIU supervisionadas para a certificação dos enfermeiros(17Conselho Federal de Enfermagem (Cofen). Resolução nº 690, de 4 de fevereiro de 2022 [Internet]. Normatiza a atuação do enfermeiro no planejamento familiar e reprodutivo. Brasília; 2022 [cited 2023 May 25]. Available from: http://www.cofen.gov.br/resolucao-cofen-no-690-2022_96063.html
http://www.cofen.gov.br/resolucao-cofen-...
).

Dos estudos analisados, dois(26Elton J. Managing change in primary care: part 1. Pract Nurs[Internet]. 2008 [cited 2023 May 25];36(10):42-4. Available from: https://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=c8h&AN=105616450⟨=pt-br&site=ehost-live
https://search.ebscohost.com/login.aspx?...
,30Atkin K, Beal MW, Long-Middleton E, Roncari D. Long-acting reversible contraceptives for teenagers: primary care recommendations. Nurse Pract. 2015;40(3):38-46. https://www.doi.org/10.1097/01.NPR.0000460853.60234.c2
https://www.doi.org/10.1097/01.NPR.00004...
) refletem sobre a importância da capacitação para inserção de DIU e SIU-LNG serem baseados em evidências e nas habilidades dos profissionais, visando um programa claro de treinamento e com uma prática abrangente. Em consonância, a experiência recente de capacitação de enfermeiros em um município do Brasil consiste em um componente teórico com carga horária de 30 horas, seguido de treinamento de inserção em um simulador, discussão de casos e termo de consentimento. Após esclarecidas todas as dúvidas, os enfermeiros devem realizar no mínimo 20 inserções de DIU supervisionadas(33Dias CLO, Silva YLM. Advanced nursing practice in reproductive planning intrauterine device insertion: an experience report. Nursing. 2022;25(294):8899-903. https://doi.org/10.36489/nursing.2022v25i294p8894-8903
https://doi.org/10.36489/nursing.2022v25...
), o que possibilita ao enfermeiro se sentir mais confiante no decorrer do treinamento e seguro para realizar o procedimento após a certificação.

Estudos também mostraram que os participantes que iniciaram o treinamento com conhecimento básico e prática em exame ginecológico desenvolveram mais rapidamente suas habilidades em procedimentos de LARC, além de aprimorarem o aprendizado sobre o aconselhamento de métodos contraceptivos, contraindicações, inserção e retirada do DIU(24Saniel FL. The Bohol IUD program. Stud Fam Plann [Internet]. 1979 [cited 2023 May 25];10(6-7):211-2. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/483349/
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/483349/...
,31Rubin SE, Maldonado L, Fox K, Rosenberg R, Wall J, Prine L. Establishing and conducting a regional, hands-on long-acting reversible contraception training Center in Primary Care. Womens Health Issues. 2018;28(5):375-8. https://www.doi.org/10.1016/j.whi.2018.04.010
https://www.doi.org/10.1016/j.whi.2018.0...
). Quanto às habilidades na inserção de DIU, pesquisa apontou que os enfermeiros de APS demonstraram maior limitação prática no procedimento, quando comparados aos enfermeiros de saúde da mulher, contudo 66% desses haviam recebido treinamento prático para inserção de DIU, diferente daqueles com apenas 12% de capacitados(29Harper CC, Stratton L, Raine TR, Thompson K, Henderson JT, Blum M, et al. Counseling and provision of long-acting reversible contraception in the US: national survey of nurse practitioners. Prev Med. 2013;57(6):883-8. https://doi.org/10.1016/j.ypmed.2013.10.005
https://doi.org/10.1016/j.ypmed.2013.10....
).

