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Cardiomiopatia/Displasia Arritmogênica do Ventrículo Direito (C/DAVD) - O Que Aprendemos após 40 Anos do Diagnóstico desta Entidade Clínica

Resumo

A cardiomiopatia/displasia arritmogênica do ventrículo direito (C/DAVD) foi inicialmente reconhecida como uma entidade clínica por Fontaine e Marcus que avaliaram um grupo de pacientes com taquiarritmia ventricular proveniente de um ventrículo direito (VD) estruturalmente comprometido. Desde então, houve avanços significativos na compreensão da fisiopatologia, manifestação e evolução clínica e prognóstico da patologia. A identificação de mutações genéticas comprometendo os desmossomos cardíacos levou a inclusão desta entidade na classificação das cardiomiopatias. Classicamente, a C/DAVD é uma doença hereditária que se caracteriza por arritmias ventriculares, disfunção ventricular direita e/ou esquerda; e substituição fibro-gordurosa dos cardiomiócitos; cuja identificação pode ser muitas vezes desafiadora, devido à apresentação clínica heterogênea, expressividade intra- e inter-familiar altamente variável e penetrância incompleta.

Na falta de um padrão-ouro que permita o diagnóstico da C/DAVD, várias categorias diagnósticas foram combinadas e, recentemente revisadas buscando uma maior sensibilidade diagnóstica, sem comprometer a especificidade. A descoberta de que as anormalidades elétricas, particularmente as arritmias ventriculares, geralmente precedem anormalidades estruturais é extremamente importante para a estratificação de risco em membros genéticos positivos. Entre os exames complementares, a ressonância magnética cardíaca (RMC) possibilita o diagnóstico precoce de comprometimento ventricular esquerdo, mesmo antes das anormalidades morfofuncionais. A estratificação de risco continua a ser um grande desafio clínico e medicamentos antiarrítmicos, ablação de cateter e desfibrilador cardioversor implantável são as ferramentas terapêuticas atualmente disponíveis. A desqualificação do esporte previne casos de morte súbita uma vez que o esforço pode desencadear não só a instabilidade elétrica, mas também deflagrar o início e a progressão da doença.

Palavras-chave
Displasia Arritmogênica Ventricular Direita/fisiopatologia; Arritmias Cardíacas/diagnóstico por imagem; Ablação por Cateter; Desfibriladores Implantáveis; Ressonância Magnética

Abstract

Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia (ARVC/D) was initially recognized as a clinical entity by Fontaine and Marcus, who evaluated a group of patients with ventricular tachyarrhythmia from a structurally impaired right ventricle (RV). Since then, there have been significant advances in the understanding of the pathophysiology, manifestation and clinical progression, and prognosis of the pathology. The identification of genetic mutations impairing cardiac desmosomes led to the inclusion of this entity in the classification of cardiomyopathies. Classically, ARVC/D is an inherited disease characterized by ventricular arrhythmias, right and / or left ventricular dysfunction; and fibro-fatty substitution of cardiomyocytes; its identification can often be challenging, due to heterogeneous clinical presentation, highly variable intra- and inter-family expressiveness, and incomplete penetrance.

In the absence of a gold standard that allows the diagnosis of ARVC/D, several diagnostic categories were combined and recently reviewed for a higher diagnostic sensitivity, without compromising the specificity. The finding that electrical abnormalities, particularly ventricular arrhythmias, usually precede structural abnormalities is extremely important for risk stratification in positive genetic members. Among the complementary exams, cardiac magnetic resonance imaging (CMR) allows the early diagnosis of left ventricular impairment, even before morpho-functional abnormalities. Risk stratification remains a major clinical challenge, and antiarrhythmic drugs, catheter ablation and implantable cardioverter defibrillator are the currently available therapeutic tools. The disqualification of the sport prevents cases of sudden death because the effort can trigger not only the electrical instability, but also the onset and progression of the disease.

Keywords
Arrhythmogenic Right Ventricular Dysplasia/physiopathology; Arrhythmias, Cardiac/diagnostic imaging; Catheter Ablation; Defibrillators, Implantable; Magnetic Resonance Imaging

Introdução

A C/DAVD é uma doença hereditária do músculo cardíaco que afeta predominantemente o ventrículo direito (VD). Caracteriza-se pela perda progressiva do tecido miocárdico ventricular direito e sua substituição por tecido fibrogorduroso.11 Fontaine G, Chen HS. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia back in force. Am J Cardiol. 2014;113(10):1735-9.,22 Elias J, Tonet J, Frank R, Fontaine G. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Arq Bras Cardiol. 1998;70(6):449-56.

Originalmente descrita por Fontaine e Marcus em 1982, a C/DAVD é uma das principais causas de morte súbita arrítmica (MSC) em jovens e atletas.33 Marcus FI, Fontaine GH, Guiraudon G, Frank R, Laurenceau JL, Malergue C, et al. Right ventricular dysplasia: a report of 24 adult cases. Circulation. 1982;65(2):384-98. Nos últimos anos houve avanços substanciais no entendimento de sua patogênese, manifestações clínicas e evolução de longo prazo.44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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A doença foi inicialmente designada como displasia porque se pensava se tratar de defeito congênito do desenvolvimento do miocárdio do VD. A descoberta subsequente de que a doença é causada por um defeito genético nos desmossomos cardíacos possibilitou sua descrição como cardiomiopatia e sua inclusão na classificação de cardiomiopatias pela American Heart Association (AHA).44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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5 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.

6 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13.
-77 Philips B, Cheng A. 2015 update on the diagnosis and management of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Curr Opin Cardiol. 2016;31(1):46-56.

Etiopatogênese

Características histopatológicas

O achado histopatológico característico da C/DAVD é a perda progressiva do tecido miocárdico do VD que é substituído por tecido fibrogorduroso.

É comum a presença de infiltrado inflamatório mononuclear irregular (predominantemente linfocitário), o que sugere que o processo possa ter uma mediação imunológica.88 Asimaki A, Kleber AG, Saffitz JE. Pathogenesis of arrhythmogenic cardiomyopathy. Can J Cardiol. 2015;31(11):1313-24. Tem sido proposto que o infiltrado inflamatório pode estender a lesão para regiões previamente sadias, processo associado a uma piora das anormalidades eletrocardiográficas com consequente aumento das arritmias sintomáticas. Esse tipo de evolução pode ser confundido com uma miocardite aguda.88 Asimaki A, Kleber AG, Saffitz JE. Pathogenesis of arrhythmogenic cardiomyopathy. Can J Cardiol. 2015;31(11):1313-24.

Ao contrário do observado em várias formas de doença cardíaca, nas quais ocorreu um predomínio do envolvimento da musculatura subendocárdica, na C/DAVD o maior comprometimento se evidencia na região subepicárdica da parede livre do VD. Além disso, segmentos da parede livre do VD que experimentam o maior estresse mecânico durante o ciclo cardíaco são mais comprometidos. Em geral, os músculos trabeculados da região endocárdica do VD e o septo interventricular (aspecto relevante quando da diferenciação com a sarcoidose) são poupados. Quando o ventrículo esquerda (VE) está envolvido, a degeneração miocárdica e a fibrose são mais visíveis no subepicárdio e no miocárdio médio da parede lateral.11 Fontaine G, Chen HS. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia back in force. Am J Cardiol. 2014;113(10):1735-9.,88 Asimaki A, Kleber AG, Saffitz JE. Pathogenesis of arrhythmogenic cardiomyopathy. Can J Cardiol. 2015;31(11):1313-24.

Na forma típica da C/DAVD, o VE é afetado em menor grau do que o VD; entretanto, existem variantes da doença caracterizadas por envolvimento equivalente ou mesmo predominante do VE.11 Fontaine G, Chen HS. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia back in force. Am J Cardiol. 2014;113(10):1735-9.,44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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,55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.

Características genéticas e moleculares

Na maioria dos casos, a C/DAVD é uma doença hereditária com padrão autossômico dominante, com penetrância e expressividade variável. Entre os probandos diagnosticados com a doença, um screening nos parentes de primeiro grau possibilita identificar presença de mutações genéticas em aproximadamente 50% dos casos, independentemente do sexo. Em um número pequeno dos casos, a C/DAVD apresenta um padrão autossômico recessivo como parte de uma síndrome cardiocutânea (doença de Naxos ou síndrome de Carvajal), que se caracteriza por um cabelo lanoso e ceratodermiapalmoplantar.44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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,66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13.

Como observado em outras doenças familiares, existe um alto grau de heterogeneidade na C/DAVD. Até o momento, mutações em mais de 12 genes foram identificados como causadores da C/DAVD, embora muitos desses genes também sejam responsáveis por outras doenças.99 Zhang L, Liu L, Kowey PR, Fontaine GH. The electrocardiographic manifestations of arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Curr Cardiol Rev. 2014;10(3):237-45.

