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Efeitos do exercício agudo na lipemia pós-prandial em homens sedentários

Resumos

OBJETIVO: Examinar os efeitos de uma sessão isolada de exercício físico isométrico na trigliceridemia pós-prandial em homens sedentários com valores de triglicérides em jejum < 150 mg/dl (NTG) ou > 150 mg/dl (TG ALT). MÉTODOS: Foram avaliados 27 indivíduos (10 NTG e 17 TG ALT), com idade entre trinta e 55 anos. Os triglicérides foram determinados no início, e após duas, quatro e seis horas da ingestão oral de uma solução com 50g/m² de gordura em duas oportunidades, em repouso e após exercício isométrico em esteira. RESULTADOS: O exercício agudo não modificou os níveis pós-prandiais de triglicérides, ou a área sob a curva (AUC) de triglicérides. Entretanto, o padrão anormal da curva de lipemia pós-prandial associou-se a maior trigliceridemia basal com exercício (TG basais: 147 ± 90 versus 238 ± 89 mg/dl, p = 0,02) e sem exercício (TG basais: 168 ± 93 versus 265 ± 140 mg/dl, p = 0,04). A análise das curvas ROC (receive operating characteristics) mostrou valores de corte de triglicérides basais com atividade física de 166,5 mg/dl (sensibilidade: 0,78; especificidade: 0,72) e AUC de 0,772 [IC 95%: 0,588-0,955], e sem atividade física de 172 mg/dl (sensibilidade: 0,78; especificidade: 0,61) e AUC de 0,722 [IC 95%: 0,530-0,914]. CONCLUSÃO: A trigliceridemia pós-prandial em homens sedentários não foi modificada pelo exercício agudo, sendo os valores basais de triglicérides preditores de uma resposta anormal dos triglicérides pós-prandiais.

Exercício agudo; triglicérides; lipemia pós-prandial


OBJECTIVE: To examine the effects of a single session of isometric physical exercise on postprandial triglyceridemia in sedentary male individuals with fasting triglycerides values < 150 mg/dl (NTG) or > " 150 mg/dl (TG ALT). METHODS: Twenty-seven individuals (10 NTG and 17 TG ALT), aged between 30-55 years were assessed in the study. Triglycerides were determined in the beginning, and at two, four and six hours after the oral ingestion of a solution with 50g/m² of fat in two occasions: at rest and after treadmill isometric exercise. RESULTS: Acute exercise did not affect the levels of postprandial triglycerides or the area under the curve (AUC) of triglycerides. However, the abnormal pattern of postprandial lipemia curve was associated with higher basal triglyceridemia with exercise (basal TG: 147 ± 90 vs. 238 ± 89 mg/dl, p = 0.02) and without exercise (basal TG: 168 ± 93 vs. 265 ± 140 mg/dl, p = 0.04). Analysis of the receiver operating characteristics (ROC) curves showed cut-off values for basal triglycerides with exercise of 166.5 mg/dl (sensitivity: 0.78; specificity: 0.72) and AUC of 0.772 [CI 95%: 0.588-0.955], and without exercise of 172 mg/dl (sensitivity: 0.78; specificity: 0.61) and AUC: 0.722 [CI 95%: 0.530-0.914]. CONCLUSION: Acute exercise did not affect postprandial triglyceridemia in sedentary male individuals, and basal triglyceride levels are predictors of an abnormal response of postprandial triglycerides.

Acute exercise; triglycerides; postprandial lipemia


ARTIGO ORIGINAL

Efeitos do exercício agudo na lipemia pós-prandial em homens sedentários

Mônica Teixeira; Nelson Kasinski; Maria Cristina de Oliveira Izar; Luiz Alberto Barbosa; José Paulo Novazzi; Leonor Almeida Pinto; Sérgio Tufik; Turíbio Ferreira Leite; Francisco Antonio Helfenstein Fonseca

Universidade Federal de São Paulo — Escola Paulista de Medicina - São Paulo, SP

Correspondência Correspondência: Francisco Antonio Helfenstein Fonseca Rua Pedro de Toledo, 458 04039-001 — São Paulo, SP E-mail: ffonseca@cardiol.br, fahfonseca@terra.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Examinar os efeitos de uma sessão isolada de exercício físico isométrico na trigliceridemia pós-prandial em homens sedentários com valores de triglicérides em jejum < 150 mg/dl (NTG) ou > 150 mg/dl (TGALT).