Ainda acerca da temática sobre treinamento para inserção de DIU e em consonância com os achados, uma revisão sistemática destaca que o conhecimento dos enfermeiros e médicos melhorou de 58% para 81% após o treinamento, o qual se mostrou positivo também na autoconfiança do profissional durante o procedimento(34Ouyang M, Peng K, Botfield JR, McGeechan K. Intrauterine contraceptive device training and outcomes for healthcare providers in developed countries: a systematic review. PLos ONE. 2019;14(7):e0219746. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0219746
https://doi.org/10.1371/journal.pone.021...
). A literatura menciona a autoconfiança como uma consequência da Prática Avançada de Enfermagem (PAE), a qual se alicerça em atributos como a prática baseada em evidências, o alto nível de autonomia e a avaliação avançada e ampla(35Olimpio JA, Araújo JNM, Pitombeira DO, Enders BC, Sonenberg A, Vitor AF. Advanced practice nursing: a concept analysis. Acta Paul Enferm. 2018;31(6):674-80. https://doi.org/10.1590/1982-0194201800092
https://doi.org/10.1590/1982-01942018000...
), essenciais à inserção de DIU por enfermeiros. Nesse sentido, ressalta-se que foi desenvolvido um instrumento para avaliar a competência do enfermeiro na inserção do dispositivo, ferramenta que pode contribuir na qualificação desses profissionais(36Lopes RRS, Galvão EL, Guedes HM. Development and validation of a tool for competence assessment of the insert of the intrauterine device. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2022;22(2):283-95. http://doi.org/10.1590/1806-9304202200020006
http://doi.org/10.1590/1806-930420220002...
) para uma Enfermagem de Prática Avançada, haja vista que as intervenções decorrentes dessa requerem conhecimento especializado, capacidade para tomada de decisões complexas e aptidões clínicas à prática(37Angeli-Silva L, Leitão TS, David HMSL, Mascarenhas NB, Acioli S, Silva TPC. State of the art on advanced nursing practice: reflections for the agenda in Brazil. Rev Bras Enferm. 2022;75(5):e20220151. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2022-0151
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2022-0...
).

Em relação à competência dos enfermeiros para a inserção do DIU, mencionada nos estudos, ressalta-se que, ao adquiri-la, os enfermeiros podem influenciar positivamente o planejamento reprodutivo de mulheres adultas e adolescentes, a qualificação da assistência, além de possibilitar a capacitação de outras enfermeiras(15Lacerda LDRC, Arma JC, Paes LG, Siqueira EF, Ferreira LBB, Fetzner RRT, et al. Inserção de dispositivo intrauterino por enfermeiros da atenção primária à saúde. Enferm Foco. 2021;12(suppl 1):99-104. https://doi.org/10.21675/2357-707X.2021.v12.n7.SUPL.1.5209
https://doi.org/10.21675/2357-707X.2021....
,26Elton J. Managing change in primary care: part 1. Pract Nurs[Internet]. 2008 [cited 2023 May 25];36(10):42-4. Available from: https://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=c8h&AN=105616450⟨=pt-br&site=ehost-live
https://search.ebscohost.com/login.aspx?...
,28Elton J. Managing change in primary care: part 3. Pract Nurs [Internet]. 2009 [cited 2023 May 25];37(2):38-40. Available from: https://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=c8h&AN=105450881⟨=pt-br&site=ehost-live
https://search.ebscohost.com/login.aspx?...
,30Atkin K, Beal MW, Long-Middleton E, Roncari D. Long-acting reversible contraceptives for teenagers: primary care recommendations. Nurse Pract. 2015;40(3):38-46. https://www.doi.org/10.1097/01.NPR.0000460853.60234.c2
https://www.doi.org/10.1097/01.NPR.00004...
), aspecto esse também considerado um atributo da PAE(35Olimpio JA, Araújo JNM, Pitombeira DO, Enders BC, Sonenberg A, Vitor AF. Advanced practice nursing: a concept analysis. Acta Paul Enferm. 2018;31(6):674-80. https://doi.org/10.1590/1982-0194201800092
https://doi.org/10.1590/1982-01942018000...
), superando modelos hegemônicos e médico-centrados(15Lacerda LDRC, Arma JC, Paes LG, Siqueira EF, Ferreira LBB, Fetzner RRT, et al. Inserção de dispositivo intrauterino por enfermeiros da atenção primária à saúde. Enferm Foco. 2021;12(suppl 1):99-104. https://doi.org/10.21675/2357-707X.2021.v12.n7.SUPL.1.5209
https://doi.org/10.21675/2357-707X.2021....
,26Elton J. Managing change in primary care: part 1. Pract Nurs[Internet]. 2008 [cited 2023 May 25];36(10):42-4. Available from: https://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=c8h&AN=105616450⟨=pt-br&site=ehost-live
https://search.ebscohost.com/login.aspx?...
,28Elton J. Managing change in primary care: part 3. Pract Nurs [Internet]. 2009 [cited 2023 May 25];37(2):38-40. Available from: https://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=c8h&AN=105450881⟨=pt-br&site=ehost-live
https://search.ebscohost.com/login.aspx?...
,30Atkin K, Beal MW, Long-Middleton E, Roncari D. Long-acting reversible contraceptives for teenagers: primary care recommendations. Nurse Pract. 2015;40(3):38-46. https://www.doi.org/10.1097/01.NPR.0000460853.60234.c2
https://www.doi.org/10.1097/01.NPR.00004...
). Investigação realizada na Inglaterra, publicada em 1999, já revelava evidências favoráveis nesse sentido, ressaltando que enfermeiras capacitadas realizam inserções de DIU eficientes e seguras, independentemente da idade da paciente, além de um melhor custo-benefício(13Andrews GD, French K, Wilkinson CL. Appropriately trained nurses are competent at inserting intrauterine devices: an audit of clinical practice. Eur J Contracep Repr Health Care. 1999;4(1):41-4. https://doi.org/10.3109/13625189909043479
https://doi.org/10.3109/1362518990904347...
).