Outros pacientes com C/DAVD podem ter anormalidades genéticas cujas mutações ainda não foram identificadas. Essas mutações podem ser herdadas de familiares ou resultado de uma nova mutação.99 Zhang L, Liu L, Kowey PR, Fontaine GH. The electrocardiographic manifestations of arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Curr Cardiol Rev. 2014;10(3):237-45.

Um indivíduo que apresente mutação para C/DAVD pode ou não desenvolver sinais e sintomas da doença. Estudos recentes sugerem presença de uma ou mais anormalidades genéticas adicionais em uma mesma classe de gene, como o plakophilin-2 (PKP2), por exemplo, pode determinar quando um indivíduo portador de mutação pode ser clinicamente afetado pela doença.1010 Marcus F, Edson S, Towbin JA. Genetics of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy: a practical guide for physicians. J Am Coll Cardiol. 2013;61(19):1945-8.

11 Mizusawa Y.. Recent advances in genetic testing and counseling for inherited arrhythmias. J Arrhythm. 2016;32(5):389-97.
-1212 van der Zwaag PA, Jongbloed JD, van den Berg MP, van der Smagt JJ, Jongbloed R, Bikker H, et al. A genetic variants database for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy. Hum Mutat. 2009;30(9):1278-83.

As mutações podem ser em genes desmossomais e não desmossomais. Estas mutações podem ser encontradas e registradas no endereço eletrônico: https://doi.org/10.1002/humu.22765.1313 Corrado D, Zorzi A, Cerrone M, Mongillo RM, Bauce B, Delmar M. Relationship between arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy and Brugada Syndrome: new insights from molecular biology and clinical implications. Circ Arrhythm Electrophysiol. 2016;9(4):e003631.

Importância e limitações do teste genético

O teste genético pode ser útil para determinar o diagnóstico nem um indivíduo suspeito de apresentar C/DAVD e para identificar parentes que não apresentam sinais e sintomas de C/DAVD, mas que são portadores do defeito genético. Se um gene anormal é identificado em um probando e não nos membros da família, é pouco provável que esses membros venham a apresentar a doença baseada nessa anormalidade genética.44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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,55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.,1010 Marcus F, Edson S, Towbin JA. Genetics of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy: a practical guide for physicians. J Am Coll Cardiol. 2013;61(19):1945-8.,1111 Mizusawa Y.. Recent advances in genetic testing and counseling for inherited arrhythmias. J Arrhythm. 2016;32(5):389-97. Entretanto, existem várias observações que limitam a análise e a utilização do teste genético na C/DAVD:

  • O probando pode apresentar um segundo defeito genético não identificável.

  • O gene mais comumente relacionado à manifestação de sinais e sintomas de C/DAVD é o da PKP2. Entretanto, essa anormalidade genética pode requerer uma segunda mutação nesse mesmo gene ou em outro gene desmossomal para que efetivamente a doença se manifeste. Ou seja, a simples identificação do gene não pode definir se ele é o causador da doença.

  • A não possibilidade de identificar todos os genes associados à patologia, bem como a existência de mutações combinadas tornam a C/DAVD uma doença geneticamente complexa, o que dificulta o aconselhamento familiar.1111 Mizusawa Y.. Recent advances in genetic testing and counseling for inherited arrhythmias. J Arrhythm. 2016;32(5):389-97.

Deve-se proceder a exames periódicos em todos os indivíduos com anormalidades genéticas para C/DAVD. Recomenda-se que a avaliação cardíaca se inicie entre os 10 e 12 anos de idade, porque a manifestação da doença antes dessa idade é rara. Sugere-se que os testes incluam eletrocardiograma, eletrocardiograma de alta resolução (ECG-AR), ecocardiograma e, se possível, RMC e Holter de 24 horas. Recomenda-se que essa avaliação seja repetida a cada 2 anos, entre os 10 e 20 anos de idade, e a cada 5 anos após os 20 anos de idade. A avaliação poderá ser interrompida entre 50 e 60 anos de idade por ser incomum a apresentação da doença nessa faixa etária.

Uma vantagem adicional do teste genético reside no auxílio da realização do diagnóstico diferencial, como no caso da sarcoidose cardíaca, que pode mimetizar os sinais e sintomas da C/DAVD.

Ademais, estudos recentes de biologia molecular voltaram a colocar em perspectiva o debate sobre uma possível ligação patogênica entre a C/DAVD e a síndrome de Brugada (SB).44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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,1212 van der Zwaag PA, Jongbloed JD, van den Berg MP, van der Smagt JJ, Jongbloed R, Bikker H, et al. A genetic variants database for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy. Hum Mutat. 2009;30(9):1278-83.,1313 Corrado D, Zorzi A, Cerrone M, Mongillo RM, Bauce B, Delmar M. Relationship between arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy and Brugada Syndrome: new insights from molecular biology and clinical implications. Circ Arrhythm Electrophysiol. 2016;9(4):e003631.

Apresentação clínica e história natural

Epidemiologia

A C/DAVD tem uma penetrância idade-dependente e se manifesta tipicamente entre a 3a e a 5a década de vida na forma de episódios de arritmias ventriculares que podem evoluir para MSC. A prevalência estimada varia de 1:2.000 a 1:5.000, com predomínio na população caucasiana e em participantes de exercícios extenuantes ou de esporte competitivo.11 Fontaine G, Chen HS. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia back in force. Am J Cardiol. 2014;113(10):1735-9.,66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13.,77 Philips B, Cheng A. 2015 update on the diagnosis and management of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Curr Opin Cardiol. 2016;31(1):46-56.

Apesar de sua baixa prevalência, a C/DAVD representa aproximadamente 5% a 20% dos casos de MSC em jovens. É extremamente rara a ocorrência de C/DAVD em indivíduos com idade inferior a 12 anos ou após os 60 anos.77 Philips B, Cheng A. 2015 update on the diagnosis and management of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Curr Opin Cardiol. 2016;31(1):46-56.,1414 Bhonsale A, Riele ASJM, Sawant AC, Groeneweg JÁ, James CA, Murray B, et al. Cardiac phenotype and long-term prognosis of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia patients with late presentation. Heart Rhythm. 2017;14(6):883-91.,1515 Ruwald AC, Marcus F, Estes NA 3rd, Link M, McNitt S, Polonsky B, et al. Association of competitive and recreational sport participation with cardiac events in patients with arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy: results from the North American multidisciplinary study of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Eur Heart J. 2015;36(27):1735-43.

A doença é mais maligna nos homens do que nas mulheres, um achado que pode ser explicado por uma influência direta dos hormônios sexuais sobre os mecanismos envolvidos na expressão fenotípica da doença ou por diferenças na quantidade e intensidade do esforço fisico.55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.

Quadro clínico e história natural

A história natural da C/DAVD, em sua forma clássica (VD dominante), pode ser classificada em 4 fases distintas, de acordo com a progressão das alterações estruturais e a sintomatologia clinica:

  • Fase oculta: trata-se da fase subclínica, na qual o paciente se mantém assintomático e com discretas anormalidades estruturais no VD ou com ausência delas. Nessa fase, a MSC pode ser a primeira manifestação da doença.

  • Fase arrítmica: o paciente apresenta palpitações, síncope e, geralmente, arritmias ventriculares sintomáticas de origem no VD, desencadeadas por esforço fisico. As arritmias podem variar desde ectopias ventriculares isoladas, (taquicardia ventricular não sustentada) (TVNS) com morfologia tipo bloqueio do ramo esquerdo (BRE), até chegar a episódios de MSC por fibrilação ventricular.

  • Falência ventricular direita: a progressiva substituição do tecido miocárdico por tecido fibrogorduroso leva a um comprometimento progressivo da função do VD, podendo resultar em insuficiência cardíaca.

  • Falência biventricular: em um estágio avançado da doença, ocorre o envolvimento do septo interventricular ocasionando insuficiência cardíaca congestiva. Nessa fase, pode ocorrer a formação de trombose mural, especialmente em aneurismas que se formam no VD ou na presença de fibrilação atrial. O fenótipo pode mimetizar uma cardiomiopatia dilatada avançada, dificuldando o diagnóstico diferencial nas fases mais avançadas da doença.1616 Pinamonti B, Brun F, Mestroni L, Sinagra G. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy: from genetics to diagnostic and therapeutic challenges. World J Cardiol. 2014;6(12):1234-44.

Recentemente, Calkins et al.,66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13. relataram o seguimento clínico de um coorte de 102 pacientes diagnosticados com C/DAVD após os 50 anos de idade. Os autores observaram que, embora a TVS seja também frequente nesse subgrupo etário, a incidência de síncope, de alterações eletrocardiográficas típicas, de ectopia ventricular ao Holter e de mutação patogênica se mostrou menos prevalente que nos pacientes de menor faixa etária.66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13. Uma manifestação mais tardia da C/DAVD não se traduz em um melhor prognóstico de sobrevida livre de eventos arrítmicos de alto risco.1414 Bhonsale A, Riele ASJM, Sawant AC, Groeneweg JÁ, James CA, Murray B, et al. Cardiac phenotype and long-term prognosis of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia patients with late presentation. Heart Rhythm. 2017;14(6):883-91.