MÉTODOS: Foram avaliados 27 indivíduos (10 NTG e 17 TGALT), com idade entre trinta e 55 anos. Os triglicérides foram determinados no início, e após duas, quatro e seis horas da ingestão oral de uma solução com 50g/m2 de gordura em duas oportunidades, em repouso e após exercício isométrico em esteira.

RESULTADOS: O exercício agudo não modificou os níveis pós-prandiais de triglicérides, ou a área sob a curva (AUC) de triglicérides. Entretanto, o padrão anormal da curva de lipemia pós-prandial associou-se a maior trigliceridemia basal com exercício (TG basais: 147 ± 90 versus 238 ± 89 mg/dl, p = 0,02) e sem exercício (TG basais: 168 ± 93 versus 265 ± 140 mg/dl, p = 0,04). A análise das curvas ROC (receive operating characteristics) mostrou valores de corte de triglicérides basais com atividade física de 166,5 mg/dl (sensibilidade: 0,78; especificidade: 0,72) e AUC de 0,772 [IC 95%: 0,588-0,955], e sem atividade física de 172 mg/dl (sensibilidade: 0,78; especificidade: 0,61) e AUC de 0,722 [IC 95%: 0,530-0,914].

CONCLUSÃO: A trigliceridemia pós-prandial em homens sedentários não foi modificada pelo exercício agudo, sendo os valores basais de triglicérides preditores de uma resposta anormal dos triglicérides pós-prandiais.

Palavras-chave: Exercício agudo, triglicérides, lipemia pós-prandial.

O conceito de que o processo aterosclerótico é um fenômeno pós-prandial foi evidenciado há mais de vinte anos por Zilversmit1, ao demonstrar em animais e em humanos que remanescentes de quilomicrons e lipoproteínas de baixa densidade (LDL) são captados por células endoteliais.

Estudos clínicos mostraram que a magnitude da lipemia pós-prandial ou mesmo níveis aumentados de triglicérides (TG) pós-prandiais podem predizer aterosclerose sintomática ou assintomática, independentemente dos fatores de risco avaliados em jejum2-5.

A lipemia pós-prandial reflete uma medida integrada da capacidade individual de remoção de triglicérides. Dietas ou tratamentos que diminuam os níveis de lipoproteínas ricas em triglicérides em jejum também podem promover melhora nos níveis de lipoproteínas ricas em triglicérides pós-prandiais. Assim, o exercício aeróbico, a redução do peso corpóreo e certos fármacos reduzem a trigliceridemia pós-prandial e têm o potencial de reduzir os níveis de lipoproteínas remanescentes6.

A lipemia pós-prandial é caracterizada por um estado hipertrigliceridêmico transitório, mas as concentrações de triglicérides no jejum relacionam-se ao tamanho da partícula de LDL7. Essa resposta pode estar condicionada a maior mobilização de ácidos graxos, aumento de síntese e retardo de remoção de VLDL, propiciando maior interação entre lipoproteínas que contribuem para a formação de partículas pequenas e densas de LDL, extremamente aterogênicas7-10.

A magnitude da resposta pós-prandial é determinada por vários fatores. A resposta pós-prandial é maior nos homens11,12, tende a aumentar com a idade13, diferindo ainda entre normo e hipertrigliceridêmicos1,14 de acordo com os valores lipídicos séricos no jejum.

O exercício regular está associado com redução da prevalência de doença arterial coronariana, diabete melito e obesidade15-18. A maior parte da vida ocorre em estado pós-prandial, sendo de particular importância intervenções que possam atenuar efeitos aterogênicos da hiperlipemia pós-prandial19.

Embora o exercício possa se acompanhar de mudanças favoráveis no perfil lipídico pós-prandial, são menos conhecidos os seus efeitos agudos, especialmente comparando indivíduos com valores normais ou alterados de triglicérides em jejum20-22.

Tendo em vista o considerável aumento na prevalência de sedentarismo, obesidade e resistência à insulina na sociedade moderna, o presente estudo foi delineado para examinar os efeitos de uma sessão isolada de exercício físico na trigliceridemia pós-prandial, em indivíduos sedentários com ou sem hipertrigliceridemia em jejum.

MÉTODOS

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo — Escola Paulista de Medicina, e todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Participaram da pesquisa 27 homens sedentários, com idades entre trinta e 55 anos, sendo dez normotrigliceridêmicos, NTG (TG basal < 150 mg/dl) e dezessete indivíduos com valores de triglicérides basais alterados, TGALT (TG > 150)23,24, sendo excluídos indivíduos com TG > 400 mg/dl.