A segurança na inserção de DIU por enfermeiros se consolida nos desfechos do procedimento descritos nos estudos, com destaque para uma excelente satisfação entre as usuárias(28Elton J. Managing change in primary care: part 3. Pract Nurs [Internet]. 2009 [cited 2023 May 25];37(2):38-40. Available from: https://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=c8h&AN=105450881⟨=pt-br&site=ehost-live
https://search.ebscohost.com/login.aspx?...
,32Chin-Quee DS, Ridgeway K, Onadja Y, Guiella G, Bai GM, Brennan C, et al. Evaluation of a pilot program for task sharing short and long-acting contraceptive methods in Burkina Faso. Gates Open Res. 2020;3:1499. https://doi.org/10.12688/gatesopenres.13009.2
https://doi.org/10.12688/gatesopenres.13...
), ausência de complicação grave após o procedimento(24Saniel FL. The Bohol IUD program. Stud Fam Plann [Internet]. 1979 [cited 2023 May 25];10(6-7):211-2. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/483349/
https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/483349/...
,32Chin-Quee DS, Ridgeway K, Onadja Y, Guiella G, Bai GM, Brennan C, et al. Evaluation of a pilot program for task sharing short and long-acting contraceptive methods in Burkina Faso. Gates Open Res. 2020;3:1499. https://doi.org/10.12688/gatesopenres.13009.2
https://doi.org/10.12688/gatesopenres.13...
) e baixa porcentagem de efeitos indesejáveis(32Chin-Quee DS, Ridgeway K, Onadja Y, Guiella G, Bai GM, Brennan C, et al. Evaluation of a pilot program for task sharing short and long-acting contraceptive methods in Burkina Faso. Gates Open Res. 2020;3:1499. https://doi.org/10.12688/gatesopenres.13009.2
https://doi.org/10.12688/gatesopenres.13...
). Salienta-se que não houve diferença significativa nos desfechos de inserções de DIU realizados por médicos e enfermeiros(25Bibb BN. The effectiveness of non-physicians as providers of family planning services. J Obstet Gynecol Neonatal Nurs. 1979;8(3):137-43. https://doi.org/10.1111/j.1552-6909.1979.tb00819.x
https://doi.org/10.1111/j.1552-6909.1979...
-27Elton J. Managing change in primary care: part 2. Pract Nurs[Internet]. 2009 [cited 2023 May 25];37(1):28-33. Available from: https://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=c8h&AN=105450851⟨=pt-br&site=ehost-live
https://search.ebscohost.com/login.aspx?...
), mesmo comparando diferentes variáveis, como remoção, expulsão, retenção e gravidez indesejada(25Bibb BN. The effectiveness of non-physicians as providers of family planning services. J Obstet Gynecol Neonatal Nurs. 1979;8(3):137-43. https://doi.org/10.1111/j.1552-6909.1979.tb00819.x
https://doi.org/10.1111/j.1552-6909.1979...
). Os estudos defendem a competência de enfermeiros para realizar inserção de DIU e SIU(25Bibb BN. The effectiveness of non-physicians as providers of family planning services. J Obstet Gynecol Neonatal Nurs. 1979;8(3):137-43. https://doi.org/10.1111/j.1552-6909.1979.tb00819.x
https://doi.org/10.1111/j.1552-6909.1979...
-26Elton J. Managing change in primary care: part 1. Pract Nurs[Internet]. 2008 [cited 2023 May 25];36(10):42-4. Available from: https://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=c8h&AN=105616450⟨=pt-br&site=ehost-live
https://search.ebscohost.com/login.aspx?...
).