Diagnóstico clínico

em geral, o diagnóstico de C/DAVD deve ser considerado em qualquer indivíduo jovem ou de meia-idade, que apresente: (1) ectopias ventriculares frequentes; (2) taquicardia ventricular com morfologia de BRE com eixo superior ou com múltiplas morfologias de QRS; e (3) MSC. Essa hipótese é reforçada nos casos de eventos arrítmicos que ocorram durante o exercício em indivíduos com ondas T invertidas nas derivações precordiais direitas.77 Philips B, Cheng A. 2015 update on the diagnosis and management of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Curr Opin Cardiol. 2016;31(1):46-56.

Apesar de esses indicadores clínicos levarem à hipótese diagnóstica, o diagnóstico definitivo da C/DAVD permanece um desafio, por se tratar de uma doença com baixa prevalência que carece de um único teste diagnóstico conclusivo.1717 Liu T, Pursnani A, Sharma UC, Vorasettakarnkij Y, Verdini D, Deeprasertkul P, et al. Effect of the 2010 task force criteria on reclassification of cardiovascular magnetic resonance criteria for arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. J Cardiovasc Magn Reson. 2014 Jul 4;16:47.

Para padronizar o diagnóstico clínico da C/DAVD, em 1994 uma força-tarefa internacional (TFC 94) propôs diretrizes sob a forma de um sistema de pontuação qualitativa com critérios maiores e menores.11 Fontaine G, Chen HS. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia back in force. Am J Cardiol. 2014;113(10):1735-9.,44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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Em 2010, a força-tarefa revisou as diretrizes para melhorar a sensibilidade diagnóstica, principalmente para o rastreamento clinico (TFC 2010)1818 Marcus FI, McKenna WJ, Sherrill D, Basso C, Bauce B, Bluemke DA, et al. Diagnosis of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia: proposed modification of the task force criteria. Circulation. 2010;121(13):1533-41. dos membros da família, fornecendo critérios quantitativos para o diagnóstico de anormalidades do VD e agregando critérios genéticos moleculares (Tabela 1).44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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,1616 Pinamonti B, Brun F, Mestroni L, Sinagra G. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy: from genetics to diagnostic and therapeutic challenges. World J Cardiol. 2014;6(12):1234-44.

Tabela 1
Task Force Criteria revisado

Apesar de ser o padrão-ouro atual, a TFC de 2010 não se aplica às formas com predominio de acometimento das câmaras esquerdas1919 Sen-Chowdhry S, Syrris P, Prasad SK, Hughes SE, Merrifield R, Ward D, et al. Left-dominant arrhythmogenic cardiomyopathy: an under-recognized clinical entity. J Am Coll Cardiol. 2008;52(25):2175-87. que possivelmente serão incluídos em revisões futuras.44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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,2020 Castanos Gutiérrez SL, Kamel IR, Zimmerman SL. Current concepts on diagnosis and prognosis of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia. J Thorac Imaging. 2016;31(6):324-35.

Os pacientes são diagnosticados como portadores de C/DAVD se apresentam um total de 4 pontos considerando-se que o critério maior tenha o valor de 2 pontos; e o critério menor, o de 1 ponto. Os pacientes que atingem o escore de “3 pontos” são classificados como prováveis portadores de C/DAVD, enquanto aqueles com 1 ou 2 pontos são classificados como não preenchendo critérios para C/DAVD.66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13.,1818 Marcus FI, McKenna WJ, Sherrill D, Basso C, Bauce B, Bluemke DA, et al. Diagnosis of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia: proposed modification of the task force criteria. Circulation. 2010;121(13):1533-41.

A avaliação inicial consiste em exames não invasivos (ECG, ECG-AR, ecocardiograma (ECO) e/ou RMC, Holter de 24 horas e análise genética), enquanto os exames invasivos (ventriculografia direita e biópsia endomiocárdica) são recomendados apenas para os indivíduos com alto risco da doença.11 Fontaine G, Chen HS. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia back in force. Am J Cardiol. 2014;113(10):1735-9.,55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.

Os critérios teciduais utilizados na TFC 2010, obtidos pela biópsia endomiocárdica, focaram na gravidade da perda de miócitos e na quantificação da fibrose.2121 Marcus FI, McKenna WJ, Sherrill D, Basso C, Bauce B, Bluemke DA, et al. Diagnosis of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia: proposed modification of the task force criteria. Circulation. 2010;121(13):1533-41. Entretanto, a biópsia endomiocárdica é invasiva e sua sensibilidade diagnóstica pode ser limitada devido à distribuição heterogênea e variável da doença. Embora a parede livre do VD seja frequentemente afetada, a biópsia é, geralmente, feita no septo devido ao receio de perfuração, o que compromete ainda mais sua sensibilidade.2222 Corrado D, Basso C, Judge DP. Arrhythmogenic cardiomyopathy. Circ Res. 2017;121(7):784-802. Raramente, utilizada fora dos EUA, seu valor no diagnóstico da C/DAVD reside, principalmente, no diagnóstico diferencial com outras cardiomiopatias, miocardites e sarcoidose.44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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Eletrocardiograma

Ritmo sinusal

O ECG de 12 derivações costuma apresentar anormalidades na maioria dos pacientes portadores de C/DAVD, indicando que as alterações eletrocardiográficas podem anteceder o desenvolvimento das arritmias ventriculares malignas (Figura 1). Sendo assim, saber reconhecer as manifestações comuns da C/DAVD no ECG de 12 derivações, no teste ergométrico e no Holter de 24 horas, pode ser útil no aumento da acurácia diagnóstica ao gerar a suspeita clínica.77 Philips B, Cheng A. 2015 update on the diagnosis and management of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Curr Opin Cardiol. 2016;31(1):46-56. Além disso, pode auxiliar na identificação de familiares afetados.66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13.,99 Zhang L, Liu L, Kowey PR, Fontaine GH. The electrocardiographic manifestations of arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Curr Cardiol Rev. 2014;10(3):237-45. Entretanto, embora a análise do ECG seja fundamental na estratificação inicial, cerca de 12% dos pacientes com C/DAVD podem apresentar um ECG normal, o que reforça a necessidade de que a avaliação clínica tome como base os critérios propostos pelo TFC 2010.99 Zhang L, Liu L, Kowey PR, Fontaine GH. The electrocardiographic manifestations of arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Curr Cardiol Rev. 2014;10(3):237-45.

Figura 1
Exemplo evolutivo da C/DAVD. Paciente com diagnóstico de C/DAVD aos 32 anos, após recuperação de MSC durante prática de esporte. Submetido a implante de CDI ventricular com múltiplos episódios de FV na evolução clínica. Aos 50 anos evoluiu com disfunção sinusal e episódios de fibrilação atrial com necessidade de troca para CDI bicameral. A) ECG de 12 derivações quando do diagnóstico. Presença de inversão da onda T de V1-V6. Onda Épsilon presente em todas as derivações precordiais e duração final do QRS ≥ 55 ms. B) ECG com fibrilação atrial. C) terapia inapropriada devido fibrilação atrial.

Além das alterações eletrocardiográficas classicamente descritas na C/DAVD, outras alterações podem ser identificadas no ECG basal: bradicardia sinusal, anormalidades na onda P (secundárias ao envolvimento atrial) e distúrbio da condução AV (mais frequentemente BAV de primeiro grau). É rara a ocorrência de distúrbio grave da condução atrioventricular na C/DAVD.99 Zhang L, Liu L, Kowey PR, Fontaine GH. The electrocardiographic manifestations of arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Curr Cardiol Rev. 2014;10(3):237-45.

Vários estudos multicêntricos demonstraram que a inversão da onda T em V1-3 é o achado ECG mais comum na C/DAVD. Em decorrência disso, no TFC 2010, essa alteração da onda T passou a ser considerada um critério maior para seu diagnóstico. Já a presença de inversão da onda T apenas em V1 e V2 é um critério menor. A inversão da T é secundária às alterações estruturais do VD. A observação de inversão além de V3 traduz um estágio muito avançado da doença com dilatação grave do VD e possível envolvimento VE, podendo, dessa maneira, ser considerado um indicativo de pior prognóstico (Figura 1A).55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.,66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13.,99 Zhang L, Liu L, Kowey PR, Fontaine GH. The electrocardiographic manifestations of arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Curr Cardiol Rev. 2014;10(3):237-45.