Foram também excluídos indivíduos cujo índice de massa corpórea fosse > 30 kg/m2, portadores de doença arterial coronariana sintomática, por meio de critérios clínicos e eletrocardiográficos, registrados em repouso ou durante o teste de esforço. Além disso, foram excluídos os portadores de hepatopatias, nefropatias graves, os diabéticos, pacientes em vigência de processos infecciosos e com neoplasias.

Desenho do estudo - O protocolo constou de avaliações médicas, testes laboratoriais, ergoespirometria, avaliação nutricional e estudo da lipemia pós-prandial (fig. 1). A prescrição de exercício foi precedida por teste ergoespirométrico.


A avaliação nutricional constou de duas etapas. Foram obtidos dados antropométricos dos pacientes selecionados na condição basal, além do registro alimentar de três dias25. Com base nos dados informados realizou-se o cálculo da dieta habitual. O cálculo da ingestão dietética de cada nutriente foi realizado utilizando-se o programa de Apoio à Nutrição do Centro de Informática aplicada à Saúde — EPM/ UNIFESP — versão 2.526.

O estudo da lipemia pós-prandial foi realizado em dois períodos, sendo os pacientes submetidos a um exercício de trinta minutos em esteira, logo após a ingestão da dieta, repetindo-se o mesmo estudo sem o exercício em esteira, duas semanas após.

Foram coletadas amostras de sangue em jejum de doze a quatorze horas e a seguir após duas, quatro e seis horas da ingestão da dieta padronizada para a análise dos triglicérides (fig. 1).

Análise laboratorial - O colesterol total e os triglicérides foram mensurados por método enzimático automatizado (Opera, Bayer, Alemanha), a fração HDL-C foi quantificada no sobrenadante, após a precipitação de lipoproteínas contendo apo B, e o LDL-C foi estimado pela fórmula de Friedewald27. Análises bioquímicas foram realizadas em aparelho Advia 120 (Bayer, Alemanha).

Avaliação ergoespirométrica e exercício físico - O exercício proposto constou de caminhada, em esteira, sem inclinação, pelo período de trinta minutos e em velocidade constante, de acordo com o resultado do teste ergoespirométrico (limiar anaeróbio). A fase de exercício foi precedida de aquecimento de três minutos, o mesmo ocorrendo ao final de cada período.

Lipemia pós-prandial - Os indivíduos foram submetidos a dois testes de lipemia pós-prandial. Para o preparo da lipemia pós-prandial solicitou-se suspensão prévia de atividade física por 48 horas, abstinência de álcool e cafeína num período de 24 horas, além de dieta orientada para o jantar da noite anterior ao exame29-33.

Para as coletas das amostras de sangue utilizou-se um cateter plástico (VialonR número 20, Becton Dickinson), sendo desprezados 5 ml de sangue a cada nova coleta para garantir a exatidão dos resultados dos exames. Realizaram-se quatro coletas de sangue (jejum, duas, quatro e seis horas). Após a coleta basal, os participantes ingeriram uma solução com alta concentração de gordura, em quinze minutos.

A solução foi constituída por: um litro de leite integral, uma lata de creme de leite, 50 gramas de ovo de galinha desidratado, 100 gramas de chocolate em pó, uma colher de sopa de manteiga sem sal, seis unidades de castanha do Pará, duas unidades de banana nanica, 150 ml de leite de coco. O valor nutricional do total da receita foi de 2.655 calorias, constituído por 81 g de proteínas (11,6%), 151 g de carboidratos (21,4%) e 209 g de lipídios (67,0%).

Foi fornecido a cada participante o equivalente a 50 gramas de gordura por metro quadrado de superfície corpórea. O rendimento da receita relativo a 50 gramas de gordura foi de 365 ml que, multiplicado pela superfície corpórea, resultou na quantidade ingerida da solução.

Análise estatística - As variáveis numéricas no período basal são apresentadas como médias e desvio-padrão das médias e foram comparadas entre os grupos NTG e TGALT pelo teste t de Student, para amostras não relacionadas. Para a análise dos triglicérides nas condições de jejum, duas, quatro e seis horas, foi utilizada análise de variâncias com medidas repetidas. A área sob a curva foi calculada utilizando-se a regra trapezoidal. Utilizou-se o teste t de Student para amostras relacionadas para comparação das áreas sob as curvas com e sem atividade física. Foram construídas curvas ROC para avaliar a eficiência dos valores basais de triglicérides em predizer alteração na resposta da trigliceridemia pós-prandial. Foram considerados significantes valores de p < 0,05.