Pesquisa sobre o acompanhamento das inserções de DIU por enfermeiros e médicos de um ambulatório de uma maternidade mostrou resultados semelhantes. Do total de DIU inseridos, 61,4% foram por procedimentos realizados pelo enfermeiro; desses, 69,9% das mulheres não apresentaram nenhuma intercorrência registrada na consulta de retorno após 30 dias. Após 12 meses, 90% das mulheres que inseriram o DIU com enfermeiros ou médicos afirmaram estar satisfeitas com o dispositivo. O total de continuação do método foi de 85,5%, sendo que, desses, 53% foram inseridos por enfermeiros. Não houve diferença significativa relacionada às intercorrências, quando se comparam com as inserções de médico e enfermeiro(7Trigueiro TH, Ferrari JC, Souza SRRK, Wall ML, Barbosa R. Follow-up of copper intrauterine device insertion by nurses: a prospective longitudinal study. Rev Bras Enferm. 2020;73(suppl 4):e20200156. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0156
https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0...
).

Entretanto, algumas barreiras de acesso à inserção de DIU foram identificadas na presente revisão, como o modelo de treinamento médico-centrado(25Bibb BN. The effectiveness of non-physicians as providers of family planning services. J Obstet Gynecol Neonatal Nurs. 1979;8(3):137-43. https://doi.org/10.1111/j.1552-6909.1979.tb00819.x
https://doi.org/10.1111/j.1552-6909.1979...
,31Rubin SE, Maldonado L, Fox K, Rosenberg R, Wall J, Prine L. Establishing and conducting a regional, hands-on long-acting reversible contraception training Center in Primary Care. Womens Health Issues. 2018;28(5):375-8. https://www.doi.org/10.1016/j.whi.2018.04.010
https://www.doi.org/10.1016/j.whi.2018.0...
), a falta de treinamento dos profissionais que atuam na área de planejamento familiar(26Elton J. Managing change in primary care: part 1. Pract Nurs[Internet]. 2008 [cited 2023 May 25];36(10):42-4. Available from: https://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=c8h&AN=105616450⟨=pt-br&site=ehost-live
https://search.ebscohost.com/login.aspx?...
) e a sobrecarga dos serviços de atenção primária, com consequente aumento do tempo de espera para os atendimentos(32Chin-Quee DS, Ridgeway K, Onadja Y, Guiella G, Bai GM, Brennan C, et al. Evaluation of a pilot program for task sharing short and long-acting contraceptive methods in Burkina Faso. Gates Open Res. 2020;3:1499. https://doi.org/10.12688/gatesopenres.13009.2
https://doi.org/10.12688/gatesopenres.13...
). Esse resultado dialoga com outros dois estudos(1Barreto DS, Maia DS, Gonçalves RD, Soares RS. Dispositivo intrauterino na Atenção Primária à Saúde: uma revisão integrativa. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2021;16(43):2821. https://doi.org/10.5712/rbmfc16(43)2821
https://doi.org/10.5712/rbmfc16(43)2821...
,9Gonzaga VAS, Borges ALV, Santos AO, Rosa PLFS, Gonçalves RFS. Organizational barriers to the availability and insertion of intrauterine devices in Primary Health Care Services. Rev Esc Enferm USP. 2017;51:e03270 https://doi.org/10.1590/s1980-220x2016046803270
https://doi.org/10.1590/s1980-220x201604...
) que abordam as diferentes barreiras no acesso ao DIU, quais sejam: não disponibilização do DIU na APS ou no próprio município; falta de protocolos para disponibilização do método; critérios pré-estabelecidos para inserção (como prescrição médica, exames prévios, participação de grupos educativos, agendamento prévio); falta de treinamento dos profissionais e de conhecimento dos mesmos sobre os critérios de elegibilidade; limitação da atuação do enfermeiro, tornando o procedimento exclusivo do médico; tempo excessivo de espera; e falta de conhecimento da população sobre o método.