Um dos achados comuns da C/DAVD é o bloqueio completo ou incompleto do ramo direito (BRD), especialmente nos pacientes com grave comprometimento estrutural, e sua presença pode comprometer a interpretação das anormalidades da despolarização ventricular.66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13. O BRD na C/DAVD pode ter as seguintes características: (1) baixa amplitude da onda R e do QRS em V1-2; (2) baixa relação R´/S em V1-2; (3) inversão da onda T em V1-3 ou nas demais derivações do plano frontal. Os estudos de mapeamento epicárdico e histopatológicos demonstraram que o BRD na C/DAVD não se deve a um bloqueio proximal no ramo direito, mas, representa o resultado das alterações distais inerentes ao retardo da propagação do estímulo nas regiões de transformação fibrogordurosa.99 Zhang L, Liu L, Kowey PR, Fontaine GH. The electrocardiographic manifestations of arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Curr Cardiol Rev. 2014;10(3):237-45.

A onda Epsilon, uma deflecção de baixa frequência que ocorre ao término do QRS e antes da onda T (Figura 1), embora incomum, é um sinal da presença de um estágio avançado da C/DAVD.11 Fontaine G, Chen HS. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia back in force. Am J Cardiol. 2014;113(10):1735-9.,22 Elias J, Tonet J, Frank R, Fontaine G. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Arq Bras Cardiol. 1998;70(6):449-56.,2323 Li GL, Saguner AM, Fontaine GH, Frank R. Epislon waves: Milestones in the discovery and progress. Ann Noninvasive Electrocardiol. 2018;23(6):e12571. Ela reflete a presença de potenciais tardios de grande monta no ECG de superfície. Embora considerados um critério maior para diagnóstico de C/DAVD, os PTs também podem estar presentes em outras patologias, em particular na sarcoidose cardíaca.99 Zhang L, Liu L, Kowey PR, Fontaine GH. The electrocardiographic manifestations of arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Curr Cardiol Rev. 2014;10(3):237-45. Esses retardos de ativação são mais bem diagnosticados com o ECG-AR. Atualmente, um ECG-AR positivo é considerado um critério menor.

Também foi incluída como critério diagnóstico a detecção de um retardo de ativação final, o qual é definido como prolongamento da duração do QRS (> 110 ms) e da onda S (≥ 55 ms) em V1-3.

Arritmias

O aumento da suscetibilidade à taquiarritmia ventricular e à MSC é a característica principal da C/DAVD.11 Fontaine G, Chen HS. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia back in force. Am J Cardiol. 2014;113(10):1735-9. Geralmente as arritmias ventriculares, na forma isolada e frequente, ou de taquicardia ventricular não sustentada e sustentada, estão associadas a sintomas de palpitação, tontura, pré-sincope e síncope. Devido à origem mais comum no VD, essa arritmia ventricular apresenta a morfologia tipo BRE com eixo variável na dependência do local acometido.55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.,66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13.,99 Zhang L, Liu L, Kowey PR, Fontaine GH. The electrocardiographic manifestations of arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Curr Cardiol Rev. 2014;10(3):237-45.

O registro de ectopia ventricular frequente no Holter de 24 horas (> 500 EVs/24h) é considerado um critério menor.77 Philips B, Cheng A. 2015 update on the diagnosis and management of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Curr Opin Cardiol. 2016;31(1):46-56.

Poucos estudos avaliaram a frequência de arritmia supraventricular na C/DAVD. Embora não relacionada à mortalidade, a presença de arritmia atrial está associada a um incremento na morbidade da doença e ao aumento de terapias inapropriadas pelo CDI. A incidência de arritmia atrial na C/DAVD varia entre 14% e 24%, e a fibrilação atrial é a arritmia supraventricular mais prevalente (Figura 1B).2424 Tonet JL, Castro-Miranda R, Iwa T, Poulain F, Frank R, Fontaine GH. Frequency of supraventricular tachyarrhythmias in arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Am J Cardiol. 1991;67(13):1153.,2525 Camm CF, James CA, Tichnell C, Murray B, Bhonsale A, te Riele AS, et al. Prevalence of atrial arrhythmias in arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy. Heart Rhythm. 2013;10(11):1661-8. A ocorrência de arritmia atrial está particularmente associada à presença de insuficiência tricúspide, ao envolvimento atrial e à dilatação significativa do VD.99 Zhang L, Liu L, Kowey PR, Fontaine GH. The electrocardiographic manifestations of arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Curr Cardiol Rev. 2014;10(3):237-45.

Exames complementares

Ecocardiograma

Uma avaliação estrutural e funcional é fundamental para o diagnóstico da C/DAVD. A ecocardiografia, em decorrência de sua acessibilidade, tem sido o exame de imagem de escolha para o início de investigação da C/DAVD. No entanto, a geometria única e o padrão complexo de contração do VD, juntamente com o aumento do reconhecimento de que anormalidades estruturais podem não ser aparentes nas fases mais precoces da doença, limita sua utilidade diagnóstica.77 Philips B, Cheng A. 2015 update on the diagnosis and management of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Curr Opin Cardiol. 2016;31(1):46-56. Os achados ecocardiográficos sugestivos de C/DAVD incluem: (1) anormalidade global ou segmentar da parede ventricular em associação à dilatação da cavidade (principalmente direita); (2) VD com hipertrofia e disfunção sistólica; (3) dilatação da via de saída do VD (diâmetro > 30 mm).66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13.

Ressonância magnética cardíaca

Na última década, a RMC despontou como a modalidade de imagem de escolha na investigação da C/DAVD, por possibilitar uma avaliação não invasiva morfológica e funcional, bem como por analisar alterações teciduais (transformação fibrogordurosa) que caracterizam essa patologia.66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13.,77 Philips B, Cheng A. 2015 update on the diagnosis and management of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Curr Opin Cardiol. 2016;31(1):46-56. No entanto, a interpretação incorreta dos achados da RMC é a razão mais comum para diagnósticos errados de C/DAVC. Os erros mais comuns incluem o diagnóstico inadequado de infiltração de gordura fisiológica ou artefactual, a má interpretação de variantes normais do movimento da parede do VD e o diagnóstico inapropriado em casos de sarcoidose e miocardite.

Essa conotação “patológica” dada à existência de gordura no VD levou a uma alta incidência de falsa positividade, principalmente quando utilizados os critérios do TFC de 1994. O TFC de 2010 trouxe uma melhor definição dos critérios a serem buscados na RMC, deixando-se de lado a utilização de protocolos específicos para pesquisa de gordura na câmara direita.

As anormalidades da RMC na C/DAVD podem ser agrupadas em anormalidades morfológicas e funcionais (Tabela 2). Essas anormalidades foram inicialmente observadas no classicamente descrito "triângulo de displasia"33 Marcus FI, Fontaine GH, Guiraudon G, Frank R, Laurenceau JL, Malergue C, et al. Right ventricular dysplasia: a report of 24 adult cases. Circulation. 1982;65(2):384-98. que se refere ao trato de entrada do VD, ao trato de saída e ao ápice. No entanto, um estudo recente sugere que essas alterações envolvem, preferencialmente, a região epicárdica subtricuspídea, a parede basal livre de VD e a parede lateral do VE, com o ápice do VD e o endocárdio geralmente poupados.66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13.,99 Zhang L, Liu L, Kowey PR, Fontaine GH. The electrocardiographic manifestations of arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Curr Cardiol Rev. 2014;10(3):237-45.

Tabela 2
Alterações encontradas da ressonância magnética cardíaca na Cardiomiopatia/displasia arritmogênica do ventrículo direito

Além dos parâmetros incluídos no TFC 2010, há outras anormalidades características da C/DAVD que também podem ser visualizadas pela RMC. Esses parâmetros incluem os microaneurismas do VD e a presença de um “sinal do acordeon”, que é o enrugamento focal da VSVD ou parede subtricuspídea livre do VD, que é mais proeminente durante a sístole. Além disso, a presença de gordura intramiocárdica no VD sugere C/DAVD; entretanto, sua presença não é específica e tem sido observada em idosos, nos usuários crônicos de esteroides e outras cardiomiopatias.44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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,55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.

Embora o aumento do realce tardio pelo gadolíneo (RT) tenha sido detectado com frequência nos pacientes com C/DAVD, esse critério não foi incorporado no TFC 2010 devido a várias limitações (paredes finas do VD, dificuldade de diferenciar gordura de fibrose e comprometimento irregular do VD). Apesar disso, acreditamos que seja de valor diagnóstico, especialmente aqueles com formas biventriculares ou dominantes esquerdas.44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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O uso crescente da RMC está levando ao reconhecimento de que o VE se encontra alterado com mais frequência do que se pensava anteriormente, o que levou a expressão cardiomiopatia arritmogênica. O envolvimento do VE está localizado principalmente nas paredes inferiores e inferolaterais basais, tipicamente na forma de infiltração de gordura que se estende do epicárdio ao miocárdio. Esses locais também podem apresentar RT, muitas vezes sem uma associação de anormalidade da motilidade da parede ventricular.