RESULTADOS

As características basais dos participantes são apresentadas na tabela 1. As variáveis demográficas e os parâmetros antropométricos não diferiram entre os participantes NTG e TGALT, com exceção da circunferência da cintura, que foi maior nos TGALT. Além de maiores valores basais de TG, os pacientes TGALT apresentaram menores valores de HDL-C, quando comparados aos NTG, não diferindo com relação aos valores de glicemia.

Não houve diferenças entre os grupos quanto ao consumo calórico total da dieta, ao conteúdo de proteínas, carboidratos e de lipídios; entretanto, os indivíduos NTG apresentaram maior consumo de ácidos graxos poliinsaturados do que os TGALT (tab. 2).

Lipemia pós-prandial e efeito do exercício agudo - A trigliceridemia pós-prandial apresentou um pico em quatro horas, não diferindo com e sem a prescrição do exercício agudo (p = 0,098), com uma razão entre os valores de triglicérides no pico de 0,95 (IC 95%: 0,74;1,15) (fig. 2). Os valores médios obtidos para as áreas sob a curva de triglicérides (seis horas) também não diferiram (AUC: 632 ± 422 vs. 751 ± 427 mg/dl, com e sem atividade física, respectivamente; p = 0,133, teste t de Student para amostras relacionadas), sendo a razão das áreas sob as curvas de 0,97 (IC 95%:0,75;1,19) (fig. 3).



As curvas de triglicérides pós-prandiais são apresentadas na tabela 3 e na figura 4. Não houve efeito do exercício agudo na curva de triglicérides pós-prandiais (p = 0,40; ANOVA com medidas repetidas). Entretanto, houve associação dos valores de triglicérides basais com o comportamento da curva de triglicérides dos indivíduos ao longo do tempo (p = 0,026).


Analisando o comportamento da curva de triglicérides pós-prandiais dos participantes do estudo observou-se que dezoito indivíduos apresentaram um comportamento típico de uma curva normal; ou seja, na sexta hora da ingestão da solução lipídica havia um retorno da trigliceridemia a valores próximos aos basais, enquanto nove sujeitos apresentaram curvas com comportamento anormal. Os perfis individuais da resposta da lipemia pós-prandial com e sem atividade física são apresentados nas figuras 5 e 6, respectivamente. Os valores basais de triglicérides foram então comparados de acordo com o comportamento da curva de triglicérides pós-prandial normal ou anormal com e sem atividade física, havendo maiores valores basais de triglicérides nos indivíduos com comportamento anormal da curva de lipemia pós-prandial com atividade física (TG basais: 147 ± 90 versus 238 ± 89 mg/dl, p = 0,02, teste t de Student) e sem atividade física (TG basais: 168 ± 93 versus 265 ± 140 mg/dl, p = 0,04, teste t de Student) (fig. 7 e 8). Houve concordância das respostas da trigliceridemia pós-prandial em dezessete indivíduos com e sem a realização do exercício agudo (treze normais com e sem atividade física e quatro anormais com e sem atividade física).





As curvas ROC mostraram que os valores basais de triglicérides foram preditores da resposta alterada da trigliceridemia pós-prandial com e sem atividade física (fig. 9 e 10). A eficiência dos valores de triglicérides basais em predizer uma resposta pós-prandial alterada dos triglicérides foi de 0,793 (IC 95%: 0,622-0,964), com atividade física e de 0,722 (IC 95%: 0,530-0,914) sem atividade física.



O ponto de corte dos valores basais de triglicérides capaz de predizer uma resposta anormal da trigliceridemia pós-prandial foi de 166,5 mg/dl (sensibilidade = 0,77 e especificidade = 0,72) com atividade física e 172 mg/dl (sensibilidade = 0,78 e especificidade = 0,61) sem atividade física.

DISCUSSÃO

A principal contribuição deste estudo foi mostrar que o exercício físico agudo foi incapaz de modificar a trigliceridemia pós-prandial em homens sedentários e, especialmente, de valorizar os níveis plasmáticos em jejum dos triglicérides como preditores da lipemia pós-prandial. Além disso, identificou quais valores basais de triglicérides estão associados com a trigliceridemia pós-prandial anormal.