Mais da metade dos estudos analisados abordou sobre o acesso ao DIU(15Lacerda LDRC, Arma JC, Paes LG, Siqueira EF, Ferreira LBB, Fetzner RRT, et al. Inserção de dispositivo intrauterino por enfermeiros da atenção primária à saúde. Enferm Foco. 2021;12(suppl 1):99-104. https://doi.org/10.21675/2357-707X.2021.v12.n7.SUPL.1.5209
https://doi.org/10.21675/2357-707X.2021....
,25Bibb BN. The effectiveness of non-physicians as providers of family planning services. J Obstet Gynecol Neonatal Nurs. 1979;8(3):137-43. https://doi.org/10.1111/j.1552-6909.1979.tb00819.x
https://doi.org/10.1111/j.1552-6909.1979...
-26Elton J. Managing change in primary care: part 1. Pract Nurs[Internet]. 2008 [cited 2023 May 25];36(10):42-4. Available from: https://search.ebscohost.com/login.aspx?direct=true&db=c8h&AN=105616450⟨=pt-br&site=ehost-live
https://search.ebscohost.com/login.aspx?...
,30Atkin K, Beal MW, Long-Middleton E, Roncari D. Long-acting reversible contraceptives for teenagers: primary care recommendations. Nurse Pract. 2015;40(3):38-46. https://www.doi.org/10.1097/01.NPR.0000460853.60234.c2
https://www.doi.org/10.1097/01.NPR.00004...
-32Chin-Quee DS, Ridgeway K, Onadja Y, Guiella G, Bai GM, Brennan C, et al. Evaluation of a pilot program for task sharing short and long-acting contraceptive methods in Burkina Faso. Gates Open Res. 2020;3:1499. https://doi.org/10.12688/gatesopenres.13009.2
https://doi.org/10.12688/gatesopenres.13...
), o que sinaliza que esse também é um tema de destaque no tocante à inserção do dispositivo por enfermeiros na APS. Sobre a temática, evidenciou-se com a atuação do enfermeiro na inserção de DIU uma maior oportunidade de conhecimento das mulheres aos métodos LARC e de acesso à inserção do dispositivo. Uma das experiências brasileiras relatadas, realizada no município de Florianópolis, Santa Catarina, mostrou um incremento de 60% no acesso e oferta do DIU às mulheres adultas e adolescentes com a inserção do dispositivo pelos enfermeiros na APS(15Lacerda LDRC, Arma JC, Paes LG, Siqueira EF, Ferreira LBB, Fetzner RRT, et al. Inserção de dispositivo intrauterino por enfermeiros da atenção primária à saúde. Enferm Foco. 2021;12(suppl 1):99-104. https://doi.org/10.21675/2357-707X.2021.v12.n7.SUPL.1.5209
https://doi.org/10.21675/2357-707X.2021....
). Outros estudos corroboram que a inserção de DIU por enfermeiros é uma importante estratégia para superar as barreiras de acesso dos serviços de saúde(33Dias CLO, Silva YLM. Advanced nursing practice in reproductive planning intrauterine device insertion: an experience report. Nursing. 2022;25(294):8899-903. https://doi.org/10.36489/nursing.2022v25i294p8894-8903
https://doi.org/10.36489/nursing.2022v25...
-34Ouyang M, Peng K, Botfield JR, McGeechan K. Intrauterine contraceptive device training and outcomes for healthcare providers in developed countries: a systematic review. PLos ONE. 2019;14(7):e0219746. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0219746
https://doi.org/10.1371/journal.pone.021...
).