Estudo eletrofisiológico

O estudo eletrofisiológico (EEF) com estimulação ventricular programada é hoje menos utilizado na avaliação diagnóstica e terapêutica da C/DAVD.77 Philips B, Cheng A. 2015 update on the diagnosis and management of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Curr Opin Cardiol. 2016;31(1):46-56. O maior estudo multicêntrico sobre pacientes com C/DAVD que receberam o implante de CDI mostrou que o EEF tem valor limitado em predizer o risco de um evento arritmico grave. Nesse estudo, a incidência de terapias efetivas para eventos fatais (FV/FLV) não diferiu significativamente entre os pacientes com arritmia indutível ou não, durante o EEF basal.2626 Corrado D, Leoni L, Link MS, Della Bella P, Gaita F, Curnis A, et al. Implantable cardioverter-defibrillator therapy for prevention of sudden death in patients with arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia Circulation. 2003;108(25):3084-91.

Apesar desses recentes resultados, oTFC 2010 considera que o EEF deve ser levado em conta para o diagnóstico e avaliação dos pacientes com suspeita de C/DAVD (classe IIa), podendo também ser utilizado na estratificação de risco de pacientes assintomáticos (classe IIb).1818 Marcus FI, McKenna WJ, Sherrill D, Basso C, Bauce B, Bluemke DA, et al. Diagnosis of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia: proposed modification of the task force criteria. Circulation. 2010;121(13):1533-41.

Estudos recentes utilizando o mapeamento eletroanatômico de voltagem (bipolar e unipolar) para avaliar a existência e extensão da área de cicatriz no VD vieram agregar interesse na utilização do EEF na avaliação da C/DAVD (Figura 2).

Figura 2
Dois exemplos de mapeamento de voltagem para ablação de taquicardia ventricular em pacientes portadores de C/DAVD. 1A) Mapeamento de voltagem epicárdico mostrando (em vermelho) áreas de cicatriz em trato de saída e região basal do VD. 1B) Mapeamento de voltagem endocárdico mostrando a presença de áreas de cicatriz mais extensas na mesma região. 1C) Perspectiva mostrando a correlação das áreas de cicatriz com a árvore coronariana. 2A e 2B) Mapeamento de voltagem utilizado para ablação de substrato em paciente portador de CDI com múltiplas terapias. Aplicações de radiofrequência (círculos brancos e vermelhos) distribuídas nas regiões endocárdica e epicárdica. 3C) Imagem do mapeamento mostrando presença de cicatriz acometendo também o VE.

Essa técnica de mapeamento mostrou-se útil em direcionar a região a ser biopsiada, por ser mais sensível que a RMC em identificar as áreas de cicatriz miocárdica, e no diagnóstico diferencial entre uma TV idiopática da VSVD e uma TV em paciente portador de C/DAVD. Apesar disso, em decorrência de tratar-se de exame invasivo, de alto custo e operador dependente, esse método diagnóstico deve ser reservado a casos com alto indice de suspeição e com diagnóstico indefinido.55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.

Diagnóstico diferencial

Os principais diagnósticos diferenciais que devem ser considerados nos casos suspeitos de C/DAVD incluem: a TV idiopática de VSVD, a TV originária das cúspides aórticas e a sarcoidose cardíaca.66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13.

A TV idiopática de VSVD é uma forma geralmente benigna de arritmia ventricular sem associação com alteração estrutural cardíaca.2727 Chung FP, Llin YJ, Chang SL, Lo LW, Hu YF, Tuan TC, et al. Current and state of the art on the electrophysiologic characteristics and catheter ablation of arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy. J Cardiol. 2015;65(6):441-50. O diagnóstico diferencial se baseia no fato de que a TV idiopática é uma arritmia não familiar e de que o paciente não apresenta as alterações eletrocardiográficas clássicas da C/DAVD.2828 Bai R, Di Biase L, Shivkumar K, Mohanty P, Tung R, Santangeli P, et al. Ablation of ventricular arrhythmias in arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy: arrhythmia-free survival after endo-epicardial substrate based mapping and ablation. Circ Arrhythm Electrophysiol. 2011;4(4):478-85. Uma avaliação com a RMC deve ser realizada em todos os casos.

Outro diagnóstico diferencial é o da sarcoidose. Essa doença granulomatosa, quando envolve o coração, pode se apresentar muito similar à C/DAVD. Deve-se suspeitar de sarcoidose cardíaca quando as manifestações cardiológicas se mostrarem associadas à linfadenopatia mediastinal, à sarcoidose extracardíaca, especialmente pulmonar, a graves distúrbios da condução atrioventricular e à presença de cicatriz no septo interventricular na avaliação de imagem.66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13. Além disso, uma idade mais avançada de início dos sintomas, presença de comorbidades cardiovasculares e padrão de doença não familiar também devem levantar suspeita de sarcoidose cardíaca.44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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A tomografia por emissão da posição cardíaca pode ser util para o diagnóstico diferencial.2929 Birnie DH, Nery PB, Ha AC, Beanlands RSB. Cardiac sarcoidosis. J Am Coll Cardiol. 2016; 68(4):411-21.

Outras patologias menos frequentes são: miocardite; síndrome de Brugada;3030 Corrado D, Zorzi A, Cerrone M, Rigato I, Mongillo M, Bauce B, et al. Relationship between arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy and Brugada Syndrome: new insights from molecular biology and clinical implications. Circ Arrhythm Electrophysiol. 2016;9(4):e003631. cardiomiopatia dilatada, nos casos com disfunção biventricular; infarto do miocárdico com acometimento de ambas as câmaras cardíacas; hipertensão pulmonar (sobrecarga de pressão do VD), e/ou regurgitação tricúspide significativa (sobrecarga de volume do VD); cardiopatias congênitas como a anomalia de Uhl e a tetralogia de Fallot corrigida; e shunts intracardíacos do tipo esquerda-direita (em geral, defeito do septo interatrial e drenagem anômala das veias pulmonares) que podem ocasionar sobrecarga ventricular direita.

Recentemente, tem-se discutido muito a sobreposição fenotípica entre a C/DAVD e a síndrome de Brugada.3030 Corrado D, Zorzi A, Cerrone M, Rigato I, Mongillo M, Bauce B, et al. Relationship between arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy and Brugada Syndrome: new insights from molecular biology and clinical implications. Circ Arrhythm Electrophysiol. 2016;9(4):e003631. As alterações ultraestruturais que advém de mutações no desmossomos podem explicar esta observação. Do ponto de vista clínico, ambas condições podem se manifestar como anormalidades na repolarização ventricular nas derivações precordiais direitas, distúrbio de condução pelo ramo direito e arritmias ventriculares de origem no VD.3131 Scheinman MM. Is the Brugada Syndrome a distinct clinical entity? J Cardiovasc Electrophysiol. 1997;8(3):332-6. Patologicamente, a infiltração gordurosa do miocárdio tem sido relatada em ambas condições.44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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,3232 Zumhagen S, Spieker T, Rolinck J, Baba HA, Breithardt G, Böcker W, et al. Absence of pathognomonic or inflammatory patterns in cardiac biopsies from patients with Brugada Syndrome. Circ Arrhythm Electrophysiol. 2009;2(1):16-23.,3333 Frustaci A, Priori SG, Pieroni M, Chimenti C, Napolitano C, Rivolta I, et al. Cardiac histological substrate in patients with clinical phenotype of Brugada Syndrome. Circulation. 2005; 112(24):3680-7. Como decorrência disso, a C/DAVD e a síndrome de Brugada podem fazer parte de um subgrupo de miopatias estruturais decorrentes de alterações na corrente de sódio, devido comprometimento da conexão inter-celular.3030 Corrado D, Zorzi A, Cerrone M, Rigato I, Mongillo M, Bauce B, et al. Relationship between arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy and Brugada Syndrome: new insights from molecular biology and clinical implications. Circ Arrhythm Electrophysiol. 2016;9(4):e003631.

Estratificação de risco

A história natural da C/DAVD é predominantemente relacionada à instabilidade elétrica ventricular que pode ocasionar uma MSC arrítmica, principalmente em atletas jovens. Em um estágio mais avançado da doença, um comprometimento progressivo do VD e o envolvimento ventricular esquerdo podem resultar em falência direita e/ou esquerda.11 Fontaine G, Chen HS. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia back in force. Am J Cardiol. 2014;113(10):1735-9.,66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13.

Os dados referentes à evolução clínica são procedentes de pequenas coortes realizadas em centros terciários e com um seguimento clínico relativamente curto. A mortalidade total estimada nesses estudos varia de 0,08% a 3,6% ao ano. Em estudos comunitários, que fornecem dados de mundo real, a mortalidade anual é < 1%.44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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,55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.