O estudo ainda mostrou que indivíduos sedentários com triglicérides em jejum alterados (TGALT) apresentavam maior circunferência da cintura e HDL-C mais baixo, apesar de valores médios de IMC semelhantes àqueles encontrados em normotrigliceridêmicos.

Embora a avaliação pós-prandial dos triglicérides não mostrasse efeito da atividade física na lipemia pós-prandial, foi observado que um grupo de indivíduos exibia um padrão anormal de resposta dos triglicérides pós-prandiais, com ou sem atividade física, caracterizando um comportamento anormal da curva, e que esse padrão pôde ser predito com base nos valores de triglicérides basais. Valores basais de triglicérides acima de 166,5 e 172,0 mg/dl, com e sem atividade física, respectivamente, foram eficientes em predizer uma resposta alterada dos triglicérides pós-prandiais em indivíduos sedentários.

As lipoproteínas ricas em triglicérides de origem intestinal e as de origem hepática contribuem para a trigliceridemia encontrada após a ingestão de uma solução rica em gorduras2,10. A quantificação da lipemia baseou-se nas concentrações plasmáticas de triglicérides, que refletem o balanço entre a taxa de aparecimento e desaparecimento na circulação de lipoproteínas ricas nesse lipídio29, sendo o pico da curva de lipemia obtido quatro horas após a ingestão da solução de gordura14, e sua normalização a partir da sexta hora31.

Está bem estabelecido que durante um estado prolongado e acentuado de lipemia pós-prandial ocorrem trocas de lípides neutros entre partículas ricas em triglicérides, LDL e HDL, levando à formação de partículas de LDL pequenas e densas e a uma menor concentração de HDL-C34. Mais recentemente, foi relatado que a função endotelial está alterada no estado pós-prandial, relacionando-se à elevação dos triglicérides pós-prandiais35. Outros estudos mostraram ainda que, em indivíduos saudáveis, as concentrações plasmáticas de citocinas inflamatórias e moléculas de adesão estavam elevadas após ingestão de dietas ricas em gorduras, mas não em carboidratos36, causando um estado pró-inflamatório transitório. Esses mecanismos estão implicados no processo aterogênico e se associam a um maior risco cardiovascular37.

Atletas e indivíduos que se exercitam regularmente apresentam baixos níveis de lipemia pós-prandial38. Os efeitos do exercício agudo em indivíduos normotrigliceridêmicos foram recentemente avaliados, não se demonstrando diferenças na resposta dos triglicérides pós-prandiais quando a dieta rica em gorduras foi administrada tanto antes como após o exercício39. Indivíduos treinados em que se avaliou o efeito de uma semana de destreinamento na lipemia pós-prandial apresentaram, contudo, aumento dos triglicérides basais e pós-prandiais e das lipoproteínas ricas em triglicérides, sem alteração da função endotelial no curto período sem exercício40.

Em atletas, diferentes graus de exercício agudo não demonstraram modificações nas áreas sob as curvas de triglicérides pós-prandiais41. Não encontramos na literatura descrição do efeito do exercício agudo na resposta pós-prandial dos triglicérides em indivíduos hipertrigliceridêmicos. Em nosso estudo, com indivíduos destreinados normo e hipertrigliceridêmicos não observamos efeito de uma única sessão de exercício na trigliceridemia pós-prandial. Entretanto, os valores basais de triglicérides foram preditores da resposta pós-prandial com ou sem a administração do exercício agudo, reforçando orientação de diretrizes atuais que valorizam os níveis dos lipídios em jejum.

Em conclusão, nosso estudo evidenciou que em homens destreinados, com valores de triglicérides basais normais ou alterados, o exercício agudo não modifica a trigliceridemia pós-prandial. Valores basais de triglicérides acima dos desejáveis são preditores de uma resposta anormal dos triglicérides pós-prandiais.

Agradecimento

Agradecemos ao Prof. Dr. Fábio Tadeu Montesano a assistência nas análises estatísticas.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflitos de interesses pertinentes.

Recebido em 24/08/05

Aceito em 08/12/05

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  • Correspondência:

    Francisco Antonio Helfenstein Fonseca
    Rua Pedro de Toledo, 458
    04039-001 — São Paulo, SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Jul 2006
    • Data do Fascículo
      Jul 2006

    Histórico

    • Aceito
      08 Dez 2005
    • Recebido
      24 Ago 2005
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