No tocante ao acesso, ressalta-se a APS como um importante cenário para a oferta do DIU, por ser a porta de entrada dos sistemas de saúde e um dos principais serviços de planejamento reprodutivo. Nesse cenário, onde muitas vezes o recurso humano é um problema, especialmente de atendimento médico, a capacitação e a atuação do enfermeiro se mostram fundamentais à qualificação da assistência contraceptiva e garantia de atenção à saúde sexual e reprodutiva para todas as mulheres(1Barreto DS, Maia DS, Gonçalves RD, Soares RS. Dispositivo intrauterino na Atenção Primária à Saúde: uma revisão integrativa. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2021;16(43):2821. https://doi.org/10.5712/rbmfc16(43)2821
https://doi.org/10.5712/rbmfc16(43)2821...
,38Souza EG, Pinheiro ERS, Rocha JMS, Sousa MM, Santos EA, Rangel HF. A capacitação de profissionais da APS para inserção do dispositivo intrauterino (DIU) de cobre: a experiência do município de Betim, Minas Gerais. APS Rev. 2021;3(1):32-8. https://doi.org/10.14295/aps.v3i1.144
https://doi.org/10.14295/aps.v3i1.144...
-39Trigueiro TH, Lima GS, Borges R, Guimarães PRB, Souza SRRK, Wall ML. Insertion of intrauterine device for doctors and nurses in a low-risk maternity hospital. Rev Gaúcha Enferm. 2021;42:e20200015. https://doi.org/10.1590/1983-1447.2021.20200015
https://doi.org/10.1590/1983-1447.2021.2...
), sobretudo àquelas que vivem em situações de vulnerabilidade social no país ou em qualquer outro lugar do mundo, prevenindo-se, por exemplo, a gravidez indesejada e o abortamento, com suas complicações e/ou repercussões.

Limitações do estudo

As limitações do estudo estão relacionadas, principalmente, ao delineamento da maior parte dos estudos que compuseram o corpo amostral, caracterizado como relato de experiência, que possui o menor nível de evidência científica. Ademais, o número reduzido de pesquisas referentes à inserção de DIU por enfermeiros na APS, quando comparado com outros cenários da prática, limitou a amostra da revisão, inclusive no contexto nacional.

Contribuições para a área da enfermagem, saúde e políticas públicas

A revisão integrativa permitiu agrupar diferentes experiências positivas acerca da inserção de DIU por enfermeiros na APS e, assim, contribuir para fortalecer essa prática profissional avançada e estimular os serviços de saúde a instituir um programa de treinamento para os enfermeiros, estratégia que pode qualificar a assistência contraceptiva e ampliar o acesso das mulheres ao DIU, comprovadamente eficaz. Ao lançar luz sobre a produção do conhecimento relacionada à temática, a presente revisão também contribui ao revelar a necessidade de estudos robustos com alto nível de evidência científica, como os ensaios clínicos randomizados. Ainda, a revisão poderá subsidiar discussões legais que envolvem a inserção e a retirada do dispositivo pelo enfermeiro, dando visibilidade para a ampliação e o fortalecimento das políticas públicas relacionadas ao planejamento reprodutivo.

CONCLUSÕES

Os estudos sobre inserção de DIU por enfermeiros na APS foram desenvolvidos predominantemente no âmbito internacional, sendo os primeiros publicados em 1979. O estudo mais recente é brasileiro, o único desenvolvido no país, publicado em 2021 e realizado em Florianópolis. Prevaleceram os estudos de relato de experiência, classificados com menor nível de evidência científica.

Os achados, com recorte na APS, revelaram três temáticas principais: Treinamento de enfermeiros para a inserção de dispositivo intrauterino; Competência dos enfermeiros para a inserção de dispositivo intrauterino; e Acesso das mulheres aos dispositivos intrauterinos. Foram apresentadas diferentes experiências de treinamento teórico e prático dos enfermeiros para a inserção de DIU, com participação de diferentes especialidades, a exemplo de enfermeiros pediátricos, de família e de saúde da mulher. Os enfermeiros capacitados demonstraram competência para essa prática, com desfechos favoráveis, como ausência de complicação grave após o procedimento, poucos efeitos indesejáveis e ótima satisfação das mulheres com o método. Além disso, os enfermeiros se mostraram tão competentes quanto os médicos na inserção de DIU. A inserção de DIU por enfermeiros se revelou uma importante estratégia para ampliar o acesso das mulheres a esse dispositivo, visto as barreiras de acesso ao planejamento reprodutivo nos serviços de saúde.

Por fim, as lacunas de conhecimento científico relacionadas à inserção de DIU por enfermeiros da APS sinalizam a necessidade de pesquisas robustas sobre a temática em âmbito nacional e internacional que utilizem metodologias homogêneas e amostras representativas, com alto nível de evidência científica, visando sustentar e fomentar essa prática profissional do enfermeiro na APS em âmbito global, além de fortalecer as práticas avançadas do enfermeiro no processo de trabalho em saúde.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Barbosa
EDITOR ASSOCIADO: Ana Fátima Fernandes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Fev 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    27 Maio 2023
  • Aceito
    09 Out 2023
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