Vários fatores foram propostos para estratificação de risco de mortalidade e/ou de taquiarritmias ventriculares na C/DAVD. Corrado et al.,3434 Corrado D,Wichter T, Link MS, Hauer RN, Marchlinski FE, Anastasakis A, et al. Treatment of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia - an International Task Force Consensus Statement. Circulation. 2015;132(5):441-53. elaboraram uma estratificação de risco categorizados como alto, intermediário e baixo risco. Com isso, os autores buscaram facilitar o reconhecimento precoce dos indivíduos que se beneficiariam do implante de CDI (Figura 3).44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
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,3434 Corrado D,Wichter T, Link MS, Hauer RN, Marchlinski FE, Anastasakis A, et al. Treatment of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia - an International Task Force Consensus Statement. Circulation. 2015;132(5):441-53.

Figura 3
Esquema proposto para a estratificação prognóstica de pacientes com C/DAVD de acordo com a apresentação clinica. Os subgrupos de risco mostrados na figura foram definidos com base na probabilidade estimada de um evento arrítmico maior (morte cardíaca súbita, parada cardíaca por fibrilação ventricular, taquicardia ventricular ou um evento que necessite de intervenção do CDI), durante o seguimento, em relação a eventos arrítmicos ou a fatores de risco prévios. Um risco anual estimado de mais de 10% define o grupo de alto risco; um risco entre 1% e 10% define o grupo de risco intermediário; e um risco abaixo de 1% define o grupo de baixo risco. EVs: extrassistoles ventriculares; C/DAVD: cardiomiopatia/displasia arritmogênica do ventrículo direito. Adaptada de Corrado et al., 2017.55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.

As principais variáveis clínicas consideradas preditoras independentes de pior prognóstico evolutivo são: eventos arrítmicos malignos (MSC, parada cardíaca devida à FV, à intervenção apropriada de CDI, ou à terapia de CDI para TV rápida/FV); transplante cardíaco; e em alguns estudos, a síncope inexplicada.55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.

Outros critérios, como o resultado do mapeamento genético e do estudo eletrofisiológico invasivo, ainda são motivo de controvérsia na literatura.55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.

Tratamento

Os objetivos mais importantes do tratamento de pacientes com C/DAVD incluem:

  • Redução da mortalidade, por MSC arrítmica ou morte por insuficiência cardíaca.

  • Prevenção da progressão da doença com consequente disfunção do VD, VE ou biventricular e insuficiência cardíaca.

  • Melhoria dos sintomas e da qualidade de vidapor meio da redução/abolição de palpitações, recidivas de TV ou descargas de CDI (apropriadas ou inapropriadas).

  • Limitação dos sintomas de insuficiência cardíaca e aumento da capacidade funcional.

As opções terapêuticas consistem em mudanças de estilo de vida, tratamento farmacológico, ablação por cateter, CDI e transplante cardíaco.11 Fontaine G, Chen HS. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia back in force. Am J Cardiol. 2014;113(10):1735-9.,66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13.,77 Philips B, Cheng A. 2015 update on the diagnosis and management of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Curr Opin Cardiol. 2016;31(1):46-56. As evidências disponíveis indicam que os membros da família com um fenótipo negativo (portadores de genes saudáveis ou com um genótipo desconhecido) não necessitam de nenhum tratamento específico que não a restrição desportiva.55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.

Mudança no estilo de vida

A atividade esportiva competitiva aumenta o risco de MSC de duas a cinco vezes em adolescentes e adultos jovens com C/DAVD.2525 Camm CF, James CA, Tichnell C, Murray B, Bhonsale A, te Riele AS, et al. Prevalence of atrial arrhythmias in arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy. Heart Rhythm. 2013;10(11):1661-8.

Em estudo recente, Ruwald et al. estabeleceram uma ligação entre a MSC e o esforço intenso em indivíduos jovens com C/DAVD. Os autores acompanharam 108 probandos e demonstraram que a prática de esporte competitivo está associada ao aumento significativo do desfecho combinado TV/morte e a manifestação fenotípica precoce quando comparada com a inatividade de pacientes sedentários ou com a prática do esporte recreativo.1515 Ruwald AC, Marcus F, Estes NA 3rd, Link M, McNitt S, Polonsky B, et al. Association of competitive and recreational sport participation with cardiac events in patients with arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy: results from the North American multidisciplinary study of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Eur Heart J. 2015;36(27):1735-43. Outro achado foi que o início mais precoce da prática de esportes competitivos está associado ao início precoce da sintomatologia clínica.1515 Ruwald AC, Marcus F, Estes NA 3rd, Link M, McNitt S, Polonsky B, et al. Association of competitive and recreational sport participation with cardiac events in patients with arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy: results from the North American multidisciplinary study of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Eur Heart J. 2015;36(27):1735-43.

A identificação precoce, antes da fase sintomática, de atletas afetados pela triagem preparatória para o início de atividade física e sua desqualificação de atividade esportiva competitiva pode “salvar vidas” (experiência italiana).3434 Corrado D,Wichter T, Link MS, Hauer RN, Marchlinski FE, Anastasakis A, et al. Treatment of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia - an International Task Force Consensus Statement. Circulation. 2015;132(5):441-53.

Postula-se que o comprometimento da adesão intercelular miocitária pode levar à vulnerabilidade dos tecidos e órgãos com consequente morte de miócitos, especialmente durante o estresse mecânico que ocorre durante a atividade esportiva competitiva.3434 Corrado D,Wichter T, Link MS, Hauer RN, Marchlinski FE, Anastasakis A, et al. Treatment of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia - an International Task Force Consensus Statement. Circulation. 2015;132(5):441-53. Como o VD é uma câmara cardíaca com maior complacência que o VE, particularmente durante o exercício físico, ela se torna mais suscetível a lesões, resultando em inflamação, fibrose e, como consequência, arritmias.77 Philips B, Cheng A. 2015 update on the diagnosis and management of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Curr Opin Cardiol. 2016;31(1):46-56.

Com base nisso, o ITF recomenda que os pacientes com diagnóstico definitivo de C/DAVD não participem de esporte competitivo ou de resistência (classe I), podendo participar apenas de esportes recreacionais de baixa intensidade (classe IIa). As mesmas restrições podem ser aplicadas aos familiares com fenótipo negativo, mesmo aqueles não portadores de mutações genéticas ou com genótipo não pesquisado (classe IIb).3535 Maron BJ, Udelson JE, Bonow RO, Nishimura RA, Ackerman MJ, Estes NA 3rd, et al. Eligibility and disqualification recommendations for competitive athletes with cardiovascular abnormalities: Task Force 3: hypertrophic cardiomyopathy, arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy and other cardiomyopathies, and myocarditis: a scientific statement from the American Heart Association and American College of Cardiology. Circulation. 2015;132(22): e 273-80.

Tratamento farmacológico

O tratamento farmacológico da C/DAVD consiste no uso de fármacos antiarrítmicos, betabloqueadores e fármacos utilizados no tratamento da insuficiência cardíaca.11 Fontaine G, Chen HS. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia back in force. Am J Cardiol. 2014;113(10):1735-9.

Terapia antiarrítmica

O objetivo do tratamento antiarrítmico na C/DAVD é o de prevenir os eventos arrítmicos. Dados de literatura sugerem a ineficácia dos fármacos antiarrítmicos na prevenção da ocorrência de taquiarritmias graves em pacientes de alto risco portadores de CDI.66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13. Dessa maneira, a terapêutica antiarrítmica deve ser indicada como terapia coadjuvante ao CDI em pacientes com múltiplas terapias apropriadas (classe I), podendo, também, ser considerada naqueles pacientes com atividade ectópica frequente e/ou TVNS (classe IIa). Nos pacientes não portadores de CDI e com TV hemodinamicamente tolerada, a terapia combinada ablação/antiarrítmico pode ser aplicada (classe IIb). Por outro lado, o uso de antiarrítmico não deve ser considerado em portadores assintomáticos de mutação genética e sem arritmia ventricular documentada (classe III).

A amiodarona, isoladamente ou em associação com betabloqueadores (por combinar os efeitos sinérgicos das propriedades antiarrítmicas de classe III e do bloqueio beta-adrenérgico) é a conduta terapêutica mais comumente utilizada no tratamento da C/DAVD.3636 Tonet J, Frank R, Fontaine G, Grosgogeat Y. Efficacy and safety of low doses of beta-blocker agents combined with amiodarone in refractory ventricular tachycardia. Pacing Clin Electrophysiol. 1988;11(11 Pt 2):1984-9. O sotalol é uma boa alternativa terapêutica, dados os efeitos colaterais consequentes ao uso crônico da amiodarona, particularmente na população mais jovem.77 Philips B, Cheng A. 2015 update on the diagnosis and management of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Curr Opin Cardiol. 2016;31(1):46-56.

Embora não disponível em nosso meio, a flecainida, quando associada com um betabloqueador, pode ser uma estratégia antiarritmica eficaz para o controle em pacientes refratários ao tratamento com amiodarona ou sotalol e/ou ablação por cateter.3737 Ermakov S, Gerstenfeld EP, Svetlichnaya Y, Scheinman MM. Use of flecainide in combination antiarrhythmic therapy in patients with arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Heart Rhythm. 2017;14(4):564-9.

Betabloqueadores

A arritmia ventricular na C/DAVD se manifesta, frequentemente, em situação de aumento do tônus simpático. O consenso atual é de que a terapia betabloqueadora deva ser instituída empiricamente em todos os pacientes com diagnóstico clínico de C/DAVD.55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.,77 Philips B, Cheng A. 2015 update on the diagnosis and management of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Curr Opin Cardiol. 2016;31(1):46-56. Em contrapartida, não existe a indicação de uso profilático de betabloqueadores nos portadores saudáveis de mutação genética para C/DAVD.3434 Corrado D,Wichter T, Link MS, Hauer RN, Marchlinski FE, Anastasakis A, et al. Treatment of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia - an International Task Force Consensus Statement. Circulation. 2015;132(5):441-53.

Outros fármacos

A terapia medicamentosa de redução da pré-carga (em geral, diuréticos e nitratos) ainda não faz parte do arsenal terapêutico regular dos pacientes com C/DAVD.3333 Frustaci A, Priori SG, Pieroni M, Chimenti C, Napolitano C, Rivolta I, et al. Cardiac histological substrate in patients with clinical phenotype of Brugada Syndrome. Circulation. 2005; 112(24):3680-7.

Já os inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECA) e os bloqueadores de receptor da angiotensina II têm seu uso preconizado nos pacientes com C/DAVD, especialmente naqueles pacientes com comprometimento estrutural evidente, embora não existam estudos que comprovem essa indicação nessa condição específica.66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13.

O uso contínuo de anticoagulante oral encontra-se indicado para prevenção secundária em pacientes com trombo intracavitário documentado, arritmias atrias do tipo flutter ou fibrilaçao ou com antecedentes de evento tromboembólico55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.,3434 Corrado D,Wichter T, Link MS, Hauer RN, Marchlinski FE, Anastasakis A, et al. Treatment of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia - an International Task Force Consensus Statement. Circulation. 2015;132(5):441-53.

Ablação por cateter

A ablação por cateter da TV é uma opção terapêutica para pacientes com TV incessante ou choques apropriados do CDI, apesar de terapia farmacológica otimizada, incluindo o uso de amiodarona (Figura 2).11 Fontaine G, Chen HS. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia back in force. Am J Cardiol. 2014;113(10):1735-9.,44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
https://academic.oup.com/europace/advanc...
,55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.,3838 Philips B, Madhavan S, James C, Tichnell C, Murray B, Dalal D, et al. Outcomes of catheter ablation of ventricular tachycardia in arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy. Circ Arrhythm Electrophysiol. 2012;5(3):499-505.

39 Verma A, Kilicaslan F, Schweikert RA, Tomassoni G, Rossillo A, Marrouche NF, et al. Short- and long-term success of substrate-based mapping and ablation of ventricular tachycardia in arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Circulation. 2005;111(24):3209-16.

40 Dalal D, Jain R, Tandri H, Dong J, Eid SM, Prakasa K, et al. Long-term efficacy of catheter ablation of ventricular tachycardia in patients with arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy. J Am Coll Cardiol. 2007;50(5):432-40.
-4141 Miljoen H, State S, Chillou C, Magnin-Poull I, Dotto P, Andronache M, et al. Electroanatomic mapping characteristics of ventricular tachycardia in patients with arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia. Europace. 2005;7(6):516-24.

As recidivas de TV a longo prazo têm sido atribuídas à natureza progressiva da ARVC, o que leva ao desenvolvimento de múltiplos focos arritmogênicos ao longo do tempo. A localização epicárdica de muitos circuitos de reentrada de TV, que reflete a propensão das lesões de ARVC a originar e a progredir a partir do epicárdio, também pode explicar a falha do mapeamento endocárdico convencional e a ablação apenas endocárdica por cateter.11 Fontaine G, Chen HS. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia back in force. Am J Cardiol. 2014;113(10):1735-9.,22 Elias J, Tonet J, Frank R, Fontaine G. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia. Arq Bras Cardiol. 1998;70(6):449-56.

O crescente entendimento do substrato arritmogênico e a possibilidade de abordagem epicárdica fizeram com que, nos últimos anos, se tenha observado um significativo aumento no índice de sucesso da ablação por cateter no tratamento da TV na C/DAVD.2727 Chung FP, Llin YJ, Chang SL, Lo LW, Hu YF, Tuan TC, et al. Current and state of the art on the electrophysiologic characteristics and catheter ablation of arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy. J Cardiol. 2015;65(6):441-50.,2828 Bai R, Di Biase L, Shivkumar K, Mohanty P, Tung R, Santangeli P, et al. Ablation of ventricular arrhythmias in arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy: arrhythmia-free survival after endo-epicardial substrate based mapping and ablation. Circ Arrhythm Electrophysiol. 2011;4(4):478-85.

O advento dos sistemas de navegação tridimensional (3D) possibilitou um avanço significativo na ablação da TV em portadores de C/DAVD. Essa técnica possibilita realizar um mapeamento do substrato endocárdico e epicárdico utilizando um mapa de voltagem tecidual colorido, particularmente nas áreas adjacentes à região da válvula tricúspide e da VSVD (Figura 2).27,28 Partindo dessa experiência mais recente, o ITF propôs que, nos casos de insucesso na abordagem endocárdica, se deva tentar a abordagem epicárdica. Recomenda ainda uma abordagem endo/epi, como estratégia inicial, nos serviços com experiência com esse tipo de técnica.2828 Bai R, Di Biase L, Shivkumar K, Mohanty P, Tung R, Santangeli P, et al. Ablation of ventricular arrhythmias in arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy: arrhythmia-free survival after endo-epicardial substrate based mapping and ablation. Circ Arrhythm Electrophysiol. 2011;4(4):478-85.

A técnica utilizada para ablação depende da resposta hemodinâmica do paciente durante a taquicardia. Nos casos de TV bem tolerada, as técnicas de mapeamento eletrofisiológico e de mapeamento de ativação com o sistema 3D são as mais comumente utilizadas. No caso de uma TV com instabilidade hemodinâmica, o tratamento consiste na modificação do substrato arritmogênico, sendo a ablação feita sobre os possíveis canais entre áreas com diferentes voltagens em combinação com a eliminação de sinais fracionados endocárdicos e epicárdicos (Figura 2).2727 Chung FP, Llin YJ, Chang SL, Lo LW, Hu YF, Tuan TC, et al. Current and state of the art on the electrophysiologic characteristics and catheter ablation of arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy. J Cardiol. 2015;65(6):441-50.,2828 Bai R, Di Biase L, Shivkumar K, Mohanty P, Tung R, Santangeli P, et al. Ablation of ventricular arrhythmias in arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy: arrhythmia-free survival after endo-epicardial substrate based mapping and ablation. Circ Arrhythm Electrophysiol. 2011;4(4):478-85.

Cardioversor-desfibrilador implantável

O implante de CDI é a estratégia terapêutica mais aceita para os pacientes com C/DAVD, pois a história natural dessa patologia se caracteriza, principalmente, pelo risco de MSC e, apenas secundariamente, por disfunção contrátil que leva à insuficiência cardíaca progressiva.11 Fontaine G, Chen HS. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia back in force. Am J Cardiol. 2014;113(10):1735-9. Embora não haja estudos prospectivos randomizados, estudos observacionais de grandes registros demonstraram que a implantação de um CDI aumenta a sobrevida dos pacientes. Esses estudos mostraram que entre 48% e 78% dos pacientes recebem terapia apropriada do CDI durante o seguimento de longo prazo.44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
https://academic.oup.com/europace/advanc...
,66 Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy - three decades of progress. Circ J. 2015;79(5):901-13.,2929 Birnie DH, Nery PB, Ha AC, Beanlands RSB. Cardiac sarcoidosis. J Am Coll Cardiol. 2016; 68(4):411-21.

Um estudo observacional avaliou o impacto clínico do CDI na história natural dos pacientes com C/DAVD. Em um seguimento médio de 3,3 anos, 24% dos pacientes tiveram como manifestação arrítmica um episódio de FV/FLV que teria sido fatal na ausência do CDI.2626 Corrado D, Leoni L, Link MS, Della Bella P, Gaita F, Curnis A, et al. Implantable cardioverter-defibrillator therapy for prevention of sudden death in patients with arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia Circulation. 2003;108(25):3084-91.

Apesar desses resultados, é importante ressaltar que o benefício de sobrevida com o CDI é obtido a expensas de um alto custo da prótese e uma taxa significativa de complicações durante o seguimento, principalmente relacionadas à ocorrência de terapias inapropriadas em torno de 4%/ano e alterações nos eletrodos.3333 Frustaci A, Priori SG, Pieroni M, Chimenti C, Napolitano C, Rivolta I, et al. Cardiac histological substrate in patients with clinical phenotype of Brugada Syndrome. Circulation. 2005; 112(24):3680-7. As intervenções inadequadas ocorrem entre 10% e 25% dos pacientes, principalmente em pacientes jovens e, geralmente, em decorrência de taquicardia sinusal ou taquiarritmia atrial (Figura 1C). A alta taxa de eventos adversos relacionados aos eletrodos pode ser explicada pela fisiopatologia peculiar da C/DAVD que leva à perda progressiva de miocárdio e à substituição fibrogordurosa que pode tanto gerar dificuldades para localização de um local adequado para implante dos eletrodos, quanto comprometer os limiares de comando e sensibilidade durante o seguimento clínico.44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
https://academic.oup.com/europace/advanc...
,55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72. Outro aspecto é que se tornou evidente que os CDIs podem ser inadequadamente implantados em pacientes com um diagnóstico falso de C/DAVD com base na má interpretação de estudos de RMC.44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
https://academic.oup.com/europace/advanc...
,55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.

Os CDIs unicamerais são recomendados para minimizar o risco de complicações relacionadas ao uso prolongado desse dispositivo, especialmente em pacientes jovens. Embora o número de intervenções inadequadas possa ser diminuído por um sistema de detecção de dupla câmara, o eletrodo adicional predispõe a um risco maior de complicações de curto e longo prazos.2222 Corrado D, Basso C, Judge DP. Arrhythmogenic cardiomyopathy. Circ Res. 2017;121(7):784-802. A estimulação anti-taquicardia é altamente bem-sucedida na terminação da arritmia ventricular e deve ser programada em todos os dispositivos.4242 Link MS, Laidlaw D, Polonsky B, Zareba W, McNitt S, Gear K, et al. Ventricular arrhythmias in the North American multidisciplinary study of ARVC: predictors, characteristics, and treatment. J Am Coll Cardiol. 2014;64(2):119-25. O papel do CDI subcutâneo está sob investigação.

Tomando como base os resultados de estudos que definiram os preditores independentes de eventos arrítmicos maiores (ou seja, MSC, parada cardíaca devido à FV, TV sustentada e intervenções apropriadas do CDI), o ITF propôs um fluxograma de indicação de CDI baseado em três categorias de risco de MSC (Figura 4).44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
https://academic.oup.com/europace/advanc...
,55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.,3434 Corrado D,Wichter T, Link MS, Hauer RN, Marchlinski FE, Anastasakis A, et al. Treatment of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy/dysplasia - an International Task Force Consensus Statement. Circulation. 2015;132(5):441-53. As recomendações para a implantação do CDI para cada categoria de risco se baseiam não apenas no risco estatístico, mas também nos fatores gerais de saúde, socioeconômicos, psicológicos e adversos do dispositivo.

Figura 4
Fluxograma de indicações para implante de CDI na C/DAVD. O fluxograma toma como base os dados disponíveis sobre as taxas de mortalidade anual associados a fatores de risco específicos. Alto risco de grandes eventos arrítmicos: >10%/ano; risco intermediário:1% a 10%/ano e baixo risco: < 1%/ano. As indicações para a implantação de CDI foram determinadas por consenso, tendo em conta não só o risco estatístico, mas também o estado geral de saúde, os fatores socioeconômicos, o impacto psicológico e os efeitos adversos do dispositivo. MSC: morte súbita cardíaca; FV: fibrilação ventricular; TV: taquicardia ventricular; VD: ventrículo direito; VE: ventrículo esquerdo. *Veja o texto para a distinção entre fatores de risco principais e menores. Adaptada de Corrado et al., 2017.2222 Corrado D, Basso C, Judge DP. Arrhythmogenic cardiomyopathy. Circ Res. 2017;121(7):784-802.

Transplante cardíaco

É raro que um paciente com C/DAVD necessite de um transplante cardíaco. O transplante estaria indicado como terapia final nos casos de insuficiência cardíaca grave e não responsivos ao tratamento farmacológico e à terapia de ressincronização (naqueles pacientes com acometimento significativo do VE) ou nos pacientes com arritmias intratáveis (por exemplo, tempestades incessantes de TV ou FV refratárias à ablação por cateter e terapia com CDI).44 Wang W, James CA, Calkins H. Diagnostic and therapeutic strategies for arrhythmogenic right ventricular dysplasia/cardiomyopathy patient. Europace. 2018 Apr 23; [Epub ahead of print]. Disponível em: https://academic.oup.com/europace/advance-article
https://academic.oup.com/europace/advanc...
,55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.

Prevenção da progressão

O último aspecto a ser considerado em relação aos pacientes portadores de C/DAVD é a prevenção da progressão da doença. É importante observar que nenhum estudo examinou aspectos que sinalizem as características evolutivas e a velocidade de progressão da C/DAVD. A progressão é lenta, porém constante. Sugere-se que a restrição da realização de exercício físico possa interferir na velocidade de evolução da doença.1515 Ruwald AC, Marcus F, Estes NA 3rd, Link M, McNitt S, Polonsky B, et al. Association of competitive and recreational sport participation with cardiac events in patients with arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy: results from the North American multidisciplinary study of arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. Eur Heart J. 2015;36(27):1735-43. Um tratamento curativo definitivo exigirá um conhecimento mais profundo dos mecanismos biológicos e fatores ambientais envolvidos na patogênese da C/DAVD.55 Corrado D, Link MS, Calkins H. Arrhythmogenic right ventricular cardiomyopathy. N Engl J Med. 2017;376(1):61-72.

Perspectivas futuras

Avanços significativos foram obtidos considerando os poucos mais de 30 anos de diagnóstico desta patologia. Entretanto, dada a sua raridade, muitas lacunas persistem.

É possível definir algumas áreas de interesse que possibilitarão a melhor condução clínica dos pacientes e definição da população de risco de morte súbita:

  • Embora ainda não disponível na rotina, a possibilidade futura de uma triagem genética dos pacientes e familiares com suspeita clínica de C/DAVD pode se tornar de extrema relevância com potenciais implicações na compreensão da patogênese e no manejo dos indivíduos afetados.

  • Um maior refinamento na detecção de anormalidades morfológicas possibilitará um maior refinamento no algoritmo para identificação de portadores de C/DAVD e melhor entendimento de sua história natural. Um aprimoramento nas técnicas de imagem (ressonância magnética e ecocardiograma), além da possibilidade de seguimento com RM nos pacientes que receberam implante de CDI RM-compatível.

  • Estudos que procurem analisar a correlação fenótipo-genótipo poderão esclarecer a história natural da doença e a maior propensão para desenvolvimento de arritmias malignas e, por conseguinte, definir o melhor momento para iniciar uma intervenção médica.

A denominação desta cardiomiopatia tem sido discutida há anos. O debate entre denominá-la DAVD ou CAVD é a representação de duas visões diferentes de sua fisiopatologia, processo degenerativo ou anormalidade de desenvolvimento. Provavelmente, ambas visões estão envolvidas; embora a terminologia inicialmente proposta por Fontaine - “dysplasia” - seja provavelmente questionável, este termo tem sido usado e aceito por 40 anos e, persistirá incorporado a história e descrição desta cardiomiopatia.

Homenagem

Guy Fontaine faleceu em 7 de março de 2018 aos 82 anos.

Foi pioneiro da eletrofisiologia moderna e da terapia das arritmias cardíacas; investigador visionário e mentor para muitos eletrofisiologistas. Fontaine iniciou suas contribuições estudando os primeiros marca-passos cardíacos nos anos 1960, e foi precursor do estudo das arritmias por cateter, introduzindo, em 1972, o mapeamento cardíaco cirúrgico para ablação de arritmias graves, síndrome de WPW e taquicardias ventriculares, o que lhe permitiu reconhecer e estudar a DAVD, seu assunto principal de pesquisa. Ele introduziu a ablação por cateter com os procedimentos de fulguração e estudou minuciosamente os métodos de mapeamento em 3D.

Guy Fontaine é autor de mais de 700 manuscritos e capítulos de livros. Recebeu inúmeros prêmios internacionais por suas contribuições e persistiu ativo até seu último dia de vida, apesar de estar sofrendo com uma grave doença incapacitante.

  • Errata
    No artigo “Cardiomiopatia/Displasia Arritmogênica do Ventrículo Direito (C/DAVD) – O Que Aprendemos após 40 Anos do Diagnóstico desta Entidade Clínica”, tabela 1 da versão português, item “5. Arritmias”, considerar correto para a frase “TV não sustentada ou sustentada com morfologia tipo BRD e eixo superior” BRE em substituição a BRD.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan 2019

Histórico

  • Recebido
    14 Ago 2018
  • Revisado
    12 Set 2018
  • Aceito
    12 Set 2018
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